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CAPÍTULO 8 Tópicos e clíticos

1.4 Hipóteses

Para a resposta a esses questionamentos, levantamos as seguintes hipóteses:

- As construções de tópico do português europeu e do brasileiro se diferenciam sintaticamente, uma vez que no primeiro, mas não no segundo, os tópicos estão numa posição mais alta da estrutura sintática, o que é evidenciado pelo fato de, no português brasileiro, nas construções de Tópico Sujeito, o tópico poder concordar com o verbo, indicação de que ele está numa posição mais baixa do que o tópico no português europeu.

- Tendo o português brasileiro a mesma origem do português europeu, acreditamos que as construções gramaticais do primeiro deviam estar de alguma forma presentes no segundo. Ou seja, supõe-se que as construções diferenciadas de tópico do português brasileiro podem ter sido desencadeadas pela gramática do português europeu do século XVIII e, a partir do século XIX, as duas gramáticas podem ter começado a se diferenciar.

Diante da possibilidade de algumas construções do português brasileiro terem continuado ou se modificado a partir do português europeu, Ribeiro (2001) levanta o seguinte questionamento: as mudanças evidenciadas no português brasileiro têm como base qual gramática do português europeu? Existem duas alternativas: a do século XVI, período de início da colonização do Brasil, ou a do final do século XVIII, relacionado ao período de aquisição do conhecimento lingüístico trazido pela Corte Portuguesa, que chega ao Brasil em 1808. Os fatos históricos mostram que as duas gramáticas estiveram em competição no solo brasileiro, o que indica que ambas influenciaram para o desenvolvimento do português brasileiro.

O século XIX, especificamente em relação ao português brasileiro, é um período crítico em termos de definição lingüística como resultante dos fatos históricos ocorridos no século XVIII. Historicamente, o século XVIII é definido como: (i) o período em que houve uma convivência mais intensa entre portugueses e brasileiros (já os brasileiros propriamente ditos18), apesar da influência dos africanos e, de forma mais tênue, dos indígenas19, a partir da segunda metade desse século; (ii) a língua falada no Brasil, devido a alguns fatos históricos, começa a se definir em direção ao português europeu dominante20, principalmente a partir da segunda metade do século XVIII, em que o Marquês de Pombal define o português como língua da colônia, obrigando o seu uso na documentação oficial, e implementa o ensino leigo no Brasil (cf. MATTOS E SILVA, 1993); e (iii) os reflexos das mudanças historicamente introduzidas na língua só começariam a surgir justamente um século depois, no XIX. Neste século, entretanto, ocorrem vários fatos que contribuem tanto para a aproximação da língua portuguesa falada no Brasil e em Portugal quanto para o seu afastamento.

Um dos fatos que permite a aproximação é a chegada da Corte Portuguesa em 1808, trazendo para o Brasil uma influência lingüística do final do século XVIII. Começa a haver no Brasil, a partir daí, a convivência de duas variedades historicamente distintas: a gramática do século XVI, trazida da época da colonização e com conseqüente contato com outras variedades lingüísticas aqui presentes, como a indígena e a africana, e a gramática do final do século XVIII.

18 Está-se considerando aqui brasileiros propriamente ditos os resultantes da miscigenação.

19 Considera-se “tênue” no período em questão por causa do extermínio dos índios que se intensificou a partir do

século XVIII; mas reconhece-se que, lingüisticamente, até meados do século XVIII, esses povos tiveram uma influência muito mais forte que a dos africanos, inclusive em função da existência das Línguas Gerais. A partir da segunda metade do século XVIII, a situação se inverte e os africanos começam a interferir na língua em função do seu contingente populacional. De qualquer modo, a influência africana na língua não conseguiu ser muito forte porque, como diz Mattoso (1990; apud MATTOS E SILVA (2001)), “aos negros nunca foi dada a voz”.

Quanto ao afastamento, é no século XIX que começa a haver o movimento de independência do Brasil em relação a Portugal, ocorrida em 1822; o que pode ter provocado nos escritores o sentimento de uma “certa” independência lingüística e, possivelmente, de alguma liberdade nas construções de suas obras. É a partir do século XIX, então, que as manifestações lingüisticamente brasileiras podem ter começado a se definir aqui no Brasil, principalmente nas regiões interioranas, distantes da capital.

São os fatos históricos dos séculos XVIII e XIX que levam a intensas mudanças no português e, por esse motivo, as produções lingüísticas destes séculos são definidas como objeto de estudo neste trabalho.

1.5 Objetivos

Diante do objeto de estudo que estabelecemos para este trabalho, propomos os seguintes objetivos:

• Descrever as construções de tópico do português europeu no período dos séculos XVIII e XIX e do português brasileiro no período do século XIX para se identificarem as diferenças e/ou semelhanças sintáticas e discursivas entre essas duas variedades do português.

• Analisar as construções de tópico do português europeu e do português brasileiro de modo a demonstrar qual é a posição sintática ocupada pelo tópico nessas vertentes do português e que tipo de interferência sintática ocorre a partir dessa posição, como, por exemplo, no uso dos clíticos, ordem do advérbio e ordem sujeito-verbo.

• Detectar se as construções de tópico típicas do português brasileiro, em oposição ao português europeu, têm a sua origem no português europeu do século XVIII ou XIX.