• Nenhum resultado encontrado

I 7 Protestantismo como Religião da “plenitude de vida”

Mesmo respeitando aos “métodos de higiene” – rituais, dogmas, sacramentos – do catolicismo romano, que servem como “muros de proteção”, Jung é um

“defensor da personalidade mais ampla”796 que o Self indica como uma

“personalidade futura mais ampla, destinada a liberdade da atitude unilateral”797, ainda que tal experiência “só é dada àquele que cumpre sem restrição à Sua vontade”798. Para ele “tudo que é transformado em princípio ou virtude, seja por inclinação ou por causa de sua utilidade, resulta sempre em unilateralidade ou em compulsão à unilateralidade que exclui outras possibilidades”799 e, inspirado pelo texto bíblico de I Coríntios 2.11, seu espírito o levou a saber as coisas do homem, que desde a infância, buscou por si mesmo, ser “consciencioso diante de si mesmo, e não somente a fim de aparentar valor”. Foi a “solidão”, isto é, ver que

794 I d. par. 167 795 I d. par. 168 796 I d. par. 79 797 I d. par. 80 798

JUNG, C. G. - Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, s/ d, p. 51, 52 799

a natureza estava cheia de maravilhas, nas quais podia mergulhar. Cada pedra, cada planta, tudo se me afigurava animado e indescritível. As plantas eram seres vivos que deviam crescer e florescer – possuíam um sentido oculto, misterioso, eram pensamentos de Deus. Devíamos olhá-las com respeito e sentir diante delas um pasmo filosófico. Pertenciam, evidentemente, ao estado divino da inocência que era melhor não perturbar. Começava a compreender: era responsável e de mim dependia o curso do meu destino. Um problema me havia sido proposto e a ele eu devia responder. Ninguém conseguiu demover-me da certeza de que estava no mundo para fazer o que Deus queria e não o que eu queria. Em tais circunstâncias decisivas isto sempre me deu a impressão de não estar entre os homens, mas de estar a sós com Deus.800

Desde sua infância nos diálogos teológicos com o pai, Jung queria vivenciar a plenitude de vida em sua religiosidade. Segundo Byington o Rev. Johann Paul Achilles Jung (1842-1896), seu pai, apesar de ser um homem honesto, trabalhador e dedicado à família, foi incapaz de corresponder ao que seu filho mais queria dele: “a transcendência do cotidiano, do formal e do tradicional na relação com a totalidade. Da mesma forma que Freud tudo explicava pela sexualidade através do Complexo de Édipo, seu pai reduzia a transcendência da vivência religiosa aos textos bíblicos, às explicações tradicionais da I greja ou a “coisas misteriosas que não temos capacidade de saber”. A vocação para a vivência de transcendência logo cedo permitiu a Jung perceber que a religião formal do pai, que asfixiava as emoções místicas do filho, não era pessoal, mas da própria I greja. No entanto, essas percepções, que o levaram mais tarde a compreender o poder criativo dos arquétipos, não ocorreram por alguma dedução racional, mas foram o resultado da compreensão teórica de intensas experiências emocionais de fatos, imaginações e sonhos”.801 Esta “transcendência do cotidiano, do formal e do tradicional” Jung, como protestante buscou compreender real e profundamente ao estudar as doutrinas em “A Dogmática

800

JUNG, C. G. – Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, s/ d. p. 42, 54, 81 801

REVI STA, Viver Mente&Cérebro: Memória da Psicanálise. Jung e a Psicologia Analítica e o Resgate do Sagrado. Nº 02, São Paulo. p. 08 e 09

Cristã” (1869) de Biedermann, na tentativa de encontrar a “plenitude de vida”, mas se frustrou nesta empresa. Diz ele:

Procurei com zelo as qualidades de Deus e as encontrei, tal como apreendera em minha instrução religiosa. Li que embora “bastando-se a Si mesmo, de nada mais precisava além de Si”, tendo criado o universo “para Sua satisfação”: “enquanto que o mundo natural Ele cumulou com Sua bondade”, “o mundo moral, Ele quis cumular com Seu amor”. Em primeiro lugar, eu me detive na desconcertante palavra “satisfação”. Satisfação com o quê, ou com quem? Evidentemente, com o universo, pois Ele louvava e achava boa Sua obra. Mas este era um ponto com o qual não concordava. Sem dúvida o universo era belo, além de qualquer expressão, mas tinha um aspecto terrível. No campo, numa cidadezinha de poucos habitantes, onde quase nada acontece, “a velhice, a doença e a morte” são sentidas com maior intensidade, mas abertamente e com todos os detalhes. Embora tivesse apenas dezesseis anos, já presenciara muitas realidades da vida dos homens e dos animais; na I greja e na escola ouvira falar freqüentemente acerca do sofrimento e da corrupção do mundo. Deus manifestara uma satisfação imensa com o Paraíso, mas também cuidara de que seu esplendor não durasse muito tempo, uma vez que nele pusera a serpente venenosa, o próprio Diabo. Que satisfação poderia isso causar-Lhe? Estava certo de que Biedermann não concordaria com esta idéia, mas devido à ausência usual de reflexão em matéria religiosa, que me surpreendia cada vez mais, tagarelava de um modo edificante, sem perceber as tolices que dizia. Eu não acreditava que Deus sentisse uma satisfação cruel com o sofrimento imerecido dos homens e dos animais, mas não me parecia insensato supor que Ele tivera a intenção de criar um mundo de oposições, no qual um devorava o outro e onde a vida era um nascimento em vista da morte. As “maravilhosas harmonias” das leis da natureza pareciam-me um caos penosamente subjugado e do “eterno” céu estrelado, com seus caminhos predeterminados, se me afigurava um amontoado de acasos desordenados e sem qualquer significação, pois as constelações, combinações arbitrárias, não podiam ser realmente percebidas.802

Assim, sua Dogmática foi altamente frustrante em busca da plenitude de vida. E, a conclusão que chegou foi: “quanto mais a religião é racionalizada e enfraquecida – destino este quase inevitável – mais intricados e mais misteriosos se tornam os caminhos pelos quais os conteúdos do inconsciente chegam até nós. O materialismo racionalista, uma atitude mental aparentemente insuspeita, é, na realidade, um movimento psicológico de oposição ao misticismo. Este é o antagonista secreto que é preciso combater. O materialismo e o misticismo nada mais são do que um par psicológico de contrários, precisamente como o ateísmo e o teísmo. São irmãos

802

inimigos, dois métodos diferentes de enfrentar de algum modo as influências poderosas do inconsciente: um negando-as e o outro reconhecendo-as.”803

Jung cautelosamente afirma:

Eu nunca inventei uma idéia de Deus. Minha convicção não provinha das explicações que me davam, se bem que no fundo não podiam acreditar no que me diziam. Para mim Deus era uma experiência imediata e das mais convincentes. Ponho a palavra “Deus” entre aspas, pois a natureza (eu inclusive) me parecia posta por Deus, como Não-Deus, mas por Ele criada como uma Sua expressão. Não me convencia de que a semelhança com Deus se referisse apenas ao homem. As altas montanhas, os rios, os lagos, as belas árvores, as flores e os animais pareciam traduzir muito melhor a essência divina do que os homens com seus trajes ridículos, sua vulgaridade, estupidez e vaidade, sua dissimulação e seu insuportável amor-próprio. Conhecia muito bem todos esses defeitos através de mim mesmo, isto é, através de minha personalidade nº 1, a do colegial de 1890. Ao lado disso, havia um domínio semelhante a um templo, onde todos os que entravam passavam por uma metamorfose. Subjugados pela visão do universo e esquecendo-se de si mesmos, apenas podiam se espantar e se admirar com ele. Lá vivia o “Outro”, aquele que conhecia Deus como um mistério oculto, pessoal e ao mesmo tempo suprapessoal. Lá, nada separava o homem de Deus. era como se o espírito humano, ao mesmo tempo que Deus, lançasse um olhar sobre a Criação.804

Jung apela para que, ainda por um momento, os olhares dos religiosos sejam “desviados de todo racionalismo europeu”805, em direção a uma “reflexão que leva à intensidade de vida”.806 Ele pede a:

Renúncia à palavrinha “físico”. O conceito de “físico” não constitui o único critério de uma verdade, pois há também verdades psíquicas que não se podem explicar, demonstrar ou negar sob o ponto de vista físico. Os enunciados religiosos são desta categoria. O fato de os enunciados religiosos se acharem muitas vezes em aberta oposição aos fenômenos fisicamente comprovados é uma demonstração da autonomia do espírito em face da percepção de ordem física e também de um certa independência psíquica em relação às realidades físicas. A alma é um fator autônomo, e os enunciados religiosos são uma espécie de confissão da alma, os quais, em última análise, têm suas razões em processos inconsciente e, por conseguinte, também transcendentais. Por isso, quando falamos de conceitos religiosos, situamo- nos em um mundo de imagem que se referem a um determinado inefável. Não sabemos se estas imagens, comparações e conceitos exprimem ou não com clareza seu objeto transcendental”.807 Jung aponta que a razão da

resistência racional em aceitá-los, se deve ao fato de se tratarem de “representações cujas imagens antropomórficas”808, e nos esquecemos que

803

JUNG, C. G. – Natureza da Psique, A. Petrópolis: Editora Vozes, 2000, par. 712 804

JUNG, C. G. – Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, s/ d. p. 65, 51, 52 805

I d. p. 223 806

I d. p. 215 807

JUNG, C. G. – Resposta a Jó. Petrópolis: Editora Vozes, 1986. par. 555 808

usam de uma linguagem emocional, que parece inacessível à razão crítica. A “manifestação da alma”, em sua linguagem emocional, ultrapassa os limites de nosso pensar comum, pois se referem a realidades que transcendem a consciência. “Estas representações não são inventadas; são percebidas interiormente (por exemplo nos sonhos), já como produtos acabados. São fenômenos espontâneos que escapam ao nosso arbítrio e por isso podemos atribuir-lhes uma certa autonomia. Pela mesma razão, devemos considerá-los não só como objetos em si, mas como sujeitos dotados de leis próprias.809

Para ele esta “reflexão” não está fora da “mensagem cristã, pois a considero primordial para o homem do ocidente. Ela deve, no entanto, ser vista sob um novo ângulo, que corresponda às transformações seculares do espírito contemporâneo, sem o quê será relegada à margem do tempo e a totalidade do homem não se encontrará mais inscrita nela”.810 Ao buscar o “novo ângulo que corresponda às transformações do espírito contemporâneo”, Jung percebe que este se encontra em suas “fantasias, emoções ou imagens, que remontam à minha infância”811, mas nas quais “uma graça indizível me invadira”812. Tal “graça é inconcebível para mim”813. Ao ser levado a termo a reflexão de sua “má consciência”, na qual verificava seu sentimento de inferioridade, em “nunca sentir-se seguro de si mesmo”, Jung lembra bastante a mesma experiência que passara Lutero, quando este diz:

Sendo frade, quando me sentia assaltado por alguma tentação, dizia no meu interior: estou perdido!... e imediatamente buscava mil meios para apaziguar os gritos de minha consciência. Confessava-me todos os dias, porém isso de nada me servia. Assistia à missa e orava com grande devoção, mas vindo ao altar com dúvidas, com dúvidas saía dali. Velava, jejuava, maltratava meu corpo; nada conseguia com isso. Então, prostrado de tristeza, atormentava- me com a multidão de meus pensamentos. Vê! Gritava comigo mesmo, és ainda invejoso, impaciente, colérico!... Então de nada te serviu, oh infeliz, o teres entrado nesta sagrada ordem...”814 Jung preferia a experiência direta do mistério à religião cristã da época, uma religião estéril cujo Deus era absolutamente distante e transcendente. Seu protestantismo foi de “tentar reconstruir a alma primitiva inconsciente”.815 E, esta experiência é

809

I d. par. 557 810

JUNG, C. G. – Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, s/ d. p. 185 811 I d. p. 170, 172 812 I d. p. 65 813 I d. p. 48 814

D’AUBI GNÉ, J. h. Merle – História da Reforma do Décimo Sexto Século. Volume I . Nova York, Publicado pela Sociedade de Tratados Americana, s/ d, p. 192

815

compreendida como: “o caminho para atingir a Deus, isto é, experimentar a graça de Deus, é cumprir sem restrição à vontade de Deus.816

A “plenitude de vida” está em se voltar ao “caráter divino das Escrituras Sagradas”817, por considerar “suas afirmações como manifestações da alma”818. É como se a Bíblia fosse escrita para o indivíduo e acerca do indivíduo. Como Jung mesmo disse:

Quando uso, por exemplo, conhecimentos históricos ou teológicos, não são mais considerados sob o ângulo da verdade filosófica ou religiosa, mas examinados, no sentido de apurar o que comportam de significação e de fundamentos psicológicos.819 Devo deixar que fale minha subjetividade

emocional, dizendo aquilo que sinto quanto leio determinados livros da Sagrada Escritura ou me recordo de certas impressões que recebi dos ensinamentos de nossa fé.820 Precisamos ler a Bíblia ou não entenderemos

psicologia. Nossa psicologia, nossas vidas, nossa linguagem e imagens foram construídas sobre a Bíblia. (EDI NGER, Edward F., 1990 apud JUNG, The Visions Seminars, vol. 1, p. 156)

A leitura e interpretação bíblica não é “fria e ponderada, muito pelo contrário, é minha reação subjetiva”.821 Para exemplificar, podemos citar o caso que Jung relata acerca de uma “velha esquizofrênica”, que ouvia vozes em toda parte do corpo. A “plenitude de vida” veio à paciente, graças à leitura da Bíblia, e aos comentários que ambos faziam nos “encontros de terapia”. Ele nos conta:

Numa ocasião a voz que vinha do “meio do tórax” dizia-lhe que se tratava da “voz de Deus”. E, disse-lhe: “nesta deves confiar”, e mesmo surpreendo-me com a resposta, ajudei-a a compreender o que se passava com ela. A voz fazia observações muito razoáveis, e certa vez disse: “É preciso que ele te ouça a respeito da Bíblia”. E, resolvi aceitar a falar a respeito da Bíblia com ela, e usando a Bíblia da paciente, li vários capítulos, e depois perguntava a respeito do texto. Estes encontros duraram sete anos, com encontros quinzenais; no fim dos quais as vozes que antes estavam disseminadas por todo o corpo, passaram a se concentrar somente no lado esquerdo, deixando completamente livre o lado direito. Foi um sucesso inesperado, pois não imaginava que nossa leitura da Bíblia pudesse ter um efeito terapêutico.822

816

I d. p. 52 817

JUNG, C. G. - Psicologia e Religião. Petrópolis: Editora Vozes, 1990, par. 34 818

JUNG, C. G. – Resposta a Jó. Petrópolis: Editora Vozes, 1986. par. 557 819

JUNG, C. G. – Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, s/ d. p. 302 820

JUNG, C. G. – Resposta a Jó. Petrópolis: Editora Vozes, 1986. par. 559 821

I d. par. 561 822

O mesmo se deu no caso, anteriormente relatado, da neta do rabino Zaddik, e sua conclusão fora: “Sentira a presença do numem. Expliquei-o à doente e a cursa se seguiu. Eu seguira um método: só o temor de Deus atuara sobre ela”.823

Jung vê a “plenitude de vida” como a vida guiada pelo “espírito”, algo que não se verificava no Protestantismo, ao contrário, para ele:

o espírito não pairava mais no alto, mas está embaixo, não é mais fogo, mas se tornou água. Quando o espírito se torna pesado, transforma-se em água e o intelecto tomado de presunção luciferina usurpa o trono onde reinava o espírito. O Espírito pode reivindicar legitimamente o “patrias potestas” (o pátrio poder) sobre a alma; não porém o intelecto nascido da terra, por ser espada ou martelo do homem e não um criador de mundos espirituais, um pai da alma.824

Esta “plenitude de vida” inclui a “má consciência”, pois se para o I luminismo, o dogma está separado da experiência interior, devido às suas origens históricas, o Protestantismo deve se valer daquilo que lhe gerou – sua própria “sombra”. A “má consciência, que pode ser um dom de Deus, uma verdadeira graça”.825 Ele acredita nisso, devido ao conceito que tem de religião, como “sistemas psicoterapêuticos”.826

Deus é um agente de cura, é um médico que cura os doentes e trata dos problemas do espírito; faz exatamente o que chamamos psicoterapia. Não estou fazendo jogo de palavras ao chamar a religião de sistema psicoterapêutico. É o sistema mais elaborado, por trás do qual se esconde uma grande verdade prática.827

Para ele, ser religioso e cristão se dá na “consciência” onde se dá “coisas diferentes e muito misteriosas”.828 Por algumas vezes ele se refere a si próprio como

823

I d. p. 127 824

JUNG, C. G. - Psicologia e Religião. Petrópolis: Editora Vozes, 1990, par. 33 825

JUNG, C. G. – Psicologia e Religião. Petrópolis: Editora Vozes, 1990, par. 86 826

JUNG, C. G. – Fundamentos de Psicologia Analítica. Petrópolis: Editora Vozes, 1989, par. 370 827

I d. par. 370 828

um “indivíduo culpado que queria ser inocente”829. Mas, sempre recordando que diante do conteúdo do seu inconsciente pessoal “não podia faltar à ética”830 consigo mesmo. Talvez nisto consiste a confissão de pecados ao protestante, enfrentar sua “má consciência” com ética. No entanto, ele constata que é:

comum satisfazer-se com os êxtases que podemos experimentar, sem que nos envolvamos com as conseqüências éticas que tais imagens, do inconsciente, pretendem. Desta forma aparecem os efeitos negativos do inconsciente. Quem não sente a responsabilidade ética que seus conhecimentos comportam, sucumbirá ao princípio de poder. Disso poderão resultar efeitos destruidores não só para os outros como também para a própria pessoa que sabe. As imagens do inconsciente impõem ao homem uma pesada obrigação. Sua incompreensão, assim como a falta de sentido da responsabilidade ética privam a existência de sua totalidade e conferem a muitas vidas individuais um cunho de penosa fragmentação.831

Esta atitude ética ele próprio exemplifica com sua atitude: “Trata-se de imagens e pensamentos nos quais vivi, que me trabalharam e me preocuparam, são idéias que palpitam em mim.”832 Cabe ao protestante, segundo Jung, perguntar-se diariamente: a qual responsabilidade ética meus conhecimentos me chamam, para não me sucumbir ao princípio de poder? Qual é a minha obrigação frente ao conhecimento que estou apreendendo? O quê cada imagem ou conteúdo do um inconsciente, diz a meu respeito, e o quê me cabe realizar na vida?

Jung explica que a dificuldade do homem se assumir como instrumento capaz de discernir moralmente, está no fato de ser “inconsciente, que não percebe suas possibilidades de decisão”833, e é sua inconsciência que o leva a “procura ansiosa de regras e leis exteriores as quais possa ater-se nos momentos de perplexidade”834.

Assim, facilmente não se refere à sua própria experiência imediata possível e 829 I d. p. 37, 48, 51 830 I d. p. 171 831 I d. p. 171 832 I d. p. 260 833 I d. p. 285 834 I d. p. 285

acessível a todos que se abrem ao Espírito. O Protestantismo esqueceu-se disso e elegeu a luz da razão por apresentar “regras e leis” que asseguram certa estabilidade diante das “perplexidades” que o Protestantismo enfrenta em seu viver. Mas, não é difícil encontrar que os defensores deste sistema, estão conscientes de que nunca poderão viver plenamente assim, pois o inconsciente não cansa de se manifestar. Assim, Jung, retorna sua idéia principal da “má consciência” para reafirmar que só encontram uma resposta ao problema do mal, os que têm um “conhecimento de si mesmo, isto é, de um conhecimento tão profundo quanto possível de sua totalidade. Deve saber, sem se poupar, a soma de atos vergonhosos e bons de que é capaz, sem considerar a primeira como ilusório ou a segundo como real. Ambas são verdadeiras enquanto possibilidades e não poderia escapar a elas se quiser viver (como obviamente deveria), sem mentir a si mesmo e sem vangloriar-se”.835 Para Jung, o protestante é ético à medida que tem conhecimento de si mesmo, isto é, atinge a “camada profunda, aquele núcleo da natureza humana no qual se encontram os instintos”. Os instintos “compõem o inconsciente e seus conteúdos os quais são conscientizados graças ao conhecimento aprofundado de si mesmo”, e Jung propõe a “psicologia”, como ciência vital para respondermos ao mal. A psicologia é vital por ser a ciência da “alma do homem”, que se apresenta como a única resposta à questão do mal.836

A justificativa que Jung ressalta para nos voltarmos à alma é que:

Nossa psique é estruturada à imagem da estrutura do mundo, e o que ocorre num plano maior se produz também no quadro mais íntimo e subjetivo da alma. Por este motivo, a imagem de Deus é sempre uma projeção da experiência interior vivida no momento da confrontação com um opositor poderosíssimo. (...) Tais experiências têm uma influência benigna ou devastadora no homem. Este não pode apreendê-la, compreendê-las, nem dominá-las. Não pode livrar-se delas ou escapar-lhes, e por este motivo as

835

I d. P. 285-286 836

Documentos relacionados