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1. INTRODUÇÃO

2.3 ESTADO E GESTÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA NO BRASIL

2.4.2 Gestão de segurança pública no Brasil

Na crise iniciada na década de 1970, a administração pública foi impulsionada à transposição do modelo de gestão burocrático para o modelo gerencial. Até a década de 80 a exclusão da sociedade civil nas formulações das políticas públicas viabilizadas pela união, se configurava pelo caráter setorial, pela pulverização institucional e pela centralização decisória e financeira estatal. No entanto, a crise causada pela ineficiência dos serviços públicos burocráticos, abriu espaço para a reforma no Estado (Farah, 2006; Fonseca, Pereira, & Gonçalves, 2015). O modelo gerencial trouxe novos desdobramentos ao ambiente público, como a responsabilização dos agentes públicos e políticos (accountability), a obrigação de prestar contas à população sobre as transações administrativas e financeiras ocorridas no interior das organizações públicas (transparência), a promoção da participação da sociedade no processo público e político, equidade e a justiça.

Ademais, o novo modelo implicava em políticas restritivas de gastos (Madeira &

Rodrigues, 2015; Blonski; Prates, Costa & Vizeu, 2016).

Tais fatos culminaram, também, na promulgação da Constituição Cidadã em 1988 e no Estado Democrático de Direito, sem, no entanto, resultar na seguida participação da sociedade civil, que decorreu da complexidade na transição do controle da ordem pública para o democrático. Durante este processo, foram criados movimentos sociais como forma de representação da opinião pública. São grupos de indivíduos que, por meio de representantes, buscam interesses e participam do processo de construção política, e influência do meio por meio de constante interação no tecido social (Carvalho & Silva, 2011; Fonseca, Pereira & Gonçalves, 2015). Nesse sentido, foram consolidadas práticas e imputados instrumentos normativos para criação de amparo legal-institucional, como as constituições estaduais e os planos estaduais de segurança pública (Bengonchea et al., 2004;

Sapori, 2007).

No Brasil, a segurança pública está prevista no artigo 144 da Constituição Federal que a estabelece como “dever do Estado, direito e responsabilidade de

todos” (Brasil, 1988, p. 119). Na esfera federal, o artigo mencionado acima, estabeleceu corporações policiais para as esferas de governo, fixou competências e atribuições, além de outorgar aos estados-membros e municípios a gestação de políticas públicas nessa área. Para efeitos, neste trabalho será abordado a segurança pública federal.

Conforme consta no sítio do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, os órgãos de segurança pública têm por função a prestação de serviços junto à sociedade, e por objetivo “proteger a cidadania, prevenindo e controlando manifestações da criminalidade e da violência, efetivas ou potenciais, garantindo o exercício pleno da cidadania nos limites da lei”. É, portanto, uma das atividades da defesa social (Ministério da Justiça e da Segurança Pública).

Em complemento, de Lima et al. (2014, p. 482), explicam que a segurança pública se relaciona ao “campo empírico e organizacional que estrutura instituições e relações sociais em torno da forma como o Estado administra ordem e conflitos sociais”. Neste contexto, a governabilidade depende da inter-relação entre Estado e sociedade civil, interdependência institucional e social, e a instituição de mecanismos e estratégias de controle social. Para Nóbrega Júnior (2011) ao analisar o quadro da discussão acerca da segurança pública no Brasil e no mundo, as políticas públicas em segurança, são variáveis determinantes no controle da criminalidade (Durante & Zavataro, 2007; Soares, 2007; Gonçalves, 2009; Sento-Sé, 2011).

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I – polícia federal;

II – polícia rodoviária federal;

III – polícia ferroviária federal;

IV – polícias civis;

V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.

No âmbito federal, o artigo mencionado acima, estabeleceu corporações policiais para as esferas de governo, fixou competências e atribuições, além de outorgar aos estados-membros e municípios a gestação de políticas públicas nessa área. Para efeitos, neste trabalho será abordado apenas as corporações de segurança pública federal. As polícias civis e militares pertencem a estrutura dos estados-membros. Dentre os vários aspectos a serem compreendidos, o que pode sugerir falha na interpretação do dispositivo, o texto sugere também que a

segurança pública “é exercida” para isentar o cidadão de perigos, danos e proteger o patrimônio público, e ao mesmo tempo imputa responsabilidade ao cidadão.

Para Costa e Lima (2014) essa abertura conceitual da segurança pública na constituição enfraquece o consenso sobre o significado. Sob esta ótica, Vanberg (2011) explica que as constituições são contratos incompletos e as tentativas de erosão são uma ameaça constante que decorre da não aceitação das restrições constitucionais na política comum. Em relação as atribuições da polícia federal, o dispositivo constitucional dispõe que a instituição como órgão público federal e estabelece as atribuições:

I – apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;

II – prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;

III – exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; (Redação dada pela EC n. 19/1998)

IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

Desse modo, Malaquias (2017) explica que o sistema de segurança é exercido pelas corporações policiais nas esferas federal, estadual e municipal.

Entretanto, complementa que a “atividade de segurança pública é rigorosamente controlada e fiscalizada pela polícia federal” (p. 326).

No que se refere a gestão orçamentária de recursos, durante o período de 1997 a 2017 o governo federal gastou o total de R$134.319.081.562 bilhões de reais em segurança pública:

Tabela 1: Despesa por função de segurança pública

Ano Despesa por Função (R$) Ano Despesa por Função (R$)

1997 10.796.627.235 2008 5.770.500.227

1998 10.859.480.788 2009 6.587.355.592

1999 10.933.383.263 2010 7.108.062.942

2000 1.555.312.157 2011 8.041.186.485

2001 2.514.297.771 2012 9.244.529.962

2002 1.835.848.532 2013 8.117.755.578

2003 2.631.444.502 2014 8.456.349.686

2004 2.722.409.285 2015 8.668.397.884

2005 3.378.053.293 2016 7.941.624.532

2006 3.439.681.065 2017 8.895.302.462

2007 4.821.478.321 Total 134.319.081.562

Fonte: Relatórios de Orçamento Fiscal e da Seguridade Social da União. Elaborado pelos autores.

Lázaro (2012) analisou a formação e destinação do orçamento da União na área de segurança pública e a construção das políticas públicas no setor, avaliando os orçamentos dos Ministérios da Justiça, do Planejamento e da Fazenda, no período de 2004 a 2011. Os principais resultados obtidos, sugerem que a participação da função Segurança Pública no orçamento é pequena, já que a média anual destes gastos no período estudado foi de R$ 6,1 bilhões, apenas 0,37% da média anual de gastos totais do governo.

A Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) noticiou em matéria sobre os gastos com segurança pública no Brasil, que eles são insuficientes (Bohen, 2016).

Contudo, a literatura no Brasil apresenta resultados ainda pouco conclusivos sobre este tema. Duenhas, et al. (2014) testaram as hipóteses de que o aumento dos gastos públicos em segurança e educação é efetivo para redução da violência nos estados brasileiros, de 1995 a 2005. Os achados indicaram que ambos os gastos podem contribuir para redução da violência no Brasil, ou seja, não rejeita a hipótese de que o aumento de gastos em educação e/ou segurança pode contribuir para redução da violência nos municípios brasileiros.

Amaral & Correia (2014) estudaram o impacto dos gastos públicos sobre a redução da criminalidade, período de 2010 a 2013 no Ceará. Os resultados sugeriram contradição em relação aos gastos governamentais com segurança pública, o que pode indicar um possível problema de causalidade inversa ou que tais dispêndios não estejam sendo bem alocados. Em contrapartida os gastos com educação e assistência social, em conjunto, foram negativos e significantes para os crimes letais, indicando que o aumento do gasto é eficaz para redução dos homicídios.

Embora a literatura brasileira aponte várias causas para a crise da segurança pública, os autores consideram que a maioria é unânime no que diz respeito ao aspecto político da gestão da segurança pública, que revela obstáculos ainda não superados, neste novo modelo de gestão gerencial, os quais só podem ser explicados a partir do qual lobbies corporativistas e lideranças locais que se apresentam influentes nas negociações político-partidárias. Por exemplo, a

constituição não prevê a aplicação de percentual mínimo para a função de segurança pública nos Estados. Apenas estabelece 15% para a saúde e 25% para a educação, o que envolve a prerrogativa de escolha política por parte dos gestores públicos.