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I Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – PBDCT

Este plano surgiu num contexto em que os governos militares viam a ciência como motor do desenvolvimento econômico. A política científica, então, consolidou-se com a criação de uma série de órgãos para esta finalidade, o que se tornou possível com a liberação de recursos prioritariamente do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT.

O FNDCT foi criado pelo Decreto-Lei no 719, de 31 de julho de 1969, com a finalidade de dar apoio aos programas e projetos prioritários de desenvolvimento científico e tecnológico, notadamente para a implantação do Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. [...] “A FINEP, empresa pública vinculada à secretaria do Planejamento, passaria a exercer o cargo de Secretaria executiva do FNDCT, cabendo-lhe gerir os recursos do Fundo”. (MOREL, 1979, p. 64)

O FNDCT foi criado em 1969 e extinto pela Constituição de 1988 - a qual estabeleceu que os fundos existentes à época de sua promulgação seriam extintos se não ratificados pelo Congresso Nacional no prazo de dois anos -, e restabelecido pela Lei 8.172, de 18.01.91.

Nos anos 1990, com a crise fiscal, o FNDCT praticamente desapareceu e, em 1999, passou a alocar 15 fundos setoriais formados com receitas de contribuições incidentes sobre a exploração de recursos naturais pertencentes à União, parcelas do Imposto sobre Produtos Industrializados de setores da produção, entre outros. (GESTÃO..., 2005, p. 35).

O documento definia diretrizes muito claras sobre os rumos que deveriam tomar o desenvolvimento científico e tecnológico do país; destacava a necessidade da integração indústria-pesquisa-universidade, como uma das formas de alavancagem do desenvolvimento.

Inicialmente, o presidente Emílio Garrastazu Médici lançou o programa “Metas e Bases para a Ação do Governo”, em outubro de 1970, colocando a aplicação do conhecimento como elemento fundamental para a superação do hiato tecnológico entre as nações e vislumbrando o aumento das possibilidades de competir internacionalmente.

Entre os objetivos almejados, constava a implantação de projetos integrados de ensino, pesquisa e indústria, assim como o melhor aproveitamento das contribuições do progresso científico e tecnológico. Para tanto, era necessário, ainda, segundo o programa Metas e Bases, a implementação do Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – PBDCT, a implantação do sistema de informações sobre ciência e tecnologia, a criação de poderoso sistema financeiro, a execução de programa Intensivo de Pós-Graduação no país, dentre outras metas.

Foi elaborado o primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento, o I PND, para o triênio 1972-1974. A aceleração do desenvolvimento científico e tecnológico era uma das principais metas desse plano. Tanto que foi concedido, pelo Governo Federal, para a execução do PBDCT, a quantia de Cr$ 1.750.000,00.

Conforme Morel (1979, p. 66), o I PBDCT, aprovado pelo decreto no 72.527, de 25 de julho de 1973, foi composto por cinco áreas de atuação, a saber: I) desenvolvimento de novas tecnologias; II) fortalecimento da capacidade de absorção e criação de tecnologia pela empresa nacional; III) consolidação da infra-estrutura de pesquisa científica e tecnológica, principalmente na área governamental; IV) consolidação do sistema de apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico; V) integração indústria-pesquisa-universidade.

Salles Filho (2002, p. 417) reproduz a íntegra do documento, enumerando as ações que deveriam ser desenvolvidas para buscar essa integração, dentre as quais dá-se, aqui, destaque para a integração indústria-pesquisa-universidade:

V – Integração Indústria-Pesquisa-Universidade, impulsionada mediante: Disseminação e consolidação dos centros de integração universidade- indústria, para assegurar programas sistemáticos de estágios de estudantes em empresas, para comunicar ao sistema universitário as necessidades quantitativas e qualitativas do setor privado quanto à formação de profissionais, e para permitir a realização conjunta de projetos de pesquisa. Portanto, contemplava a previsão de realização de programas conjuntos de pesquisa em setores prioritários e de grande dimensão, com participação de instituições governamentais de pesquisa, universidades e setor privado, particularmente na área industrial. Da mesma forma, previa a adoção, pelas instituições de pesquisa governamentais, de programa sistemático de articulação com o setor produtivo nacional, principalmente para disseminação do resultado de seus estudos, bem como a realização de convênios do Governo com as Universidades, para que estas procedessem a estudos de desenvolvimento regional ou a pesquisas aplicadas, de interesse do planejamento econômico e social e da política científica e tecnológica. Outrossim, contemplava a ampliação dos esquemas de participação do estudante nos programas de desenvolvimento, a exemplo do Projeto Rondon, da operação Mauá, etc.

Desse modo, o I PBDCT foi o primeiro documento governamental que demonstrou o interesse pela cooperação universidade-empresa, indicando as ações que deveriam ser realizadas, bem como disponibilizando recursos para fomentá-las, por meio do FUNDCT. Ficou marcado claramente o interesse pela cooperação como forma de acelerar o desenvolvimento econômico. Motoyama (2004, p. 331) confirma esse interesse na seguinte afirmação:

O I PND esperava alcançar resultados marcantes, como colocar o país na categoria de desenvolvidos, no tempo de uma geração. Por esse ângulo pretendia duplicar a renda per capita em oito anos, além de promover o crescimento do PIB a taxas da ordem de 18 a 20% ao ano, nos três anos seguintes. No I PND, continua persistindo a idéia de fortalecer a indústria nacional para poder competir nas áreas consideradas prioritárias, inclusive naquelas indústrias de alta intensidade tecnológica.

Morel (1979, p. 66) também analisa o I PND e, particularmente, o I PBDCT, e, compartilhando com Motoyama (2004) a idéia de fortalecimento da indústria nacional, afirma

que “o desenvolvimento científico e tecnológico é considerado, novamente, como fator indispensável na melhoria das vantagens comparativas entre países; para tanto é necessário fortalecer a indústria nacional, e integrar pesquisa e empresa”.

O quarto presidente militar, Ernesto Geisel, assumiu o poder em 15 de março de 1974 e deu continuidade aos planos de Médici. Dentre as medidas de cunho administrativo que atestavam a importância que a ciência assumira nesse período, estava a transformação do Ministério de Planejamento e Coordenação Geral em Secretaria de Planejamento – Seplan, diretamente ligada à Presidência da República, por intermédio da lei no 6.036, de lo de maio de 1974, possibilitando sua participação mais efetiva junto à área de Ciência e Tecnologia – C&T.

À Seplan foram vinculados o BNDE, a FINEP, o CNPq, o Instituto de Planejamento Econômico e Social – IPEA, e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Foi nomeado para a pasta, o ministro João Paulo dos Reis Velloso.

Na seqüência, foi formulado o Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento – II PND – para o período de 1975/79, com a participação ativa do presidente Geisel, do ministro Velloso e do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. O II PND impôs, como tarefas a serem executadas, a implementação do II e do III PBDCT – para o período de 1980/85, assim como a do primeiro Plano Nacional de Pós-Graduação e a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que herdou a sigla CNPq. Em decorrência do III PBDCT, foi criado o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – PADCT.

Foi criado também o Sistema Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – SNDCT, com o decreto no 225, de 15 de janeiro de 1975. Em conseqüência, foram instituídas as secretarias de tecnologia nos diversos ministérios. A atuação do SNDCT foi comandada pelo PBDCT, apoiada pelos recursos do FNDCT, cujas verbas só poderiam ser

liberadas de acordo com as diretrizes aprovadas pelo Presidente da República, baseadas nas indicações da Seplan.

Conforme relato de Albuquerque (2004, p. 201), a dificuldade encontrada por ocasião do lançamento do III PBDCT, em fevereiro de 1980, era a seguinte:

[...] equacionar problemas na área de C&T como a descontinuidade no processo de consolidação da estrutura de ciência e tecnologia, a insuficiente atuação do SNDCT (Sistema Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e a carência de recursos humanos qualificados na produção, no uso e difusão do conhecimento científico e tecnológico. O III PBDCT foi expressão do esforço de planejamento realizado no campo da Ciência, Tecnologia e Inovação em âmbito federal, no início da década de 1980. O III PBDCT serviu para unir as ações das agências e diversos órgãos do governo que operavam na área de coordenação, fomento e execução das atividades de pesquisa e desenvolvimento e outras áreas afins, não esquecendo da harmonização das diversas políticas de desenvolvimento econômico e social que pudesse interferir em seus objetivos.

Sob outro ângulo, Motoyama (2004) avalia o III PBDCT, lançado em um cenário bastante desfavorável em virtude da crise econômica instalada no Brasil, com o segundo choque de petróleo, a alta explosão dos juros internacionais e o aumento da dívida externa, acelerando a inflação. Nesse panorama em que a C&T começou a perder importância para o governo, destaca-se o seguinte trecho do autor (p. 378):

Que não havia interesse em C&T comprova-o o fato de o III PND não dedicar mais do que uma página ao tema. Era como se figurasse apenas para cumprir uma exigência legal. O III PBDCT, aprovado pelo decreto no 85.118, de 3 de setembro de 1980, também reforça essa idéia porquanto é vago, primando pela ausência de dados concretos. Nem sequer arrola os objetivos a serem alcançados, substituindo-os por considerações gerais - sem ultrapassar o lugar-comum - rotuladas de política de ciência e tecnologia. Embora repita as argumentações dos PBDCTs anteriores em prol da capacitação científica e da autonomia tecnológica das empresas nacionais, não demonstra a mesma disposição em promovê-las, pois não especifica os valores dos recursos a serem alocados e, conseqüentemente, não apresenta o cronograma de dispêndios.

Salles Filho (2003, p. 408) também analisa o III PBDCT:

Nas palavras do presidente do CNPq, Dr. Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque, este plano diferia dos anteriores, pois se centrava mais em diretrizes que programas, projetos e prioridades. Neste sentido, inaugurava- se um novo mecanismo: O Plano definiria linhas gerais e deveria ser completado por “um processo de seleção de programas e atividades prioritárias a serem implementadas nos diversos setores”. Este processo

daria origem a outra importante peça do planejamento científico e tecnológico no país, as Ações Programadas em Ciência e Tecnologia, com orçamento e revisão anuais.

O autor afirma, também, que o III PBDCT diferia dos anteriores em seu foco: ciência mais do que tecnologia, tecnologia mais do que inovação. Segundo o mesmo autor, a prioridade bem expressa – mas não necessariamente executada – dos Planos anteriores, que vinculava C&T com desenvolvimento industrial e econômico, não era tão explícita assim nesse III Plano. Havia uma determinação voltada para a formação de recursos humanos, seja para a pesquisa científica, seja para a capacitação tecnológica, naquilo que hoje se conhece como tecnologia industrial básica – metrologia, normalização, certificação, propriedade intelectual, informação tecnológica, engenharia de projetos, etc.

Independentemente da efetividade dos PBDCTs, enquanto processo e aplicabilidade, eles trouxeram enorme contribuição ao instituir um arcabouço institucional que pudesse viabilizar a implementação da política científica e tecnológica no Brasil. Diante da criação desses planos e órgãos, foram delineados a atuação e o papel da ciência e da tecnologia no desenvolvimento econômico brasileiro, bem como na formação de recursos humanos. A idéia de cooperação entre universidade e empresa, como uma das formas de contribuir para o desenvolvimento econômico, passou a ser defendida nos PBDCTs e incentivada pelos recursos do FUNDCT.

Salles Filho (2003, p. 408) reproduz trecho do capítulo 6 do III PBDCT sobre a cooperação universidade-empresa:

Para a articulação entre os centros de pesquisa e desenvolvimento e as empresas do setor industrial deve-se utilizar [...] o projeto de pesquisa e desenvolvimento contratado com a empresa cliente, e, quando necessário, com a participação de empresas de engenharia de projetos, visando à utilização prática dos resultados da pesquisa.

O autor analisa este trecho afirmando que a lógica era transferir o conhecimento técnico avançado dos centros de pesquisa industrial para as empresas nacionais. Havia, portanto, uma preocupação clara de juntar a pesquisa pública e a empresa, ainda que fosse

para serviços técnicos especializados. Por isso é importante resgatar os PBDCTs, em que se identifica um posicionamento do governo federal favorável e de incentivo à cooperação universidade-empresa.