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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO

2.1. TRAGETÓRIA DA GESTÃO DOS SERVIÇOS DE PÚBLICOS DE SAÚDE

2.1.1. Gestão da Assistência Farmacêutica

A assistência farmacêutica no setor público brasileiro se refere ao fruto das políticas sociais voltadas à saúde, cuja materialidade ocorre com a oferta de medicamentos e serviços afins e se viabiliza, prioritariamente, na rede de serviços do SUS (SANTOS, 2011). A partir do momento que a assistência farmacêutica é firmada como uma política social de grande impacto, que gera custos ao sistema de saúde e em que a estruturação, os recursos humanos capacitados e o acesso aos medicamentos derivam dessa política, ela precisa ter capacidade de gestão.

A Política Nacional de Assistência Farmacêutica define assistência farmacêutica como:

um conjunto de ações voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde, tanto individual como coletiva, tendo o medicamento como insumo essencial e visando o acesso e o seu uso racional (CNS, 2004).

Para Santos (2011), a concepção de assistência farmacêutica passa a ser focada no medicamento a partir da industrialização deste, a expansão do comércio farmacêutico e a organização dos serviços de saúde como assistência médica curativa e beneficiária dos contribuintes – o acesso ao produto medicamento. Apenas com os avanços do SUS, as

construções teóricas nacionais e internacionais, e as políticas: Nacional de Medicamentos (PNM) e de Assistência Farmacêutica (PNAF) (BRASIL, 1998; CNS, 2004), passou a ser construída uma concepção mais abrangente de assistência farmacêutica, que pode ser resumida como acesso e uso racional dos medicamentos.

Caracterizada como uma política, a assistência farmacêutica precisa de uma reflexão sobre gestão, que está além de questões técnicas somente.

A ênfase nos aspectos logísticos relativos à disponibilização de medicamentos, necessária em um primeiro momento, tendeu a restringir a discussão à descrição técnica das partes do modelo proposto pelo “ciclo da assistência farmacêutica” (SANTOS, 2011).

No Brasil, o ciclo da assistência farmacêutica é tradicionalmente discutido com base na publicação marcante de Marin e colaboradores (2003), intitulada “Assistência Farmacêutica para gerentes municipais”. Para os autores dessa publicação, a gestão é reconhecida como um processo administrativo e ocorre em todos os níveis de atividades da organização, ou seja, gestor, gerente e supervisor. Cada qual no seu nível desempenha atividades de previsão, organização, liderança, coordenação e controle, como ‘atividades administrativas essenciais’. Dessa forma, este trabalho ‘não se restringe’ somente ao Gerente da Assistência Farmacêutica, mas a todos os profissionais que executam atividades no Ciclo da Assistência Farmacêutica (MARIN et al., 2003).

As características da administração clássica e científica de Taylor e Fayol, como previsão, organização, comando, coordenação e controle, são referenciais técnicos, que objetivam o aumento da produção. A gestão vista somente como modo de executar as etapas do ciclo da assistência farmacêutica remete à herança dessa administração clássica e, ao mesmo tempo em que parece facilitar a visualização das etapas e dar uma ideia de continuidade das tarefas logísticas, o ciclo também coloca a assistência farmacêutica em um patamar operacional somente, deixando uma visão simplista e reduzida, não levando em consideração os aspectos sociais, políticos e estratégicos. Desta forma, é possível compreender por que o medicamento enquanto tecnologia é mais privilegiado em determinadas concepções de assistência farmacêutica do que as pessoas que devem ser beneficiadas por seu uso.

A gestão da assistência farmacêutica ficou, então, empiricamente definida como um conjunto de ações técnico- operacionais, delimitadas ao cuidado do produto medicamento e, quando muito, ao seu destino.

Moratelli e Inácio (2010), estudando a literatura referente à gestão da assistência farmacêutica, constatam que a maior parte dos trabalhos analisados traz o conceito de gestão ligado ao campo da administração clássica. Esses achados evidenciam a visão tecnicista da gestão da assistência farmacêutica, privilegiando os princípios organizacionais com forte viés burocrático, numa condição de fornecedora de medicamentos, ou seja, voltada à logística de medicamentos.

Em um contexto mais amplo e geral, pode-se dizer que essas questões representam apenas um dos vértices do Triângulo de Matus, ou seja, a Capacidade de governo, que significa a importância de manter e mobilizar recursos operacionais, técnicos e humanos para a consecução do projeto.

Sendo a gestão da assistência farmacêutica vista como prática social, e tomando o referencial de gestão conceituado por Guimarães e colaboradores (2004), a assistência farmacêutica básica é entendida como o

conjunto de práticas que envolvem atividades de regulação, planejamento, distribuição e dispensação de medicamentos essenciais na rede de atenção básica da saúde pública, garantindo o acesso e a promoção do uso racional de medicamentos de forma descentralizada e compartilhada (BARRETO; GUIMARÃES, 2010).

E, por fim, o mesmo grupo ainda conceituou a gestão da assistência farmacêutica na atenção básica da saúde como a

capacidade de formular, articular e criar condições de implementação e de sustentabilidade da Assistência Farmacêutica Básica de forma descentralizada e compartilhada no âmbito municipal (BARRETO; GUIMARÃES, 2010).

2.2. AVALIAÇÃO EM SAÚDE

As decisões necessárias para atender os preceitos de universalidade do acesso, a qualidade da atenção prestada e a

viabilidade econômica do SUS, são particularmente difíceis de tomar, principalmente, por envolverem um sistema de saúde complexo. Nesse contexto, a necessidade de informação sobre o modo de funcionamento, a qualidade, efetividade, segurança e satisfação dos usuários do sistema de saúde é cada vez mais reconhecida, e a avaliação se torna uma alternativa adequada para tal investigação (FIGUEIRÓ; FRIAS; NAVARRO, 2010).

Estudos avaliativos de políticas e programas podem oferecer aos governantes, gestores, formuladores e executores a possibilidade de tomar decisões com maior qualidade, no sentido da identificação dos aspectos exitosos, das dificuldades e, também, dos efeitos esperados e dos não intencionais, produzidos a partir de fatores gerenciais e operacionais. A avaliação pode, ainda, favorecer a racionalização do gasto público, como um instrumento para a melhoria do desempenho das organizações e do governo, promovendo uma maior capacidade de alcance dos melhores resultados desejados, e gerando uma maior possibilidade de governança (FELISBERTO, 2010).

Para Calvo e Henrique (2006), a avaliação não é exclusivamente um procedimento de natureza técnica e deve ser entendida como um processo de negociação entre atores sociais. O resultado da avaliação está associado às concepções e práticas de saúde dos envolvidos, pelos parâmetros e critérios adotados, pelos valores e motivações dos atores e pelo aspecto do objeto que está sendo avaliado.

Neste estudo, o conceito de avaliação adotado foi o de Champagne e colaboradores (2011), que corresponde a:

Avaliar consiste fundamentalmente em fazer um julgamento de valor sobre uma intervenção, empregando um dispositivo que permita fornecer informações cientificamente válidas e socialmente legítimas sobre uma intervenção ou qualquer um dos seus componentes, considerando os diferentes atores envolvidos, que possam ter julgamentos diferentes, de modo a revelar a posição sobre a intervenção e construir (individualmente ou coletivamente) um julgamento que se possa traduzir em ações (CHAMPAGNE et al., 2011, p.44 – grifo da autora).

Para Silva (2005), conforme afirmado anteriormente, a intervenção é ajustada a um escopo maior do campo da avaliação,

chamado de “prática social”, uma vez que as práticas de saúde são consideradas casos especiais.

Na avaliação, são encontradas algumas vertentes e abordagens diferentes, tendo alguns autores como pioneiros no tema da avaliação em saúde, como passamos a apresentar.

Donabedian (1984) desenvolveu um quadro conceitual fundamental para o entendimento da avaliação de qualidade em saúde, a partir dos conceitos de estrutura, processo e resultado, classicamente considerados uma tríade (MALIK; SCHIESARI, 1998).

A abordagem proposta por Donabedian diz respeito ao processo geral de cuidado e, quando se fala de um componente específico das ações em saúde (por exemplo, assistência farmacêutica), observam-se diferentes níveis de compreensão das consequências das estruturas e dos processos envolvidos com interesse avaliativo (PORTELA, 2000). Os resultados podem ser compreendidos sob diferentes óticas, cuja adaptação da terminologia internacional tem, no Brasil, aparecido com certa confusão nas diversas traduções (OPAS, 2005).

Segundo Guba e Lincoln (1989), a avaliação não surge de um momento para o outro; ela é resultado do desenvolvimento de um processo de construção e reconstrução que envolve e onde interagem inúmeras influências.

Esses mesmos autores demarcaram em quatro fases distintas a evolução do campo da avaliação. Como Primeira Geração consideram o período referente à construção e aplicação de instrumentos de medidas (1910-1930), que têm origem nas medições de coeficiente de inteligência para classificação das crianças e determinação do progresso escolar. A Segunda Geração da avaliação é baseada no conceito de descrição e que, segundo os autores, marca o nascimento da Avaliação de Programas. A Terceira Geração da avaliação, segundo Guba e Lincoln (1989), surgiu a partir dos limites da abordagem anterior - descritiva e orientada por objetivos - e do fato de que não atendiam a outra face da avaliação que era o julgamento. O que se esperava dos avaliadores era mais do que a descrição de atitudes, contextos e realizações, mas algo que referisse o mérito do objeto sob avaliação e para tal deveria julgar com base em padrões externos, para ajudar na tomada de decisão. Uma Quarta Geração da avaliação foi sugerida, então, caracterizada por esses autores, pela função de negociação, e emergiu na década de 80, tomando forma com a sua conhecida publicação de 1989 (GUBA; LINCOLN, 1989).

Na saúde pública brasileira, o marco inicial do processo de monitoramento e avaliação da Atenção Básica no âmbito do SUS foi a

formulação pelo Ministério da Saúde, em 1998, do Pacto de Indicadores da Atenção Básica, concebido como um instrumento nacional de monitoramento das ações e dos serviços de saúde referentes à atenção básica (BRASIL, 2003).