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P RINCÍPIO DO M UTUALISMO

III.6. I NTERVENCIONISMO E STATAL

A partir do século XX, como já analisado ao tratarmos da história dos seguros no Brasil, o Estado, atento à importância social e econômica do mercado securitário, passou a intervir cada vez mais nesta matéria.

Essa intervenção do Estado limita a plena autonomia da vontade privada inerente aos contratos em geral, porém, justifica-se devido à constatação de que ao seguro compete relevante função de desenvolvimento equilibrado do país, com respaldo na capacidade de incentivar e garantir a livre iniciativa privada, conquistando, consequentemente, a promoção da existência digna e da justiça social.

Tal regulação, controle e fiscalização são necessários pois os contratos de seguro, dentro de uma ordem social, possuem importância que ultrapassam a esfera individual de cada um dos segurados, eis que, dividindo mutualmente os riscos, servem à sociedade na formação de fundo financeiro coletivo, que, necessariamente, precisa ser acompanhamento pelo órgão especializado. A captação de recursos privados destinados

127 C.M.S.PEREIRA,Instituições de Direito Civil, v. III, 10ª ed., São Paulo, Editora Forense, 2.001, p.

à cobertura de riscos sociais, autoriza, sobremaneira, a imposição de normas administrativas que possam gerir a atividade privada de interesse social e coletivo.

A segurança do contrato de seguro só se configura quando há a inserção deste dentro de um universo maior de contratos da mesma espécie, de tal forma que a somatória das contribuições dos segurados e através das reservas legais obrigatórias, os meios de se socorrerem os segurados vítimas dos sinistros estão plenamente viáveis.

Há interesse coletivo e risco social no negócio de seguro, razão pela qual as seguradoras precisam de autorização governamental e funcionam sob controle de órgãos públicos especializados, responsáveis pela preservação da paz e da segurança social, com espeque na estabilidade e continuidade da atividade econômica que se sujeita a riscos insuportáveis quando arcados pessoalmente.

Inicialmente, como vimos, houve a instituição de seguros obrigatórios (o primeiro foi o de seguros contra acidentes de trabalho em indústrias, em 1.919) e, com a criação, em 1.939, do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), nacionalizou-se a atividade securitária e se estimulou a sua expansão.

Em vista disso, e à luz do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1.966, ficou determinado que todas as operações de seguros realizadas no país estariam subordinadas às suas diretrizes.128 E mais, o Estado passaria a controlá-los mediante

órgãos criados para este fim.129

Este Decreto-Lei, além das disposições apresentadas não só neste tópico, traz diversas outras disposições, numa tentativa quase exaustiva de traçar, ao menos em linhas gerais, os contornos da atividade securitária. Essa preocupação, fruto da importância social e econômica desse instituto jurídico, é reflexo das grandes responsabilidades a que estão sujeitas quaisquer pessoas nas sociedades. Na medida em que se amplia o espectro de ação da responsabilidade civil, menores são as chances de haver dano sem que alguém seja responsável. O homem moderno, para garantir sua subsistência, passa a não apenas buscar os meios para se proteger dos eventuais danos provocados por seus iguais, como também dos próprios danos que possa dar causa.

128 Decreto-Lei nº 73/66: “Art. 1º. Todas as operações de seguros privados realizados no País ficarão

subordinadas às disposições do presente Decreto-lei.”

129 Decreto-Lei nº 73/66: “Art. 2º. O controle do Estado se exercerá pelos órgãos instituídos neste

Mais adiante, no mesmo diploma legal, vem disposto a forma como se dará este intervencionismo e institui o Sistema Nacional de Seguros Privados:

“Art. 7º. Compete privativamente ao Governo Federal formular a política de seguros privados, legislar sobre suas normas gerais e fiscalizar as operações no mercado nacional.

Art. 8º. Fica instituído o Sistema Nacional de Seguros Privados, regulado pelo presente Decreto-lei e constituído:

a) do Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP; b) da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP; c) do Instituto de Resseguros do Brasil - IRB;

d) das Sociedades autorizadas a operar em seguros privados; e) dos corretores habilitados.”

Cumpre ressaltar que, como em diversos segmentos da atividade econômica privada, a contratação dos seguros, em todas as suas modalidades, sujeita-se à autorização e controle da Administração Pública, sob responsabilidade de órgãos técnicos especializados, qual seja, a Superintendência de Seguros Privados – SUSEP, autarquia federal. De fato, o mencionado Decreto-Lei nº 73/66, em seus artigos 36, a, b, c, d, e, g e h, 84, 85, atribui à autarquia as funções de fixar as condições de apólices e prêmios a serem utilizadas pelo mercado segurador nacional, examinar e aprovar as condições de coberturas especiais, bem como de fixar as taxas aplicáveis.

À SUSEP cabe processar, também, os pedidos de autorização das Sociedades Seguradoras; baixar instruções e expedir circulares relativas à regulamentação das operações de seguro; fixar condições de apólices, planos de operações e tarifas a serem utilizadas obrigatoriamente pelo mercado segurador nacional; aprovar os limites de operações das Sociedades Seguradoras, de conformidade com os critérios fixados pelo Conselho Nacional de Seguros Privados – CNSP; examinar e aprovar as condições de coberturas especiais, bem como fixar as taxas aplicáveis; fiscalizar as operações das Sociedades Seguradoras; e, proceder à liquidação das Sociedades Seguradoras que tiverem cassada a autorização para funcionar no País.

Dessa forma, o seu ato de fiscalização, se entendido lesivo aos segurados, ensejará, sob esse viés, responsabilidade civil, nos termos do art. 37, § 6º da Constituição Federal.

A SUSEP tem poder, ainda, para aprovar alterações nos seguros contratados, chegando até à extinção das apólices nos casos mais graves de desequilíbrio na equação entre os riscos e os recursos captados entre os segurados para a manutenção do fundo comum de garantia.

O artigo 22, VII, da Constituição Federal, determina, ainda, a competência exclusiva da União Federal para legislar sobre seguros de qualquer natureza, tendo sido o Decreto-Lei nº 73/66, recepcionado pela Carta Magna de 1.988 com status de Lei Complementar, tal como determina o caput do art. 192 da Constituição Federal130.

Apesar da regulamentação trazida no Código Civil, provavelmente, o campo de maior abrangência dos seguros seja o do Direito Comercial, sendo que, de acordo com os historiadores, o berço deste contrato foi exatamente o comércio.

130 “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento

equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram.”