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IDIOMAS COMO EXPRESSÕES SOCIAIS

No documento LUCIETE TELES DE SOUZA (páginas 33-46)

A língua é um fenômeno eminentemente social. Ela surge como instrumento de comunicação, com o objetivo de tornar facilitar a transmissão e recepção de mensagens em grupo de sujeitos sociais. É por meio dela que os indivíduos criam, produzem, compreendem e desenvolvem interação entre si.

Todo sujeito social, independente do nível de escolaridade, das condições econômicas, históricas e culturais em que vive, necessita estabelecer comunicação com os seus pares. Para isso, fazem uso da língua, principalmente em sua modalidade oral, já que esta possibilita maior rapidez e dinamismo na comunicação e não exige, em situações informais, o domínio das tecnologias do ler e do escrever. Muitas vezes, os sujeitos sociais, na interlocução diária, acabam por criar estratégias linguísticas para efetivarem de modo compreensível a comunicação, é o que acontece comumente com falantes naturais do Brasil e de países latinos.

Como o português e o espanhol mantém certa proximidade por derivarem de dialetos ibéricos de origem neolatina, os falantes de ambos os idiomas, quando não dominam a língua do outro, tentam, por vezes, se adaptar à situação de comunicação no intuito de que seu interlocutor compreenda o enunciado, para isso procuram aproximar tanto a estrutura fonética quanto a sintática e o léxico ao que a percepção deles consegue elaborar a partir dos enunciados ouvidos na língua do outro. Essa estratégia de linguagem, conhecida como portunhol, surge, então, como forma de atender necessidades de entendimento entre falantes do português e do espanhol que se encontram em situações de trabalho, estudo, relacionamentos afetivos etc.

Nos contatos comerciais diários na zona franca de Cobija, onde brasileiros e bolivianos se comunicam quase que exclusivamente por meio da fala, é comum se perceber o uso corrente do portunhol, principalmente pelo brasileiro que, em sua maioria, não consegue falar bem o idioma da fronteira. Já entre os bolivianos, é visível o fato de que eles procuram usar mais o português quando falam com os brasileiros.

Assim, o portunhol, nas regiões de fronteira do Brasil com os países latino- americanos, funciona para os brasileiros como um instrumento de comunicação valioso,

sobretudo para aqueles que não dominam o espanhol ou sua variedade falada no país vizinho. Em geral, os falantes do portunhol, tanto o brasileiro quanto o estrangeiro, pouco conhecem das regras de funcionamento da outra língua, por isso perdoam os erros sintáticos e fonéticos no uso do idioma, quando os percebem, pois privilegiam a comunicação.

Como a proximidade formal entre o português e o espanhol possibilita que falantes de ambas as línguas consigam se comunicar com certa facilidade, não é raro perceber que parte dos falantes do portunhol deixa de progredir na aprendizagem da língua do outro, por considerarem que há entendimento mútuo na comunicação, o que reforça oimaginário popular de “línguas parecidas.”

Os brasileiros que falam o portunhol quando visitam os países hispânicos da fronteira o fazem na tentativa de serem melhor compreendidos pelo estrangeiro, sem se preocupar com a correção formal do espanhol. Quando o interlocutor também não se preocupa com este aspecto, o falante brasileiro interage usando essas estratégias achando que fala bem. No entanto, quando o outro possui certo domínio da língua portuguesa, por vezes o brasileiro acaba sendo alvo de risos ou deboche. Essa realidade aparece na fala da entrevistada Luz Marina Menezes, quando indagada sobre o uso da língua espanhola pelos brasileiros na comunicação com os bolivianos na fronteira Brasileia-Epitaciolândia-Cobija:

“Bom, o que a gente vê é a lei do menor esforço, todo mundo acha, o brasileiro, e nós achamos que sabemos falar o portunhol, mas aí a gente vai para lá e às vezes… às vezes a gente acaba o boliviano rindo da cara da gente porque a gente tá tentando falar espanhol e eles ficam rindo, porque eles já tão falando melhor do que o brasileiro que tá indo lá achando que tá sabendo falar espanhol,...”

Conforme as pessoas aqui deixam entrever que se os vizinhos bolivianos, com o riso, criticam o portunhol, pretenso espanhol do brasileiro, é porque eles, nessa região de fronteira, possuem maior domínio do português em detrimento do pouco conhecimento que o brasileiro tem do espanhol. Para reforçar esta conclusão e enfraquecer o imaginário popular de que a comunicação se efetiva porque as duas línguas são parecidas, basta saber que a maioria dos entrevistados bolivianos admitiu que quando conversam com os brasileiros usam mais o português, pois se usam a língua espanhola o seu interlocutor não entende a mensagem:

“En las oportunidades que voy allí pero trato más de falar portugués porque a veces digamos trato de falar el castellano y me preguntan...” no entendí, no entendí.” (Thales Zaguizi - comerciante ambulante)”

“Portugués, porque si yo falo español no entienden… no entienden. .” (Hector - operador de vendas)”

Estas duas falas representam a mesma posição de outros bolivianos entrevistados no comércio de Cobija, os quais, ao serem questionados por que preferem falar em português, responderam que isso se dá pelo fato de os brasileiros não falarem o idioma espanhol, daí que o uso do português facilita sobremaneira a comunicação.

Ressalta-se que apesar de usarem com frequência o português para a efetiva comunicação diária com os brasileiros/acreanos, os bolivianos não estão valorizando o português em detrimento do espanhol, apenas estão buscando uma maneira mais eficaz de interagir com o outro socialmente. Não estão deixando de preservar a sua língua, a qual os identifica como sujeitos bolivianos, mas demonstrando uma forma de respeito com seu interlocutor brasileiro. Não estão se rendendo ao português e nem acreditam que sua língua é inferior ao outro código, somente entendem que é necessário fazer o jogo discursivo para que, nessas condições, a comunicação aconteça com o mínimo de ruído.

Todavia, parece que o mesmo não vale para os falantes brasileiros/acreanos, tendo em vista que grande parte deles não demonstra interesse ou esforço em se comunicar com seus vizinhos de fronteira fazendo uso do espanhol, quando muito, utilizam o portunhol. Esta questão, conforme já explicitado neste capítulo, parece se relacionar com o pretenso sentimento de superioridade da língua portuguesa em relação à variação do idioma espanhol falado pelos bolivianos em Pando, subsidiada por aspectos da história e da cultura do povo habitante dessa fronteira.

Há que se ressaltar aqui que nenhuma língua é superior ou inferior a outra, cada uma se desenvolve e expande na medida da necessidade de seus usuários. Todos os idiomas são manifestações da linguagem humana e se materializam nas expressões sociais. Quanto a essa concepção, todos os entrevistados, brasileiros e bolivianos, admitiram que, para eles, não há

um status hierárquico entre as línguas, que todas estão em pé de igualdade quanto ao seu valor e importância. Vejamos algumas falas:

“No, todas son iguales para mí.” (Rober Gallardo) “No, no creo. Todas son iguales.” (Hector)

“Não, eu acho que toda língua tem seu valor (…) a minha … minha conclusão é de que toda língua é muito importante.” (Luz Marina)

“Creio que não, toda língua tem seu valor.” (Jorge Soares)

“Bem, eu acho que não, mas tem umas que são mais faladas e mais estudadas do que outras.” (Áuria Maria)

Os entrevistados, especificamente em relação a essas falas, deixam entrever que seu idioma não é melhor ou superior ao do outro, no entanto, em outras falas, entrevistados brasileiros sugeriram que o idioma português é mais importante que o espanhol, conforme demonstrado neste capítulo.

No comércio, tanto em Brasiléia e Epitaciolândia quanto em Cobija, é mais comum os brasileiros se comunicarem em português com os bolivianos, enquanto estes, em sua maioria, sejam vendedores ou compradores, procuram falar o mais próximo possível do português, muitos falando razoavelmente bem o idioma. Esse fato não quer dizer, no entanto, que os bolivianos considerem sua língua menos importante nessa relação de contato, apenas tentam se fazer entender para melhor atingir seus interesses.

Todavia, nessas trocas linguísticas, muitos brasileiros associam a preocupação dos bolivianos em usar a língua portuguesa com a questão de uma pretensa inferioridade ou dependência em relação ao Brasil, estando assim também seu idioma numa situação hierarquicamente inferior ou menos privilegiada. Estaria, dessa forma, o uso das duas línguas fortemente ligado ao jogo de poder, ou seja, à ideologia de um grupo pretensamente dominante.

Vê-se, assim, que embora uma língua, para a sociolinguística, não possua menos valor que outra, concepção que se reflete nas falas acima citadas, nem sempre os sujeitos sociais de diferentes nacionalidades ou status social consideram essa visão, o que demonstra que a constituição de identidades linguísticas não se desatrela das políticas de representação sobre os sujeitos e grupos sociais.

3.3 - OS OUTROS: RECONSTRUINDO UMA IDENTIDADES.

A sociolinguística, as variações linguísticas postas em contato provocam a mistura e mudanças nos códigos, principalmente na oralidade, o que acontece porque os grupos que entram em contato possuem, cada um, características próprias de fala. As situações de contato exigem comportamentos verbais que podem resultar em interferência e absorção de elementos do outro código, o que pode se dá de forma consciente ou inconsciente. Os movimentos migratórios de um país para outro, ou dentro do mesmo país, constituem uma das principais causas desses comportamentos, porque a relação inter-humana se efetiva primeiramente pela língua.

No caso do Brasil e da Bolívia, conforme já foi explicitado neste trabalho, há um século ocorrem encontros e desencontros entre falantes do português e do espanhol na fronteira Acre/Pando, onde há muitas décadas realizam-se movimentos migratórios, sejam compulsórios ou espontâneos. Os seringais e, mais recentemente, a zona franca de Cobija, tornaram-se zonas de contato entre brasileiros e bolivianos que vivem fixados ou em trânsito entre esses dois países. A história do Acre demonstra como essa fronteira se tornou um espaço trabalho, convívio familiar e sobrevivência de acreanos desde o início da formação do estado. Mostra ainda como a língua constituiu uma das representações e reafirmação da identidade desses sujeitos “deslocados”.

Assegurar a identidade pela conservação e uso contínuo da própria língua, não significa, no entanto, que o sujeito em contato temporário ou permanente com o outro povo, vai negar todo e qualquer elemento da língua do outro, mesmo porque tendo contato com mais de uma língua, em nível individual ou social, o falante está automaticamente fadado a conectá-las em algum momento. Isso ocorre porque todo falante que convive com um idioma diferente do seu, mais cedo ou mais tarde, irá absorver características daquele código. O seu comportamento linguístico vai mudando diante da necessidade de interação com o interlocutor falante e usuário da outra língua.

Quando os trabalhadores extrativistas acreanos passaram a viver nos seringais da Bolívia, inevitavelmente, com o tempo, foram aprendendo o idioma espanhol, mesmo que o contato com o estrangeiro fosse pequeno. O tempo de vivência proporcionava um certo domínio para atuar nas conversas com os bolivianos, principalmente com as autoridades, ali constituídas, do porto aduaneiro e, militares do posto de comando33. Hoje, os brasileiros, especialmente, os acreanos que transitam nas ruas e comércio de Cobija, uns mais outros menos, vão aprendendo um pouco da variedade do espanhol ali falado, pela necessidade de comunicação naquela zona de contato, porém não é visível em sua fala cotidiana o uso, mesmo que inconsciente, de elementos próprios da língua espanhola.

Fenômeno diferente foi observado nas falas de entrevistados bolivianos, que apesar de admitirem que em geral só empregam o português quando falam com brasileiros, revelaram que usam, às vezes, empréstimos do português quando falam espanhol com sua família ou amigos. Quando indagados sobre usar ou não palavras ou expressões da língua portuguesa na comunicação com a família e amigos, responderam:

“Alguna vez... algún...algunas costumbres que tienen ¿no?, algunas veces.” (Rober Gallardo - taxista)

“A veces cuando estamos falando entre aquí amigos de Bolivia utilizamos a veces... algún ejemplo así como: ‘como está você?’” (Thales Zaguizi - comerciante ambulante)

“Si, a veces falo ‘menina’, ‘carro’, ‘olha’, y más unas pocas palabras.” (Hector - operador de vendas)

Ao admitirem o uso, ainda que pequeno, de palavras e frases do português na comunicação com seus familiares e amigos, esses sujeitos demonstram como se torna difícil manter a pureza da língua no contato diário e constante com outro idioma, pois a prática social de seu uso, em determinadas situações que a exigem, leva à internalização de elementos do outro código, que acaba por se tornar familiar. Essa questão aponta para a existência de certa influência da língua portuguesa na fala dos bolivianos na região fronteiriça de Brasiléia, Epitaciolândia e Cobija.

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Outro aspecto observado nas falas dos estrangeiros entrevistados foi que ao responderem as perguntas, três deles usaram o termo “brasilero(s)” e não “brasileño”, o verbo “falar” e não “hablar”, como se vê nos exemplos:

“Por la frontera ¿no?, por la relación social y económica entre brasileros y bolivianos” e “En Brasil, el portugués, porque se falo en español no entienden mucho.” (Rober Gallardo - taxista)

“...yo veo que los bolivianos tratan más de aprender portugués y que los brasileros tratan de aprender poco el castellano, español.” e “En las oportunidades que voy allí pero trato más de falar portugués porque a veces digamos trato de falar el castellano y me preguntan... ‘no entendí, no entendí’” (Thales Zaguizi - comerciante ambulante)

“Muy poco, en general, no falam español. Esperan que nosotros utilizamos su idioma.” (Hector - operador de vendas)

Nota-se que os três entrevistados apresentaram comportamento linguístico semelhante, pois apesar de responderam às perguntas em espanhol, fizeram uso de termos em português. Talvez por força do hábito de diariamente se comunicarem com brasileiros, introduzem elementos do português de forma inconsciente, sendo muitos empréstimos incorporados naturalmente às conversas, o que se notou nas em algumas dessas falas, conforme demonstrado. A ocorrência desse comportamento linguístico não quer absolutamente dizer que esses falantes estejam esquecendo o espanhol ou negando a identidade de sua língua, mas sim interagindo com outra identidade linguística.

Como falar é um ato social com todas as suas implicações, talvez o uso desses termos em português não tenha sido inconsciente, mas sim proposital para manter uma relação de interlocução com a pesquisadora, que tem como idioma o português. Isso significaria dizer que esses falantes bolivianos se preocupam com a eficácia da interlocução com o brasileiro, contrariando uma constatação já neste trabalho apresentada quanto a aparente despreocupação do brasileiro/acreano em tentar fazer uso do espanhol para se comunicar melhor com o boliviano na fronteira Acre/Pando.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em vista das leituras, pesquisa de campo e análise dos dados obtidos sobre o objeto de estudo, percebeu-se que as representações identitárias na fronteira Acre/Pando se relacionam, nesta zona de contato, dentre outros elementos, com o uso das línguas ali faladas, materializadas nas inter-relações dos sujeitos fronteiriços que se encontram e se reconhecem a partir da diferenciação ou identificação com o outro.

A pesquisa constatou que nas cidades gêmeas de Brasiléia, Epitaciolândia e Cobija brasileiros e bolivianos mantêm constantes contatos e trocas socioculturais em razão de motivações diversas, como lazer, diversões, trabalho, estudos, saúde, laços afetivos e negociações efetivadas em cenas cotidianas. Todavia, o comércio se manifesta como o elemento que proporciona maior contato linguístico entre acreanos e pandinos nessa fronteira, sobretudo por causa da zona franca instalada em Cobija.

Assim, a fronteira mostra-se não só como um espaço geográfico, mas também social e cultural, no qual sujeitos de ambas as nacionalidades têm construído experiências e dado significado para suas práticas no encontro com o outro, no contato com diferentes ideologias, costumes, crenças, línguas. São estas instituições imateriais as conexões que influenciam diretamente as identidades dos indivíduos que vivem e convivem no espaço móvel da fronteira.

Essas inter-relações efetivadas entre sujeitos do estado do Acre e do Departamento de Pando já ocorrem há pouco mais de um século, conforme evidenciado neste trabalho. Em diferentes momentos históricos, brasileiros e bolivianos conviveram, ora por meio de discursos de aproximação, ora pelo afastamento. A exemplo dos tempos de negociações diplomáticas e conflitos armados pela posse das terras acreanas; de quando, nas primeiras décadas do século XX, brasileiros se internaram no país vizinho para produzir e comercializar a borracha, e, mais intensamente quando, nas décadas de 1970 e 1980, em razão da instalação da empresa agropecuária no Acre, deu-se o deslocamento de milhares de extratores acreanos em direção aos seringais interior da floresta boliviana.

A partir da década de 1990, esses contatos ganharam uma nova dinâmica, efetivando de modo mais contundente na cidade, em vista da criação e expansão da Zona Franca de

Cobija, o que intensificou a comunicação entre brasileiros e bolivianos nesta fronteira. Assim, mais um registro histórico fora analisado na pesquisa evidenciando o entrosamento social e linguístico, dinâmico e construído entre os sujeitos na zona de contato entre as cidades gêmeas de Brasiléia, Epitaciolândia e Cobija.

Para a compreensão das relações sociais, foi necessário levar em consideração a história econômica e a dinâmica populacional dessas cidades, a fim de identificar os fatores que caracterizam hoje os contatos linguísticos dos sujeitos possuidores de culturas distintas, que convivem nesse espaço de fronteira, realizando um exercício diário de interação e aproximação, sobretudo por meio das relações econômicas.

Considerando os idiomas português e espanhol como forte elemento que possibilita as interações sociais, culturais e econômicas em espaços de circulação nesta zona fronteiriça, foi possível verificar que o uso dessas línguas se destaca como um forte elemento responsável por gerar uma identidade própria do fronteiriço. Assim, para entender e explicar, a partir das hibridações étnicas, culturais e sociais, a singularidade linguística presente na relação cotidiana dos brasileiros e bolivianos nas cidades de Brasiléia, Epitaciolândia e Cobija, buscou-se investigar de que forma os falantes brasileiros e bolivianos procuram se intercomunicar.

A pesquisa possibilitou perceber que nessa zona de contato as trocas linguísticas fazem parte da história desta fronteira, mas que há duas décadas se efetivam com maior intensidade em decorrência da Zona Franca de Cobija. Assim, partir das observações e entrevistas realizadas, percebeu-se que a língua portuguesa é mais utilizada do que o espanhol no contato entre brasileiros e bolivianos na fronteira Acre/Pando, e que especialmente dois fenômenos contribuem para esta realidade, sendo eles determinantes econômicos e socioculturais.

Em Cobija, devido ao grande fluxo de acreanos comprando na zona de livre comércio, os bolivianos empregam bastante o português quando falam com brasileiros, o que justificam dizendo que se falam em espanhol o outro não compreende. Os brasileiros, por sua vez, evitam usar o espanhol, ou porque se sentem inseguros ou porque acreditam que os bolivianos é que precisam aprender e falar em português.

Outro aspecto observado foi que nessa região fronteiriça há a presença de um sentimento apodera mento histórico de superioridade de muitos acreanos em relação aos bolivianos, os quais muitas vezes são julgados como inferiores tanto no aspecto econômico quanto linguístico e cultural, o que demonstra como os processos de representação identitária na fronteira Acre/Pando por uma real relação de poder.

De forma geral, ao longo da história dos contatos na fronteira Acre/Pando, os encontros e desencontros entre brasileiros e bolivianos possibilitaram e cada termo pressupõe a eliminação do outro. No entanto, ao analisarmos esta fronteira notamos que os contatos sociais, políticos e culturais, a cada dia, vão criando condições para que, pouco a pouco, haja uma melhor comunicação. Nota-se que nos eventos corriqueiros, os fronteiriços circulam e dialogam, de forma dinâmica, e mesmos que muitos sujeitos em alguns momentos usem o idioma do outro, continuam a falar o seu próprio idioma, preservando o elemento de maior representação identitária, que é a língua. Ao mesmo tempo em que surge a necessidade de manter vínculos, também esses sujeitos procuram fortalecer a própria identidade conservando o uso de sua língua.

Enfim, a pesquisa possibilitou afirmar que a comunicação entre brasileiros e bolivianos no fronteiriço em estudo acontece independentemente do nível de domínio do código linguístico que cada um tem da língua do outro, já que os sujeitos são capazes de se

No documento LUCIETE TELES DE SOUZA (páginas 33-46)

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