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O problema da AIDS vem crescendo assustadoramente, haja vista estar diretamente ligada ao problema sexual e ao uso de drogas injetáveis, o que é muito comum e freqüente nas prisões brasileiras.14

Prisão e encarcerados tornam-se fenômenos que representam uma ameaça tão profunda à sociedade normatizada que as atitudes e reações da opinião pública, perante a problemática da prisão, revelam o desejo de que sejam excluídos do mundo dos humanos. Observa-se o limite dessa exclusão ao se negar o direito à vida, quando se evita discutir e enfrentar o problema da AIDS, que atinge significativamente parte da massa carcerária brasileira.15

Dentro dos presídios, em condições subumanas e nas promiscuidades, ocorre toda sorte de infecções e violências.

Muitos presos que estão infectados pelo HIV, sem os demais saberem, são vítimas de violência sexual, gerando, conseqüentemente, novos infectados. Como consequência, os

14 LEAL, César Barros. Prisão: crepúsculo de uma era. 2. ed. rev. atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 104.

15 KAHN, Tulio. Intimidação, incapacitação ou prevenção? Revita de ciências criminais. São Paulo, v. 30, p.

infectados, ao saberem que se tornaram soropositivos, voltarão a agredir a vítima inicial, colocando inclusive a vida em risco.

Porém, “é certo que o medo da AIDS tem produzido mudanças nos hábitos dos presos, ampliando a preocupação com os procedimentos, com as condutas preventivas, a par de uma redução nos relacionamentos homossexuais.”16

Outro fator para o avanço desproporcional da AIDS nos presídios é o uso indiscriminado de drogas injetáveis, que adentram nos estabelecimentos, deixando os condenados totalmente expostos ao contágio e contribuindo, por conseguinte, para a disseminação da doença.

Relata Varella que,

A repressão, contraditoriamente, favorecia a disseminação de hepatite e AIDS, pois estimulava o uso comunitário de seringas e agulhas, que podiam ser alugadas ou vendidas já cheias de droga para usuários que as injetavam em frações proporcionais à quantia paga, sem qualquer cuidado, a agulha passando direto da veia de um para o braço do outro.17

Uma questão importante, tendo em vista o exorbitante crescimento da AIDS nos presídios, é a definição de uma política que rompa “a cadeia de transmissão do HIV, através da alteração de atitudes e comportamentos individuais que abrangem desde o uso de drogas injetáveis até as práticas homossexuais com múltipla parceria.”18

É preciso que se faça uma campanha de conscientização, para detentos, familiares, funcionários em geral, que pode ser através de cartazes, panfletos, vídeos, sempre numa linguagem acessível, adequada aos destinatários.

Em Porto Alegre, usou-se uma estratégia para que fossem os presos, sensibilizados aos cuidados que a AIDS exige:

[...] decidiu-se fazer gibis, com a colaboração de presos, voluntários do GAPA e assistentes sociais. Nos gibis são identificados três momentos básicos: Rejeição do ato de compartilhar seringas, bem como repasse de informações de como lavá-las adequadamente para evitar a transmissão do HIV [...]. Abordagem da questão das relações sexuais entre os presos, sem postura moralista ou condenatória, enfatizando a importância de práticas seguras, capazes de impedir ou reduzir o risco de transmissão do HIV. Incorporação de práticas preventivas pela namorada do lampadinha (personagem fictício do gibi), uma prostituta, que passa a ser multiplicadora de informações e comportamentos sexuais de risco reduzido, estimulando a co-responsabilidade das companheiras dos presos na prevenção da Aids.19

16 LEAL, 2001, p. 104.

17

VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 66.

18 NASCIMENTO, Elisabete dos Santos. Aids: stigma dentro do stigma. Revista Escola do Serviço

Penitenciário do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, n. 9, p. 149-156, set. 1989.

19

Essa situação demonstra a necessidade de ações concretas no sentido de assegurar aos detentos o acesso à informação, à prática segura do sexo (uso de preservativos) e o não compartilhamento de seringas e agulhas.

Os detentos brasileiros são, em sua maioria, homens na faixa etária de 20 a 49 anos, com pouca escolaridade e provenientes de grupos de baixo nível socioeconômico.20

As prisões, em sua maioria, são locais superlotados, pouco ventiladas e com baixos padrões de higiene e limpeza. A nutrição é inadequada e comportamentos ilegais, como o uso de álcool e drogas ou atividades sexuais (com ou sem consentimento), não são reprimidos. Estas condições submetem essa população a um alto risco de adoecimento e morte por AIDS.21

Um fator importante a ser destacado é a extrema mobilidade desta população, circulando de uma prisão para outra e retornando ao convívio social. A média de permanência nos Presídios é de aproximadamente 30 meses. Nas cadeias públicas e distritos policiais não existe informação sobre a rotatividade do sistema, mas acredita-se que seja alta.22

A precariedade da assistência médica é outro aspecto bastante preocupante. Doenças potencialmente letais como a AIDS atingiram níveis epidêmicos entre a população carcerária do Brasil.23

De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo24, as condições de confinamento favorecem tanto a evolução da infecção para doença como a sua transmissão. Ao dificultar um tratamento adequado aos presos, o sistema prisional não apenas ameaça a vida dos detentos como também facilita a transmissão dessas doenças à população em geral, através dos profissionais que trabalham nas Unidades Prisionais, dos visitantes (familiares e visitas íntimas) e do livramento dos presos.

Como os detentos não estão completamente isolados do mundo exterior, uma contaminação não controlada entre eles representa um grave risco à saúde pública.25

20 NOGUEIRA, Péricles Alves; ABRAHÃO, Regina Maura Cabral de Melo. A infecção tuberculosa e o tempo

de prisão da população carcerária dos distritos policiais da zona oeste da cidade de São Paulo. Revista

Brasileira de Epidemiologia, São Paulo, v. 12, n. 1, mar. 2009. Disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-790X2009000100004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 14 abr. 2011.

21 Ibid. 22 Ibid. 23 Ibid. 24 Ibid. 25 Ibid.

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