• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 2. A cultura como factor de (des)envolvimento

51 Idem, ibidem, p 33.

"A nossa aposta nos centros de interpretação dos monumentos e sítios, na modernização e actualização das sínaléticas e dos quadros informativos, no desenvolvimento dos serviços educativos e no uso generalizado das novas tecnologias para a difusão do conhecimento, obedece a este imperativo básico: fazer do património um companheiro indispensável e natural da nossa vida, pessoal e colectiva. ^

Para José Maria Cabral Ferreira, a realidade cultural refere-se a "um conjunto de

modelos, formas de ser, motivações, símbolos, saberes e coisas, cuja estruturação orgânica e histórica dão rosto a um lugar e à gente que o vive.'63

Na actualidade, e pelo que foi descrito, em todo e qualquer debate sobre o desenvolvimento a cultura surge com grande intensidade e pertinência. Quando se reflecte sobre práticas de desenvolvimento e de emprego a cultura assume um papel cada vez mais implícito, fluído e transversal.

A ideia da cultura como um compartimento estanque e com limites bem definidos não é mais válida nem compatível com as novas dinâmicas das sociedades. A UNESCO, em relatórios recentes, revela que o factor cultural se distanciou do restrito universo das "belas artes" do século XIX, afirmando-se agora como parte integrante da vida social e económica moderna e interagindo com qualquer domínio de actividade.

2.2 cultura enquanto realidade multifacetada

Para Augusto Santos Silva54 o conceito cultura assume uma tripartição: alta cultura, cultura de massas e cultura popular. Esta divisão diz respeito a processos pelos quais as diferenças de condição, posição e trajectória social marcam distintamente os modos de acesso, fruição e produção de bens e actos culturais. Tais diferenças estão, na generalidade dos casos, associadas a desigualdades sociais.

Augusto Santos Silva, «Nós e o património: empenhamento, equilíbrio, usufruto», in jornal Público, 30 Setembro 2001.

José Maria Cabral Ferreira, «Do planeamento da cultura à cultura do planeamento», in Sociedade e Território - Revista de

Estudos Regionais e Urbanos, Porto, Edições Afrontamento, p. 22.

Augusto Santos Silva, Helena Santos; Prática e representação das culturas: um inquérito na área metropolitana do Porto, Porto, Centro Regional de Artes Tradicionais, colecção mãos, 1995, p. 18.

Relativamente aos meios de acesso a "televisão e rádio quase esgotam...os canais

de acesso ao campo da informação e da cultura. Outros meios de comunicação de massas, como a imprensa, já repercutem directamente sobre um agregado bem mais limitado de pessoas. E os bens e práticas vinculados ao campo da cultura erudita - a literatura, como os concertos de música clássica, os programas culturais de rádio ou os museus de arte moderna - tocam um número muitíssimo reduzido de actores, mesmo entre as classes favorecidas em capital económico ou escolar".

"A relação entre o capital escolar detido e as possibilidades de acesso à hierarquia social de bens e práticas culturais tem sido demonstrada por várias investigações sociológicas. Não só os títulos escolares constituem uma forma particularmente importante de capital cultural institucionalizado; como a experiência prolongada e sucedida da escolarização, quer dizer, a que atinge patamares elevados do sistema de ensino, e, por via dela, o contacto continuado com referências culturais de matriz urbana, nacional e cosmopolita, favorecem a aquisição de níveis mínimos de capital cultural incorporado e melhoram as condições de reconhecimento e acesso a diversas formas de capital cultural objectivado, isto é, às obras e bens que tendem a ser, em cada contexto, legitimados. Não admira, pois, que nos modelos de relações entre variáveis que tem sido possível construir, para explicar, por exemplo, a frequência dos museus de arte, o nível de instrução ocupe um lugar central.'65

No entanto, um estudo56 apresentado muito recentemente, demonstra a dimensão

de algumas práticas culturais entre os estudantes do ensino superior no Porto, ou melhor dizendo, das não práticas culturais desta população. De facto, segundo os dados apurados e em especial os dados referenciados para a «frequência de visitas a museus com alguma regularidade», 91,3% não regista tal frequência. Será então pertinente relativizar o capital escolar adquirido como factor de maior preponderância no estímulo de algumas práticas culturais.

Idem, ibidem, p. 22

Constamos, por isso, que "...o domínio das práticas culturais é um dos que ilustra

bem a complexa dinâmica de cruzamento entre elementos de continuidade e elementos de renovação...'67

Por seu turno, Maria de Lourdes Lima dos Santos58 questiona, tal como Augusto

Santos Silva, três noções de cultura: grande cultura, cultura popular e cultura de massas. Estando a primeira associada ao saber crítico dos «clássicos» e a segunda ao do «povo», a última designação associa-se à indústria cultural.

Os museus e a sua frequência são elementos e práticas constantemente associados à grande cultura, ficando o seu usufruto no âmbito das elites e dos grupos socialmente dominantes. Constatamos, no entanto, que sendo os museus instituições, parte integrante de um todo mais vasto e em permanente devir, também a sua natureza, a sua missão, os seus objectivos, os seus modos de agir, os seus públicos, e acima de tudo a sua função social estão igualmente a mudar.

A cultura contemporânea, segundo Carlos Fortuna59, é «caracterizada como uma

cultura de distâncias e de fronteiras que, fruto de construções simbólicas, desordenadas e caóticas, são flexíveis e se encontram em permanente redefinição». É, assim, cada vez mais, "uma cultura expressiva, em que abundam práticas de extemalização e de

objectivação dos sentimentos, gostos e preferências dos sujeitos".60 É uma cultura de

confronto entre sujeitos mas também uma cultura de encontro do sujeito consigo mesmo. Assiste-se portanto, a uma reconstrução permanente da identidade dos sujeitos perante novos figurinos sociológicos e culturais. "O mercado e o consumo, tanto material como simbólico, a tecnologia da informação e a cidade surgem como pano de fundo da

«destruição criadora» das identidades."61 Para Carlos Fortuna a "paisagem cultural pós- modemizante das cidades de hoje está carregada (...) de lugares de significados contrastantes. Ao lado dos monumentos e ruínas, também os museus, os santuários, os cemitérios, os estádios ou os

Augusto Santos Silva, Helena Santos, op.cit. p. 115.

58 Maria de Lourdes Lima dos Santos, «Questionamento à volta de três noções - a grande cultura, a cultura popular, a cultura de

massas», in Análise Social, vol. XXIV (101-102), 1988 (2o e 3o), p. 689-702 59 Carlos Fortuna, op. c/ft.

60 Idem, ibidem, p. 1.

Documentos relacionados