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A Renovação Carismática Católica é um movimento da Igreja Católica Apostólica Romana que vem crescendo em número de adeptos e ganhando destaque, chamando a atenção de diversos pesquisadores devido às suas características celebrativas, ao êxtase religioso, às curas milagrosas durante seus encontros e à influência que exerce na vida e na conduta das pessoas que a freqüentam. Observando a similaridade deste movimento com os cultos das igrejas pentecostais e neopentecostais, a RCC vem sendo considerada uma resposta do catolicismo ao avanço dessas igrejas, principalmente no que se refere ao fato de que muitos católicos migraram de sua religião de batismo para as denominações religiosas já citadas.

Repleta de símbolos, ritos, e de uma esfera mística extremamente popular nas paróquias de todo o Brasil, ela surge na década de 60, em Pittsburgh, nos Estados Unidos, trazida para o Brasil pelos padres jesuítas Eduardo Dougherty e Haroldo Rahm. É um movimento voltado para a experiência pessoal com Deus, particularmente através do Espírito Santo e dos seus dons. Esse movimento busca dar uma nova abordagem às formas de evangelização e renovar práticas tradicionais dos ritos e da mística católicos. O movimento carismático católico foi influenciado em seu nascimento pelos movimentos pentecostais de origem protestante e até hoje esses dois grupos se assemelham em vários aspectos.

A Renovação Carismática, inicialmente conhecida como Movimento Católico Pentecostal, ou católicos pentecostais, surgiu em 1966, quando Steve Clark, da Universidade de Duquesne em Pittsburgh Pensilvânia, Estados Unidos, durante um Congresso Nacional de católicos, mencionou o livro "A Cruz e o Punhal", do pastor John Sherril, sobre o trabalho do pastor David Wilkerson com os drogados de Nova York, falando que era um livro que o inquietava e que todos deveriam lê-lo.

No referido ano, católicos da Universidade de Duquesne reuniam-se para oração e conversas sobre a fé. Eram católicos dedicados a atividades apostólicas, mas, ainda assim, insatisfeitos com a sua experiência religiosa. Em razão disso, e recordando a experiência bíblica do Pentecostes (Atos 2:1-47) e das primeiras comunidades cristãs cheias do Espírito Santo, decidiram começar a orar para que o Espírito Santo se manifestasse neles. Querendo vivenciar a experiência com o Espírito, foram ao encontro de William Lewis, sacerdote da Igreja Episcopal Anglicana, que por sua vez os levou até Betty de Shomaker, que fazia em sua casa uma reunião de oração pentecostal. Em 13 de janeiro de 1967, Ralph Keiner, sua esposa Pat, Patrick Bourgeois e Willian Storey vão à casa de Flo Dodge, paroquiana Anglicana de William Lewis, para assistir a reunião. Em 20 de janeiro assistem mais uma reunião e

suplicam que se ore para que eles recebam o Batismo no Espírito Santo. Ralph recebe o dom de línguas (fenômeno chamado no meio acadêmico de glossolalia).Na semana seguinte, a fevereiro de 1967, Ralph impõe as mãos para que os quatro recebam o batismo no Espírito. A partir destes eventos, o que antes passava por mera especulação, começou a tomar forma e se tornou um dos movimentos mais expressivos da Igreja Católica, expandindo-se posteriormente por diversos países.

O termo carismático está relacionado com os dons do Espírito Santo recebidos por aqueles que se reuniram no dia de Pentecostes, citado no livro de Atos dos Apóstolos. Segundo a passagem bíblica, os que estavam reunidos no local do evento, foram abençoados com diversos dons, os chamados carismas, que se resumem em: palavras de sabedoria,

palavras de conhecimento, discernimento dos espíritos, línguas, interpretação das línguas, cura, profecia e milagres.

Os grupos de oração (reuniões da comunidade para celebrar o Espírito Santo), tentam reproduzir esse momento de consagração do Pentecostes. Durante a realização desta celebração, é comum perceber que vários integrantes recebem os dons. Essa manifestação é percebida através do êxtase religioso, onde ocorrem situações das mais diversas: transes, orações em línguas (glossolalia), curas milagrosas, desmaios, e até mesmo possessões” (tais possessões, segundo eles, fruto de uma atividade demoníaca).

Outra característica que merece destaque nesses encontros é o caráter festivo. A música é um fator muito importante para a realização dos grupos de oração. Os estilos musicais variam desde músicas sacras, típicas da Igreja Católica, até aos mais populares, como forró, axé, rock, etc. Interessante notar que apesar da profunda introspecção espiritual durante os momentos de oração, o momento de alegria proferido durante esses eventos é praticamente massivo, onde todos dançam, batem palmas e cantam.

No aspecto teológico, cabe lembrar que a RCC traz um aspecto inovador: a figura central da Igreja Católica, Jesus Cristo, cede lugar ao Espírito Santo, terceira pessoa da Santíssima Trindade. A Santíssima Trindade é um dogma da Igreja Católica, denominado “mistério”. Os mistérios são dogmas aplicados pela Igreja para definir aspectos que não possuem explicação racional. O mistério da Santíssima Trindade define que Deus enquanto entidade espiritual é ao mesmo tempo uno (Deus, assim como Javé dos judeus) e trino: Deus- Pai, Deus-Filho e Deus-Espírito Santo. A representação simbólica do Espírito Santo é a pomba branca.

Figura 1- Símbolo da RCC: a pomba em destaque, representação do EspíritoSanto

Essa mudança de foco, no que concerne aos símbolos utilizados pelos carismáticos, reflete a intenção deste grupo: renovação. Como o próprio nome do movimento diz, a RCC exerce a função de revigorar diversos aspectos da tradição católica, com o intuito de além de evangelizar seus integrantes, também mantê-los fiéis à Igreja, proporcionando atrativos para o público católico.

A princípio, a RCC é muito semelhante aos movimentos pentecostais e neopentecostais das igrejas protestantes, particularmente as evangélicas. Contudo, há um fator teológico que não pode deixar de ser destacado e que faz grande diferença entre a RCC e os seus semelhantes pentecostais de outras religiões: o culto aos santos (assim como às imagens destes), mas principalmente à Maria, mãe de Jesus. Segundo PRANDI (1997):

Com seu apego a Maria, cria-se uma marca explícita de separação entre os dois grupos: os carismáticos são pentecostais, mas com Maria, e nesse ponto a separação está completa. Maria é é uma fronteira instransponível, entre dois territórios que, de outro modo, poderiam ser um só. (...) Esse apego a Maria nos parece muito bom justificado pela necessidade de diferenciação entre os dois grupos e também como modo de das às práticas carismáticas algo realmente genuíno dos católicos (p. 141- 142)

Maria, enquanto representação teológica, não é apenas mãe de Jesus, mas segundo a tradição católica, reforçada pelos carismáticos, é mãe de todos os filhos de Deus, e é uma das principais responsáveis pela “intercessão dos pedidos de seus filhos junto ao Pai”. Durante a realização da pesquisa foram percebidas frases como “apela à mãe que o filho atende”, reforçando assim, o caráter de mediadora entre os fiéis e a entidade superior, no caso, Jesus ou

Deus. A figura de Maria não fica restrita somente à representação bíblica, mas também é cultuada de acordo com as inúmeras representações de Nossa Senhora, tais como: Aparecida, Lourdes, Fátima, Rosa Mística, Guadalupe, Do Carmo, Do Perpétuo Socorro, etc. Essa variação ocorre de acordo com a paróquia ou diocese na qual a comunidade carismática está inserida, abrangendo tanto o aspecto regional quanto local. Assim, pode-se perceber a nítida ligação da imagem de Maria com a sociedade na quela ela está inserida, adotando características que se remetem ao grupo que a cultua. Esse tipo de situação também ocorre na diocese de Ourinhos, que possui inclusive sua “própria” Nossa Senhora: a Nossa Senhora

Aparecida do Vagão Queimado, que além do aspecto religioso, também se mistura com a história da cidade. Esse aspecto peculiar da religiosidade de Ourinhos será tratado com maior ênfase no decorer desse trabalho.

Figura 2 – A culto a Maria, um dos elementos que diferencia Carismáticos de Pentecostais

Além do culto à Maria, outro aspecto importante no que se refere à diferenciação entre carismáticos e pentecostais é a obediência à hierarquia estabelecida pela Igreja Católica, representada pelo clero, o qual é responsável pelas diretrizes impostas pela instituição que devem ser seguidas pelos fiéis. Nesse sentido, a presença do clero como elemento essencial para a qualquer tipo de atividade é essencial para que o movimento desenvolva sua funcionalidade de maneira plena. Mesmo sendo um grupo de estrutura basicamente laica, a hierarquia se faz presente, principalmente no que se refere à santidade do papa, assim como a autoridade que os cardeais, bispos e padres exercem sobre estes. Apesar de em determinados momentos a relação entre leigos carismáticos e padres não ser plenamente harmoniosa, a hierarquia prevalece, cabendo aos carismáticos recorrerem à saídas alternativas (nesse caso,

procurando apoio em padres que simpatizam com o movimento), principalmente quando seus anseios não são atendidos, mas sobretudo, respeitando a estrutura imposta pelo Vaticano. Nesse sentido, será abordado no capítulo VI que a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) demonstra sua preocupação com relação à RCC e procura evidenciar sua autoridade no que se refere às práticas carismáticas.

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