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CAPÍTULO V. FONTES EMPÍRICAS

5.1 As Entrevistas

5.1.4 Guilherme – 22 anos

Guilherme é aluno do 3º ano do curso e ingressou transferido do curso de matemática do IME, que cursou por 4 anos. Diz que, apesar do longo período na matemática, ainda precisava fazer muitas disciplinas, pois trabalhava e não conseguia seguir integralmente o currículo proposto pelo curso. Realizou a transferência para o curso de pedagogia em busca de discussões que abarcassem a área da educação, com a qual teve contato nas matérias de licenciatura na FEUSP e que não aconteciam no curso de matemática.

Ao optar pela mudança de curso, Guilherme relata que não teve apoio de nenhum conhecido e enfrentou preconceito e duras críticas, situação semelhante com a que viveu quando decidiu ser professor. Diz essas críticas são baseadas na lógica de desvalorização do professor atualmente, na baixa remuneração e no fato de o curso de pedagogia ser encarado como um curso de segunda linha, de fácil ingresso e por isso, formado por alunos não conseguiram ingressar em outros cursos.

Ah, meu gosto pela educação sempre foi meu mesmo, porque encorajamento, ainda mais de fora, nunca tem... pra ser professor... pedagogia, então, pior ainda! Se eu falo pra alguém: -ah, eu larguei matemática! - pra fazer o que? - pedagogia! Nossa!!! Sem noção! Se fala que faz matemática, é cara de louco.. pedagogia é cara de: pô! Que que você quer fazer da sua vida?!!! Quer dar aula? E trabalhar?? Ainda tem essa pergunta!!! Mas foi uma decisão minha mesmo.. partiu de mim (...) todo mundo acha professor uma profissão bonita mas vai perguntar se alguém quer ser professor? Nunca quer... pedagogia ainda! As pessoas já pensam: putz, trocou por um curso mais fácil!é burro... quem entra em pedagogia é uma pessoa que não é capacitada a fazer um curso como engenharia, medicina... as pessoas tem um preconceito enraizado já...

engenheiro, médico, advogado(...) são os doutores, os inteligentes. O resto já é outra história...

Apesar da falta de apoio, revela que teve influência de alguns professores em sua escolha:

Meio que me inspiraram... acho que quando você escolhe uma profissão você não escolhe do nada, você tem alguma admiração, alguém pra quem olhar... E não necessariamente de matemática... eu tive bons professores de matemática, mas tive também de história...

Por vivenciar durante muito tempo outra realidade na USP – o curso de matemática – Guilherme compara os dois cursos em quase todas as suas falas. Diz que na pedagogia os estudantes são mais politizados, mas que, especialmente agora, com o as discussões sobre o policiamento, os alunos evitam participar de eventos ou discutir fora das salas de aula. No entanto, ele busca se envolver com os grupos do curso: participa de clubes de estudo e laboratórios e do centro acadêmico, promovendo festas, eventos e ajudando a revitalizar a atlética. Esse envolvimento em outros espaços, segundo ele, contribui para sua aproximação com alunos e professores, pois tenta não ser radical em seus posicionamentos políticos para evitar discussões.

O entrevistado diz ter contato com estudantes de todos os anos do curso, o que contribuiu para a construção de relações de amizade com alguns alunos, e descreve sua relação com os professores como “próxima e aberta”.

Assim como outros estudantes entrevistados, Guilherme relata dificuldades ao ingressar no curso pela falta de informação sobre a estrutura da faculdade de educação e sobre o currículo e também diz que, ao frequentar disciplinas com alunos de outros períodos, sente muita diferença com relação às discussões e ao posicionamento.

A diferença é que no 1º ano o pessoal ainda tá descobrindo as coisas, a se soltar um pouco mais. Nas primeiras aulas eles às vezes tem medo de perguntar ou então as perguntas são aquelas bem... bem básicas porque eles ainda não estão na dinâmica da universidade... não só da feusp... então eles se sentem acuados, tímidos... e vão se posicionando aos poucos... então a diferença é essa: o pessoal dos outros anos já tem mais autonomia, já sabe mais ou menos como tudo funciona, até os professores eles já conhecem alguns, pegam matérias com os mesmos professores. No 1º, não, eles ainda tão descobrindo as coisas...

Segundo ele, bons professores, os que desempenham sua função de forma ideal, são aqueles que não tentam impor sua visão aos alunos, mas que buscam o diálogo nas aulas. Comenta que atualmente a escola mudou e o professor tem que estar preparado para educar o aluno de forma geral, pois isso não acontece mais em casa. O professor tem que estar disposto a falar sobre os problemas sociais que seus alunos enfrentam, participar e conhecer a comunidade onde leciona.

Mas também depende da escola... se for um professor de escola particular isso já muda um pouco... deveria ser o papel do professor também, mas ele acaba não fazendo isso e muito porque as escolas não permitem... em algumas escolas ainda tem aquele negócio: aula dada, aula, estudada, então se você não der aula você prejudica o aluno que está estudando pro vestibular, que o pai tá pagando, ai ele não vai passar na FUVEST e o professor é que vai se ferrar depois...

Guilherme considera o curso da USP melhor que os de outras instituições, mais completo, mas ainda assim acha que falta aprofundamento em algumas disciplinas, como as que tratam de ensino não formal, realizado em espaços diferentes da escola.

(...)eu já conversei com um amigo meu que faz pedagogia em outra faculdade, particular, e o curso é muito... não sei... quando eu falei que era superficial aqui eu acho que não usei a palavra certa...é um curso que não é superficial, mas poderia se aprofundar ainda mais... em outras faculdades, ai sim é bem superficial mesmo...