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1. INTRODUÇÃO

1.3 Algas marinhas e polissacarídeos ácidos

1.3.2 Fucanas

Segundo as regras regentes referentes a nomenclatura de polissacarídeos, o termo fucana deveria ser usado para identificar polissacarídeos ricos em fucose. Apesar dessa definição simples, esta terminologia nem sempre é aplicada. Como no caso de polímeros neutros ricos em fucose, encontrados em fungos, mas que não são denominados de fucanas. Por outro lado, diferentes polissacarídeos contendo fucose sulfatada são denominados de fucanas, inclusive polissacarídeos que contém outros monossacarídeos como o principal componente, como é caso de fucanas da alga Spatoglossum schröederi, que apresentam galactose (ROCHA et al., 2005; NOBRE et al., 2013) ou ácido glucurônico como o principal monossacarídeo (BARROSO et al., 2008; ALMEIDA-LIMA et al., 2010; AMORIM et al., 2016). Por isso a IUPAC recomenda o uso do termo fucana para polímeros cuja composição contenha 90% ou mais de α-L-fucose sulfatada, enquanto os demais polissacarídeos devam ser chamados de fucoidan (BERTEAU & MULLOY, 2003). Contudo, facilmente encontram-se autores utilizando o termo fucoidan para homofucanas (GUPTA & ABU-GHANNAM, 2011). Discussões sobre nomenclatura de fucanas à parte, nesta dissertação as fucanas serão definidas como polissacarídeos sulfatados cujo monossacarídeo mais representativo é a α-L-

fucose sulfatada. Elas podem ser encontradas nas algas marrons e equinodermas, quando presentes nos equinodermas elas detêm estruturas simples, organizadas de forma linear com sequências repetitivas dos resíduos (PEREIRA et al.,1999). Já as fucanas existentes nas algas marrons, comumente, possuem estruturas heterogêneas, sendo bastante ramificadas, com

diferentes tipos de resíduos e graus de sulfatação, variando de acordo com a espécie e entre as partes da alga (DIETRICH et al., 1995).

Em 1995, Dietrich e colaboradores extraíram e caracterizaram os polissacarídeos ácidos das algas Dictyota mertensis, Padina gymnospora e Sargassum vulgare. Eles identificaram em cada alga três fucanas sulfatadas com padrões de migração eletroforética diferentes, sendo nomeadas de acordo com o perfil de migração no gel de agarose em bandas A, B e C. As diferenças na migração para cada banda sugerem estruturas definidas, estando assim os resíduos de sulfato e os monossacarídeos distribuídos de forma particular em cada banda.

Assim como as algas utilizadas no trabalho de Dietrich e colaboradores (1995), a alga

Spatoglossum schröederi possui três fucanas. Estas foram denominadas de fucanas A, B e C

em alusão as bandas A, B e C descritas por Dietrich e colaboradores (1995). A fucana A foi caracterizada inicialmente por Leite e colaboradores (1998), por meio de técnicas de cromatografia de exclusão molecular, metilação, hidrólises ácida, e enzimática (com o uso de glicosidases e sulfatases), espectroscopia de infravermelho, ressonância magnética nuclear. Esta fucana de 21 kDa é constituída por fucose, xilose, ácido glucurônico e sulfato, portanto uma xilofucoglucuronana, sua estrutura compreende uma cadeia central de ácido glucurônico unida por ligações do tipo β (1→3) com ramificações de fucose em C4. Algumas fucoses são substituídas por grupos sulfato em C4 e em C2 por dissacarídeos de xilose, que também podem estar sulfatadas como pode ser observado na Figura 3.

Figura 3 - Estrutura da fucana A proposta por Leite e colaboradores (1998).

Após a caracterização da fucana A, foram realizadas as identificações e caracterizações das fucanas B e C. A fucana B é uma xilofucogalactana com 21.5 kDa (ROCHA et al., 2005a), já a fucana C possui 24 kDa e é constituída principalmente por fucose, xilose, galactose e sulfato, sendo assim, também, uma xilofucogalactana (ROCHA et

al., 2005b). A fucana C não possui atividade anticoagulante, hemorrágica e citotóxica, mas

consegue estimular a síntese de um heparan sulfato antitrombótico nas células endoteliais de aorta de coelho, sugerindo assim um possível uso como agente antitrombótico (ROCHA et

al., 2005b). A fucana B apresentou atividade antitrombótica tempo-dependente in vivo,

embora não demonstrasse atividade anticoagulante in vitro (ROCHA et al., 2005a). Ela conseguiu inibir a adesão de células tumorigênicas CHO-K1 (células de ovário de hamster chinês) e uma mutante deficiente em xilosiltransferase CHO-745, às proteínas da matriz extracelular (ROCHA et al., 2001) por meio da ligação à fibronectina, bloqueando assim os sítios reconhecidos pelos ligantes de superfície (ROCHA et al., 2005a). Posteriormente, Nobre e colaboradores (2013) mostraram que a fucana B exibiu um efeito antiproliferativo e antimigratório sobre a linhagem CHO-K1 na presença da fibronectina, bloqueando a progressão do ciclo celular.

A fucana A é a representante mais estudada dentre as fucanas da alga Spatoglossum

schröederi, uma das explicações é o fato dela corresponder a 80% das fucanas que são

sintetizadas pela alga (ALMEIDA-LIMA, 2009). Leite e colaboradores (1998) demonstraram que a fucana A não apresentava atividade anticoagulante in vitro, mas conseguiu estimular a síntese de heparan sulfato antitrombótico pelas células endoteliais em cultura de forma semelhante ao observado para a heparina. A fim de entender como o efeito antitrombótico ocorria, Barroso et al. (2008) testaram a fucana A em um modelo experimental de trombose em ratos. Foi possível observar que após 8 horas de administração intravenosa a fucana exibiu um efeito dose-dependente de ação antitrombótica, efeito que também foi observado quando as vias de administração subcutânea, intramuscular e intraperitoneal foram empregadas. Também foi verificado que a fucana A estimulava a síntese de heparan sulfato de forma semelhante à heparina, sendo possível assim sugerir que o efeito antitrombótico desta fucana ocorre pela estimulação da síntese de um composto antitrombótico (BARROSO et al., 2008).

Diante deste potencial, Almeida-Lima e colaboradores (2010) decidiram avaliar a citoxicidade, mutagenicidade e genotoxicidade in vitro desta fucana. Eles observaram uma citotoxicidade frente às linhagens tumorais HeLa, PC3 (adenocarcinoma prostático), PANC (carcinoma pancreático), HL60 (leucemia) , ausências de mutagenicidade em teste Kado com cepas de Salmonella e de genotoxicidade utilizando o ensaio do cometa frente às células CHO (células de ovário de hamster chinês). Em seguida, foram avaliadas a toxicidade aguda e subcrônica da fucana A em ratos Wistar após administração subcutânea. Os resultados obtidos demonstraram que não houve alteração dos parâmetros hematológicos e bioquímicos, assim

como da morfologia e tamanhos dos órgãos dos animais (ALMEIDA-LIMA, 2011). Em conjunto, esses estudos indicam que a fucana A não possui toxicidade in vivo.

Com o objetivo de explorar se a atividade citotóxica da fucana A se mantinha frente a linhagens tumorais na forma de nanogel, Dantas-Santos e colaboradores (2012) modificaram quimicamente a fucana A com hexadecilamina deixando-as em forma de nanogel. Este nanogel inibiu consideravelmente a proliferação das linhagens tumorais HepG2, 786-0 (adenocarcinoma renal) e HS-5 (medula óssea), ao passo que induziu a proliferação de linhagens normais CHO e RAW (macrófagos). Ao analisarem o mecanismo de morte celular promovido pelo nanogel frente à linhagem 786-0, eles perceberam que a inibição da proliferação ocorria por mecanismos dependentes e independentes de caspases, além de ocorrer bloqueio das fases S e G2-M do ciclo celular.

Mais recentemente, Amorim e colaboradores (2016) avaliaram os efeitos antiproliferativos da fucana A na forma de nanopartículas de prata sobre linhagens tumorais e normais, eles observaram que a fucana A na forma de nanopartícula inibe proliferação das células tumorais, mas não interfere na proliferação das células normais. Embora o emprego da fucana A na nanotecnologia se mostre promissor, os custos para a purificação da mesma ainda inviabilizam seu uso comercial. Uma alternativa seria a utilização de frações ricas em fucanas A. Rocha (1998) mostrou que a partir de 50 g da alga é possível obter cerca de 5 g de frações ricas em fucana A: frações 0.5v (70%) e 0.6v (30%). Além disso, estas frações apresentam baixa contaminação por proteínas e compostos fenólicos, por outro lado, apresentam ácido algínico em sua composição, que também é um polissacarídeo bioativo.

Tendo em mente que a fucana A na forma de nanopartícula de prata teve suas atividades potencializadas, mas que o custo de sua obtenção é mais oneroso do que o de obtenção de frações ricas em fucanas, decidiu-se nesta dissertação, produzir nanopartículas de prata na presença de uma fração rica em fucana A (F0.5 v), utilizando para tal um método não agressivo para o meio ambiente, bem como, avaliar características físico-químicas e várias atividades das nanopartículas produzidas. Vale salientar, que esta fração também é rica em alginato (LEITE et al., 1998), que ainda não foi caracterizado nem estruturalmente nem com relação as suas atividades biológicas.

2 OBJETIVOS

Sintetizar, caracterizar e avaliar o potencial antiproliferativo das nanopartículas constituídas por prata e uma fração rica em ácido algínico e fucana A da alga marrom

Spatoglossum schröederi.

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