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7. A IGREJA CATÓLICA E A CONTRIBUIÇÃO ÉTICO-CIDADÃ NO MUNICÍPIO DE CURRAIS NOVOS

7.1 QUAIS OS FUNDAMENTOS DA ÉTICA CRISTÃ?

Fundada por Jesus Cristo no século I a partir da realização do mandamento do amor, a Igreja Católica em sua doutrina social é regida por alguns princípios essenciais: o bem comum, a igualdade, a subsidiariedade, a participação e a solidariedade. Além destes princípios, ela é alicerçada em três valores fundamentais: a verdade, a liberdade e a justiça.

Diante de uma crise moral no mundo contemporâneo Eduardo Lopez Azpitarte (1995) fala de um ser humano desintegrado e que vive o paradoxo entre o ser e o dever ser. Em sua concepção o “homem nasce como uma realidade incipiente, inacabada, com a necessidade de evolução e desenvolvimento posterior”

(AZPITARTE, 1995, p. 111). Na filosofia chamaríamos tal compreensão de ser potencial, isto é, por mais que o homem tente a integração do ser, enquanto estiver neste mundo ele é um ser em devir, em aperfeiçoamento, tendo em vista a busca da felicidade. Nesta procura o homem vai formando sua conduta e se depara com o problema da liberdade. Por ter a capacidade de escolha o homem torna-se autônomo em relação aos outros seres e pelo uso da razão pode distinguir entre o certo e o incerto, o bem e o mal.

Depara-se, dessa forma, com a necessidade de uma liberdade responsável visto que não é apenas portador de direitos, mas também de deveres. E neste aspecto, ele vislumbra a importância dos outros ao abrir-se para a dimensão da alteridade. É o momento que o homem forma a sua consciência ética. Comparato (2016, p. 464) fala da existência desta “consciência humana a partir das dimensões individual e coletiva”. A primeira é essencial para a pessoa humana encontrar-se consigo mesma. A segunda para que possa interagir e encontrar-se com o mundo exterior. Sendo o homem dotado de liberdade ele torna-se “capaz de escolher conscientemente as finalidades de suas ações que podem ser boas ou más” (COMPARATO, 2016, p. 467).

Esta consciência ética do uso de uma liberdade responsável põe o ser humano diante do princípio do bem comum. Segundo a Constituição Gaudium et

spes nº. 26 por bem comum entende-se “o conjunto daquelas condições da vida

social que permitem aos grupos e a cada um dos seus membros atingirem de maneira mais completa e desembaraçadamente a própria perfeição” (VIER, 2000, p. 169). A doutrina social da Igreja nos mostra que é responsabilidade de todos a prática do bem comum e, por ser o homem um ser sociável, ele deve buscar a integração de sua dignidade e lutar pelos próprios direitos fundamentais.

Neste aspecto, é tarefa da comunidade política prezar por estes direitos para que o cidadão possa usufruir individualmente ou em família de uma vida digna e justa perante o Estado. Para isso o princípio da igualdade é fundamental. Comparato ao citar o pensamento aristotélico, mostra que a igualdade é a própria essência da justiça. Para ele o “homem injusto é aquele que viola o princípio da igualdade, pois injusto diz-se, comumente, do que é desigual” (COMPARATO, 2016, p. 562).

Outro princípio fundamental é o da subsidiariedade. Neste, todas “as sociedades de ordem superior devem pôr-se em atitude de ajuda [...] em relação às

menores” (PONTIFÍCIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”, 2008, p. 112). Se não houver a compreensão daqueles que tem maior condição econômica em relação aos menos favorecidos torna-se muito difícil promover a dignidade humana entre as nações.

O quarto princípio é o da participação. Nela, o cidadão “como indivíduo ou associado com os outros, diretamente ou por meio de representantes, contribui para a vida cultural, econômica, política e social da comunidade civil a que pertence” (PONTIFÍCIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”, 2008, p. 114). Se o bem comum é interesse de todos, os cidadãos pela sua participação política na exigência de um mundo mais justo e da garantia de seus direitos fundamentais torna-se um agente proativo na construção de uma sociedade melhor.

Fechando o ciclo e não menos importante, temos o princípio da solidariedade. Ele apresenta-se a partir da necessidade humana de sociabilidade, da igualdade de seus direitos e da interdependência entre os homens e os povos.

A solidariedade não diz respeito, portanto, a uma unidade isolada, nem a uma proporção entre duas ou mais unidades, mas à relação de todas as partes de um todo, entre si e cada uma perante o conjunto de todas elas. São de cunho solidário não só o conjunto das relações interindividuais dos cidadãos na sociedade política, e dos povos na cena internacional, mas também a relação do Estado com qualquer cidadão ou grupo de cidadãos, ou da Organização da Nações Unidas com qualquer de seus membros

(COMPARATO, 2016, p. 581)

Analisando o pensamento de Fábio Konder Comparato percebemos que ser solidário não é simplesmente ajudar a quem precisa ou sensibilizar-se com a dor do outro, mas cumprir com os deveres para com os cidadãos que necessitam de dignidade e justiça diante da estrutura estatal.

Quanto aos valores, a verdade é primeiro foco de nossa análise. Mas, o que é a verdade? Existem três concepções que podem nortear nossa compreensão. Na primeira apresentada pelos gregos ela é definida como aquilo cujo intelecto (razão) está adequado a coisa pensada: “o verdadeiro é que se manifesta aos olhos do corpo e do espírito [...] e o falso é aquilo que está encoberto, escondido e dissimulado” (CHAUÍ, 2000, p. 123). O segundo conceito de verdade vem do pensamento romano apresentando a partir do termo veritas. Ela está relacionada aos fatos através do rigor e da precisão dos relatos. A última ideia, oriunda da

concepção semítica” não está ligada ao pensamento, mas à vida ética” (COMPARATO, 2016, p. 526). Ser verdadeiro é cumprir com a palavra e prezar pelo bem comum no âmbito social.

O segundo valor a ser apresentado é a liberdade. É bom lembrarmos que ser livre não significa ausência de obrigações. O homem por estar inserido no contexto social faz o uso de sua liberdade na capacidade de fazer suas escolhas a partir da compreensão do todo. Uma perspectiva puramente reducionista empobrece o termo e deturpa o próprio entendimento do que é ser livre. Para a Doutrina Social da Igreja (2008, p. 121) “o valor da liberdade deve ser respeitado e honrado na medida que se consente a cada membro da sociedade realizar a própria vocação pessoal”. Ser livre é buscar a verdade que é professada através da escolha das ideias religiosas, culturais e políticas.

A justiça é o terceiro e último valor de nossa análise. Seu fundamento é pautado na valorização do outro como pessoa. O princípio essencial é “não fazer aos outros aquilo que não queremos que nos façam” (COMPARATO, 2016, p. 531). Esta máxima defendida por Platão no livro “A República” nª 335c, ilustra ser a justiça embasada no bem comum. Assim, justo é aquele que busca a moderação e os caminhos retos. É ser fiel aos próprios deveres e as leis universais que prezam pelo bem da humanidade. Este valor é fundamental em todas as situações de vida social, bem como para o uso da política entre os homens. O não cumprimento da justiça gera uma atmosfera de insegurança e descrença por parte dos cidadãos. A missão da Igreja Católica e das demais religiões é contribuir para a formação de uma consciência reta nas pessoas tendo em vista desenvolverem valores e princípios capazes levá-las a busca da felicidade por intermédio da prática do amor.

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