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3. R EVISÃO DA LITERATURA 1 Ambientes estuarinos

3.3. A Baixada Santista

3.3.2. Histórico da contaminação da Baixada Santista por organoclorados

Durante as décadas de 60 e 70, grandes indústrias como a Carbocloro, a Copebrás, a Cosipa e a Ultrafértil atraíram, para a Baixada Santista, várias empresas de pequeno e médio porte como a Clorogil/Rhodia, a Engeclor, a Liquid Química, a Petrocoque, entre outras.

A indústria química Clorogil S.A., criada em 1965 pela associação da própria Carbocloro com a Progil Socyeté Anonyme, de origem francesa, se instalou em Cubatão com o intuito de aproveitar os subprodutos das grandes indústrias como matéria-prima e fornecer a estas insumos básicos de sua linha de produção. Essa nova empresa utilizava como matéria prima o cloro, o fenol e a soda cáustica para produzirem solventes e fungicidas como o pentaclorofenol (PCP) e o seu respectivo sal, o pentaclorofenato de sódio, conhecido como pó da China (Couto, 2003). Além desses, a empresa produzia também o diclorodifeniltricloroetano (DDT), o hexaclorociclohexano (HCH), o hexaclorobenzeno (HCB) e o hexaclorobutadieno (HCBD) (Couto, 2003). De acordo com este autor, até 1974 a Clorogil ainda era considerada uma indústria de pequeno porte, com produção entre 1.000 e 1.500 toneladas/ano. No entanto, ainda neste ano, com a inauguração da nova unidade de tetracloreto de carbono e percloroetileno a empresa passou a ser considerada de porte médio, com capacidade de produzir 60.000 toneladas/ano. Em 1976, a Rhodia que pertencia ao grupo francês Rhône-Poulenc, comprou a Progil e a partir de então a Clorogil passou a se chamar Rhodia S/A. Em 1978, a nova unidade fechou a fábrica de pentaclorofenato diante da pressão sindical e da sociedade, pois vários operários foram intoxicados por este composto e dois

faleceram por intoxicação aguda. Em 1993, a Rhodia S/A foi interditada pelo Ministério Público, em caráter preventivo, pela constatação de um depósito de 15.000 toneladas de resíduos quase puros dentro de um aterro instalado na área da própria fábrica, tornando o local impróprio para os trabalhadores. Com a privatização do Grupo Rhône-Poulenc pelo governo francês e uma ação civil movida contra a empresa pelo Ministério Público do Estado em conjunto com as Promotorias de Justiça do Meio Ambiente de Cubatão, São Vicente, Santos e Itanhaém a Rhodia declarou a desativação da unidade de Cubatão, em 2002.

A acusação contra a Rhodia era referente ao não cumprimento do passivo ambiental adquirido na compra da Clorogil, pois a empresa deveria se responsabilizar pela adequada deposição e tratamento dos resíduos organoclorados produzidos durante sua atividade. De acordo com Boligian & Nascimento (2001) a deposição dos resíduos foi realizada sem nenhum estudo ou planejamento, sendo apenas transportados para diversas áreas da Baixada Santista que na época não eram urbanizadas. O principal problema gerado foi a contaminação de uma extensa área por compostos clorados depositados inadequadamente em locais extremamente críticos como em margens e cabeceiras de rios, além de zonas de mangue.

Segundo Matheus (1998), no período de 1966 a 1988, aproximadamente 12 mil toneladas de dois tipos de resíduos tóxicos, gerados pela Clorogil e pela Rhodia, foram dispostos inadequadamente em vários locais da planície arenosa da Baixada Santista; ambos com elevadas concentrações principalmente de pentaclorofenol (PCP) e hexaclorobenzeno (HCB). Ainda segundo o autor, em 1988, por exigência da Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental (CETESB) a Rhodia foi obrigada a construir um incinerador para queimar seus resíduos tóxicos e os solos que foram contaminados por organoclorados. Porém, até finalizar a instalação do incinerador foi preciso construir uma “Estação de Espera” no Bairro Quarentenário, situado na Planície do Samaritá, para armazenar cerca de 33 mil toneladas dos solos contaminados removidos de três áreas do Distrito de Samaritá, em São

Vicente. Nascimento (1999) realizou um estudo sobre a poluição dos solos por PCP e HCB neste bairro e verificou a existência de um fluxo de escoamento subsuperficial que juntamente com uma frente de lixiviação da matéria orgânica formaram a base de disseminação direta desses organoclorados pela região, tanto nas áreas limítrofes quanto nas opostas ao local de depósito. Geralmente os clorofenóis causam sérios impactos ambientais em localidades adjacentes às indústrias que exercem esta atividade, pois são detectados em solos e sedimentos marinhos por até centenas de metros de onde são fabricados ou estocados (Kahkonen et al., 1998). Atualmente, o material depositado na “Estação de Espera” ainda aguarda a oportunidade de ser tratado adequadamente, uma vez que a incineração dos mesmos provocou a liberação de resíduos tóxicos para a atmosfera, levando à interdição do incinerador. De acordo com Baker & Hites (1999), subprodutos complexos formados a partir da combustão de clorofenóis durante a incineração, como as dioxinas e furanos que são altamente prejudiciais à saúde pública e ao ambiente, quando lançados na atmosfera podem ser transportados para locais bem distantes do seu ponto de origem.

Ainda em relação aos problemas ocasionados pelos organoclorados no Bairro Quarentenário, Boligian & Nascimento (2001) compilaram estudos que mostram que além do solo, a água, os animais marinhos e a população local foram contaminados. Vários moradores do bairro apresentaram sintomas característicos de exposição crônica ao HCB como porfiria cutânea com fotosensibilidade e hepatomegalia, atrofia na pele e dores de cabeça.

Durante muitos anos o lixão de Pilões, situado em Cubatão, também contribuiu para a contaminação da região, pois acondicionava inadequadamente os resíduos sólidos urbanos juntamente com os compostos clorados oriundos da Carbocloro, da Rhodia S/A e de outras fábricas de fertilizantes (CETESB, 2001). Apesar do lixão ter sido coberto com material inerte e desativado há quase 20 anos, os estudos realizados por Filho et al. (2003) revelaram que os catadores de lixo e suas famílias, que continuam residindo próximos a essa localidade, ainda

apresentam elevadas concentrações de praguicidas organoclorados no sangue, como o pentaclorofenol, o hexaclorobenzeno e o diclorodifeniltricloroetano. Tais compostos são responsáveis por enfermidades graves como o enfraquecimento do sistema imunológico, o câncer, os distúrbios do sistema nervoso central, entre outros problemas que podem levar o indivíduo à morte. De acordo com os pesquisadores, em Pilões, até os bebês com menos de 1 ano de idade estão contaminados por esses compostos e alertam sobre a necessidade urgente de medidas saneadoras do ponto de vista de saúde pública como a remoção dos resíduos perigosos ou, na sua inviabilidade, a remoção das pessoas do local de risco.

Outras empresas que contribuíram para a contaminação da região estuarina da Baixada Santista foram a Companhia Siderúrgica Paulista (COSIPA) e o Porto de Santos, devido à inadequação dos processos de descarga e de armazenamento de matérias-primas em seus portos. Além disso, a remoção dos sedimentos para desobstruir os canais de navegação também contribuiu diretamente para a propagação dos compostos tóxicos para outros locais anteriormente livres de contaminação (CETESB, 2001).

3.3.3. Esforços para a recuperação do Sistema Estuarino de Santos e São Vicente