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Qaudro 5 Acentuação/omissão do acento

2.2 Gêneros textuais/discursivos em LE/L2

O gênero relatório constitui uma prática social bastante disseminada nas esferas profissionais, especialmente naquelas voltadas para a formação de docentes, desenvolvido em disciplinas como prática de ensino ou estágio supervisionado, conforme apontamos anteriormente. Ao assumirmos o relatório enquanto gênero textual/discursivo, partimos para uma noção de gênero na perspectiva de Bakhtin (1997, p. 280), para ele “A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana”. Dessa maneira, os enunciados refletem determinadas condições e finalidades de acordo com essas esferas, não apenas pelo seu conteúdo temático e por seu estilo verbal (recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais), mas também por sua construção composicional (BAKHTIN, 1997). O autor acrescenta que cada uma dessas esferas de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso o que denomina de gêneros do discurso.

A infinitude dos gêneros apontada por Bakhtin parece tornar seu estudo ou seus traços comuns abstratos e de difícil operacionalização, já que pressupõe a variedade de intenções das pessoas que falam ou escrevem. No entanto, Dolz e Scheneuwly (2004) nos explicam que mesmo sendo mutáveis e flexíveis, os gêneros apresentam certa estabilidade, ou mesmo, têm certa estrutura definida por sua função, aquilo que denominam de plano comunicacional.

A classificação dos gêneros ainda não está completamente resolvida pelos campos da Linguística Textual ou pela Linguística Discursiva, por exemplo. A própria nomenclatura dada como gênero do discurso é alvo de contestações e aparecem termos como gêneros discursivos e gêneros textuais8 a depender da perspectiva teórica. Um dos paradoxos do gênero reside ainda no fato de não poder agrupá-los de forma sistemática, dado o seu caráter multiforme, maleável e espontâneo (DOLZ e SCHNEUWLY, 2004). Embora conscientes dessa dificuldade, esses mesmos autores apresentam um enfoque de agrupamento de gêneros, ainda que provisória, a partir de cinco modalidades retóricas: da ordem do narrar, do relatar, do expor e do descrever. Para cada agrupamento levam-se em conta os aspectos tipológicos e as capacidades de linguagem dominantes. No caso do relatório, este está na ordem do expor, os domínios

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Não pretendemos discutir aqui, quais dessas expressões poderá ser mais pertinente, tomaremos esses termos de forma intercambiável, a menos em casos em que se necessite identificar um fenômeno mais específico, de forma mais clara e objetiva.

sociais de comunicação são a transmissão e a construção de saberes; a capacidade de linguagem dominante é a apresentação textual de diferentes formas dos saberes. Ressaltamos que a proposta dos autores está voltada para o ensino de língua materna, porém cabe ao ensino e aprendizagem de segunda língua/língua estrangeira. Esclarecemos mais uma vez que esses modelos não são estanques, visto não poder classificar um gênero de maneira definitiva ou absoluta.

Marcuschi (2008) aponta várias perspectivas para o estudo dos gêneros e elenca um rol de tendências desenvolvidas no Brasil aliadas a perspectivas teóricas em curso internacionalmente, são elas: a) perspectiva sócio-histórica e dialógica (Bakhtin); perspectiva comunicativa (Steger, Gülich, Bergmann, Berkentkotter); perspectiva sistêmico-funcional (Halliday); perspectiva sociorretórica de caráter etnográfico (Swales, Bhatia); perspectiva interacionista e sociodiscursiva (Bronckart, Dolz, Scheneuwly); perspectiva da análise crítica (N. Fairclough, Kress) e perspectiva sociorretórica/sócio-histórica e cultural, (Miller, Bazerman, Freedman). Dentre tantas propostas, ele explicita que esses enquadres ainda são precários, posto não representarem de modo completo as possibilidades teóricas existentes. Traz-nos ainda, algumas noções que consideramos importantes para a noção de gênero textual.

Partindo da tese de que é impossível não se comunicar verbalmente por algum gênero, assim como é impossível não se comunicar por algum texto, posição defendida por Bakhtin (1997) e por Bronckart (1999), Marcuschi (2008) explica que é necessário distinguir duas noções que se convencionou chamar de tipo textual e gênero textual. Segundo ele “quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma

forma linguística e sim uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações particulares” (MARCUSCHI, 2008, p. 154). A distinção proposta torna-se necessária em todo trabalho com a produção e a compreensão textual.

Assim o tipo textual “designa uma espécie de sequência teoricamente

definida pela natureza linguística de sua composição (aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas)”. A expressão gênero textual refere-se a “textos materializados em situações comunicativas recorrentes. Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de força históricas, sociais, institucionais e técnicas”. (MARCUSCHI, 2008, p. 155).

Outra noção pertinente nessa compreensão diz respeito aos domínios discursivos em que os gêneros são constituídos, esses domínios no sentido bakthiniano,

constituem práticas discursivas nas quais podemos identificar grupos de gêneros textuais que em alguns casos lhes são próprios ou específicos, como por exemplo, os discursos jurídicos, jornalístico, religioso, etc. Numa tentativa de distribuição dos gêneros por domínio discursivo (MARCUSCHI, 2008), o gênero textual relatório inscreve-se no domínio instrucional (científico, acadêmico e educacional), em nosso caso, inserido no ambiente discursivo universitário.

O relatório de estágio integra uma diversidade de gêneros, entre os quais destacamos os planos de aula, diários, atividades realizadas com alunos, cujo propósito é expor, ou mesmo relatar atividades desenvolvidas pelo aluno estagiário ao supervisor do estágio ou professor responsável por esse componente curricular. É apresentado ao final do curso e funciona como um dos principais instrumentos de avaliação.

Do ponto de vista da composição textual, o relatório de estágio apresenta, geralmente, uma introdução, um desenvolvimento e uma conclusão. Na primeira parte do texto são estabelecidos os objetivos do relatório, tratando do trabalho desenvolvido no estágio, bem como o contexto da área de atividade. Na segunda parte, relatam-se as atividades desenvolvidas apoiando-se num referencial teórico já trabalhado em sua formação. Na última parte, realiza-se o fechamento do tópico desenvolvido, delineando os aspectos principais, as dificuldades encontradas, sugestões e avaliação.

Dessa forma, os relatórios são documentos formais nos quais se descrevem fatos fundamentados nos referenciais teóricos pesquisados, aliados aos conhecimentos acadêmicos e experiências do aluno estagiário, de modo que podem se enquadrar na proposta delineada no início por Dolz e Schneuwly em um texto que apresenta diferentes formas de saberes, inscritos em um domínio discursivo instrucional, conforme aponta Marcuschi (2008).