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CAPÍTULO 3 PRODUÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA NAS UNIVERSIDADES

3.2 Investimentos em pesquisa pelo terceiro setor no Brasil

Como visto, a partir do advento da modernidade, fortaleceu-se a idéia, nas diferentes nações ao redor do mundo, de que era necessária a existência de um Estado moderno, fazendo com que os mais diversos países adotassem, com o passar do tempo, este tipo de modelo político e de governança estatal. Embora em alguns momentos o Estado tenha sido visto como a principal ferramenta para a condução da vida em sociedade, dicotomicamente, com o decorrer do século XIX, intensificando-se a partir do declínio soviético – a partir da década de 1970 –, também ganhou força o pensamento de que o Estado sozinho não era suficiente para atender todas as demandas da sociedade (DUARTE e TORRES, 2005).

Este pensamento, representado, principalmente, pela corrente neoliberal, anunciava que o Estado – primeiro setor – era incapaz de oferecer à sociedade os bens e serviços que ela necessitava, fazendo com que a iniciativa privada – segundo setor – assumisse importante papel, já que partilharia do compromisso de promover o bem comum. Seguindo este modelo, não apenas a iniciativa privada atuaria mais intensamente junto à sociedade, mas o Estado também deveria reduzir seu papel, regulando menos a economia, agindo mais como um mediador em determinadas circunstâncias sociais, políticas e econômicas. Entretanto, a proposta neoliberal, de uma maneira geral, também se apresentou ineficiente e deixou profundas seqüelas na sociedade (DUARTE e TORRES, 2005).

Neste sentido, do mesmo modo que o Estado se mostrou limitado para sozinho resolver os problemas da sociedade, o modelo neoliberal também se mostrou ineficiente para atender a todas as demandas sociais, ampliando ainda mais as disparidades econômicas, a pobreza e os danos ambientais. Isto fez com que outra esfera, não representada pelo Estado ou pelo mercado, ganhasse força e destaque no mundo contemporâneo: o terceiro setor48.

O terceiro setor não se limita às práticas assistencialistas ou de denúncia, mas, também, participa e financia pesquisas científicas, ainda que de forma incipiente e

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O terceiro setor é um arranjo da sociedade civil, representado por organizações sociais – sindicatos, associações de moradores de bairro, etc. –, que objetivam contribuir para efetivação dos direitos humanos, combater as desigualdades sociais, proteger o meio ambiente, entre outras ações.

pouco representativa no Brasil, quando comparado ao total de investimentos em pesquisas no país. De acordo com Mattos e Drummond (2005), mesmo não gerando

e distribuindo lucros, algumas ONGs movimentam e transferem significantes valores

financeiros que, muitas vezes, são aplicados no financiamento de pesquisas

científicas, executados pelas próprias organizações ou por outras instituições.

As pesquisas desenvolvidas ou financiadas pelas ONGs prestam importantes serviços para as comunidades envolvidas com as mesmas, buscando soluções para os problemas socioambientais e para melhoria da qualidade de vida. Neste sentido, de maneira geral, é de interesse público que as ONGs participem do processo de desenvolvimento científico e tecnológico, já que estas organizações visam o desenvolvimento social e, na maioria das vezes, são marcadas por uma ótica ambientalista (MATTOS E DRUMMOND, 2005).

Com base na discussão acerca dos interesses públicos e privados que influenciam nos direcionamentos estatais e sobre os investimentos em Ciência e Tecnologia no Brasil, será analisada, a seguir, a produção científica e tecnológica do CCA/UFV, a fim de identificar as principais origens dos recursos aplicados nas pesquisas desenvolvidas pelos pesquisadores deste Centro e os potenciais grupos e/ou setores que se beneficiam com tais pesquisas.

4 Procedimentos metodológicos

Este capítulo objetivou analisar os discursos dos professores do CCA/UFV sobre quem são os principais beneficiários das pesquisas realizadas neste Centro e, também, identificar as principais diferenças levantadas pelos pesquisadores em realizar pesquisas a partir do financiamento privado e estatal. Para tal, o capítulo foi delineado como descritivo-explicativo, com coleta de dados primários, fazendo uso de variáveis – e abordagens – quantitativas e qualitativas.

4.1 População e amostra

Os professores pesquisadores dos programas de pós-graduação strictu sensu do CCA/UFV, campus Viçosa-MG, constituem a população deste estudo. Em 2009, estes programas somavam 235 orientadores de diversos departamentos desta Universidade, entretanto, o número de professores destes programas era menor que este valor, já que muitos professores atuavam como orientador em mais de um programa. Cada um dos 10 programas possuía, neste mesmo ano, quantidades distintas de orientadores. O programa de Ciência Florestal era composto por 32 orientadores; o de Economia Aplicada era composto por 12 orientadores; o de Engenharia Agrícola era composto por 26 orientadores; o de Extensão Rural era composto por 11 orientadores; o de Fitopatologia era composto por 17 orientadores; o de Fitotecnia era composto por 39 orientadores; o de Genética e Melhoramento era composto por 37 orientadores; o de Meteorologia Agrícola era composto por 8 orientadores; o de Solos e Nutrição de Plantas era composto por 23 orientadores; e o de Zootecnia era composto por 30 orientadores (UFV, 2009).

Para este estudo, seguindo um nível de significância de 90%49, a amostra representativa se constituiu de 68 orientadores. Foi sorteada uma amostra de 60 professores, entretanto, oito deles atuavam em dois programas distintos, sendo, por este motivo, contabilizados nos dois programas que orientavam. A disposição desta amostra foi probabilística. A partir do sorteio da população total (235 orientadores), passaram a fazer parte da amostra deste trabalho: 8 orientadores da Ciência Florestal, 5 da Economia Aplicada, 5 da Engenharia Agrícola, 4 da Extensão Rural, 6 da Fitopatologia, 11 da Fitotecnia, 12 da Genética e Melhoramento, 3 da Meteorologia Agrícola, 6 do Solos e Nutrição de Plantas e 8 da Zootecnia.

4.2 Métodos e Técnicas de Coleta de Dados

Após os sorteios dos professores, os mesmos foram contatados e iniciaram-se as entrevistas, realizadas em escala de tempo transversal, entre os meses de agosto e novembro de 2009. O roteiro das entrevistas foi organizado de forma estruturada e, a partir das mesmas, foi feito um levantamento acerca das principais origens dos

recursos para as pesquisas conduzidas por estes professores, sobre quem os       

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mesmos identificam como principais beneficiários de suas pesquisas e a respeito dos pontos positivos e negativos em se desenvolver pesquisas financiadas pelo

Estado e pela iniciativa privada (ver apêndice 1: perguntas 6, 8, 9 e14).

4.3 Organização e Análise dos Dados

Com base nas respostas dadas pelos professores nas entrevistas, foram feitas categorizações das informações recebidas, agrupando estes dados em diferentes quadros temáticos. A partir destas informações e do escopo teórico apresentados, realizamos as análises a seguir.

5 A produção científica e tecnológica do Centro de Ciências

Agrárias da UFV: constituída por interesses públicos ou privados?

Como discutido anteriormente, o fato de que a maior parte dos recursos aplicados em pesquisas científicas conduzidas nas Universidades brasileiras serem de origem estatal, não significa que os interesses que influenciam em tal produção científica e tecnológica sejam fundamentalmente públicos. Do mesmo modo, o fato de existirem pesquisas conduzidas na Universidade sob financiamento da iniciativa privada, não significa, necessariamente, que estas pesquisas vão atender exclusivamente aos interesses de determinado grupo privado. Este fato é percebido na análise feita à produção científica do CCA/UFV.

Como demonstrado no Quadro 10, 57,3% dos professores apontaram o Estado como o principal financiador de suas pesquisas, 26,4% apontaram o investimento estatal como sendo equivalente ao da iniciativa privada e apenas 14,7% apontaram a iniciativa privada como sendo o principal financiador de suas pesquisas. Deste modo, a origem dos recursos para realização das pesquisas no CCA/UFV está de acordo com a realidade das demais Universidades brasileiras, em que a maior parte dos financiamentos é proveniente do Estado.

Embora o terceiro setor apresente pouca expressividade como principal financiador das pesquisas realizadas pelos professores do CCA/UFV – para apenas 1,4% dos

professores –, alguns pesquisadores entrevistados levantaram que ONGs50 estão cada vez mais ativas no financiamento de pesquisas realizadas na UFV. Mesmo afirmando que o Estado e/ou a iniciativa privada são os principais financiadores de suas pesquisas, alguns professores disseram já terem participado de alguma pesquisa financiada por uma ONG.

Quadro 10. Principais origens dos recursos para as pesquisas realizadas pelos pesquisadores entrevistados* do CCA/UFV

Programas de pós-graduação Origens a b c d e f g h i j total % Estado 2 4 2 2 3 7 7 2 4 6 39 57,3 Iniciativa privada 1 1 1 1 2 3 1 10 14,7 Estado e iniciativa privada equivalentes 5 2 2 2 2 2 2 1 18 26,4 ONGs 1 1 1,4

(FONTE: Dados de pesquisa, 2009)

* Professores orientadores dos programas de pós-graduação stricto sensu do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Viçosa

a. Pós-graduação em Ciência florestal b. Pós-graduação em Economia aplicada c. Pós-graduação em Engenharia agrícola d. Pós-graduação em Extensão rural e. Pós-graduação em Fitopatologia f. Pós-graduação em Fitotecnia

g. Pós-graduação em Genética e melhoramento h. Pós-graduação em Metereologia agrícola i. Pós-graduação em Solos e nutrição de plantas j. Pós-graduação em Zootecnia

Tratando das pesquisas financiadas pela iniciativa privada, embora, de fato, os resultados das pesquisas tenham grande importância para as empresas que as financiaram, também não é correto afirmar que, em sua totalidade, beneficiem apenas tais empresas, ou que interessam apenas a um restrito grupo privado a condução de tais pesquisas. Tomando como exemplo o trabalho realizado por pesquisadores entrevistados do programa de pós-graduação em Extensão Rural

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  É importante ressaltar que, juridicamente, ONGs (Organizações Não-Governamentais sem fins lucrativos),

apesar de serem reconhecidas legalmente em alguns países, não existem no Brasil. Corriqueiramente são denominadas de ONGs algumas entidades do terceiro setor, como associações e fundações, por exemplo, com finalidades públicas e sem fins lucrativos. Deste modo, o que os professores apontaram como ONGs ou são estrangeiras ou são outras entidades do terceiro setor. 

para capacitação e geração de tecnologias sociais junto aos jovens catarinenses produtores de fumo, vemos que, mesmo a pesquisa sendo patrocinada por uma empresa privada do ramo, ela também interessa a estes jovens, que poderão ser beneficiados com a mesma.

Ainda em se tratando da limitação em pensar que as pesquisas patrocinadas pela iniciativa privada são interessadas somente às empresas financiadoras, lembremos outro interesse privado atuante na realização destas pesquisas: o interesse pessoal do pesquisador. Conseguir recursos com a iniciativa privada para realizar pesquisas é de extrema importância para os professores pesquisadores, sendo de grande interesse dos mesmos conseguir tais financiamentos e, consequentemente, de realizar pesquisas financiadas pela iniciativa privada. Do mesmo modo, o fato do Estado ser o principal financiador das pesquisas realizadas no CCA/UFV, não significa que todas estas pesquisas patrocinadas pelo primeiro setor interessem ou beneficiem, necessariamente, o público. Em alguns casos, determinados grupos privados são os mais preocupados e favorecidos com estas pesquisas.

O Quadro 11 contém os grupos/setores que os pesquisadores apontaram como sendo os principais beneficiários das pesquisas realizadas no CCA/UFV. Segundo os professores, diferentes grupos privados se beneficiam com as tecnologias e com os conhecimentos científicos gerados a partir de suas pesquisas, que vão desde aqueles relacionados ao setor produtivo (agricultura e indústria), ao acadêmico e movimentos sociais (outros pesquisadores, cooperativas e ONGs).

Mais de 60% dos pesquisadores apontaram tanto a agricultura com um formato empresarial, mais direcionada ao mercado agroexportador, como a com um formato familiar, menos relacionada a este mercado, como sendo os principais beneficiários de suas pesquisas. Muitas vezes, as mesmas pesquisas – ou pesquisas diferentes desenvolvidas por um mesmo professor – têm o potencial de alcançar grupos, às vezes, tidos como dicotômicos e excludentes. De acordo com os entrevistados, cultivos e produções diversas podem se beneficiar com as pesquisas realizadas no CCA/UFV, dos relacionados ao mercado agroexportador aos relacionados à pequena agricultura familiar.

Quadro 11. Principais beneficiários das pesquisas desenvolvidas pelos pesquisadores entrevistados* do CCA/UFV

Programas de pós-graduação Grupos / áreas / setores a b c d E f g h i j total % Agricultura empresarial 4 2 6 1 1 9 2 5 5 44 64,7 Agricultura familiar 4 1 2 1 5 1 0 8 5 5 41 60,2

Setor terciário ligado ao agronegócio (exportação, gerenciamento e silagem) 4 1 1 6 8,8 Agroindústrias à montante51 3 1 1 1 1 2 9 13,2 Agroindústrias à jusante52 4 1 3 4 1 2 15 22,0 Meio acadêmico 1 2 1 4 1 9 13,2

Terceiro setor (ONGs

e cooperativas) 1 1 1 1 4 5,8

Outros 3 3 6 8,8

(FONTE: Dados de pesquisa, 2009)

* Professores orientadores dos programas de pós-graduação stricto sensu do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Viçosa

a. Pós-graduação em Ciência florestal b. Pós-graduação em Economia aplicada c. Pós-graduação em Engenharia agrícola d. Pós-graduação em Extensão rural e. Pós-graduação em Fitopatologia f. Pós-graduação em Fitotecnia

g. Pós-graduação em Genética e melhoramento h. Pós-graduação em Metereologia agrícola i. Pós-graduação em Solos e nutrição de plantas j. Pós-graduação em Zootecnia

O cultivo menos conectado ao mercado agroexportador e ao grande agronegócio, portanto, mais próximo do universo da agricultura familiar, lembrado pelos pesquisadores como alvo de suas pesquisas, foi o feijão. Entre as produções relacionadas ao agronegócio moderno mais lembradas pelos pesquisadores como alvos de suas pesquisas, estavam: a soja, o milho, o maracujá, o pêssego, o café, a cana-de-açúcar, o eucalipto e carnes (bovina, suína e aves, principalmente). Embora

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Produz implementos e insumos industriais para serem utilizados no processo produtivo da agropecuária, como máquinas, sementes e agrotóxicos, por exemplo.

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Produz produtos industriais a partir de matérias-prima produzidas pela agropecuária, como derivados do leite, o álcool e o açúcar, por exemplo. 

estas produções sejam mais lembradas por estarem profundamente envolvidas com a agricultura empresarial, elas também fazem parte da realidade de muitos agricultores familiares, umas mais, como o café na Zona da Mata mineira, outras menos, como a soja, no Centro-Oeste brasileiro.

Como declararam os professores, a indústria, sobretudo aquela relacionada ao agronegócio, também se beneficia com as pesquisas desenvolvidas pelo CCA/UFV. Entre as indústrias à montante mais lembradas pelos entrevistados como beneficiárias destas pesquisas, destacam-se as indústrias de sementes, de fertilizantes e as de maquinários. Já, quanto às indústrias à jusante mais lembradas pelos pesquisadores como beneficiárias destas pesquisas, destacam-se as indústrias de celulose, de móveis, de açúcar e álcool, de biodiesel e de processamento de carne.

Se forem considerados os consumidores de todos os itens produzidos por estas indústrias ou dos produtos industriais produzidos a partir destes itens, o público, de maneira geral, se beneficia e se interessa para que estas pesquisas ocorram. Não é possível, então, delimitar um grupo privado restrito como beneficiário e interessado na produção dos conhecimentos e das tecnologias desenvolvidas no CCA/UFV. Os Quadros 12.1 e 12.2 demonstram o que os pesquisadores do CCA/UFV declararam como os principais pontos positivos e negativos em realizar pesquisas patrocinadas pelo Estado e pela iniciativa privada. De acordo com o Quadro 12.1, 41,1% dos professores acusaram existir pouca flexibilidade para uso dos recursos

provenientes do setor público e dificuldade para a prestação de contas perante o Estado. Por outro lado, nenhum professor denunciou tal inflexibilidade em relação ao

uso dos recursos oriundos do segundo setor, ocorrendo exatamente o inverso. O ponto positivo mais lembrado pelos pesquisadores em se realizar pesquisas patrocinadas pela iniciativa privada foi, justamente, o fato de haver rapidez para

liberação dos recursos e flexibilidade para uso dos mesmos, como salientado no

Quadro 12.2. Deste modo, para os professores do CCA/UFV, a iniciativa privada é mais interessante no quesito flexibilidade para acessar e utilizar os recursos para

Quadro 12.1. Pontos positivos e negativos mais lembrados pelos pesquisadores entrevistados* do CCA/UFV em realizar pesquisas patrocinadas pelo Estado

Programas de pós-graduação Pontos

a b c d e f g h i j total %

Contribui mais para formação de recursos humanos e para o sucesso na carreira científica 2 2 4 1 1 1 11 16,1 Muita liberdade na condução da investigação ou para desenvolver pesquisa sem aplicabilidade imediata 1 1 2 1 2 2 2 3 2 16 23,5 Outros 2 1 1 1 1 6 8,8 P o s i t i v o s Não souberam responder ou não identificaram pontos positivos 6 4 3 2 4 6 8 1 3 4 41 60,2 Pouca flexibilidade para uso dos recursos

e para prestação de contas 5 3 3 5 4 1 3 4 28 41,1 Demora para liberação dos recursos 1 1 2 3 1 2 10 14,7 Outros 1 2 2 1 2 1 9 13,2 N e g a t i v o

s responder ou não Não souberam identificaram pontos

negativos

2 3 2 2 0 4 5 2 3 3 26 38,2

(FONTE: Dados de pesquisa, 2009)

* Professores orientadores dos programas de pós-graduação stricto sensu do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Viçosa

a. Pós-graduação em Ciência florestal b. Pós-graduação em Economia aplicada c. Pós-graduação em Engenharia agrícola d. Pós-graduação em Extensão rural e. Pós-graduação em Fitopatologia f. Pós-graduação em Fitotecnia

g. Pós-graduação em Genética e melhoramento h. Pós-graduação em Metereologia agrícola i. Pós-graduação em Solos e nutrição de plantas j. Pós-graduação em Zootecnia

O oposto ocorre em relação à flexibilidade para se conduzir as pesquisas, sendo o financiamento estatal lembrado por 23,5% dos professores como positivo. No mesmo quesito, o patrocínio privado é indicado como negativo por 25,0% dos pesquisadores. Neste sentido, percebe-se que o Estado oferece ao pesquisador mais liberdade para desenvolverem suas pesquisas, enquanto as empresas privadas são mais rígidas em seus direcionamentos para execução das pesquisas. Isso mostra a importância desempenhada pelo Estado para a formação de recursos

humanos – segundo ponto positivo mais lembrado pelos entrevistados em realizar

pesquisas a partir do financiamento estatal – e para a condução de pesquisas tidas como básicas, sem ter, necessariamente, aplicação imediata. Para a iniciativa privada, grande parte das vezes, o que interessa é a produção de conhecimentos com potencial de uso imediato, por isso esse rigor na execução de suas pesquisas, impedindo que os pesquisadores desenvolvam trabalhos além daquelas estabelecidos pela empresa. Tal fato demonstra o segundo ponto mais recordado pelos pesquisadores como positivo em se realizar pesquisas sob patrocínio da iniciativa privada, o fato de haver muita aplicação prática dos resultados da

pesquisa.

Ao contrário do que muitas vezes ocorre em relação às pesquisas patrocinadas pelo setor público, na iniciativa privada há menos “engavetamento” dos resultados das pesquisas muita aplicação prática dos resultados –, já que as empresas privadas, de maneira geral, esperam que haja aplicabilidade dos resultados das investigações científicas por elas patrocinadas. Por sua vez, é mais comum em pesquisas financiadas pela iniciativa privada haver restrição na divulgação dos resultados das

pesquisas, segundo ponto negativo mais lembrado pelos professores em se realizar

pesquisas a partir de financiamento privado.

De uma maneira geral, os professores apontaram mais inconveniências em realizar pesquisas patrocinadas pelo Estado que pela iniciativa privada. Como mostram os quadros, 60,2% dos professores não souberam responder ou não identificaram

pontos negativos em realizar pesquisas a partir de financiamento privado, enquanto

Quadro 12.2. Pontos positivos e negativos mais lembrados pelos pesquisadores entrevistados* do CCA/UFV em realizar pesquisas patrocinadas pela iniciativa privada

Programas de pós-graduação Pontos

a b c d e f g h i j total %

Rapidez para liberação e flexibilidade para uso

dos recursos

4 1 3 5 3 1 2 4 23 33,8

Muita aplicação prática nos resultados

da pesquisa 1 1 1 1 2 3 2 1 12 17,6 Outros 1 2 1 1 5 7,3 P o s i t i v o

s responder ou não Não souberam identificaram pontos positivos 4 3 2 2 3 4 9 2 3 3 35 51,4 Rigidez nos direcionamentos impostos pela empresa para execução da pesquisa 1 1 2 2 4 3 1 1 1 1 17 25,0 Restrição para divulgação dos resultados das pesquisas 3 1 1 1 1 7 10,2 Outros 1 1 1 2 2 2 9 13,2 N e g a t i v o s Não souberam responder ou não identificaram pontos negativos 4 4 2 2 1 7 1 1 2 3 5 41 60,2

(FONTE: Dados de pesquisa, 2009)

* Professores orientadores dos programas de pós-graduação stricto sensu do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Viçosa

a. Pós-graduação em Ciência florestal b. Pós-graduação em Economia aplicada c. Pós-graduação em Engenharia agrícola d. Pós-graduação em Extensão rural e. Pós-graduação em Fitopatologia f. Pós-graduação em Fitotecnia

g. Pós-graduação em Genética e melhoramento h. Pós-graduação em Metereologia agrícola i. Pós-graduação em Solos e nutrição de plantas j. Pós-graduação em Zootecnia

6 Conclusão

A partir de tais análises, ficou nítido que, na ótica dos professores do CCA/UFV, grupos privados distintos se beneficiam com as diferentes pesquisas desenvolvidas por este Centro, seja a partir de patrocínio privado ou estatal. Com base nos discursos destes professores, não é possível identificar um grupo privado restrito como único interessado na produção de conhecimentos e tecnologias desenvolvidas pelo CCA/UFV.

Ficaram evidenciadas, também, as diferenças entre a iniciativa privada e o Estado no que tange ao financiamento das pesquisas realizadas pelos professores orientadores do CCA/UFV. De acordo com os pesquisadores, as pesquisas patrocinadas pelo Estado possuem caráter mais burocratizado, oferecendo menos flexibilidade para eles utilizarem os recursos, e tendem a ter menos aplicabilidade prática. Por outro lado, a Iniciativa privada, mesmo sendo mais flexível neste sentido, estabelece, de forma mais rígida, direcionamentos na condução das pesquisas, assim como nos resultados finais das mesmas, havendo mais restrição na divulgação dos resultados. Isto pode demonstrar o maior interesse da iniciativa privada em aplicar o conhecimento produzido em seu setor produtivo e a necessidade que as mesmas vêem em manter o “segredo industrial” como uma estratégia de mercado.

Por fim, conclui-se que, de maneira geral, os pesquisadores reclamam menos das dificuldades em se realizar pesquisas com financiamento da iniciativa privada que do Estado, embora o Estado continue sendo o maior investidor das pesquisas realizadas no CCA/UFV.