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GRANDEZA E EXPRESSÃO DA PROBLEMÁTICA DE ACESSO AO SOLO E À HABITAÇÃO SOCIAL

O município de Barcelona, capital da Catalunha, com cerca de 1,5 milhão de habitantes, faz parte hoje em dia de um extenso território, de quase 4,5 milhões de habitantes e limites imprecisos, habitualmente conhecido como Região Metropolitana de Barcelona - RMB -. Esta Região Metropolitana conta com uma clara zona central, de 3 milhões de habitantes, normalmente identificada como Área Metropolitana de Barcelona - AMB -. O território metropolitano encontra-se com uma estrutura urbana muito sedimentada, com um núcleo central urbano de grande importância, o município de Barcelona.

Depois de 15 anos de estagnação populacional, a Catalunha e a Região Metropolitana passaram a recuperar um dinamismo demográfico positivo, sobretudo devido à imigração estrangeira. Ao mesmo tempo, as migrações internas, a maior demanda por moradia, a urbanização dispersa e o persistente aumento do preço do metro quadrado para moradias seguem favorecendo a desconcentração dentro e além do âmbito metropolitano. Observa-se um efeito de deslocamento da população do centro metropolitano até seu entorno imediato, devido em boa parte à maior construção de novas habitações de custo menor neste setor.

Na década de 70, os municípios da primeira coroa ao redor de Barcelona se desenvolveram até se conectar a ela. Atualmente estão crescendo aceleradamente os municípios da segunda coroa, acusando um processo de descentralização.

A evolução da AMB, no qüinqüênio 1991-1996, apresenta um decréscimo de 129.000 habitantes, para posteriormente experimentar uma mudança de tendência no qüinqüênio seguinte, em que se recuperam 14.000 habitantes, aproximando-se novamente de um total de 3 milhões de pessoas. Por outro lado, o conjunto da Região Metropolitana de Barcelona aumentou em 3% sua população no período entre os censos 1991-2001 e compreende 4.390.390 habitantes, incremento atribuído aos movimentos migratórios que se produzem no resto da RMB, ou na segunda coroa metropolitana, e que são acompanhados de um forte ritmo de construção residencial, o mesmo que na zona mais periférica da AMB, ou primeira coroa metropolitana.

Hoje em dia, o problema da habitação na Região Metropolitana pode se caracterizar por uma forte polarização dos preços em relação ao centro. O acesso à habitação no município central é difícil inclusive para as camadas médias da população e, especialmente para os jovens e idosos, que muitas vezes não são os proprietários da moradia em que residem. O desafio a ser enfrentado é o de conseguir uma presença relevante de habitações de aluguel de propriedade pública no núcleo central da Região Metropolitana e a promoção de viviendas protegidas86, em todo o âmbito metropolitano. Para isso, é fundamental a aquisição de solo a preços acessíveis ao poder público, e isto se realiza através das cessões obrigatórias de solo em operações de criação e intensificação de solo urbano.

Prevê-se uma mudança de tendência a médio e curto prazo que corrija este processo altamente especulativo de forte incremento dos preços das moradias que, em cinco anos, entre 1997 e 2002, dobraram tanto em Barcelona como na primeira e na segunda coroa metropolitana.

No período 1997-2001, as moradias de obras novas (considerando a produção pública e privada) representaram uma média de 14.000 unidades/ano na Área Metropolitana de Barcelona, cifra que representa o recorde de construção dos últimos 25 anos. O mesmo pode se dizer do conjunto da Região Metropolitana de Barcelona e Catalunha: processo de elevado ritmo de construção e cifras recorde. Os anos 2002 e 2003 se mantiveram na mesma linha. O mesmo pode se dizer do conjunto da RMB e Catalunha: ritmo elevado de construção e cifras recorde dos últimos 25 anos.

A. Os bairros marginais e os polígonos de habitação

Como a maioria das grandes metrópoles, Barcelona padeceu com o problema da moradia irregular. O motivo também é comum: uma grande afluência imigratória que ao chegar à cidade se encontrava ante a inexistência de moradia ao seu alcance, devido à falta de habitação social ou às vezes simplesmente devido à falta de moradia, gerando problemas de superpopulação, informalidade e precariedade urbana.

Daí nasceu o problema das urbanizações marginais ou ilegais, consideradas durante décadas como “cidade defeituosa”. Os dois fatores que exorbitam o problema são: por um lado o dinamismo (impossível de controlar) do fenômeno imigratório e, por outro, a incapacidade da administração de fazer frente ao fenômeno, promovendo habitações de baixo custo. As urbanizações marginais, como alternativas ao problema residencial, surgiram à margem do planejamento e da capacidade econômica ou vontade do poder público.

O problema se apresentou de maneira mais grave nas décadas de 50 e 60, quando nasceram inúmeros bairros de “barracas”87. Estas moradias se construíram em terrenos considerados “não urbanos” e de titularidade “difusa”: nas encostas da montanha de Montjuïc ou na de outros morros que rodeiam a cidade de Barcelona; nas praias e nos terrenos considerados “zona de ninguém”, que costumam ficar perto das linhas de trem, etc

A política aplicada tanto em âmbito municipal, pela Prefeitura de Barcelona, como em nível federal, pelo Ministério da Habitação88, não pretendeu legalizar as construções existentes, mas erradicá-las e transferir seus residentes a conjuntos habitacionais, denominados polígonos89, de nova construção, tanto de promoção pública como privada. Evidentemente, nestes casos não se contemplava a propriedade do solo. A política seguida foi de se encarregar a um organismo ad hoc, a Comissão de Urbanismo de Barcelona, a aquisição de solo nas periferias urbanas para edificar os polígonos dedicados aos “barraquistas”90. Isto fez com que até finais da década, o número de barracas houvesse diminuído.

87 Por bairros de barracas entende-se os assentamentos urbanos de caráter muito precário, construídos geralmente com materiais de reciclagem (chapas, papelão ou plástico).

88 Em espanhol “Ministério de la Vivienda”.

89 Em espanhol “polígonos de vivienda”.

No entanto, o problema não foi solucionado, mas aumentou na década seguinte, porque a imigração aumentou. Se entre 1950 e 1960 haviam chegado à Catalunha em torno de 440.000 pessoas - 65% das quais à cidade de Barcelona -, no qüinqüênio 61-65, só a área de Barcelona recebeu 300.000 imigrantes e uma tendência similar prosseguiu até o ano 1973. A diferença mais importante entre os dois qüinqüênios foi a saturação da cidade de Barcelona: no qüinqüênio 61-65 recebeu 50% dos imigrantes da área metropolitana, enquanto que em 65-70 baixou para 44%. Por este motivo, foi necessário buscar solo disponível para a construção de novas moradias nos municípios do entorno.

A sensibilidade social quanto ao tema do barraquismo foi aumentando, sobretudo tendo em conta que a partir de 1962, com o andamento dos Planos de Desenvolvimento, o Estado espanhol conheceu um período de notável auge econômico. A Prefeitura de Barcelona reativou o Patronato Municipal de la Vivienda, enquanto se colocava em marcha, em nível federal, os planos de absorção do barraquismo. A Comissão de Urbanismo de Barcelona desenvolveu um plano em várias fases, entre os anos 1965-1972. Foi construído um importante número de polígonos destinados a barraquistas ou a pessoas que, a causa da construção de importantes obras de infra-estrutura deviam ser desalojadas de suas casas. A construção se realizou tanto em Barcelona como em municípios da periferia, através de uma atuação chamada Unidades de Absorção de Vizinhança - UVA -, nome este referente à absorção de barraquistas.

Em 1973, o Patronato Municipal de la Vivienda de Barcelona declarava o barraquismo erradicado da cidade. Esta afirmação não era 100% certa mas, em boa medida, se podia considerar verdadeira. Apenas cabe assinalar, para finalizar, que muito de acordo com a situação política do momento, a erradicação de barracas e destinação de novas moradias se fizeram “a dedo”, sem nenhuma participação das pessoas afetadas: muitas delas foram transferidas contra sua vontade e alojadas às vezes em locais muito distantes de seus antigos núcleos de relação ou de trabalho.

À parte destes bairros de barracas, de caráter muito precário, também se levantaram durante todo este período em Barcelona e seu entorno metropolitano outras construções de caráter irregular, ainda que sem chegar aos níveis tão elevados de precariedade nem de sordidez. Estas moradias se situaram sobre solos de caráter mais claramente urbanos, ainda que de expectativas não consolidadas. Em alguns casos existiam títulos de propriedade do lote, ainda que em muitos outros não houvesse nenhum documento a comprovasse. Por outro lado, muitas destas moradias foram melhorando relativamente em dois aspectos: a melhoria da edificação em razão do incremento da renda do núcleo familiar (principalmente a partir do trabalho dos filhos), e a disponibilidade de serviços municipais como esgoto, recolha de lixo e transporte público.

Com tudo isso, se chegou a pensar que estas moradias tinham um nível mínimo de habitabilidade, ou estavam muito pouco abaixo dele, de maneira que não foram objeto das sucessivas atuações dos planos de erradicação do barraquismo durante o período da ditadura franquista.

No entanto, chegou um momento na metade dos anos 70, coincidindo com a mudança de regime político (período da redemocratização), em que sua evolução ficou paralisada, seja pelo elevado custo das obras, ou porque não estavam habitadas pelo

seu proprietário, mas por seu locatário, com pouco interesse em melhorias, ou também pela incerteza de seu futuro ante a constatação da maior disciplina urbanística e das possíveis mudanças para sua regularização. Assim, apesar de que em meados dos anos 70 já não houvesse graves problemas de habitação em Barcelona, constituíram-se periferias pobres e constituíram-sem qualidade urbana.

1.3.2. PAINEL 2

EVOLUÇÃO DAS POLÍTICAS DE ACESSO AO SOLO E À HABITAÇÃO EM