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CAPÍTULO 2 PRODUÇÃO CIENTÍFICA E CIÊNCIAS AGRÁRIASErro! Indicador

2.1 Gênese da Ciência no Brasil

Quando se trata do desenvolvimento da Ciência no território brasileiro, é uma falácia afirmar que não foram desenvolvidos mecanismos de institucionalização da ciência ainda no Brasil colonial. Mesmo que de forma incipiente, após a chegada dos portugueses em solo brasileiro iniciou-se a precursora institucionalização das práticas científicas no Brasil, organizando e formalizando a as pioneiras pesquisas em documentos técnicos e criando e desenvolvimento observatórios astronômicos, por exemplo. Os primórdios das pesquisas científicas brasileiras deveram-se, principalmente, à sua metrópole: Portugal (MONTOYAMA, 2004).

Muitas vezes, apenas os ingleses, franceses e holandeses são lembrados como os que desenvolveram relevante poderio tecnológico no período da expansão marítima européia, ocorrida entre os séculos XV e XVII. Porém, como salientado por Montoyama (2004), Portugal conduziu, de forma pioneira, diversas pesquisas científicas no campo da navegação, desenvolvendo importantes tecnologias navais, baseando-se em seus conhecimentos nas áreas da matemática, cartografia, astronomia, metereologia, cosmografia e de engenharia náutica, se tornando, juntamente com a Espanha, as maiores potências em navegação deste período. Desde o descobrimento, muitas descrições foram produzidas por estudiosos e curiosos – viajantes, naturalistas, botânicos, religiosos e navegadores – caracterizando os diferentes aspectos geológicos, botânicos e zoológicos, além de relatos sobre os hábitos e os costumes indígenas presentes na colônia. A partir destes dados, uma infinidade de pesquisas científicas – desenvolvendo importantes conhecimentos e descobertas sobre diversos assuntos – foi conduzida neste período e posteriormente, principalmente, na Europa. Nos séculos XVII e XVIII foi a vez da França e da Holanda contribuírem para a investigação científica e para a inovação técnica do Brasil colonial. Os franceses e os holandeses se preocuparam mais que os portugueses neste quesito – criando museus, bibliotecas e observatórios astronômicos –, produzindo um vasto número de informações estatísticas, mercadológicas, iconográficas e descritivas (MONTOYAMA, 2004).

Para Montoyama (2004), o temor em relação ao surgimento de possíveis movimentos nativistas23 no Brasil fez com que a metrópole lusitana não permitisse o desenvolvimento de manufaturas na Colônia. Isso, aliado a outros fatores, dificultou o desenvolvimento tecnológico do Brasil colonial.

A partir de 1807, como destacou Nagamini (2004), após a chegada da família real ao Brasil24, a Ciência passou a ser conduzida de forma mais institucionalizada na colônia, ainda que restrita a poucos estabelecimentos – como jardins botânicos, museus e Universidades, por exemplo – até o fim do período colonial. Declarando como intuito principal qualificar profissionais ligados à saúde, à defesa e à aclimatação de espécies vegetais na Colônia, importantes instituições de caráter técnico e científico foram desenvolvidas. Um ano após a chegada da corte portuguesa – 1808 – algumas destas importantes instituições já haviam sido inauguradas, merecendo destaque a criação: das escolas de Cirurgia da Bahia; de Anatomia e Cirurgia do Rio de Janeiro; das academias dos Guardas-marinhas25; além do Real Horto no Rio de Janeiro. Em 1809 já eram impressos os primeiros livros escritos por europeus e traduzidos por mestres que atuavam nestas instituições. Com o passar das primeiras décadas do século XIX, várias expedições foram financiadas pela realeza para coleta e catalogação das diferentes variedades de espécies vegetais e animais existentes no território abrangido pela Colônia.

Com o fim do período colonial, em 1822, a abolição da escravidão, em 1888 e a independência do Brasil, em 1889, a produção científica e tecnológica passou a exercer ainda mais relevância para o Brasil, crescendo exponencialmente o número de instituições e para promover o ensino superior e o desenvolvimento da ciência e tecnologia (NAGAMINI, 2004).

A revolução técnico-científica, iniciada na segunda metade do século XIX, que favoreceu ao desenvolvimento da petroquímica, dos motores à combustão, da

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Mesmo sem caráter separatista, estes movimentos questionavam as ordens coloniais, tendo por objetivo obterem mais autonomia em relação à metrópole e melhoria das condições políticas, econômicas e sociais da Colônia (MONTOYAMA, 2004).

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Escoltada pela marinha inglesa e acompanhada de aproximadamente 12 a 15 mil lusitanos, a família real portuguesa desembarcou no Brasil em 1807, fugindo dos ataques do exército francês a Portugal (NAGAMINI, 2004).

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De acordo com Nagamini (2004), a criação destas academias militares contribuiu enormemente para as pesquisas astronômicas brasileiras – devido à instalação de observatórios astronômicos em algumas destas – e para o desenvolvimento da engenharia bélica e civil brasileira, com destaque para o setor dos transportes.

engenharia elétrica, da medicina, entre outros, contribuiu muito para a fragmentação da Ciência em diversas áreas do conhecimento e campos de pesquisa. Isto, juntamente com as novas demandas sociais construídas a partir de então – necessidade de energia elétrica, de transportes mais eficientes e de serviços sanitários, por exemplo – foram fatores que contribuíram positivamente para que a ciência e a tecnologia desempenhassem ainda mais significância no cenário brasileiro (NAGAMINI, 2004). Aliado a estes, as diferentes posturas governamentais da República Velha26, em relação às governanças coloniais e imperiais, certamente, também influenciaram para este resultado. Para os republicanos, era necessário que o Brasil “civilizasse-se” seguindo os moldes europeus, dando maior importância para a industrialização e para a modernização dos processos produtivos (VALLA e SILVA, 1981).

A Primeira República (1889-1930), no que se refere ao posicionamento político- econômico do Brasil na Divisão Internacional do Trabalho, como destacou Rodrigues (1987a), se manteve como agroexportadora e desenvolveu pouco o setor industrial, sendo um prolongamento do Segundo Império (1840-1889). Mesmo assim, esta nova fase política brasileira contribuiu de forma mais atuante – quando comparada com a imperial – para o fomento da Ciência e Tecnologia e para a formação de recursos humanos mais bem qualificados no país (NAGAMINI, 2004).

Muitos centros experimentais de plantas e jardins botânicos foram reestruturados e ampliados e, embora seja certo que alguns casos não foram bem-sucedidos, como é o caso da Fazenda Santa Mônica, no Rio de Janeiro (RODRIGUES, 1987a), outros obtiveram mais sucesso como a Imperial Estação Agronômica, criada em 1887 e, em 1892, transformada no IAC (Instituto Agronômico de Campinas) (NAGAMINI, 2004).

Neste período também foram criadas e reformuladas importantes instituições para desenvolvimento de conhecimentos e tecnologias agrícolas, como o Instituto de Zootecnia, em 1905, e a ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), em 1925. Importantes institutos ligados à área médica, farmacológica e sanitária

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Em 15 de novembro de 1889, um grupo de militares liderados pelo Marechal Deodoro da Fonseca depuseram, sem o uso da violência, o imperador Dom Pedro II, pondo fim ao governo imperial no Brasil, proclamando, deste modo, a república.

também foram criados, como o Instituto Vacinogênico, em 1892, o Instituto Butantan, em 1901, e o Instituto Soroterápico Nacional, em 1900, posteriormente transformado em Fundação Oswaldo Cruz. Acrescido a tudo isso, proeminentes associações de pesquisadores e revistas científicas foram criadas, como a ABC (Academia Brasileira de Ciências), em 1916, a ABE (Associação Brasileira de Educação), em 1924, a

Revista da Sociedade Brasileira de Ciências, em 1917, e a Revista da Academia Brasileira de Ciências, em 1926. Por fim, algumas das mais importantes Faculdades

e Universidades públicas do país foram instituídas nesta primeira metade do século XX, como a Universidade de São Paulo (USP), criada em 1936 (NAGAMINI, 2004). Outro marco que tange a institucionalização da Ciência no Brasil foi a criação do CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa), em 1949. De acordo com Valla e Silva (1981), a justificativa para a criação de tal organismo foi a idéia de que, a partir do mesmo, seria possibilitado ao Brasil alcançar o status dos países desenvolvidos, denominadas de nações cultas por muitos dirigentes e políticos da época.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os investimentos em Ciência e Tecnologia no Brasil passaram a ser vistos como cruciais, também, para a segurança nacional. Por este motivo, em alguns momentos na década de 1950, mesmo com um discurso de fomento e incentivo à ampliação das pesquisas nas diversas áreas do conhecimento, inclusive criando importantes institutos ligados ao CNPq – como o INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), em 1952, o IBBD (Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação), em 1954, e o IMPA (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), em 1955, por exemplo –, o Estado brasileiro reservou como prioridade científica nacional, o desenvolvimento da tecnologia nuclear (VALLA e SILVA, 1981).

Outro importante órgão de fomento à pesquisa criado na década de 1950 foi a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), em 1951, cujo objetivo era o de promover a capacitação de pessoal com alta especialização, atuando, principalmente, na ampliação da pós-graduação em nível de mestrado e doutorado stricto sensu, além de oferecer bolsas de estudos para pós-graduandos. Como observou Coutinho (1994), a criação desta instituição esteve diretamente concatenada com a industrialização brasileira e a conseguinte demanda por mão-de- obra mais especializada.

De acordo com o mesmo autor, entre 1966 e 1980, o Estado brasileiro, motivado pela industrialização e buscando modernizar o país, fez dobrar a quantidade de Centros de Pesquisa estatais em solo brasileiro. Além destes órgãos, que incluem Universidades e empresas de pesquisa, outras instituições de fomento á Ciência foram criadas, como a FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos), em 1967, e a FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), em 1962.

Os investimentos em Ciência e Tecnologia durante o regime militar foram semelhantes aos dos governos anteriores. As políticas de Ciência e Tecnologia deste regime, assim como as políticas anteriores, valorizavam timidamente as ciências sociais, seguindo uma lógica extremamente produtivista, com a produção tecnológica altamente planejada, organizada e financiada pelo Estado, buscando atender, majoritariamente, às demandas do setor produtivo brasileiro (VALLA e SILVA, 1981).

O investimento em Ciência e Tecnologia no Brasil, mesmo sempre inferior27 ao investimento dos países desenvolvidos nesta área – com médias superiores à 2% do PIB –, a partir da proclamação da República, sobretudo a partir da era Vargas, passou a ser visto como algo crucial para o desenvolvimento do país. Devido a esta premissa, o incentivo ao desenvolvimento da Ciência e Tecnologia passou a fazer parte de importantes pautas políticas ao longo de todo o século XX (VALETIM, 2002). Este ganho de importância da ciência e o conseguinte aumento dos investimentos neste setor influenciaram para o dinamismo das ciências no Brasil, assim como, para (re)configurar o universo das distintas áreas do conhecimento, incluindo, das Ciências Agrárias.