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Há relação entre determinantes e adjetivos qualificativos pós-nominais?

2 OS ADJETIVOS PÓS-NOMINAIS E OS NOMES

2.3 Há relação entre determinantes e adjetivos qualificativos pós-nominais?

Argumentamos que os adjetivos qualificativos e os elativos são gerados no campo pós-nominal. Veremos no próximo capítulo que o movimento destes adjetivos para a posição pré-nominal ocorre somente se o determinante oferecer as condições necessárias para o movimento. Isto nos faz esperar que os determinantes não sejam selecionadores dos adjetivos qualificativos pós-nominais. Mas veremos que há alguns casos discutíveis.

42 Uma diferença entre qualificativos e elativos (especialmente os lexicais) é o licenciamento de elipse nominal.

Isto porque os elativos são adjetivos que portam a opinião do falante, e portanto, sem informação compartilhada não há como encontrar a referência deste adjetivo. Este fato não invalida a aproximação que se faz entre qualificativos e elativos.

(i) Me empresta a verde. (ii) *Me empresta a estupenda. (iii) ?Me aponta o inteligentíssimo.

43 Em geral soa melhor o determinante definido com elativos sintáticos na posição pré-nominal que os

indefinidos.

(i) O incrivelmente perigoso canivete da Maria (ii) Um incrivelmente perigoso canivete da Maria

Um dado problemático para esta proposta é apresentado por Demonte (1999, p.65): em (151) temos um adjetivo elativo que não ocorre com naturalidade na posição pós-nominal (só quando há leitura de contraste) mas ocorre na pré-nominal quando o DP em questão é encabeçado por um definido. Com o determinante indefinido, estes adjetivos são possíveis tanto em posição pré quanto em posição pós-nominal, ainda que não haja contraste.

(151) a. *Colocou o chapéu horrível/ belíssimo/ maravilhoso.

b. Colocou o horrível/ belíssimo/ maravilhoso chapéu.

(152) a. Colocou um chapéu horrível/ belíssimo/ maravilhoso.

b. Colocou um horrível/ belíssimo/ maravilhoso chapéu.

Uma evidência de que estes adjetivos pós-nominais não estão sendo influenciados pelo determinante encontra-se nos exemplos que seguem, em que a presença de outro adjetivo pós-nominal legitima a presença do elativo pós-nominal em DP definido sem que a leitura de contraste seja obrigatória (cf (153)). Outra opção seria a presença de uma relativa, como em (154).

(153) Colocou o chapéu roxo belíssimo.

(154) Colocou o chapéu horrível que ganhou do irmão.

Leonetti (1999), que também discute a questão, aponta que muitos dos adjetivos qualificativos que bloqueiam o uso do definido em favor do indefinido são predicados factivos: os fatos que se apresentam como pressupostos são predicados que denotam juízos ou reações psicológicas, ou seja, que são voltados ao falante. O autor aponta que isto ocorre provavelmente porque o conteúdo semântico destes adjetivos enfáticos não os permite atuar como elementos restritivos e contribuir com a fixação do referente quando na ausência de outros modificadores. O mesmo é esperado, portanto, com outros adjetivos enfáticos, que só ocorrem com definidos se houver leitura contrastiva do adjetivo.

(155) João ficou lá motivando *o/um jogador incrível. (156) Ela viu *o/um espetáculo magnífico.

(157) Protagonizou *o/um episódio absurdo/surpreendente/emocionante/inesperado.

Mas a presença de mais material modificador também legitima o uso destes adjetivos com o determinante definido.

(158) O espetáculo magnífico que a Maria me recomendou ver.

(159) Protagonizou o episódio absurdo/ surpreendente/ emocionante/ inesperado narrado pela Maria.

O uso de um advérbio de grau também faz supor que o falante registre sua opinião com o uso do adjetivo, e nestes casos a concatenação (merge) com determinante definido também é incompatível com nome e adjetivo qualificativo pós-nominal. Novamente o uso de mais material na posição posposta ao adjetivo qualificativo legitima a presença do adjetivo modificado.

(160) a. *o/um café bastante doce

b. O café bastante doce feito pela Maria

(161) a. *a/uma novela muito ruim

b. A novela muito ruim que a Maria insiste em ver

Parece que há mais casos que em princípio estão relacionados. Outros adjetivos tais como extinto, comum, abundante, raro, escasso também não aparecem em DPs definidos sem que haja complemento ou outro modificador a seu lado.

(162) a. *O pássaro comum (vivia na casinha que eu construí)

b. Um pássaro comum (vivia na casinha que eu construí)

(163) a. Traga-me o pássaro raro *(que foi citado no livro)

b. Traga-me um pássaro raro.

(164) Apontou o pássaro comum. (só com leitura de contraste) (165) O pássaro mais comum da Nova Zelândia

A resposta que ofereceremos a esta questão é que os adjetivos, ainda nestes casos, são selecionados somente pelo nome, e não pelo determinante. Por serem adjetivos que só se combinam com kinds para formar subkind, o determinante definido não é capaz de selecionar por si um único indivíduo ao deparar-se com um subkind formado por nome mais adjetivo qualificativo, porque não há informação suficiente, mas na presença de outros elementos (conferir novamente (163a) e (165)) esta limitação se exaure.

Outros casos um pouco diferentes ocorrem quando a concatenação de um adjetivo qualificativo pós-nominal torna possível o uso de um determinante indefinido com nomes com os quais estes determinantes não se concatenam sem a presença do adjetivo.

(167) a. *Se despediu com uma amabilidade.

b. Se despediu com uma amabilidade inesperada.

(168) a. *Fazia um frio.

b. Fazia um frio intenso.

(169) a. *Pela janela se via um céu.

b. Pela janela se via um céu cinzento.

Parece que há nestes casos interdependência entre o adjetivo pós-nominal e o determinante indefinido, visto que a presença do adjetivo qualificativo exige a adição do determinante indefinido. Mas esses determinantes indefinidos podem ocorrer com os nomes

amabilidade, frio e céu sem o adjetivo quando em construções associadas a uma entonação

exclamativa. De qualquer modo, é curioso que quando não há adjetivo, a ausência de determinante é permitida na sentença não-marcada. Já quando o adjetivo está presente, a sentença não-marcada é a que porta o DP encabeçado por um determinante indefinido.

(170) a. Se despediu com uma amabilidade...!

b. Se despediu com amabilidade.

c. ?Se despediu com amabilidade inesperada.

d. Se despediu com esperada amabilidade.

(171) a. Fazia um frio...!

b. Fazia frio.

c. *Fazia frio intenso.

Estes exemplos se tornam previsíveis quando observamos que os nomes em questão,

amabilidade, frio, céu, são nomes que a princípio não se subdividem em unidades que possam

ser subespecificados para que o indefinido possa ocorrer de forma natural. A presença do adjetivo explicita as possibilidades de o nome ser subespecificado, e assim a presença do determinante indefinido é permitida.

Antes de encerrar o capítulo, falta-nos dissertar a respeito das posições sintáticas que ocupam os adjetivos exclusivamente pós-nominais e os adjetivos que ocorrem nas posições pré e pós-nominais, além de apresentar motivações para as escolhas teóricas que serão feitas.