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Exposição Rio São Francisco navegado por Ronaldo Fraga

• Belo Horizonte, MG | Grande Galeria Alberto da Veiga Guignard | Palácio das Artes De 20 de outubro a 19 dezembro de 2010239, aprox. 450m2

• São Paulo, SP | Pavilhão das Culturas Brasileiras, Parque do Ibirapuera De 1º de abril a 26 de junho de 2011, aprox. 840m2

• Rio de Janeiro, RJ240 | Palácio Gustavo Capanema De 11/11/2011 a 10/2/2012, aprox. 680m2

• Recife, PE | Centro Cultural Santander De 6/11/2012 a 7/2/2013

A grande mudança na coniguração da expo- sição aconteceu na montagem de Belo Horizonte, inaugurada em 20 de outubro de 2010, portanto 11 meses após o encerramento em Pirapora, ocu- pando a maior galeria do Palácio das Artes, um dos principais centros culturais da capital mineira.

Enquanto as peças do acervo passavam por reparos, várias reuniões foram realizadas com os curadores, cenógrafos e produtores para deinir o novo projeto de montagem, que incluía também

iluminação e sonorização.241

O imenso sucesso junto ao público conferiu à exposição o recorde de visitação da instituição, que decidiu prorrogar sua permanência até o dia 19 dezembro daquele ano.

238 Relatório da Paralelo Marketing Social e Cultural enviado ao MinC sobre as quatro montagens da expo- sição Rio São Francisco navegado por Ronaldo Fraga através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais, enviado à autora por Camila Valente. Publicação eletrônica [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <bebel@mandacarudesign.com.br> em 9 jul. 2014. O documento disponibilizado pela produtora traz ainda detalhes sobre as ações complementares de divulgação, serviço educativo, parcerias firmadas, eventos de inauguração e outras informações.

239 A previsão inicial era que a mostra se estendesse até 28 de novembro de 2010, mas o sucesso do público 28 de novembro de 2010, mas o sucesso do público fez com que ela fosse prorrogada por mais 3 semanas.

240 Nesta edição, o nome da exposição era Nesta edição, o nome da exposição era Rio São Francisco, um rio brasileiro.

241 Relatório da Paralelo enviado ao MinC sobre as quatro montagens da exposição Rio São Francisco nave- gado por Ronaldo Fraga através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais.

Figura 55 – Ronaldo Fraga apresenta sua exposição sobre o Velho Chico.

120 Bebel Abreu

Neste, que consideramos ser o formato inal da exposição, a moda aparece em apenas dois dos mais de dez ambientes, que apresentam aspectos diversos da cul- tura e história do rio e serão detalhados a seguir.

QUANTO À NATUREZA

Rio São Francisco pode ser considerada uma exposição de natureza cultural, dadas as suas características enquanto evento realizado em espaços e centros cul- turais abertos ao público em geral, e tendo por objetivo dar a conhecer, através do olhar interessado e afetuoso de Fraga, uma parte tão cara ao povo brasileiro, a im de informar, educar e entreter seus visitantes.

Ao ser inanciada por políticas públicas de incentivo à cultura242, a exposição

recebe dos governos a chancela de sua importância na formação cultural da socie- dade, através de um acervo plural que será apresentado adiante.

Em seu processo de criação da exposição, Ronaldo Fraga diz que um dos parâ- metros mais importantes foi o da acessibilidade da exposição:

Eu queria que a mostra encantasse tanto as crianças que ainda nada sabem sobre o São Francisco, para que conhecessem ali seus peixes, suas lendas e histórias, até o ancião que já tenha uma vivência do rio — a ideia era, através da realização de múltiplos ambientes e estímulos, que o visitante se identiicasse com o rio em algum momento. A intenção era que o público fosse composto não só por pessoas do mundo da moda ou apreciadores das artes e do meu trabalho, mas por todo o

povo brasileiro.243

Essa preocupação em relação à compreensão do público se reletiu ainda no desenvolvimento de atividades do serviço educativo e em elementos de estímulo à participação, descritos adiante.

QUANTO AO CONTEÚDO

Rio São Francisco não é uma exposição de acervo, é uma exposição de uma viagem imaginária pelas várias faces desse rio. Ronaldo Fraga

242 Nas montagens de Ipatinga, Montes Claros e Pirapora, a exposição havia sido realizada com recursos da Lei Estadual de Incentivo à Cultura. Em abril de 2009, enquanto ainda estava em Ipatinga, o projeto foi inscrito e aprovado na Lei Rouanet. Com aprovação na Lei Federal, através da qual o projeto propunha novas cidades para itinerância da exposição, foi necessário reelaborá-la, tornando-a maior, pois agora passaria a cir- cular nas capitais, cujos espaços culturais eram maiores dando liberdade criativa ao estilista. Foram captados recursos junto à CEMIG e à FIAT. A última cidade a receber a exposição no Projeto da Lei Estadual foi Belo Horizonte. A informação consta no relatório da Paralelo Marketing Social e Cultural enviado ao MinC sobre as quatro montagens da exposição Rio São Francisco navegado por Ronaldo Fraga através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais, enviado à autora por Camila Valente. Publicação eletrônica [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <bebel@mandacarudesign.com.br> em 9 jul. 2014.

243 Informação verbal fornecida ao telefone por Ronaldo Fraga em entrevista à autora, realizada em 20 fev. 2014.

Expografia Brasileira Contemporânea | Capítulo 3 121

Para falar do conteúdo exibido pela exposi- ção é necessário voltar ao que lhe deu origem: a pesquisa para a coleção, que Fraga descreve em seu site.

Nenhum outro brasileiro desperta tanto encantamento quanto o rio São Francisco. Cruzando 5 Estados, ele rasga o coração do Brasil, carregado de histórias, lendas e profecias. (…)

Hoje a situação do rio é um prenúncio de conlitos em torno da água. E o que isso tem a ver com a moda? Bom, tenho usado o “ter-que-fazer-mais-uma-coleção” como “desculpa” para ler e entender mais sobre certos assuntos. Desta vez a pesquisa me levou ao Velho Chico.

Mergulhei literalmente neste universo de lendas e conlitos numa paisagem humana colorida e bordada por marinheiros, caboclos d’água e mulheres-peixe. De lá trouxe laranjas desavergonhadas, brancos sujos, verde-água transparente. Bebi azuis, cheirei a opulência dos opacos e nobres beges. Lambi a base amarela dos

sedimentos caídos dos verões e os marrons das cheias das cabeceiras. O lado morto do Rio vem colorido de preto. Vieram bordados e aplicações de alma artesã. A estamparia inspirada nas sobreposições das madeiras coloridas dos barcos e das casas. Os sacos de juta, embalagens das preciosas especiarias.

Da lenda do caboclo d’água vem a beleza sem olhos (ou olhos de canudinhos para beber o Rio).

Por mais que pareça, nada no São Francisco é simples. Descobri ser o Velho Chico o único rio com terceira margem. Mesmo com tanta beleza o rio padece. Entretanto, espero que o São Francisco desassombre as almas dos carcarás

carregados de poder.244

Como descreve Clarissa Neves:

A história toda começou com a pesquisa do Ronaldo: ele é um estilista que usa do tema como um pretexto pra imergir, mergulhar num determinado assunto. Quando ele fez (a coleção do) São Francisco, a pesquisa que ele realizou foi muito maior do que o que apareceu nas roupas. Ele fez primeiro a passarela, que eram as bacias das lavadeiras com sal: era um rio feito de sal, uma crítica sobre a transposição do rio e a salinização da água. Quando acabou o desile, ele disse: “Bem, eu tenho muito mais material, é uma área inteira do país, é uma história fascinante que eu quero transformar numa exposição”.

244 Site Ronaldo Fraga. Disponível em: <http://www.ronaldofraga.com.br/>. Acesso em: jul. 2013.

Figura 56 – Ronaldo Fraga em expedição no Rio São Francisco, a bordo do vapor Benjamin Guimarães: rica inspiração.

122 Bebel Abreu

Não é uma exposição de acervo, então não tinha grandes objetos — são usados objetos do dia-a-dia, do cotidiano, e objetos que são transformados para contar uma história.

A produtora Cibele Teixeira ressalta que, mesmo sendo consequência da coleção, essa não é uma exposição de moda:

Ele não queria que fosse uma exposição de moda, e ela não é de moda. Os vestidos que compõem a exposição foram bordados por comunidades das cidades ribeirinhas. É a única hora em que ele mostra a roupa, e essa roupa saiu da passarela para as galerias; é a única hora em que se tem moda. Ele quis mostrar os mercados das cidades ribeirinhas, sua religiosidade, quis mostrar uma série de elementos que

compõem a história do rio.245

Numa aplicação prática da transversalidade de tipos de conteúdos tão recorrentes nas expo- sições narrativas contemporâneas — e em total acordo com a diversidade existente no tema abor- dado e ainda na maneira como Fraga quis apre- sentá-lo — a exposição Rio São Francisco traz, em sua montagem, itens que cabe- riam em muitas das categorias propostas pelo IBRAM, citadas no capítulo anterior. A Antropologia está presente através dos ribeirinhos e sua vivência religiosa, seus mercados, danças e também nas lendas; as artes visuais através dos bordados e reproduções dos letreiros, as Ciências Naturais através da apresentação dos peixes do rio em vias de extinção, a História pela presença do ilme que registra o antes e o depois da inundação da cidade baiana de Rodelas para a construção de uma hidre- létrica — ilme este que já se enquadraria na categoria Imagem e Som, que também abarca os vídeos do projeto Cinema no Rio, o mapa do rio e as fotos das cidades, bem como a gravação do poema de Carlos Drummond de Andrade Águas e Mágoas do Rio São Francisco, declamado pela cantora Maria Bethânia especialmente para a exposição. O acervo Documental comparece através dos registros de época feitos por Marcel Gautherot.

Complementam o conteúdo a coleção de Fraga desilada em 2008, gênese do projeto, bem como vestidos desenhados especialmente para a exposição, além das garrafas que trazem rótulos de cachaça inventados, e muitos outros elementos.

Aliado a tudo isso, há ainda a dimensão crítica, tanto à salinização do rio,

245 Informações atribuídas a Cibele Teixeira neste capítulo foram obtidas por correio eletrônico (ao longo de 2013 e no início de 2104) e em entrevista pessoal realizada pela autora em 28 jun. 2013, na loja de Ronaldo Fraga, em Belo Horizonte.

Figura 57 – Aspectos da viagem: as garrafas de cachaça e o mercado nas cidades ribeirinhas.

Expografia Brasileira Contemporânea | Capítulo 3 123

presente nas bacias cheias de sal, quanto à sua poluição, representada pelos peixes feitos em garrafas PET — que ironicamente povoam o rio atualmente.

QUANTO AO TRATAMENTO EXPOGRÁFICO

Dentre os tratamentos expográicos descritos no capítulo anterior, Rio São Fran- cisco é claramente um exemplo de Ambientação como linguagem, na medida em que se utiliza de diversos elementos cenográicos e recursos para transmissão do conteúdo, itens abordados mais adiante, com a descrição de cada ambiente no formato inal da exposição. Por hora, apresentaremos uma breve análise dos dois primeiros momentos do projeto, fundamentais para o resultado inal exibido a partir de Belo Horizonte.

Atendendo ao desejo do curador, de promover “um mergulho nas águas festivas e de memórias, nas águas alegres e também nas águas amargas do rio”, a mon- tagem resultou numa grande instalação com a identidade visual típica da obra de Fraga, que foi bastante bem recebida pelo público:

Linda demais. Lúdica e sensorial demais. Informativa sem ser chata e sem ser professoral. O que me encantou em primeiro lugar foi a beleza plástica da mostra, depois as formas geniais de expor aspectos do rio: adorei as garrafas de cachaça, as embalagens, adorei o barco. Gostei muito muito muito do vídeo com

o depoimento do Wagner Moura.246

Como comenta Teixeira:

A exposição é muito lúdica e afetuosa, mas também é crítica: os peixes feitos de garrafas PET são uma crítica à poluição do rio, que hoje inclusive tem muito menos peixes que antigamente.

Na análise das quatro montagens da Grande Exposição, serão apresentados os elementos citados no capítulo anterior (cenograia, gráicos e instrumentos de me- diação) para, na sequência, demonstrar como os ambientes sofreram adaptações em cada um dos locais ocupados.

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