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4 ANÁLISE E RESULTADOS

4.1 Andamento das interações

4.2.5 Gestos e expressões faciais

Os gestos e expressões faciais são elementos importantíssimos na análise de atividades de conflitos, atuando não só como atenuadores ou intensificadores, mas podendo também serem usados isoladamente, sem o uso simultâneo de elementos linguísticos. Dentre os elementos identificados nas interações, há aqueles que intensificam as atividades de conflito com destaque para gestos e expressões faciais de desacordo ou desaprovação e aqueles que atenuam a atividade de conflito, com destaque para o riso e o sorriso.

4.2.5.1 Gestos e expressões faciais de desaprovação ou desacordo

Os elementos não verbais tratados nesta seção possuem uma importante função como formas de expressão de opinião e de sentimentos durante a interação. Esses elementos foram identificados a partir da sua associação com atividades de conflito e por característica que no contexto da interação indicam um sentimento de desaprovação ou desacordo. Muitas vezes as críticas ou discordâncias são potencializadas pelos gestos e expressões faciais utilizados ou podem ser realizadas exclusivamente por eles.

Tabela 27: Distribuição de gestos e expressões faciais de desaprovação ou desacordo

gestos expressão

facial Total

Int. 1 (masc.) alemães 20 7,49% 5 1,87% 9,36%

brasileiros 16 11,68% 2 1,46% 13,14%

Int. 2 (fem.) alemãs 6 3,97% 2 1,32% 5,30%

brasileiras 20 7,43% 14 5,20% 12,64%

A análise pelo teste qui-quadrado mostra uma distribuição significativa para os dados (χ²=14,9; df=6, p<0,05), apontando para frequências maiores dos participantes brasileiros. Os gestos mais comuns observados nas atividades de conflito foram gestos de negação com a mão ou a cabeça, expressando discordância, podendo ser usados tanto isoladamente quanto em conjunto com elementos verbais. Outros gestos englobam gestos de apontamento, bater a mão na perna, dedo em riste, entre outros:

Trecho 44: ((Interação Masculina, 89:08 - 89:13 min., Tópico 3 - Culinária))

128 A4: o feiJÃO da alemanha é a batata. 129 (1.05)

→ 130 A2: na also <<com o dedo em riste>o ARROZ.>

O dedo em riste nesse caso tem um sentido de chamar a atenção do interlocutor e de enfatizar o que se fala, assumindo um papel de intensificador da atividade de conflito.

Trecho 45: ((Interação Feminina, 106:15 - 106:20, Tópico 6 - Carnaval))

359 B7: ah mas ninGUÉM escuta isso. 360 B6: escuta [SIM. ]

361 B5: [ah:: ][escu::ta, ]

→ 362 B6: [((bate na perna))][((bate na perna))] 363 B7: [ah não ] 364 A6: mas no carnaval todo mundo escuta.

Nesse exemplo, assim como no anterior, o uso do gesto serve como um reforçador, como uma função semelhante à entonação enfática, que também é usada nos exemplos. Esses gestos são encontrados apenas em uso conjunto com expressões linguísticas, devido ao seu caráter de reforçadores. Os gestos de negação por outro lado podem ser usados tanto isoladamente quanto associados a elementos linguísticos, como mostra o Trecho 46.

Trecho 46: ((Interação Masculina, 97:14 - 97:23 min., Tópico 3 - Custo de vida))

044 A2: eu como num lugar que eu pago cê paga cinco reais o pê éfe.

045 A3: é;=eu conheço esses lugares também, 046 mas depois você fica lá no banheiro.

→ 047 B1: [<<nega com a cabeça>não não;=muito estranho isso.>] → 048 B2: [((sinal de negação com a mão)) ] → 049 A2: [((nega com a cabeça)) ]

((ri))

Nesse trecho, enquanto B1 usa o gesto para intensificar sua opinião, A2 e B2 discordam apenas de forma não verbal. Esse uso isolado ou conjunto também pode ser observado em relação às expressões faciais. As expressões faciais de desagrado ou de desaprovação consistem geralmente em franzir uma parte do rosto, como testa, sobrancelhas, nariz e boca. Podem ser também interpretadas como expressões de dúvida, estranhamento ou

surpresa dependendo do contexto e podem estar associadas tanto a uma realização mais direta quanto mais indireta da atividade de conflito.

Trecho 47: ((Interação Masculina, 97:04 - 97:13 min., Tópico 3 - Custo de vida))

033 A3: mas também na rua;=você paga- 034 A2: quanto você paga?

035 (0.33) se você compra no restaurante,

036 você paga pelo MEnos com a:: com a bebida,= 037 B1: [mas aqui ó, ]

038 A3: [=vinte reais ]quinze a vinte reais. → 039 A2: <<franzindo a testa>não.>

040 A3: não (mas eu)

Nesse trecho, A2 usa a expressão facial como intensificador da sua discordância, realizada de forma mais direta.

Trecho 48: ((Interação Feminina, 34:56 - 35:07, Tópico 2 - Onde A5 mora))

019 A5: hier wohne ich ahm mit_ner argentinischen familie:, 020 (0.48)

→ 021 B6: [((franze o cenho e se vira para as demais)) ] 022 A6: [((ri)) ] 023 B5: [((ri)) ]

024 A5: [ja (-) eh:::]und (.) mein freund wohnt auch in dem gleichen haus.

025 ah so:: in dem haus;

Neste trecho, o uso da expressão facial isoladamente, sem elementos verbais, mostra uma realização indireta. No contexto de sua realização, a expressão pode ser interpretada como crítica, como se a participante dissesse para as demais que acha estranho o fato de A5 morar com uma família argentina.

Naturalmente uma análise completa dos gestos utilizados na interação seria muito mais ampla, havendo outras categorias como gestos embelezadores, lexicais, descritivos, entre outros que não foram abordadas aqui. A preocupação dessa análise foi apenas em mostrar os gestos mais frequentes encontrados na interação dentro da sua relevância para a análise de conflitos.

4.2.5.2 Riso e sorriso

O riso e o sorriso foram considerados de forma geral como elementos atenuadores das situações de conflitos, uma vez que demostram simpatia ou pressupõem uma brincadeira, tirando a seriedade do ato. Apesar de o uso do riso e sorriso não ser mencionado por Brown e Levinson (1987) como uma estratégia de polidez, eles podem ser associados de forma geral a uma estratégia de polidez positiva, uma vez que demonstram simpatia com o ouvinte ou, como na estratégia ‘piada’ (joke), retiram a seriedade do FTA, exercendo uma minimização de seus efeitos.

Tabela 28: Distribuição do uso de riso e sorriso nas atividades de conflito70

Sorriso Riso Total

Int. 1 (masc.) alemães 12 4,49% 35 13,11% 17,60% brasileiros 11 8,03% 10 7,30% 15,33% Int. 2 (fem.) alemãs 26 17,22% 19 12,58% 29,80% brasileiras 7 2,60% 14 5,20% 7,81%

A distribuição de todas as ocorrências foi mostrada como significativa pelo teste do qui-quadrado. Os números totais de utilização de riso e sorriso mostram uma proximidade das ocorrências por alemães e brasileiros do sexo masculino e uma diferença considerável entre participantes do sexo feminino. No geral, o grupo de alemãs apresentou a porcentagem mais elevada de ocorrências de riso ou sorriso, que representam quase 30% do total das suas atividades de conflito. Em contraste, as brasileiras apresentaram a menor frequência, com cerca de 8% do total. Observa-se também uma diferença considerável entre os grupos de alemães dos sexos masculino e feminino, com cerca de 12 pontos percentuais e entre brasileiros e brasileiras, com cerca de sete pontos percentuais. Esses dados apontam para uma maior tendência dos brasileiros a utilizarem riso e sorriso nas atividades de conflito quando comparados com brasileiras, além da tendência maior de alemãs a usarem esses elementos em comparação com todos os outros grupos.

O riso e particularmente o sorriso são usados na maior parte das situações como forma de atenuação de uma atividade de conflito, como mostra o Trecho 49:

70 A análise pelo teste do qui-quadrado mostra que a distribuição total é altamente signinficativa, sendo χ²=50,3; df=6; p<0,001

Trecho 49: ((Interação Feminina, 6:14 - 6:23 min., Tópico Espera - Lazer em Belo Horizonte))

085 B6: a::hm ich meine-

ahm quero dizer

086 (0.6) eh/es gibt NIX zu tun hier;

é não tem nada pra fazer aqui

→ 087 A6: <<sorrindo> doch !KLAR!;>

claro que tem

088 B6: aber was?

mas o quê?

→ 089 A6: <<sorrindo> aber !HALLO!,>

como assim

→ 090 A8: mehr als am stra:nd <<rindo>auf jeden fa:ll;>

mais do que na praia com certeza

Mesmo que as discordâncias mostradas no exemplo sejam explícitas, o riso e o sorriso empregado pelas participantes A6 e A8 têm o efeito de atenuá-las. Esse uso atenuador é observado também nos demais grupos. Porém, há um uso específico do riso no grupo de alemães do sexo masculino que não é observado nos demais grupos de forma tão recorrente. Este uso acompanha atividades de conflito sem mostrar necessariamente um efeito atenuador:

Trecho 50: ((Interação Masculina, 8:37 - 8:51 min., Tópico 1 - dscolha da profissão))

019 B1: é:: eu acho_isso muito legal inclusive. 020 eu a/ eu acho esse JEIto é um jeito meio americano,=assim.

021 tem uma parte da minha família que:- 022 A2: você acha americano?

023 A1: [hahahaha] 024 A4: [((ri)) ]

025 A2: [hahahaha] eu acho: eu acho:- 026 é:;

027 B1: [não- ]

028 A2: [vem ]vem de uma ideia eu acho q/que é: muito assim-

Nesse trecho, A2 mostra discordância em relação a B1 através de uma pergunta (“você acha americano?”) e em seguida, uma risada, acompanhada por outros participantes alemães. Nesse exemplo a própria risada, devido às circunstâncias da situação, pode ser vista como um indicativo da discordância de A2, passando uma ideia de que os participantes alemães nesse caso estariam rindo do próprio B1. Esse tipo de ocorrência de risos,

direcionados à pessoa que falou ou à sua fala é de certa forma frequente na Interação Masculina, principalmente por parte dos alemães e representa em grande parte de suas ocorrências uma atividade de conflito específica, tratada na Seção 4.2.1.5.