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Grupos de interesse

No documento António - tese final (páginas 60-64)

Capítulo 1 1 Conceptualização teórica

1.3. Movimentos sociais

1.3.1. Grupos de interesse

Nascido no pós-Renascimento, com o advento do período contratualista, o Estado moderno tipifica um modelo no qual o monarca estabelecia contratos e desenvolve-se até à actualidade com base num conceito de Estado funcional, assente num Executivo. Quando hoje se fala em Estado fala-se em soberania e legitimidade – ainda que, como se sabe, a importância da economia e da globalização constitua uma clara afronta e um inequívoco desafio a esta realidade.

O Estado, que começou e nasceu na óptica de uma ideia, consiste actualmente numa arquitectura sujeita aos fluxos da sociedade, vivendo-se a era da liberdade privada, que mais não é do que uma invenção do «statu quo» neoliberal. O Estado tornou-se, assim, numa máquina funcional.

Aparelho de luta de que os partidos se servem para adquirir ascendente no seio da sociedade, o Estado não é mais o palco de soberania absoluta teorizado por Hegel desde que Augusto Comte e, mais tarde, Max Weber plasmaram a soberania como uma marca da posse do poder constituinte. Segundo este, o Estado acabará por se tornar numa organização susceptível de recorrer ao uso legítimo da força.

António Manuel de Sousa Duarte

Movimento de 1383 e 25 de Abril de 74 – burgueses e capitães, do «putsch» à revolução

Admitindo-se que os homens inventaram o Estado para não obedecerem aos homens, a verdade é que o Estado se tornou na forma de poder que enobrece a obediência. Por isso, como parceira da obediência, brotou a arbitrariedade, hoje factualmente entendida como um dos perigos mais considerados no contexto da ideia moderna de Estado.

À concepção medieval que dispõe sobre um poder cuja acção prefigura e prepara o advento do reino de Deus, sobrevirá a interpretação muito mais laica das tarefas políticas. E a laicização da função política passou a ser acompanhada de uma correspondente e consequente ampliação geográfica.

Mas, ainda que o Estado tenha passado a exigir que haja um aprimoramento das relações entre os indivíduos e o respectivo contexto geográfico – o que hoje se apelida de ordenamento do território – e mesmo tendo a institucionalização do poder radicada na existência de um território e de uma nação – conceito que correlaciona a raça, a língua, a religião, o passado histórico e o «habitat», como escreveu André Malraux, o espírito dá uma ideia de nação – fica claro que são esses dados suficientes para dar origem à ideia de Estado – porque importa serem acompanhados de uma reflexão sobre o próprio poder. Porque, quando a colectividade aumenta, os governantes distanciam-se dos governados e, à distância física, passa a acrescer o afastamento emocional.

A autoridade do chefe, que primitivamente assentava na submissão individual de cada um dos membros do clã, tendeu a ser substituída pela ascendência da ideia representada pelo chefe.

O indivíduo adquire uma nova autonomia e uma nova dignidade pessoal. Desta forma, porque institucionalizado, o poder deixa de ser evidentemente o poder pessoal dos indivíduos e do Estado encarnado num homem, para dar lugar ao advento do homem, dos homens, confundidos com o próprio Estado. O Estado institucionalizou o poder para que, não concentrado numa só pessoa e despojado dessa encarnação, o Estado sobreviva sempre e a todos os seus titulares.

Sendo o Estado uno e a sociedade múltipla, ele é o único poder capaz de regularizar a concorrência dos poderes sendo, também, o motor e o travão dialécticos de toda a actividade que sustenta o combate pela sua obtenção. Motor e árbitro dessa luta, o Estado é o regulador da ordem e do movimento enquanto factores intrínsecos da actividade política e da dinâmica da sociedade.

A existência do Estado é essencial para fundamentar a legitimidade e continuidade do poder, bem como para assegurar a superioridade da competência dos governantes. Por essa razão quando, no regime do poder individualizado, ocorre resistência dos governados, o chefe só consegue impor a sua vontade pela força e assegurar a obediência incondicional através da legitimidade no Estado e não no conjunto das suas qualidades individuais.

Eterna dialéctica agregada, o Liberalismo despreza o Estado na medida em que aceita uma administração pública sem política; serviços sem poder; gerentes mas não patrões. Em suma, elimina o Estado-potência e fomenta o Estado-servidor. Já o Marxismo entende que o poder só o é desde que proceda da sociedade inteira, empenhando-se com afinco na realização da homogeneidade social como objecto da revolução proletária, cujo ascendente sobre classes adversárias resultará numa sociedade sem classes.

Como resultado directo das metamorfoses orgânicas registadas nos interstícios estatais, foi neste quadro que se foi observando o surgimento daqueles a que hoje se designam por grupos de interesse e grupos de pressão.

Ainda que nem sempre fáceis de discernir, e por vezes sujeitos a linhas de fronteira extremamente ténues, parece não ser aconselhável considerar ambos como um único e mesmo organismo.

Os grupos de interesse podem ser caracterizados pelo facto de apresentarem um formato que assenta numa intervenção constante e permanente. A sua tipologia comportamental e de intervenção aponta para a procura da consumação de um conjunto de objectivos duradouros e sustentados que podem ser definidos por uma acção consistente dos pontos de vista do espaço e do tempo.

Dividida e espartilhada entre múltiplos e difusos poderes, a nova sociedade política evidencia uma complexa crise existencial no que aos poderes tradicionais diz respeito. E esta ambiguidade deve-se, sobre todos os outros factores, à proliferação de poderes – de entre os quais emergem o poder partidário, elevado à sua máxima potência; o pesado poder administrativo-burocrático do aparelho de Estado; o poder sempre ameaçador da hierarquia militar; o poder das elites académicas e científicas; totalizando todos, enfim, um conjunto de poderes que, autónoma ou circunstancialmente conjugados entre si, não poucas vezes resvalam para um formato organizacional que os afirma poderosamente no contexto da sociedade.

António Manuel de Sousa Duarte

Movimento de 1383 e 25 de Abril de 74 – burgueses e capitães, do «putsch» à revolução

“À margem das eleições, a questão da participação política nas Democracias contemporâneas é um tema recorrente. Em tom gradualmente crescente, os cidadãos e os actores políticos, económicos e sociais desafiam os poderes políticos para serem entendidos” (Grossman & Saurugger, 2006, p. 7). Trata-se, concluem estes autores, da “demanda de uma demografia mais participativa que é um fenómeno cada vez mais na agenda dos especialistas”.

Enquanto isso, entende-se que viver numa sociedade de grupos e de movimentos indicia um conjunto de consequências determinantes para o exercício do poder no Estado. Porque “os grupos de interesse desempenham um papel de produtores de normas, importa analisar o seu funcionamento e as suas actividades tanto do ponto de vista funcional e empírico como normativo” (Grossman & Saurugger, 2006, p. 7).

Por grupos de interesse entendem-se, assim, as forças e as movimentações que “emergem do ponto de vista social e se organizam com os objectivos de conquistar ou sedimentar as vantagens e os benefícios de determinado grupo. Por isso, aos grupos de interesse, deve ser acoplada a interpretação segundo a qual a sua conduta se caracteriza pela acção de médio ou longo prazo” (Bastos, 2004, págs. 259-262).

Numa perspectiva de reconhecimento institucional, os grupos de interesse tendem a organizar-se e a obter o reconhecimento formal das suas próprias existência e actividade. Ora, segundo alguns investigadores, é quando os seus mentores dão passos mais concretos e de interferência directa na dinâmica da sociedade que passam a poder ser considerados como grupos de pressão.

“Digamos que a existência do interesse comum é o elemento incorporado do grupo; a pressão, o seu objecto, e o «lobby», um dos principais instrumentos utilizados para alcançar o objectivo” (Castro, 2004, p. 122).

Numa perspectiva mais lata, “a noção de grupo de interesse pode ser perspectivada e definida como uma entidade que procura representar no espaço público os interesses de um departamento específico da sociedade” (Grossman & Saurugger, 2006, p. 11). Por outro lado, numa tentativa de compreensão mais restrita, “o grupo de interesse pode ser definido como uma organização constituída que procura influenciar os poderes políticos num sentido favorável aos seus interesses”.

Sucede assim que, enquanto no primeiro caso, o grupo de interesse é apresentado como “um actor que visa influenciar não só o poder político mas também outros grupos ou a Opinião Pública mais abrangente” [o grupo de interesse] insiste no nexo puro de causalidade existente entre os poderes políticos e o grupo – e, daí, a noção de grupo de interesse” (Grossman & Saurugger, 2006, p. 11).

No documento António - tese final (páginas 60-64)

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