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PERSPECTIVAS DA PRÁXIS DO CANTO CORAL NA ATUALIDADE

3. Igrejas Batistas Renovadas ou Carismáticas

São igrejas que vivem uma busca de experiências crescentes ou avivamento. Seguem uma literatura própria e seus temas são geralmente os dons e as manifestações do Espírito Santo. Os cultos e o programa musical são conservadores. Portanto, o repertório é tradicional, seguindo geralmente o estilo histórico, usando o Cantor Cristão (Brasil) como fonte principal ou, em outros países, os hinários mais antigos. Uma das preocupações na liturgia é a busca por experiências espirituais, levando a um crescente envolvimento das pessoas na dinâmica do culto. Curiosamente, encontramos também igrejas renovadas que não aceitam o repertório tradicional e hinários, utilizando cânticos de comunidades ou de outros grupos de neopentecostalismo, com características rítmicas mais fortes e que alguns chamam de “cânticos de batalhas”. 4. Igrejas Batistas Abertas

São igrejas que buscam, no equilíbrio entre as tendências acima, um estilo novo para conviver com as diferenças. Não estão preocupados com um estilo só e buscam, nessa convivência com as divergências, organizar um programa alternativo. Os cultos e o programa musical são flexíveis, ora utilizando os hinos tradicionais com uma roupagem mais contemporânea, ora utilizando os cânticos verticais e até os de batalha. A literatura do programa educacional é voltada para as diversas idades, mas nem sempre segue a temática denominacional. A ênfase do trabalho prioriza as pessoas e não a estrutura, procurando envolvê- la em grupos pequenos, células ou Koinonias”. 82

Todas estas possibilidades são encontradas dentro do núcleo Batista pertencente a Convenção Batista brasileira. Ou seja, percebemos inseridos na mesma denominação diferentes raciocínios litúrgicos e teológicos.

Como já dissemos, em março de 2000 na cidade de Niterói- RJ, aconteceu o último congresso Batista em nível internacional. O encontro propôs a discussão sobre a natureza e a importância da adoração e as implicações da pluralidade sobre a identidade Batista brasileira.83 Como resultado deste encontro surgiu um documento que inicia exatamente falando desta realidade e afirmando que os Batistas brasileiros “estão conscientes da situação que vivem algumas (...) igrejas e convenções para as quais a adoração tem sido tema de debate, razão de conflitos e causa de lamentáveis divisões.”84.

Entretanto, fica transparente que, a rigor, a liderança Batista ainda não encontrou alternativas concretas que possam solucionar este estado de tensão e conflitos. Condição esta que oferece possibilidades de enfraquecimento das estruturas e conseqüentemente, da identidade.

Partindo deste cenário conflituoso podemos indagar: Quais são as lógicas que predominam neste universo Batista? Quais seriam as possibilidades das praticas tradicionais, como o Canto Coral, diante de uma igreja em transição, coexistir num espaço comum com outras manifestações contemporâneas sem que isto necessariamente seja entendido como abandono aos pilares da doutrina?

Canto Coral – Uma questão de lógica

Entendemos que do ponto vista da prática religiosa Batista, existem duas lógicas que podem ser percebidas neste contexto conflituoso e que ambas procuram estabelecer um tipo de identidade, mas é claro, cada uma emergindo de sua própria ótica e pratica.

83 O I CONGRESSO LATINO -AMERICANO BATISTA DE ADORAÇÃO, aconteceu no mês de março, de 15 a 18, no templo da PIB de Niterói (RJ). O objetivo foi o de conhecer e compartilhar aspectos da adoração e do culto Batista com líderes, pastores e ministros de música de muitos lugares do Brasil e de outros lugares. Foi promovido pela Aliança Batista Mundial (ABM) e pela União Batista Latino-Americana (UBLA). Teve a participação de preletores representando variadas correntes de cultos presentes na América Latina. Este evento aconteceu à semelhança do Congresso Mundial de Adoração, ocorrido em Berlim, de 15 a 18 de outubro de 1998. Artigo da Revista Louvor, Ano 23, vol. 3 - nº 84. 3T2000.

84 I CONGRESSO LATINO-AMERICANO BATISTA DE ADORAÇÃO, Revista Louvor, Ano 23, vol. 3 nº 84. 3T2000. p. 23

Consideraremos uma como “lógica exclusivista” e a outra como “lógica dialética”. A lógica exclusivista se caracteriza pela persistência na manutenção de antigas prá ticas e diretrizes considerando-as como sendo verdades universais e exclusivas. O exclusivista relaciona a identidade de sua denominação diretamente com a tradição de suas práticas. Diríamos que na hinologia esta lógica está fortemente presente na defesa incondicional dos hinários oficiais, das músicas do passado e da prática coral.

Os aspectos da tradição, segundo a lógica dos exclusivistas, são os que realmente se identificam com a sua denominação. Geralmente as pessoas que se encaixam neste perfil, são irredutíveis em suas posições e nutrem um sentimento de posse muito forte.

A ênfase da identidade para os exclusivistas dá-se muito mais pela tradição de uma práxis eclesiológica do que pelo conhecimento das doutrinas, teologia e da própria história denominacional.

Segundo Moreira, este é um aspecto problemático para os Batistas, pois cerca de 95% dos fiéis, incluindo pastores e outros líderes da denominação, sabem pouco ou quase nada de suas doutrinas, seus princípios, sua origem, conhecimento da vida, obra e caráter dos seus precursores 85 Diante da falta de conhecimento de sua própria denominação

Dusilek86 diz que as pessoas procuram estabelecer tal identidade somente a partir da práxis eclesiológica, sem qualquer vínc ulo com a sua própria história87 e complementa citando Hegel que diz “quem não conhece a sua história está condenado a viver sem a direção e perspectiva que ela oferece (...) aqueles que desconhecem a história estão condenados a viver sem a luz de sua memória”.88

85 ZAQUEU Moreira de Oliveira. Liberdade e Exclusivismo: ensaios sobre os Batistas Ingleses. p.13

86 Darci Dusilek é mestre em Ciência da Informação, tem vários outros cursos de graduação e pós-graduação e trabalha como pastor batista, professor universitário e escritor. Foi Presidente da Convenção Batista Brasileira; Pastor da igreja Batista de Itacuruçá, na cidade de Rio de Janeiro, e Professor do Seminário Teológico Batista do Sul, além de exercer outras atividades na denominação. Por 10 anos atuou como Diretor Executivo da Visão Mundial para o Brasil.

87 ZAQUEU Moreira de Oliveira. Liberdade e Exclusivismo: ensaios sobre os Batistas Ingleses. p. 18 88Ibid., p. 17

Os Batistas exclusivistas se identificam mais com determinadas práticas do que propriamente a seus princípios bíblico-teológicos. E neste caso o Canto Coral é uma destas práticas tradicionais que reforça a identidade, segundo a lógica exclusivista.

Uma outra lógica é entendida como a “lógica dialética” e se caracteriza pela capacidade que possui em se aproximar e dialogar com aspectos distintos num contexto plural. Com tantas possibilidades que o contexto contemporâneo oferece, os Batistas do século XXI têm pela frente o desafio da pluralidade. Estabelecer uma identidade nestas condições parece não ser uma tarefa fácil. Faz-se necessário sair do isolacionismo ou exclusivismo e redefinir a identidade a partir do diá logo com as várias possibilidades sejam teológicas, litúrgicas e musicais.

A “lógica dialética” aplicada ao aspecto litúrgico- musical vislumbra uma identidade a partir do diálogo, como por exemplo, com a cultura local. Neste caso, abrem-se possibilidades de inserção no contexto eclesial de manifestações da cultura popular que por vezes a religião rechaçou com veemência.

Entretanto, num processo dialético há o desencadear de um outro desafio que é o da aceitação, pois a tensão entre valo res do passado e do presente caracteriza-se certamente pela não aceitação da realidade de ambas as partes. Há uma rigidez que promove um estado de conflito e impede o diálogo.

Um dos pilares de sustentação da doutrina Batista é exatamente o da liberdade de consciência religiosa. Como diz Langston:

Os Batistas são um povo que tem a coragem das suas convicções. Crêem num indivíduo livre, numa igreja livre, num estado livre; crêem na competência da cada alma tratar diretamente com Deus da sua própria salvação; crêem nos direitos iguais para todos e privilégios especiais para ninguém; crêem numa democracia política, religiosa, social, econômica e educativa(...)89

89 LANGSTON. A. B. Verdadeira Democracia. p. 70 In, Israel Belo de Azevedo. A Celebração do

Este conceito de liberdade, segundo Moreira, exposto como confissão de fé Batista, foi se expandindo com o tempo e hoje pode ser entendido como algo que vai muito mais além da livre expressão de pensamentos. Deve ser entendido como um sentimento de tolerância em relação às manifestações e interpretações diferentes.90

Este princípio doutrinário parece dar suporte à “lógica dialética” ao colocar em relevo o fator tolerância. No mínimo deveria permitir com mais naturalidade o intercâmbio entre os aspectos da tradição e da contemporaneidade sem maiores sobressaltos.

Banda e Coro – Uma questão dialética

Vemos na aproximação entre o Coro e Banda uma possibilidade de diálogo. Na pratica musical dialogar significa mesclar estilos, cruzar arranjos entre a música tradicional e a música contemporânea. De repente, tirar o velho órgão e colocar a Banda para fazer o acompanhamento de um grupo coral, ou possibilitar que uma banda execute clássicos corais e assim por diante. Maraschim falando sobre a inovação cúltica, diz que “são inúmeros hoje em dia os pensadores cristãos empenhados em romper com a rigidez dos nossos livros de reza e dos nossos hinários tradicionais. Entretanto, nem sempre temos sabido o que oferecer em seu lugar”.91

Esta compreensão de “substituir” parece ser um outro fator de tensão que acaba dificultando o processo de contextualização.

Como diz Denise Frederico, a tradição pode ser considerada um patrimônio “cuja existência tem história e memória, passando de geração em geração”. As pessoas que se identificam com a música do passado, além de ressaltar o seu gosto pessoal, relacionam o seu próprio ato de culto a este estilo. Portanto, dificilmente aceitariam mudanças, daí a importância de se pensar na contextualização partindo do diálogo ao invés da substituição total e radical.

90 ZAQUEU Moreira de Oliveira. Liberdade e Exclusivismo: ensaios sobre os Batistas Ingleses. p. 22 91 JACI Maraschim. É no Corpo que somos Espírito. p. 112. In, Estudos de Religião, ano XVII, nº 24, junho de 2003, São Bernardo do Campo, SP, Universidade Metodista de São Paulo.

Mas nesta direção existem implicações que se referem à própria gênese do protestantismo brasileiro, pois os primeiros missionários estabeleceram aqui um culto caracterizado pelo distanciamento da práxis religiosa com a práxis cultural.92

Desde o início fomos doutrinados a olhar para as manifestações fora da igreja como inaceitáveis e assim estabelecemos no decorrer da história evangélica brasileira um progressivo enrijecimento entre os aspectos culturais e religiosos. Ou seja, não desenvolvemos a prática do diálogo.

Segundo Magali:

As culturas evangélicas no Brasil, desde seus primórdios no século XIX, assentaram-se sobre as bases da negação das manifestações culturais autóctones e da supervalorização do americam way of life e da cultura religiosa anglo-saxã; do autoritarismo, presente no forte clericalismo; da intolerância religiosa e do antiecumenismo de uma visão de mundo dua l em que o sagrado e o profano são antagônicos, concretizados no dualismo igreja-mundo, alicerces de um sectarismo; de um anti-intelectualismo, baseado em uma fé de certezas;

de uma religiosidade racional, com pouca ênfase na emoção; de um modo de vida rural, inserindo práticas e costumes rurais nas formas de institucionalização e organização; de uma ética restritiva nos costumes, fundada no moralismo puritano (não dançar, não beber, não fumar, guardar o domingo, adotar indumentária sóbria são exemplos de costumes a serem cultivados). 93

Este distanciamento, que dá-se em dimensões mais abrangentes como sagrado e o profano, contribuiu para que o culto protestante brasileiro se desenvolvesse fazendo clara distinção entre passado e presente, entre tradição e contemporaneidade.

92 Segundo Raymond Williams a cultura é o processo social de dar e receber sentidos, um lento desenvolvimento de sentidos comuns, formados por aquelas direções já conhecidas com as quais os sujeitos estão acostumados, mas também pelas novas observações e os novos sentidos que são recebidos e testados. RAYMOND Williams. Culture is ordinary. In, MAGALI do Nascimento Cunha: Consumo: novo apelo

evangélico em tempos de cultura gospel. p.54. – In, Estudos de Religião – ano XVII, nº 26, junho de 2004,

São Bernardo do Campo, SP: UMESP.

93 MAGALI do Nascimento cunha. Consumo: novo apelo evangélico em tempos de cultura gospel. p. 55. In, Estudo de Religião – Ano XVII, nº 26, junho de 2004, São Bernardo do Campo, SP – UMESP.

Deste modo, quando as igrejas brasileiras pensam numa renovação, logo surge a impossibilidade de diálogo que acaba por inviabilizar o processo. Maraschin ratifica esta proposição dizendo que:

...a necessidade de renovação (...) levou muita gente a pensar que só se renova na medida em que se abandona o passado. Ou melhor, que só se renova se conseguirmos abandonar as melhores tradições da igreja. Nada mais falso. Por outro lado, há muita gente que tem medo das “inovações” porque lhes parece ameaçadoras da paz eclesiástica e, portanto, do progresso da igreja. 94

Entender contextualização a partir de um processo de substituição, parece facilitar um clima conflituoso e neste caso Freddi Junior adverte que sem o diálogo:

As igrejas locais são terrenos (...) fecundos para estes conflitos, pois nelas as divergências surgem em diferentes pontos, como nas questões etárias – jovens x adultos - nas preferências estilísticas, tendências tradicionais ou renovadoras, como também inclinações eruditas ou populares e nas discussões teológicas e ideológicas, nas quais a postura se dá numa relação vertical, homem e Deus, ou em condutas horizontalistas, sociedade, cultura, etc.95

As igrejas identificadas com a tradição sentirão dificuldades de abandonar sua s expressões cúlticas históricas, seus hinários e suas músicas as quais se confundem com a própria história do grupo. Por isso que promover o diálogo entre o Coro e Banda pode ser uma possibilidade de aproximação entre tradição e contemporâneo tornando a contextualização um processo facilitado.

Nestes últimos anos, alguns esforços foram envidados no sentido de promoverem mudanças no culto protestante brasileiro. A partir do aspecto musical propôs-se a repensar uma estrutura litúrgica na qual pudesse se promover um diálogo com a cultura brasileira. Estas iniciativas, mesmo sendo ações individualizadas, representaram um sentimento que a rigor estava presente em todos os segmentos religiosos de cunho histórico.

94 JACI Maraschin. A Beleza da Santidade: ensaios de liturgia. p. 19

O que faremos a seguir é analisar dois movimentos que são considerados pioneiros e importantes no processo de contextualização do culto protestante brasileiro.

Tentativas de mudanças no culto protestante brasileiro Movimento Nacionalista

Um dos movimentos que surgiu foi o “nacionalista”,96 considerado assim pela tentativa de abrasileiramento da liturgia97 introduzindo aspectos da cultura local na estrutura do culto. A contextualização aqui era entendida a partir da inculturação, tanto que musicalmente houve uma ênfase muito forte nos ritmos considerados brasileiros, tais como: o samba, o maxixe, o baião. Também no aspecto teológico foram observadas algumas mudanças, pois as letras falam mais a partir de um contexto sócio-cultural brasileiro expressando a nossa realidade.

Os exemplos a seguir são composições consideradas bem brasileiras, pois são harmonizadas em ritmo e melodia nordestina, no caso, o baião.

96 É importante pontuar que os músicos participantes dos Vencedores por Cristo e de outros grupos estão em atividades até hoje exercendo funções em suas respectivas igrejas. Dentre estes estão: João Alexandre, Guilherme Kerr e Nelson Bomilcar.

97 Liturgia aqui entendida, segundo Maraschin, como a realização mais perfeita da experiência da vida da Igreja com Deus. Move-se, pois, entre o espaço da experiência e o espaço da revelação. Nesse movimento, estão presentes a história, portadora da tradição, a cultura, que expressa os des ejos humanos, e a arte, manifestação do poder criativo do ser humano. In, JACI Maraschin. Na Beleza da Santidade. p. 67

Este movimento, pelo menos no contexto Batista, não se tornou uma iniciativa tão abrangente e permanente, mas, foi notável a sua influência na liturgia da denominação. Alguns grupos musicais contribuíram nesta tentativa de mudanças no culto protestante brasileiro, tais como os: Vencedores por Cristo, Milad, Novo Som, Grupo Elo.

Talvez como fruto deste movimento surgiu no contexto Batista, o HCC – Hinário para o Culto Cristão - após 100 anos de um mesmo hinário o CC – Cantor Cristão. Este novo hinário surgiu, a princípio, com uma proposta de renovação que se aproximasse da realidade brasileira, entretanto ainda trouxe um repertório miscigenado e com uma maioria absoluta de músicas americanas e européias. Mas houve abertura significativa dando oportunidade a compositores brasileiros.

Outras manifestações que emergiram se localizaram em outros grupos denominacionais, com é o caso do Projeto Canteiro da Igreja Presbiteriana Independente, o Nova Canção da Igreja Anglicana e o Novo Canto da Terra. Este último movimento musical, foi o resultado dos esforços de um grupo de músicos e teólogos de várias origens protestantes.98

Estas iniciativas, porém, parecem não ter logrado o êxito desejado, pois se por um lado faltou continuidade no processo, por outro a música americana e européia continuou ditando o tom da música protestante e dominando o espaço litúrgico brasileiro.

Deste modo, suspeitamos que qualquer movimento dentro do protestantismo brasileiro que busque uma identidade musical própria, tentando dialogar com a cultura local, esbarre-se em pelo menos duas tarefas difíceis. A primeira provavelmente seria a de caráter estético e advém da dificuldade de se formular um conceito preciso de música brasileira. Devemos considerar que o Brasil, desde a sua colonização, tornou-se um país culturalmente miscigenado, fruto da presença e influência de africanos, indígenas, espanhóis, portugueses, italianos, ingleses e outros.

Tinhorão aponta para as dificuldades de se falar na existência de ações musicais nos primeiros duzentos anos de colonização. Ele afirma que neste período as manifestações musicais genuinamente brasileiras seriam somente os cantos e danças ritualísticas dos indígenas acompanhados por instrumentos de sopro.99 Porém, este tipo de música parece nunca ter sido percebida.

Outras manifestações que se constituíram em algo representativamente popular e brasileiro, tais como: a modinha, o lundu, o maxixe, o choro, o frevo, o samba e até mesmo o baião, chegaram até nós através do processo de colonização. É da fusão destas cantigas e danças que se originou o que hoje é conhecido de base da música popular brasileira. Como diz Freddi Junior “...esta música não contém uma tipologia pura. Fruto de influências e misturas, o perfil desta arte é um leque de opções, criado em território brasileiro, de caráter sincrético...”100

Se a cultura musical brasileira é tão rica em influênc ias importadas, quais os aspectos desta música poderiam ser considerados importantes para a formação de um pensamento musical evangélico e puramente brasileiro? E por quais critérios se definiriam estes aspectos? Diante destas indagações a tarefa de formatar um conceito de música brasileira tornou-se um desafio que requer ações interpretativas eficazes.

Um segundo desafio para a implantação de uma identidade musical própria mais próxima do contexto brasileiro seria de caráter teológico. E se refere à “polarização entre o sagrado e profano”. Uma dualidade que veio na bagagem dos missionários pione iros. Para Magali do Nascimento, esta teologia dualística nasceu com o protestantismo do Brasil e se caracterizou pela forte ação proselitista, como também, pela racionalidade, pela restrição aos costumes e pelo estabelecimento de uma dualidade entre: bem- mal, igreja-mundo, sagrado-profano.101

99 JOSÉ Ramos Tinhorão. Pequena História da Música Popular. p. 5

100 SERGIO Freddi Junior. Música Cristã Contemporânea: renovação ou sobrevivência. p. 49

101 MAGALI do Nascimento Cunha. Consumo: novo apelo evangélico em tempos de cultura gospel. p. 58. In, Estudos de Religião. Ano XVII, nº 26, São Bernardo d o Campo – SP: UMESP.

Um aspecto importante deste raciocínio teológico não é a supremacia de um dos pólos sobre o outro, mas o permanente estado de tensão entre eles.102

No aspecto musical, esta separação, justificada pela igreja, remonta a uma antiga e longa história de discussões, preconceitos e disputas. A musicalidade do povo sempre transitou numa linha tênue entre o sagrado e o profano103 e o protestantismo brasileiro herdou e desenvolveu com grande eficácia este aspecto teológico medieval.

Maraschin sugere que a igreja promova uma renovação litúrgica dando espaço para o que ele considera de aspectos musicais mais próximos da realidade de nossas igrejas. Ele assim diz:

A liturgia precisa se libertar da tirania dos hinários(...)

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