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2.2 Processamento da biomassa lignocelulósica

2.2.2 Hidrólise enzimática

Para serem submetidos à conversão em produtos por fermentação, os açúcares constituintes da biomassa lignocelulósica precisam ser hidrolisados a açúcares simples que possam ser metabolizados pelos microrganismos desejados. A reação de hidrólise (1) pode ser catalisada por duas vias principais: a via química, utilizando principalmente ácidos, diluídos ou concentrados, e a via bioquímica, utilizando enzimas (Balat, 2011; Balat et al., 2008). Balat et al. sugerem ainda a possibilidade de hidrólise da biomassa lignocelulósica utilizando irradiação de raios gama ou feixe de elétrons e irradiação micro-ondas, porém essas

metodologias não são usualmente abordadas para a hidrólise da celulose e hemiceluloses (Balat, 2011; Balat et al., 2008).

(𝐶6𝐻10𝑂5)𝑛+ 𝑛𝐻2𝑂 → 𝑛𝐶6𝐻12𝑂6 (1)

A hidrólise ácida é uma das tecnologias mais antigas e aplicadas para a conversão de lignocelulose em açúcares fermentescíveis, sendo inclusive referenciada como técnica convencional (Balat & Balat, 2009; Haldar et al., 2016). Para a hidrólise ácida, o ácido sulfúrico (H2SO4) é o ácido mais utilizado devido ao seu baixo custo e grande

disponibilidade, porém outros ácidos também podem ser utilizados, como o clorídrico, sulfuroso, fluorídrico e nítrico (Haldar et al., 2016). Existem dois tipos básicos de processos de hidrólise ácida comumente utilizados, a hidrólise com ácido diluído, a altas temperaturas (200 – 240 °C), e com ácido concentrado, em temperaturas mais brandas (Balat & Balat, 2009; El-Zawawy et al., 2011; Haldar et al., 2016). Apesar de efetivas, as hidrólises ácidas apresentam grandes desvantagens, como a degradação dos monossacarídeos, o que reduz a recuperação dos açúcares com a formação de compostos capazes de inibir os processos de fermentação, e a corrosão dos equipamentos, sendo necessário alto investimento em reatores de materiais não corroíveis (Haldar et al., 2016; Larsson et al., 2000).

Diante dos problemas apresentados pela hidrólise ácida, a hidrólise enzimática é considerada a opção mais adequada para a obtenção de açúcares fermentescíveis a partir da biomassa lignocelulósica. Essa consideração é baseada principalmente no fato da hidrólise enzimática ser um processo específico para cada substrato, não provocando a degradação dos açúcares hidrolisados, e ser conduzida em condições mais brandas com temperaturas variando normalmente entre 45 e 50 °C, o que propicia a diminuição dos custos totais, economizando energia para o aquecimento e, também na manutenção dos equipamentos por não proporcionar problemas com corrosão (Balat et al., 2008; El-Zawawy et al., 2011; Howard et

enzimas. Para resolver este problema, faz-se necessário desenvolver estudos buscando o entendimento dos mecanismos das enzimas, das interações entre estas e as proporções de aplicação, visando o desenvolvimento de coquetéis enzimáticos eficientes e econômicos, bem como o desenvolvimento de processos de fermentação e a utilização de substratos alternativos para baixar os custos de produção dessas enzimas (Banerjee et al., 2010).

As celulases são enzimas que constituem um complexo enzimático capaz de atuar sobre materiais celulósicos, promovendo sua hidrólise e são consideradas como uma ferramenta em potencial para sacarificação industrial de biomassa (Castro & Pereira Jr, 2010; Singh et al., 2009). Essas enzimas são biocatalisadores altamente específicos e sensíveis a mudanças de pH e de temperatura que atuam em sinergia para a liberação de açúcares, sendo entre estes a glicose a unidade que desperta maior interesse industrial, devido à possibilidade de sua conversão em etanol (Castro & Pereira Jr, 2010). As enzimas do complexo celulolítico são hidrolases que clivam ligações glicosídicas. Devido a sua ação hidrolítica, as celulases atacam diretamente a estrutura da celulose, causando perda de massa e diminuindo seu grau de polimerização.

Conforme os métodos de separação de moléculas e os estudos sobre a ação dos componentes das celulases têm mostrado, o complexo enzimático das celulases caracteriza-se como um conjunto de três enzimas hidrolíticas: endo-β-1,4-glucanases (EC 3.2.1.4); exo-β- 1,4-glucanases (EC 3.2.1.91); e β-1,4-glucosidases (EC 3.2.1.21) (Castro & Pereira Jr, 2010; Dillon, 2004; Dillon et al., 2008; Medve, 1997). As endoglucanases hidrolisam as ligações glicosídicas aleatoriamente em vários locais internos nas regiões amorfas da fibra de celulose abrindo esses locais para a subsequente ação das exoglucanases (Dillon, 2004). As exoglucanases, ou celobioidrolases, são o principal componente do sistema de celulases de fungos contabilizando de 40-70 % do total de proteínas capazes de hidrolisar a celulose altamente cristalina (Howard et al., 2004). As exoglucanases agem nas extremidades

redutoras e não redutoras geradas pela ação das endoglucanases liberando principalmente celobiose (Dillon, 2004). As β-glucosidases hidrolisam a celobiose e oligossacarídeos solúveis à glicose (Dillon, 2004; Howard et al., 2004). Essas enzimas atuam de forma sinérgica na hidrólise da celulose, apresentando assim um rendimento melhor do que a soma dos rendimentos individuais, ou seja, quando atuam isoladas umas das outras (Dillon, 2004).

As celulases são encontradas em secreções de microrganismos, como fungos e bactérias, e estão presentes também no sistema digestório de algumas espécies de gastrópodes (Kubicek et al., 1993; Rolle, 1998). Trichoderma reesei e seus mutantes são amplamente utilizados para a produção comercial de celulases e hemicelulases. Isto se dá, em parte porque o T. reesei foi um dos primeiros organismos celulolíticos isolados, ainda na década de 1950, e serviu de organismo modelo para os estudos de celulases. De certa forma, esse fato influenciou os processos de produção industrial de celulases para que fossem desenvolvidos com este organismo ao longo dos anos em vários países (Howard et al., 2004). O complexo enzimático do T. reesei contém grande quantidade de endoglucanases e exoglucanases que correspondem a aproximadamente 80% do total de proteínas secretadas, porém sua atividade de β-glucosidase é muito baixa (Martins et al., 2008).

Os complexos de celulases secretadas por fungos do gênero Penicillium são conhecidos por exibir as atividades relativamente elevadas de β-glucosidases (Martins et al., 2008). Singh et al. (2009), após a triagem de um grande número de culturas, selecionou uma linhagem Penicillium como uma fonte de celulases com alta atividade de β-glucosidase. Os autores relatam uma comparação do desempenho da hidrólise utilizando celulases de

Penicillium e uma celulase comercial (AccelleraseTM 1000®) a partir do Trichoderma reesei

geneticamente modificado. Em virtude da atividade de β-glucosidase alta no complexo de celulases do Penicillium, a hidrólise rendeu maior proporção de glicose como o principal produto final. Penicillium echinulatum tem sido caracterizado como um fungo promissor para

a produção de celulases porque a sua capacidade secretora é quase equivalente as melhores estirpes de fungos reportados na literatura (Camassola & Dillon, 2010; Dillon et al., 2011; Dillon et al., 1992; Dillon et al., 2006; Pereira et al., 2013). O complexo enzimático das celulases secretadas pelo P. echinulatum apresenta maior atividade em pH ácido, estabilidade de 50°C, maior proporção de β-glucosidase e FPA que o T. reesei (Camassola et al., 2004; Martins et al., 2008).

P. echinulatum apresenta produção simultânea de celulases e xilanases, condições

que favorecem a hidrólise enzimática de lignocelulósicos (Camassola & Dillon, 2010). As xilanases são um grupo de enzimas capazes de hidrolisar as xilanas, as quais são um dos principais constituintes das hemiceluloses e desempenham um importante papel na integridade estrutural das paredes celulares através da realização de ligações covalentes e não covalentes (Girio et al., 2010; Saha, 2003). As xilanases microbianas incluem principalmente endo-β-1,4-xilanase, que cliva o esqueleto da xilana produzindo xilo-oligossacarídeos, e β- xilosidase, que hidrolisa os xilo-oligossacarídeos e a xilobiose liberando xilose (Michelin et

al., 2012).

Celulases e xilanases são enzimas glicosil hidrolases (GHs), também conhecidas como hidrolases glicolíticas, responsáveis pela hidrólise e/ou rearranjo de ligações glicosídicas, resultando na degradação dos polissacarídeos contidos nas paredes celulares dos vegetais. Porém, além delas, outras enzimas e proteínas que também apresentam atividade sobre polissacarídeos auxiliam nas modificações destes e são chamadas de enzimas acessórias. Entre as enzimas e proteínas acessórias, podem-se citar as transferases sacarídicas (xiloglicano transferase), as expansinas (swoleninas) e as feruloil esterases (corboxilesterases). A swolenina, também identificada no secretona do P.echinulatum, se destaca entre as enzimas acessórias por ser caracterizada como uma proteína relacionada à expansina das plantas e, como esta proteína, é capaz de afrouxar a parede celular pelo

enfraquecimento das ligações de hidrogênio e assim auxiliar na degradação enzimática da biomassa lignocelulósica (Ribeiro et al., 2012; Saloheimo et al., 2002). A swolenina apresenta forte sinergismo com as enzimas de degradação da xilana e desta forma enfraquece a estrutura lignocelulósica facilitando principalmente a hidrólise enzimática da xilana e, consequentemente, aumenta o acesso das enzimas à celulose, porém sozinha esta proteína resulta em baixos níveis de liberação de monômeros e oligômeros, o que faz dela uma enzima acessória (Gourlay et al., 2013).

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