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Aguilera (2008) destaca que a atitude linguística assumida pelo falante implica a noção de identidade. De acordo com Tabouret-Keller (1998), a identidade de uma pessoa é um conjunto heterogêneo composto por todos os nomes ou identidades, concedidos e assumidos por ela. Mas, em um processo ao longo da vida, a identidade é infinitamente recriada, de acordo com as restrições e interações sociais, encontros e desejos que podem ser muito subjetivos e únicos.

Ainda segundo Tabouret-Keller (1998), toda pessoa explora diferentes camadas de identidades formando redes, algumas das quais são propensas a mudanças e substituições de acordo com a fase da vida ou espaço social e cultural em que está inserida, somos identificados e nos identificamos na sociedade a partir de diferentes grupos.

A identidade de um grupo é, muitas vezes, chamada de identidade cultural ou étnica. Conforme Zingarelli (1983 apud FROSI, 2013, p. 104)14, “a palavra éthnos deriva do grego, com o significado de raça, povo ou nação, e etnia vale como agrupamento humano baseado em caracteres raciais, linguísticos e culturais”. Em outras palavras, a identidade étnica define-se pela alteridade, ou seja, se institui por um conjunto de elementos definidores que o distingue dos demais.

Para compreendermos etnicidade, Fishman (1998) destacou três dimensões: a paternidade, o patrimônio e a fenomenologia. A paternidade compreende tudo aquilo que é herdado em família, passando, sem interrupção através do tempo. A dimensão do patrimônio refere-se ao conhecimento e comportamento da coletividade, como por exemplo a música, roupas, sexualidade, etc. A última dimensão é a fenomenologia, ou seja, os significados que atribuímos às dimensões anteriores. O autor ainda acrescenta que a língua é o símbolo por excelência da etnicidade, pois ela dá conta da paternidade, expressa o patrimônio e sustenta a fenomenologia.

A partir das descrições acima, entendemos que a identidade se manifesta no sentimento de pertença a um grupo étnico que compartilha de características culturais semelhantes, representadas por uma língua ou dialeto. Dessa forma, o idioma, além de nomear o grupo étnico, é o meio pelo qual os indivíduos se relacionam, ou seja, os aproxima ou diferencia. Portanto, segundo Appel e Muysken (1996), a linguagem não é apenas um instrumento para a comunicação de mensagens. Isso se torna especialmente claro em comunidades multilingues, onde vários grupos têm sua própria língua. As normas e valores culturais de um grupo são transmitidos pelo seu idioma que tem significado social, pois as pessoas irão avaliá-lo em relação ao seu status e de seus usuários, ou seja, as atitudes de linguagem serão atitudes sociais. Tanto a identidade individual quanto a social são mediadas pelo idioma.

Edwards (apud APPEL; MUYSKEN, 1996, p. 27) pondera que “a língua, como uma das manifestações de identidade mais óbvia, é muito suscetível de substituição e perda. Exatamente por ser tão pública é que se assumiu que a língua é o componente mais importante da identidade.” 15

Para Le Page e Tabouret-Keller (apud TABOURET-KELLER, 1998), a linguagem falada por alguém e sua identidade são inseparáveis. Os atos de linguagem são atos de identidade e o idioma é tomado como um comportamento externo que permite a identificação de um falante como membro de algum grupo, pelo seu modo de falar.

14ZINGARELLI, N. di. Il nuovo Zingarelli – vocabolario della lingua italiana. 11. ed. Bologna: Zanichelli, 1983. 15 No original: “La lengua, como una de las manifestaciones de identidad más obvias, es muy susceptible de sustitución y deterioro. Exactamente por ser tan pública es por lo que erróneamente se ha asumido que la lengua es el componente más importante de la identidad.”

Dessa forma, “uma única característica fonêmica pode ser suficiente para incluir ou excluir alguém de qualquer grupo social. Mas qualquer outro item de linguagem[..], por exemplo, um nome próprio, pode cumprir a mesma função”. (TABOURET-KELLER, 1998, p. 215).

Consoante, Mey (1998 apud FROSI, 2013, p. 104)16 sustenta que a “identidade étnica [...] sempre conteve um traço de racismo – racismo entendido aqui como um conjunto de crenças que [...] exclui certas pessoas e aceita outras”.

Os casos de contato linguístico são bons para estudar fusão e disjunção de identidade. As situações multilíngues ilustram os dois aspectos da identificação pelo idioma. Um falante bilíngue pode ser identificado por características linguísticas derivadas do contato linguístico. Em certas situações, isso gera sentimentos de inferioridade, discriminação ou exclusão do grupo dominante, ou inversamente, sentimentos de familiaridade, reconhecimento, cumplicidade entre aqueles que compartilham a língua ou a situação de contato. A criatividade dos bilíngues, especialmente na língua oral que não é controlada pelo poder normativo da escrita, sofre repressão pela super valorização da língua dominante.

Para Vandermeeren (2005), o grupo familiar é, na maioria das vezes, o primeiro grupo étnico e linguístico com o qual o indivíduo um que tem que lidar, mesmo deixando-o mais tarde. Muitos querem se juntar a outros grupos, adotando suas características, entre as quais está o idioma, o qual implica afiliação e revela limites. Daí a identidade é mais uma rede de identidades, refletindo os muitos compromissos e sentimentos.

Para explicar esse fenômeno, Giles’s (apud TABOURET-KELLER, 1998) desenvolveu a Teoria da Acomodação:

[...] as pessoas estão motivadas para ajustar seu estilo de fala ou acomodar, como meio de expressar valores, atitudes e intenções para com os outros. Propõe-se que a medida em que os indivíduos mudam seus estilos de discurso para perto ou longe dos estilos de fala de seus interlocutores a aprovação ou desaprovação social é comunicada. Uma mudança de estilo de fala em direção a outra é denominada convergência e é geralmente considerada como reflexo da integração social, enquanto que uma mudança do estilo de expressão do outro representa divergência e é considerada uma tática de dissociação social. 17

16 MEY, J. L . Etnia, identidade e língua. In: SIGNORINI, I. (Org.). Lingua(gem) e identidade – elementos para uma discussão no campo aplicado. Campinas: Mercado de Letras; São Paulo: Fapesp, 1998. P. 69-88.

17No original: “[…] people are motivated to adjust their speech style, or accommodate, as means of expressing values, attitudes and intentions towards others. It is proposed that the extent to which individuals shift their speech styles toward or away from the speech styles of their interlocutors is a mechanism by which social approval or disapproval is communicated. A shift in speech style toward that of another is termed convergence and is considered often a reflection of social integration, whereas a shift away from the other's style of speech represents divergence and is considered often a tactic of social dissociation”.

De qualquer forma, o indivíduo é o postulado básico para a construção de qualquer identidade. Para Le Page (apud TABOURET-KELLER, 1998):

"o indivíduo cria para si os padrões de seu comportamento linguístico de modo a assemelhar-se ao ou aos grupos com os quais, de tempos em tempos, ele deseja ser identificado, ou para ser diferente daqueles de quem ele deseja ser distinguido".

Conforme Frosi (2013), a concepção primordialista de etnicidade (ponto a partir do qual foi elaborada a maioria dos conceitos posteriores), também chamado de essencialista, concebe etnicidade como algo inato que acompanha o homem desde os tempos remotos num prosseguimento sem fim. No entantanto, o que se observa, atualmente, é uma concepção bastante generalizada de que a identidade étnica é decorrente de um processo de construção, de reconstrução e de invenção.

Por fim, Rajagopalan (1998 apud FROSI, 2013, p. 108)18:

A identidade de um indivíduo se constrói na língua e através dela. Isso significa que o indivíduo não tem uma identidade fixa anterior e fora da língua. [...] Em outras palavras, as identidades da língua e do indivíduo têm implicações mútuas. Isso significa que as identidades em questão estão sempre num estado de fluxo.

Para o autor, o estado de fluxo da identidade significa estar sempre em processo, a língua evolui, o indivíduo muda e, portanto, a identidade também vai se modificando e se reconstruindo.

Conclui-se, então, que os seres humanos são limitados pela língua, a qual funciona como um atributo comportamental e também fornece os termos pelos quais as identidades são expressas. Dessa forma, a identidade é formada e definida historicamente e é plural.

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