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Há reclamações ou não? Reclamações sim, mas eles

2– A PROFISSIONALIZAÇÃO E SUA INSERÇÃO NA SOCIEDADE E NO ESTADO: A CONTRIBUIÇÃO DE HEGEL E MAR

3- Há reclamações ou não? Reclamações sim, mas eles

compreendem, há uma cobrança porque o familiar acaba que ele quer conviver mais com a gente no final de semana, familiares, namoradas, dentre outros. Acaba que esse tempo se a gente não policiar a gente fica só trabalhando, inclusive final de semana e feriado, e nem encontra com os familiares, então se a gente não tiver um controle rigoroso em encontrar com o familiar, com namorada, como se fosse uma obrigação mesmo, como um tempo para a família a gente acaba sendo consumindo mesmo pelo trabalho e aí as relações afetivas vão embora.

(Sujeito 6)

Quando se depara com a realidade vivencial do trabalho docente dos sujeitos pesquisados, verifica-se a tensão gerada pela intensificação do trabalho, onde o professor, o trabalho intelectual não mais se separa da máquina produtiva hodierna, da racionalidade tecnológica afetando a sua subjetividade nas relações sociais.

Ao se observar os sujeitos da pesquisa, nitidamente presencia-se a intensificação, bem como o afetamento nas relações sociais quando o professor não mais distingue o "seu tempo", tempo ocioso, do tempo do trabalho, "porque você não é professor só na hora que chegar no portão da escola, você é professor 24 horas por dia" (Sujeito 3). Ainda, na especificidade do trabalhador advogado essa intensificação reveste-e de uma aparente "normalidade", como se fosse típica ou exclusiva de determinadas atividades laborais e não de todo

trabalhador, " pois, antes de ser professor eu era advogado então eu estou acostumado a trabalhar final de semana, feriado, ano novo, natal, o advogado de certa forma ele não tem muito esse tempo assim de descanso, que os trabalhadores comuns têm..." (Sujeito 6).

Constata-se, ainda, nos sujeitos pesquisados, a tensão do valor efetivamente pago para o trabalho do escritório virtual e o dever-obrigação no cumprimento das tarefas a serem realizadas. Destaca-se ainda, o prévio questionamento desse valor pago ou recebido para o exercício da atividade específica. Doutra forma, o questionamento do trabalho imaterial, constituído por tempo de trabalho explorado e não pago. Daí a lógica da "normalidade" acessar o escritório virtual em finais de semana e feriados, pois, "a gente tem inclusive a nossa dedicação, temos horas pagas, justamente para a gente ter em casa o acesso escritório virtual" (Sujeito 2). Mas valor questionado na dimensão do 'quantum' específico do trabalho, pois, "não acho que as horas do escritório virtual são suficientes para essas atividades extra-trabalho, ou extra-SAJ" (Sujeito 4).

No que tange às relações sociais, dos sujeitos pesquisados, o trabalho intensivo afeta, em grau variado, a subjetividade do professor, a relação social do trabalhador, a relação psico-afetiva, pois, "se a gente não tiver um controle rigoroso em encontrar com o familiar, com namorada, como se fosse uma obrigação mesmo, como um tempo para a família a gente acaba sendo consumindo mesmo pelo trabalho e aí as relações afetivas vão embora" (Sujeito 6).

No que tange à saúde psico-afetiva, evidencia-se a possibilidade não remota dos pesquisados de conviverem com algum estresse, sobretudo na questão familiar, na auto-vigilância para que as "relações afetivas não sejam destruídas". Neste aspecto, torna-se relevante a contribuição de Askenazy (2004) ao analisar a intensificação do trabalho na Europa, nos Estados Unidos mas, sobretudo na França, e o conseqüente aumento da doença do trabalho tanto no aspecto físico quanto mental, psicológico.

Após a análise dos estudos sobre a intensificação do trabalho nas respectivas regiões aludidas, Askenazy (2004, p.41-46) constata e analisa as conseqüências ou implicações da três práticas chaves adotadas na Europa, quais sejam, as de normas de qualidade, a rotatividade de empregos ou trabalhos

e a flexibilização do tempo de trabalho. Esta última tanto na flexibilização em horas quanto no número de dias. As conseqüências não poderiam ser outras senão a intensificação do trabalho gerando tanto uma carga excessiva mental, como pressões temporárias, tensões, etc., quanto uma carga física caracterizadas pelo risco no trabalho e superveniência de acidentes de trabalho.

Essa mundialização do tempo aliada à imediatidade na utilização das tecnologias, tais como a internet domiciliar, para soluções diárias na vida privada modifica, em seus usuários, incessantemente a consciência que possuem de tempo. A esses usuários o tempo não adquire a característica de mensuração do tempo em duração, em quantitativo de tempo e tampouco a característica de estar restrito a um espaço. Ao contrário, a consciência modificada sobre a noção de tempo adquire a característica da velocidade, da rapidez na realização de tarefas cotidianas.

Não é mais o tempo o estruturante, o que comanda as atividades, mas sim o impulso do desejo do sujeito em si, ou seja, o tempo de seu desejo. Pode o sujeito, conforme o comando de seu desejo, motivado ou não por sua necessidade, realizar uma compra de maneira rápida, enviar uma mensagem eletrônica no momento, no tempo que melhor lhe convier. Do mesmo modo o receptor receberá a mensagem enviada no tempo que melhor convier. A temporalidade é transformada em tempo do desejo. O que lhe convém transforma-se assim no tempo do desejo de um contra o tempo de desejo do outro.

A mundialização do tempo pela tecnologia, afetando a consciência de temporalidade transformando-a em tempo do desejo alimenta um forte sentimento de poder brincar com o tempo e de sentir-se, agora, como o senhor do tempo. Encerrando-se no momento presente e sedimentado pela lógica da imediatidade, alimenta a própria ilusão de poder triunfar contra o tempo e até mesmo de eliminá-lo. Com o auxílio da tecnologia, obtém o poder de satisfazer todos os seus desejos possíveis, em todos os sítios que lhe aprouver, sem restringir-se ou subjugar-se ao tempo e ao espaço, haja vista que não há mais a necessidade de deslocamento físico para a satisfação de seu desejo. A onipresença, a ubiqüidade teológica, transforma-se agora em ubiqüidade telecomunicacional. Uma

ubiqüidade tecnológica permitindo ao pensamento humano estar simultaneamente aqui e agora e além.

Entretanto, não se deve olvidar a dupla face das tecnologias comunicacionais ao proporcionarem a imediatidade. Ao mesmo tempo em que permitem uma liberdade de escolha, de realização dos desejos sem a necessidade da presença física, de ganhar o tempo, a ilusão de eliminação do tempo através da ubiqüidade telecomunicacional, da imediatidade, proporcionam uma permanente tensão, sobretudo no mundo do trabalho ante o espectro da urgência, do ganho da produtividade.

Analisaremos a seguir um dos instrumentos tecnológicos, fundamental e contributivo para o incentivo da eliminação do tempo, por meio da ubiqüidade telecomunicacional. Cuida-se, do correio eletrônico, que inaugura, instaura a imediatidade e as relações atemporais.

3.2 - O tempo mundializado no mundo do trabalho pelo correio eletrônico

Essa tensão permanente no mundo do trabalho promovida pelas tecnologias comunicacionais na mundialização do tempo, principalmente no que tange à imediatidade, à urgência, pode ser testificada através do correio eletrônico (emails). Esse é visto, sob a ótica da tensão, como elemento contributivo para engendrar a urgência, instaurando a exigência da imediatidade, da rapidez e, sobretudo, tornando as relações atemporais.

Nas relações laborais o emitente de um determinado correio eletrônico não mais pressupõe a possibilidade de uma espera, o que seria considerado uma perda de tempo, ou da opção da liberalidade de resposta do remetente. Antes, espera-se e exige-se do remetente uma atitude de imediatidade, de rapidez, de resposta nos próximos minutos ou, no mínimo, a mesma atitude empregada pelo emitente.

Nossa pesquisa constatou uma contradição no que tange à utilização de correio eletrônico vinculado ao Escritório Virtual (E.V), pois se em outros dados obtidos deparamos com a intensificação, a exigência cada vez maior do tempo,

tempo de urgência, o gráfico que segue apresentou-se como uma discrepância, a qual requereu uma maior investigação, senão vejamos:

26- Quantas mensagens de correio eletrônico relacionadas ao Escritório Virtual envia em média por semana?

A discrepância consiste no grande percentual (85,7%) dos sujeitos pesquisados utilizarem de uma a cinco mensagens de correio eletrônico em média por semana, o que a nosso aviso contradiz, e muito, ao compararmos com o gráfico de mensagens de correio eletrônico, também enviados em média por dia (85,7% de 1 a 5 mensagens/dia). Obrigou-nos então, a verificarmos com maior acuidade a discrepância constatada.

Para tanto, ouvimos os sujeitos para a devida elucidação, a qual ficou evidenciada em situações como, a de que desde o momento da resposta dada à época, intensificou ainda mais a utilização do correio eletrônico, caracterizando, portanto, a devida intensificação:

Questão-26) Quantas mensagens de correio eletrônico relacionados ao escritório virtual você envia em média por semana?

De 1 a 5. Na verdade do momento que respondi essa pesquisa até hoje, eu reduzi consideravelmente as minhas horas, não só no SAJ, como na instituição, eu tinha um regime de 40 horas e pedi para reduzir para 10 horas por questões pessoais e isso me levou a ter hoje, o que antes eu tinha 30 a 40 horas no SAJ e me levava a 10 ou 5 horas de escritório virtual, hoje 20 minutos apenas para corrigir questões criminais, então em razão disso eu diminui, mas

eu tenho certeza que do momento que eu respondi ao final eu intensifiquei, a esse momento que eu reduzi as horas, porque as

mensagens do escritório virtual elas podem até não ser vistas pelo aluno, mas elas são um meio muito eficiente de registramos as investidas que nos demos nos alunos, então com certeza eu

intensifiquei antes de diminuir as minhas horas. (Sujeito 1)

Questão-26) Quantas mensagens de correio eletrônico relacionados ao escritório virtual você envia em média por semana?

De 1 a 5. Hoje a passar desse tempo que eu respondi o

questionário, eu uso ainda mais essas mensagens, por

exemplo, quando um aluno tem um prazo em andamento e ele ainda não cumpriu eu mando mensagens para ele, perguntando se tem alguma dúvida, algum problema em pedir para dar o andamento, para evitar que se perca o prazo. A média tem sido essa, mas é uma ferramenta útil. (Sujeito 6) (Grifamos)

Outra resposta encontrada para a discrepância apresentada reside na própria recusa ou "resistência" do sujeito no envio de respostas das mensagens recebidas, sempre em grande número, ou por não considerar o correio eletrônico uma forma "produtiva":

Questão-26) Quantas mensagens de correio eletrônico relacionados ao escritório virtual você envia em média por semana?