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2.1 Subimperialismo

2.1.4 Categorias Geopolíticas do Subimperialismo

2.1.4.2 Hegemonia Regional

Uma política de hegemonia regional seria o outro lado da política externa própria do subimperialismo. Enquanto a cooperação antagônica seria a postura do Brasil em relação aos EUA, a busca de hegemonia regional pautaria as relações do país com a vizinhança sul-americana. Essa busca seria essencial à reprodução ampliada do capital subimperialista, de acordo com o modelo de realização tripartite, e poderia de fato ser identificada na política externa brasileira durante a ditadura militar.

Esse posicionamento político advém da própria dinâmica econômica que cria a necessidade expansiva dos países subimperialistas. À expansão econômica deve acompanhar um crescimento político, criando da parte do Brasil a necessidade de consolidação de um aparato militar e uma política interna coesa que embase este expansionismo.

Os países dependentes que mais se desenvolveram tem a necessidade in- trínseca de seguir se desenvolvendo de forma cada vez mais intensa. [. . . ] Isso supõe a resolução do problema dos mercados, o que significa que os países nos quais se deu um maior desenvolvimento das forças produtivas tratem de impor seu poderio sobre os países menos desenvolvidos [. . . ] É por isso que o Brasil [. . . ] tem uma necessidade imperiosa de afirmar uma política subimperialista sobre o continente, superando os acordos regionais e se lançando em uma audaz conquista de mercados (BAMBIRRA, 2013 [1971], p. 201 - 202).

A partir de uma relação privilegiada com os EUA o Brasil trataria de conseguir o apoio do país para a conformação de uma área econômica estratégica na América do Sul. Busca-se uma economia continental integrada, beneficiando a indústria sediada no Brasil por ter atingido setores que outros países não chegaram. Assim se conformou uma estrutura de especialização produtiva no continente, enquanto a produção brasi- leira mantinha-se diversificada, dominando ramos de considerável grau de tecnologia. Cresceram as exportações de manufaturados do Brasil para a América do Sul enquanto se mantiveram as importações sobretudo de primários.

Foi no Brasil que se sediou a maior parte das grandes indústrias multinacionais, de setores industriais de maior tecnologia como o automobilístico. A partir daqui que se expandiu o capital para o domínio de mercados e matérias-primas ao redor do continente. Essa posição reestabeleceria no continente uma situação assimétrica, que reproduzia de certa maneira a relação entre o Brasil e os países industrializados. O incentivo do Estado se deu através dos acordos políticos necessários à instauração deste sistema, bem como no incentivo as empresas industriais exportadoras.

Segundo Luce (2011), foi neste sentido que se estabeleceu, por exemplo, a ALALC, e outros processos de integração regional que buscavam ampliar a es- cala do mercado consumidor. Buscando compensar a limitação do mercado interno se consolidava um sistema benéfico à indústria sediada no país. Esse processo en- gendrou, por outro lado, uma desarticulação de processos industriais em uma série de países na vizinhança, e consolidou a especialização da produção e uma divisão regional do trabalho.

Luce demonstra a importância que a integração comercial da América Latina teve para a manutenção do processo de acumulação brasileiro e do desenvolvimento capitalista do país apontando que:

de 3,97 milhões de dólares, representando em 1960 19% do total das ex- portações brasileiras de manufaturados, os países da ALALC absorveriam em, 1965, 68,6 milhões de dólares correspondentes a 63% das manufaturas exportadas (LUCE, 2011, p. 145 - 146).

Essa busca hegemônica engendra uma rivalidade com a Argentina, que pro- curou também expandir sua zona de influência na América do Sul. O processo de desenvolvimento industrial brasileiro, e o projeto político expansionista presente na elite do regime militar nacional acabaram por suplantar a posição do vizinho platino. A coesão das classes dominantes que aqui se mantiveram no poder contrastavam com o caso argentino, onde prevaleceram os processos ligados às oligarquias agroexportado- ras. Alijando finalmente o rival sul-americano da posição de potência regional o Brasil pode assumir de vez a dianteira econômica e política do subsistema sul-americano. Atraiu assim crescentemente os capitais internacionais em sua direção, para que daqui pudessem expandir-se para a região, permitindo, contudo, um processo próprio de acumulação intermediária. Nas palavras de Luce:

o regime tecnocrático-militar lançou mão de uma política que buscava fazer do capitalismo brasileiro o subcentro hegemônico sede da indústria pesada no continente, sobre a base da associação entre capitais nacionais e estrangei- ros.[. . . ] Para conquistar esse status, um passo necessário foi consolidar a vantagem sobre a Argentina (LUCE, 2011, p. 144).

Destaca-se ainda o apoio do regime militar brasileiro às outras ditaduras militares no continente, como “no golpe contra Torres na Bolívia e o golpe preventivo contra a Frente Ampla no Uruguai [. . . ] assim como na ditadura Ströessner e seu Partido

Colorado, no Paraguai.” Consolidava-se assim uma vizinhança integrada ao projeto político-econômico expansionista do regime civil militar brasileiro, além de alijar a influência argentina sobre esses países. Deve-se considerar ainda a desarticulação de outras possíveis lideranças regionais para além da Argentina e do próprio cone sul. A integração da economia venezuelana, por exemplo na divisão regional do trabalho que beneficiava a indústria brasileira e a desarticulação de sua influência no norte do continente foram funcionais à consolidação da influência brasileira na região (LUCE, 2011, p. 148 - 149).

A política de hegemonia regional não deve ser confundida com militarismo, ou identificada apenas nesta forma de governo. Justamente o que se propõe é que a partir do subimperialismo essa política se dê com um caráter diferenciado e pecu- liar. A busca de hegemonia surge da necessidade econômica do expansionismo do capital brasileiro (ou sediado no Brasil), em busca de mercado consumidor e matérias- primas, para manter seu processo interno de acumulação. Nenhuma outra economia do continente poderia manter o processo expansivo e dinâmico ao nível da indústria brasileira e a integração política era essencial para a expansão do capital na vizi- nhança. Apresentava-se aqui um grau enorme de concentração e centralização de capital (advindos da entrada de capitais internacionais) e acesso à tecnologia superior que chegava dos países centrais. A isso somou-se o coeso esforço estatal por ampliar o alcance das empresas nacionais, consolidando assim a estrutura produtiva brasileira diversificada e a especialização dos países vizinhos.