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2 O PRINCÍPIO DA ISONOMIA ELEITORAL APLICADO

2.2 A igualdade como princípio no Direito

A ideia de igualdade também se conecta com o Estado Democrático de Direito, cujo sistema de direitos depende da distribuição igualitária dos direitos de participação para que todos os cidadãos possam ser coautores e destinatários das decisões participando ativamente da formação da opinião e da vontade pública (GALUPPO, 2002, p. 207). Se o Estado Democrático

19 Para maiores detalhes sobre os limites do poder econômico e das funções do poder político e suas

especificidades: WALZER, Michael. Spheres Of Justice: A Defense Of Pluralism And Equality, Reprint edition. New York: Basic Books, 1984.

de Direito é essencialmente plural e precisa compatibilizar os diferentes projetos de vida, é necessário que as decisões sejam discursivamente construídas e, nesse sentido, a própria configuração a igualdade perpassa necessariamente pelo debate público que deve ser inclusivo. A igualdade seria ainda fundamento da democracia, sendo que "[...] a maior ou menor democraticidade de um regime se mede precisamente pela maior ou menor liberdade de que desfrutam os cidadãos e pela maior ou menor igualdade que existe entre eles" (BOBBIO, 2000, p. 8).

Assim sendo, a igualdade é fundamento da legitimidade do discurso jurídico no Estado Democrático de Direito, mas referida fundamentação é sempre falível ou provisória, pois "[...] a fundamentação de uma norma pode ser superada pela fundamentação de outra norma, ou seja, pela mudança dos pontos de vista dos envolvidos pelas normas jurídicas" (GALUPPO, 2002, p. 211). E não poderia ser diferente já que não há um conteúdo preestabelecido para a igualdade, pois os resultados é que demonstram a igualdade concreta.

Em célebre obra sobre o princípio da igualdade, Celso Antônio Bandeira de Mello, definiu três pontos de análise para a verificação do atendimento à igualdade que, para o referido autor, tem como principal destinatário o legislador. São eles: o elemento tomado como fator de desigualação (o que será adotado como fator discriminatório); a correlação lógica abstrata entre o fator de discrímen e a diferença de tratamento juridicamente estabelecida (fundamentação para se atribuir um tratamento jurídico específico em função da desigualdade); e a consonância da correlação lógica com os interesses constitucionalmente estabelecidos (se a justificativa abstrata se revela, na prática, em harmonia com os fundamentos constitucionais) (MELLO, 2000, p. 21/22). Uma vez verificado o desequilíbrio em relação a um destes pontos, haverá inobservância do princípio da igualdade.

Segundo Oliveira (2016, p. 455), o princípio da isonomia – ou princípio da igualdade jurídico-formal-material - é profundamente conectado com o ideal de justiça, consistindo “em um dos princípios centrais da especulação jurisfilosófica e de grande repercussão no Direito, especialmente nos sistemas jurídicos das atuais sociedades estruturalmente complexas e plurais, e culturalmente democráticas”.

A compreensão deste princípio perfaz pelo reconhecimento das cinco premissas e diretrizes mais significativas do seu núcleo semântico-normativo (OLIVEIRA, op. cit., p. 455). A primeira dessas diretrizes parte da compreensão de que “todos os sujeitos do sistema jurídico são distintos entre si em várias aspectos e dimensões (biológicos, psicológicos, sociais, econômicos, etc.)”, sendo que “as diferenças entre os indivíduos tornam cada sujeito um ser único (diferenciação real, material ou substantiva confere individualmente a cada ser”.

A partir deste cenário, destaca que “as distinções reais e inerentes aos sujeitos do Direito não podem significar tratamento jurídico privilegiado ou prejudicial”, de modo que o sistema seria responsável por “propiciar igualdade formal (tratamento jurídico equânime) em contraposição à diferenciação real” (OLIVEIRA, op. cit., p. 455).

Todavia, reconhecendo as possibilidade destas diferenças, para alguns sujeitos do Direito ou grupos sociais, serem muito acentuadas ao ponto de inviabilizar ou de dificultar “excessivamente a vida mediana de seus portadores em relação aos demais indivíduos ou grupos, causando-lhes, por consequência, segregação social, econômica e política”, o sistema jurídico ficaria autorizado a estabelecer regras de compensação das diferenças, com o intuito de atenuá-las e propiciar maior inclusão social, econômica e política entre os indivíduos e entre os grupos. O sistema deve, assim, promover desigualação formal-material (tratamento jurídico diferenciado) para estimular a igualdade substantiva. (OLIVEIRA, op. cit., p. 455).

Para tanto, as regras de desigualação (ou regras de compensação) só poderão ser positivadas e implementadas se, assim como diagnosticado por MELLO (op. Cit.), atenderem a determinados critérios. O primeiro critério é o da necessidade, para o qual “ [...] a adoção de regras de desigalação deve mesmo ser necessária para gerar maior inclusão e para reduzir a exclusão”; ou seja, “[...] sem a adoção de tais regras, a exclusão permanecerá, agravar-se-á ou apenas poderá ser superado com muito esforço e a longo prazo”. O segundo critério é o da utilidade. Explica Oliveira (op. cit., p. 455) que “[...] as regras de desigualação devem [...] ter potencialidade para alterar, efetivamente, a situação de exclusão pela atenuação das diferenças (potencialidade para produzir resultados satisfatórios)”. Por fim, o terceiro critério é o da adequação, segundo o qual “[...]as regras de desigualação devem conter os meios mais adequados possíveis para alcançar o fim pretendido (promoção da inclusão e redução da exclusão), sem provocar outros malefícios (adequação entre meios e fins)”

A última premissa identificada por Oliveira condiciona que as diferenças realmente existentes entre os sujeitos do Direito e entre os grupos sociais não poderiam servir para inviabilizar que “[...] o acesso aos institutos jurídicos (ex.: direitos e garantis) e às instituições jurídicas (ex.: Poder Judiciário)” continue sendo de “[...] de alcance universal para os sujeitos e para os grupos do sistema jurídico.” (OLIVEIRA, op. cit., p. 455).

Feitos tais esclarecimentos, retoma-se a discussão iniciado no subtópico anterior. Dentro de todas as considerações acerca do princípio da isonomia em nosso ordenamento jurídico, a argumentação aqui tecida se desdobra a partir de uma visão específica da chamada “igualdade substantiva”. Ou seja, compreende-se que a busca de formas de controle e compensações das diferenças entre os indivíduos têm como objetivo reduzir as distorções que

distanciam os cidadãos do exercício do poder político democrático. Nesta esteira o poder econômico, por exemplo, será tratado como um fator indesejado na definição dos resultados de uma eleição.