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4 MOVIMENTO NEGRO, QUESTÃO RACIAL E PARTIDO DOS

4.2 A questão racial no governo dos Trabalhadores

4.2.3 Governo Dilma Rousseff: entre o continuar e o avançar

Um ano de mandato também não seja suficiente para realizar uma boa avaliação das mudanças de um governo para outro. Mas é interessante para este trabalho, a tentativa de análise das ações da nova gestão. Um destaque do governo de Dilma Rousseff é mesmo a permanência, o desenvolvimento e o aprimoramento das ações já existentes. O slogan do governo muda, mas o cerne das políticas permanece. E isso foi definido desde as primeiras articulações para as eleições de 2010 e permaneceu no programa de governo da coligação e também nas diretrizes que norteiam o mandato de Dilma.

A ideia sempre foi de que a nova gestão desse continuidade à implementação das políticas de promoção da igualdade racial, executando, fortalecendo, ampliando as ações

desenvolvidas nas áreas citadas no tópico anterior (4.2.2), como também nas áreas da comunicação, relações internacionais, segurança pública e juventude.

Mas, apesar de o partido ser o mesmo e as principais questões continuarem em pauta, já é possível ver indicações de que o novo governo não pretende ficar no continuísmo. A ideia da coligação vencedora era “avançar e avançar muito” (PT, 2010a, p. 6). As mudanças estão, se não tanto no trato da questão racial, ao menos na vontade de tornar a coordenação e a articulação das políticas de promoção da igualdade racial mais eficientes.

Ao analisar o programa de governo, no tocante às políticas, houve a preocupação de trazer novas propostas. Como no Governo Lula, há a presença de propostas de políticas universais e afirmativas. Mas destaco a ênfase no binômio gênero/raça, na preocupação em construir uma igualdade que possa aprofundar a autonomia econômica, social e política das mulheres (PT, 2010b). Com base nas notícias veiculadas no site da SEPPIR em 2011117, esse

tem sido um tema recorrente e preponderante nas ações da secretaria.

Na avaliação desta pesquisa, isso se deve a dois motivos: a ministra Luiza Bairros, à frente da SEPPIR desde o início da gestão Dilma Rousseff, é reconhecida pelo trabalho desenvolvido na questão gênero e raça e, em 2011, houve no Brasil, uma série de ações da ONU Mulheres, entidade da ONU criada em 2010 e que promove e coordena as ações da organização para o avanço da igualdade de gênero. No entanto, o que chamou mais a minha atenção foi mesmo a preocupação em preencher as lacunas na área da gestão.

No Programa Setorial de Governo da Igualdade Racial, há um tópico específico sobre o tema. Entre as propostas estão: assegurar que as políticas de ações afirmativas e de promoção da igualdade racial sejam transversalizadas na administração pública federal; garantir a inclusão dos recursos necessários no PPA e nas leis orçamentárias para a implementação do Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial e as políticas dele derivadas; e fortalecer e ampliar a estrutura da SEPPIR e outros órgãos que promovam a igualdade racial118 (PT, 2010c, p. 7).

117 O capítulo 5 traz a análise completa das notícias veiculadas em 2011.

118 Um fato que abalou a imagem de fortalecimento da SEPPIR foi a divulgação de que a Presidente Dilma

Rousseff pretendia extinguir a SEPPIR em sua primeira reforma ministerial, semelhante ao que aconteceu em 2005, na gestão de Lula. A informação foi veiculada no Jornal O Estado de S. Paulo, em 18/11/2011. Texto disponível em: <http://estadao.br.msn.com/ultimas-noticias/movimento-negro-defende-secretaria-sob-novo- comando>. O jornal O Estado de S. Paulo e a Folha de S. Paulo, esta de 09/10/2011, também divulgaram que a ministra poderia deixar o cargo, ou por vontade própria ou decisão do Planalto. Quanto à vontade da ministra, a informação logo foi desmentida pela SEPPIR. O jornal O Estado de S. Paulo também citou a insatisfação de parte do movimento com as ações da atual gestão da SEPPIR, que estaria, por exemplo, pouco disposta para o diálogo com organizações sociais e ignorando demandas petistas. Reportagem da Folha de S.

Paulo disponível em:<http://www1.folha.uol.com.br/poder/987787-reforma-do-primeiro-escalao-ameaca-

Já a relação com o movimento negro continua. Ao pensar as diretrizes para o Programa de Governo (2011-2014), o PT chega a afirmar que “catalisou, nas últimas décadas, os anseios do movimento negro” (PT, 2010b, p. 12). Inclusive, a SEPPIR voltou a ter uma ministra ligada ao movimento. Os dois ministros anteriores, Edson Santos (2008-2010) e Eloi Ferreira de Araújo (2010), atual presidente da Fundação Cultural Palmares, não tinham ligação direta com nenhuma entidade do movimento.

A atual ministra Luiza Bairros é ligada ao PT, ao MNU e ao movimento de mulheres. Também é pesquisadora da área. Antes de ocupar a pasta, foi secretária de Promoção da Igualdade do Estado da Bahia. Uma trajetória que, segundo ela, ensinou-lhe o papel do combate ao racismo no país.

[…] o racismo é uma questão nacional, indissociável, portanto, dos grandes temas que definem os rumos da sociedade brasileira e que devem determinar as escolhas coletivas que fazemos, para que o Brasil se realize como um país justo, democrático e igualitário. Para que o Brasil, impulsionado pelas conquistas dos últimos oito anos, adentre o rol das nações mais importantes do mundo, sem deixar ninguém para trás. (BAIRROS, 2011, p. 1).

Em seu discurso de posse, a nova ministra também reconhece que é preciso caminhar na gestão, na coordenação com outros ministérios e na articulação com demais poderes. Uma rápida pesquisa sobre as atividades da SEPPIR nos primeiros meses do novo governo mostra que o foco foi mesmo a articulação. Houve uma intensa agenda de reuniões e visitas a estados, municípios, órgãos da administração federal, entidades da sociedade civil e órgãos internacionais para propor, renovar, começar ou ampliar programas e projetos.

Outro ponto destacado no discurso da ministra Luiza Bairros e que, na avaliação da pesquisa, surpreende um pouco foi a afirmação de que as prioridades do Governo Dilma Rousseff não atendem somente às demandas do movimento negro, mas também chamam a atenção do governo “para os desafios que a nova configuração das relações raciais impõe à sociedade brasileira” (BAIRROS, 2011 p. 2). Um desses desafios seria, segundo ela, a inclusão das demandas dos indígenas e a inclusão das minorias étnicas (ciganos, árabes e judeus) no esforço de radicalização da democracia.

A inclusão desses grupos no discurso da ministra surpreende porque no Plano setorial de Governo sobre a Igualdade Racial, da campanha de Dilma Rousseff (PT, 2010c), mais especificamente na introdução, é explicado que o objetivo é ampliar as políticas de promoção da igualdade racial, os programas voltados aos quilombos, às comunidades de terreiro, aos indígenas e ciganos, aos jovens e às mulheres negras. O plano cita o fortalecimento das ações da SEPPIR, da Fundação Cultural Palmares, do Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade/MEC. Essa é uma das poucas partes do documento em que os demais grupos (indígenas, ciganos) são citados. Só que isso é feito com a abordagem de outros órgãos que não a SEPPIR119.

De qualquer forma, o discurso da ministra pode sinalizar um indicativo de mudanças que pode tornar a promoção da igualdade racial no país mais plural. Esperança também de mais eficiência. Mas é preciso lembrar que esse processo não é algo rápido, como fala Heringer:

Estamos assistindo no Brasil apenas o alvorecer de um processo que provavelmente levará décadas e – esperamos – terá como desdobramento a adoção de políticas cada vez mais eficazes e sensíveis, na busca de maior inclusão social e racial no país. É preciso que o país perceba que a mobilização contra o racismo não é um tema divisionista, mas sim uma variável que deve ser levada em conta para se pensar o combate à pobreza e as alternativas de desenvolvimento para o Brasil. (HERINGER, 2006, p. 31).

É nesse contexto de intensa relação entre movimento negro e a história do Partido dos Trabalhadores, de relação entre movimento e a criação e as ações da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, que vou analisar, nas próximas páginas, a comunicação desenvolvida pela SEPPIR. Buscarei discutir se e como as informações e os recursos do site da SEPPIR influenciam no espaço que a questão racial possui na esfera pública virtual, seja em termos de visibilidade, seja em termos de discutibilidade. Farei isso, buscando também compreender em que medida essas informações dialogam com as escolhas discursivas e de ação o movimento negro e com a história de relacionamento entre movimento, Partido dos Trabalhadores e Executivo Federal.

119 Mais informações sobre o lugar desses demais grupos na história e nas ações da SEPPIR será discutido no