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3. Educação a Distância

3.3 Função social da Educação Superior a Distância

De início, é preciso pensar na educação superior a distância como essencialmente educação superior, sendo desenvolvida na modalidade a distância por opção ou necessidade metodológica, pedagógica, social ou política. Esta demarcação busca contribuir para que não ocorra o seu desvinculamento da academia, da pesquisa, da docência e de um dos maiores desafios que na atualidade se impõe à universidade brasileira: o de democratizar o acesso da população ao ensino superior. Também importa demarcar aqui que a presente discussão parte da compreensão de que esta tarefa cabe, essencialmente à universidade pública, esclarecendo também a escolha por discutir a EAD superior pública.

Tal intenção parte da ideia de que, em geral, os mercados veem na educação, especialmente a distância, uma forma de ampliar seus ganhos, reduzir pesquisa e investir cada vez menos em qualidade, visando em geral o lucro, pois

[…] Evidentemente, o modelo neoliberal selvagem, aplicado aos países periféricos segundo receitas das agências internacionais, só vem favorecer a expansão de iniciativas mercadológicas de larga escala, colocando nos mercados periféricos, a exemplo do que ocorre há muito no campo da comunicação, produtos educacionais de baixa qualidade a preços nem tão baixos. É aí que se abre o mercado da educação a distância, no qual o uso intensivo das TIC se combina com as técnicas de gestão e marketing, gerando formas inéditas de ensino que podem até resultar, às vezes e com sorte, em efetiva aprendizagem. (BELLONI, 2002, p. 121)

Cabe destacar, portanto, o que diz Boaventura Santos sobre os desafios da universidade. O autor afirma que a Universidade passa, desde o século XX, por três crises, quais sejam: a) a crise de hegemonia, que corresponderia às contradições entre as funções reais da universidade e as inúmeras outras funções que lhe foram sendo atribuídas, por exemplo, a produção do pensamento crítico e da cultura, a fim de atender a formação de uma elite e, do outro lado, a produção de conhecimentos instrumentais que destinavam-se à preparação para o mercado de trabalho, considerando o ponto de vista dos sistemas capitalistas. b) a crise de legitimidade, uma vez que suas restrições ao acesso deixavam de fora dela uma imensa parcela da população, oriunda da classe trabalhadora, que então passa a manifestar a intenção de romper com esta ordem, exigindo a democratização do acesso. c) a crise institucional, que contrapunha os anseios de autonomia aos critérios de eficácia e produtividade. (SANTOS e ALMEIDA FLHO, p. 14, 2008).

Tais crises, no Brasil, apresentaram-se agregadas agora a outros fatores como a mercantilização do ensino superior já mencionada por Belloni como forma de expansão deste ensino, especialmente através da multiplicação de IES (Instituições de Ensino Superior) com fins lucrativos, uma vez que

No octênio 1994-2002 quase dobra o número de IES – 851 para 1.637 ou 92,4% de aumento –, mas as IES públicas reduzem seu número em -10,5% contra um aumento de 127,8% das IES privadas. A proporção, que em 1994 era de 25,6% públicas e 74,4% privadas, agora, em 2002, é de 11,9% públicas e 88,1% privadas. (SGUISSARDI, 2011, p. 90)

As crises enfrentadas pela universidade e discutidas por Almeida Filho e Santos expõem a necessidade de que a universidade se fortaleça, que busque como prioridade o atendimento às demandas da sociedade, tornando-se cada vez mais relevante. Anísio Teixeira considerava que a universidade tem quatro funções fundamentais: a formação profissional, a do alargamento da mente humana, o que se torna possível nos processos educativos desenvolvidos pela universidade, a de desenvolver o saber humano, elaborando este saber e por último, transmitir a cultura nacional comum. (TEIXEIRA apud SGUISSARDI,

2011, p. 104)

Considerando o pensamento de Santos (2008), pode-se conceber a educação superior pública a distância no Brasil como elemento capaz de se inserir no contexto de desafios impostos à educação superior como elemento que deve contribuir para o fortalecimento das IPES e com a democratização do acesso à educação superior, especialmente para pessoas que enfrentam impedimentos para se inserirem na universidade presencial, seja por questões de moradia, muitas vezes distante dos centros universitários, de tempo disponível para os estudos presenciais por incompatibilidade com o trabalho ou ainda por adequação aos métodos utilizados pela universidade. Estes últimos, em especial, apresentam grande diversidade na EAD, considerando

A materialização de ambientes e metodologias educacionais inovadoras no contexto dos recentes, constantes e intensos avanços dos recursos tecnológicos de informação e comunicação, especialmente as tecnologias digitais, potencializando práticas de EAD que tradicionalmente estavam apoiadas em material impresso distribuído por correspondência. (MOTA e CHAVES FILHO, p. 464, 2011).

Compreende-se, portanto, que a coexistência da educação presencial e da educação a distância no ensino superior pode significar o avanço em ambas as propostas, na medida em que cada uma das modalidades pode se beneficiar das possibilidades apresentadas pela outra. Tal embricamento pode favorecer o desenvolvimento de projetos e práticas que conduzam à transição do conhecimento universitário para o que Santos definiu como conhecimento pluriversitário, o que extrapola os limites da universidade e que se relaciona transdisciplinarmente com o mundo, pois

À medida que a ciência se insere mais na sociedade, esta insere-se mais na ciência. A universidade foi criada segundo um modelo de relações unilaterais com a sociedade e é esse modelo que subjaz à sua institucionalidade actual. O conhecimento pluriversitário substitui a unilateralidade pela interactividade, uma interactividade enormemente potenciada pela revolução nas tecnologias de informação e de comunicação. (SANTOS e ALMEIDA FLHO, p. 14, 2008).

Desse modo, compreende-se que as perspectivas apontadas para a universidade a partir da interação com várias referências e do rompimento com o modelo de produção unilateral do conhecimento científico, notadamente quando se consideram as possibilidades de construção coletiva de conhecimentos propiciada pelos suportes digitais em rede, podem significar a aproximação cada vez maior e mais transformadora da universidade e da sociedade. Uma relação que pode transformar, positivamente, ambas as partes.