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GILT Instituto Superior de Engenharia do Porto

RESUMO

O jogo tem feito parte do espaço escolar desde sempre. A pontuação, a competição, os rankings e as recompensas, enquanto elementos de jogo, sempre estiveram presentes no processo educativo. Já muito se escreveu sobre o conceito de gamificação (gamification) e parece haver alguma unanimidade em defini-lo como o emprego de elementos e pensamento de jogo em contextos não jogo. Todavia esta definição, provindo de áreas não académicas, pode parecer algo vaga. Assim, gamificar uma atividade educativa não significa apenas jogar, ela é muito mais abrangente, já que uma atividade educativa gamificada ou não tem sempre uma finalidade pedagógica. Através de estratégias de gamificação é possível aumentar o envolvimento dos alunos e torná-los mais ativos e implicados nas atividades e tarefas curriculares. Neste texto, apresentamos o projeto “Magos da Sabedoria”, uma estratégia de gamificação para o estudo de duas obras literárias, na aula de Português. Pelos dados recolhidos constatou-se que esta estratégia foi do agrado dos alunos, aumentou a sua motivação pelas aprendizagens e o seu sucesso educativo.

Palavras-chave: gamificação, literatura, motivação, literacia digital, colaboração

ABSTRACT

Games have been part of the school scene ever since. Scores, competition, rankings and rewards as elements of play have always been present in the educational process. Much has already been written about the gamification concept and there seems to be some unanimity in defining it as the use of game elements and game thinking in non-game contexts. However, this definition, coming from non-academic areas, may seem somewhat vague. Gamification does not turn activities into games, it is much more comprehensive from the educational point of view, since, be it gamified or not, an educational activity always has a pedagogical purpose. Through gamification strategies it is possible to increase the involvement of students and make them more active and connected with the activities and tasks. In this text, we present the project “Magos da Sabedoria”, a strategy of gamification used for the study of two literary works, in the Portuguese classroom. From the data collected, it was found that this strategy was appreciated by students, increasing their motivation for learning and their educational success.

Keywords: gamification, literature, motivation, digital literacy, collaboration

Introdução

Vivemos num mundo imprevisível e em permanente mudança. É um mundo líquido marcado pela globalização, migração e coexistência humana (Bauman, 2013). Para prosperar num mundo cada vez mais interconectado, os jovens precisam de adquirir novos conhecimentos, desenvolver as habilidades e as atitudes necessárias para aprenderem e colaborarem, agora e ao longo da vida. Mais do que nunca, os jovens necessitam das habilidades do século XXI para conseguir competências globais, múltiplas literacias, pensamento crítico e colaboração global. Com estratégias motivacionais baseadas nas mecânicas e dinâmicas de jogo é possível conseguir mudanças participativas, experiências de aprendizagem significativas e desenvolvimento cognitivo. Isto exige da escola a preparação das futuras gerações de trabalhadores com competências que lhes permitam ser capazes de aprender autonomamente, ser reflexivos, criativos, críticos e capazes de resolver problemas com algum grau de complexidade (Figueiredo, 2016). Atualmente, a escola enfrenta grandes desafios e é cada vez mais pressionada a adotar pedagogias inovadoras capazes de ir ao encontro das necessidades dos alunos e de melhorar os resultados académicos. Uma das dificuldades que o professor encontra, diariamente, é manter a atenção e o interesse dos alunos pelos assuntos da aula. A verdade é que as novas gerações de alunos são diferentes das de há uma ou duas décadas. Por isso, diferentes técnicas e metodologias educativas (Gamificação, Aprendizagem Baseada em Projetos, Problemas ou Jogos, Aprendizagem Invertida) vão ganhando interesse na área educativa.

Relativamente, ao conceito de gamificação há vários estudos realizados sobre o potencial do jogo e dos elementos de jogo em contexto educativo (Araújo & Carvalho, 2014; Foncubierta & Rodríguez, 2014; Glover, 2013; Gomes et al., 2014; Kapp, 2013; Moura, 2016; Zimmerling et al., 2018). O crescimento da indústria de jogos digitais ajudou ao surgimento dos conceitos: Aprendizagem Baseada em Jogos e Gamificação1. De modo genérico, o termo gamificação consiste em introduzir

aspetos e características semelhantes aos jogos em contextos que não são jogo, como a sala de aula. Uma das definições de gamificação mais conhecida foi proposta por Deterding et al. (2011, p. 1): “Gamification is an informal umbrella term for the use of video game elements in non-gaming systems to improve user experience (UX) and user engagement”. Mas, há evidências de que o termo “gamification” tenha sido cunhado, uns anos antes, por Nick Pelling2, com o sentido de

construir coisas físicas e torná-las divertidas e eficazes de usar. Outras definições foram surgindo, aproximando-se umas das outras. Destacamos a de Werbach & Hunter (2012, p. 29): “The use of game elements and game design techniques in non-game contexts” e a de Kapp (2012, p. 10): “Gamification is using game-based mechanics, aesthetics and game thinking to engage people, motivate action, promote learning and solve problems”.

1 Estes dois conceitos não se devem confundir. A Aprendizagem Baseada em Jogos (Games Based Learning) permite

criar uma experiência de aprendizagem baseada em jogos educativos ou jogos sérios. O termo gamificação é a tradução literal do termo inglês gamification (também se pode traduzir por ludificação) e não se trata de um jogo.

2 Nick Pelling, um programador britânico de jogos de computador, cunha o termo gamification: “Unsurprisingly,

this was the point when I coined the deliberately ugly word “gamification”. https://nanodome.wordpress. com/2011/08/09/the-short-prehistory-of-gamification/.

O que se destaca nestas definições é o uso de técnicas de jogo para tornar as atividades mais envolventes e divertidas, sobressaindo a experiência lúdica. Todas elas contribuem para clarificar o conceito e diversificar as áreas da sua utilização.

Foncubierta & Rodríguez (2014) apresentam uma definição de gamificação direcionada ao contexto educativo, referindo tratar-se de uma técnica que o professor utiliza, no desenho de uma atividade de aprendizagem (seja analógica ou digital), introduzindo elementos de jogo (emblemas, limite de tempo, pontuações, dados, ...) e a sua conceção (objetivos, competição, …), com a finalidade de enriquecer essa experiência de aprendizagem e orientar ou modificar o comportamento dos alunos na aula. Mas, não se trata de uma prática totalmente nova na educação, já que os quadros de mérito académico ou de honra são prémios usados, há muito tempo, para valorizar o trabalho e esforço dos melhores alunos. Pode ser que alguns professores estejam a usar técnicas de gamificação sem disso se darem conta.

Fora da educação, o conceito de gamificação tem sido estudado no mundo dos negócios e das empresas (Zichermann & Linder, 2013). Estes autores apresentam exemplos de como aplicar as mecânicas de jogo para melhorar o envolvimento dos funcionários e clientes à volta de uma ideia, produto ou serviço. Os estudos de caso apresentados ajudam a compreender melhor o potencial da gamificação aplicada às empresas ou escolas de negócios. Ao entender a gamificação como o processo de usar o raciocínio e mecânicas de jogo para envolver o público e resolver problemas, ela pode ajudar em diferentes âmbitos, seja na construção de estratégias, no recrutamento, na formação ou envolvimento do cliente.

Embora uma atividade gamificada não dependa de tecnologias, o advento das tecnologias digitais tornou o desenvolvimento e a implementação da gamificação mais omnipresente (Kapp, 2013). Nos últimos tempos, têm surgido estudos e revisões de literatura que ajudam a consolidar investigação e estudos de caso sobre a temática, permitindo uma compreensão e um desenvolvimento futuro mais consistente deste fenómeno (Xu, 2015). Em virtude deste conhecimento acumulado, a escola tem de aproveitar as novas possibilidades que o mundo eletrónico apresenta, para incentivar a relação dos alunos com o património cultural, através da literatura, como é o caso apresentado neste texto sobre o estudo de duas obras da literatura portuguesa, oferecendo-lhes instrumentos para pensar e viver melhor.

Mecânicas, dinâmicas de jogo e estética

É preciso não confundir gamificação com jogos digitais educativos ou jogos sérios. Na gamificação o aluno não joga um jogo inteiro do início ao fim. Os alunos participam em atividades que incluem elementos motivacionais dos jogos, como por exemplo ganhar pontos, superar um desafio ou receber emblemas pelo bom desempenho nas tarefas. No entanto, ao juntar certos elementos

do jogo a uma atividade de aprendizagem vai-se mais longe do que apenas motivar os alunos. Sabemos que as dinâmicas de jogo em atividades de aprendizagem podem contribuir para melhorar a atenção, a memorização, a aquisição de conhecimentos ou o desenvolvimento de diversas competências dos alunos.

Bunchball (2010) apresenta as mecânicas e dinâmicas de jogo como elementos centrais na gamificação. Este autor considera que sendo termos que se relacionam, não são a mesma coisa, mas, por vezes, são usados um pelo outro. Do seu ponto de vista, as mecânicas de jogo envolvem ações, comportamentos e mecanismos de controlo. Quando usados para gamificar uma atividade, criam uma experiência envolvente para o utilizador. Por seu lado, a natureza motivadora e convincente dessa experiência é o resultado de desejos e motivações que se designam por dinâmicas de jogo. No quadro 1, apresentamos a sistematização dos dois elementos apresentados por este autor.

Estes dois elementos de jogo são peças fundamentais para gamificar atividades de sala de aula. Com as mecânicas é possível tornar visível o progresso, como a pontuação, os emblemas, as cartas, os desafios e as missões. Através das dinâmicas de jogo, podemos construir uma história para a experiência de jogo que liberte diferentes emoções, uma narrativa que envolva e apaixone o jogador. Não se pode negligenciar a estética, pois é um elemento importante para atrair a atenção, através de uma interface gráfica agradável ao olhar, com cores, medalhas ou emblemas originais e apelativos. A componente estética entra no campo das emoções e experiências, por isso o desenho deve relacionar-se com o utilizador final.