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IV. Jus Variandi

1. Fundamento

As empresas, devido a vários factores, por vezes são confrontadas inesperadamente com a necessidade de satisfação de determinado resultado tendo que oferecer respostas imediatas. Nestas circunstâncias, é necessário que os trabalhadores, nos termos legalmente previstos, se sujeitem provisoriamente a uma restruturação organizacional da actividade laboral.

Partindo de alguns exemplos, esta sujeição poderá passar pela alteração da actividade a desenvolver178, o modo de realizar a actividade ou mesmo a alteração do próprio local de trabalho179. Nestes termos, a razão de ser do jus variandi “reside nas necessidades de gestão do empregador, mais precisamente nas necessidades de compatibilizar os imperativos de gestão com as disponibilidades de mão-de-obra”180 sendo necessário que os trabalhadores se movimentem funcionalmente.

Ora, se o empregador, deparado com determinado problema de gestão, verifica que a resolução do mesmo não passa pela contratação de novos trabalhadores, diante essas necessidades, poderá, desde que preenchidos determinados requisitos, exigir ao trabalhador a prestação de uma actividade distinta da que, contratualmente, este se encontra obrigado a prestar181.

Mais uma vez, a lei atendeu às exigências de flexibilidade empresarial, as quais exigem que o trabalhador seja funcionalmente móvel182. O legislador não fez nada mais

178

Como refere LUÍS MIGUEL MONTEIRO, Da vontade contratual na configuração da prestação de trabalho, RDES, Ano XXXII, N.ºs 1-2-3-4, 1990, p. 328, “em atenção às necessidades da organização de meios no seio da qual o trabalhador executa a sua prestação, a lei admite uma forma de modificação unilateral temporária do objecto da obrigação principal do contrato de trabalho”.

179

Cfr. Neste sentido, BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER, Curso de Direito…, ob. cit., p. 328 e ss. 180

Cfr. MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, ob. cit., pp. 449-450. A Autora menciona dois exemplos, são eles: “o acréscimo ocasional de um trabalhador num sector e a subocupação noutro sector poderão justificar a deslocação temporária de trabalhadores, e a ausência de um trabalhador poderá ditar a necessidade de o fazer substituir, para que continue a ser assegurado o serviço”. Cfr. Ainda, no desenvolvimento da mesma ideia, FELICIANO TOMÁS DE RESENDE, As prestações das partes no contrato de trabalho, ESC n.º 32, 1969, p. 15, defendendo que a figura do jus variandi é exigida por motivos como: “a iminência de perigos ou prejuízos para a organização empresarial, a falta de trabalhadores, a alteração de técnicas ou mercados, em suma, interesses fundados das empresas e, por reflexo, da economia nacional”.

181

Cfr. Neste sentido MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, ob. cit., pp. 449-450. 182

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do que atribuir ao empregador um instrumento de gestão flexível, pois permite-lhe, perante a mão-de-obra que este tem ao seu dispor, o preenchimento das necessidades da empresa, necessidades estas, que não foram previstas aquando a celebração do contrato, sem que para isso tenha que recorrer a mais mão-de-obra183.

Resumindo, o recurso ao jus variandi surge pela necessidade de as empresas se adaptarem a novos condicionalismos184 “impedindo que a organização destas e a sua necessidade técnica de divisão e especialização do trabalho adquiram rigidez no plano jurídico”185

. Deste modo, confirma BERNARDO LOBO XAVIER186 que “no ritmo da vida moderna pode surgir a todo o tempo necessidade de uma mudança de técnica, ou uma crise, ou uma alteração dos mercados, que comprometa a eficácia do esquema de divisão de trabalho em que se alicerça a fixação contratual do tipo de actividade a desenvolver pelo trabalhador. Por outro lado, não poucas vezes acontecerá que os próprios acidentes da vida das empresas, a iminência de perigos ou a falta de alguns trabalhadores, venham embaraçar decisivamente o processo produtivo, se ao estorvo não se der pronto remédio, através de um novo plano de organização de trabalho”.

Surge assim, do poder que o empregador tem ao seu dispor, de em determinadas circunstâncias exigir do trabalhador a prestação de actividades que não fazem parte da actividade laboral, o jus variandi187.

183

Cfr. Neste sentido, DIOGO VAZ MARECOS, ob. cit., p. 310. 184

Cfr. Neste sentido, CATARINA CARVALHO, ob. cit., p. 1032. 185

Cfr. BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER, A determinação qualitativa…, ob. cit., p. 27. 186

Cfr. BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER, A determinação qualitativa…, ob. cit., p. 27. 187

Cfr. Neste sentido, BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER, A determinação qualitativa…, ob. cit., p. 27, expondo que “para ocorrer (…) à instabilidade das circunstâncias que determinam a dedução no contrato de uma especial modalidade de serviço, torna-se necessário conceder poderes amplos ao chefe da empresa, para livremente modificar a organização do trabalho, alterando, se for preciso, as funções dos seus empregados e assalariados. E a tal solução não devem obstar os princípios negociais; quando não entrará em crise a instrumentalidade do contrato de trabalho para acudir às necessidades das empresas em constante evolução”. Cfr. Ainda, neste sentido, MÁRIO PINTO/P. FURTADO MARTINS/ANTÓNIO NUNES DE CARVALHO, ob. cit., p. 111, “reconhece-se aqui a instrumentalidade do contrato de trabalho relativamente às finalidades da organização a que se destina e, consequentemente, permite-se, dentro de certos parâmetros, que sobrevindo necessidades relevantes inerentes ao funcionamento da organização, se reclamem do trabalhador tarefas não compreendidas no programa contratual”. Inserindo o jus variandi no princípio da mútua colaboração Cfr. PEDRO ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho ob. cit., p. 795, “no fundo, como a actividade laboral prossegue o fim do empregador, admite-se que possa ser exigido ao trabalhador uma prestação diversa. O poder de alterar e a obrigação de exercer uma actividade diversa inserem-se no princípio da mútua colaboração”.

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