• Nenhum resultado encontrado

Igualdade de posições como condições para a igualdade de oportunidades

3.1 IGUALDADE DE OPORTUNIDADES E IGUALDADE DE POSIÇÕES

3.1.3 Igualdade de posições como condições para a igualdade de oportunidades

A igualdade de oportunidade acaba por descortinar as discriminações e injustiças existentes por detrás da modelo das posições, evidenciando as desigualdades discriminatórias não sanadas por este último. Assim, pode-se dizer que a predominância do modelo de oportunidades divide a sociedade em grupos sociais em termos de discriminação e desvantagem e não em termos de estratificações socioprofissionais e classes sociais (renda). O que passa a ficar em jogo na sociedade não são mais as instituições, mas sim a mobilização dos indivíduos, que se esforçam para obter triunfo e aproveitar suas oportunidades, que traz a vantagem de propiciar a coesão e o dinamismo, que são fatores importantes para que haja inovação (DUBET, 2012).

Do ponto de vista das minorias, é possível entender que assegurar suas posições significa encerrá-las em uma posição subordinada. Este modelo ensina que cada um tem o direito de que seus esforços e méritos sejam reconhecidos e de desejar que suas vidas não sejam um destino de antemão definido (DUBET, 2012).

Entretanto, a meritocracia, princípio em que se apoia a igualdade de oportunidades, exalta os esforços e o sucesso individual sem considerar outros fatores sociais e variáveis influentes para uma vitória ou derrota, como por exemplo: herança, diferenças educacionais, sexo, cultura, entre outros, conforme já mencionado. Diante disso, fica praticamente impossível visualizar fidedignamente o (de)mérito individual, pois este sempre surge mesclado com as (des)vantagens sociais vivenciadas pelo indivíduo (DUBET, 2012).

A realidade tem mostrado que nas sociedades onde impera a igualdade de oportunidades, as desigualdades têm se aprofundado. Isto ocorre porque este modelo concede a todos as oportunidades de aspirarem às diversas posições sociais existentes (por mais desiguais que estas sejam), sem questionar as desigualdades sociais. Assim, os que mais se beneficiam deste modelo são justamente as classes que já se encontram no topo da hierarquia social. A meritocracia então se volta para a elite, e as camadas mais baixas da sociedade, além de não conseguirem ascender, passam a ser culpabilizadas por seus fracassos. A culpa pelo

insucesso atribuída diretamente ao indivíduo fracassado, bem como a atribuição da vitória diretamente aos exitosos, exime dos demais membros da sociedade a sua contribuição para essas ocorrências, como se os indivíduos fossem livres de toda dívida social, mesmo sabendo que o êxito de alguns não seria possível sem uma contribuição coletiva. Essa contribuição está presente nas infraestruturas, na cultura e nas instituições que propiciam a multiplicação dos talentos dos exitosos para que estes alcancem sucesso. O que acaba ocorrendo é que as “vantagens adquiridas” pelas elites são mantidas e pagas por quem não as tem, sem que isso seja levado em conta (DUBET, 2012).

Por sua vez, a igualdade de posições tem como objetivo a redução das desigualdades de rendas e a aproximação das condições de vida entre as diferentes classes. A diminuição da distância social entre as classes contribui para que se eleve a igualdade de oportunidades, já que um dos indicadores da igualdade de oportunidades é justamente a mobilidade social. A ascensão social ocorre de forma muito mais fácil, quanto menor for o degrau entre as posições. Assim, a igualdade de posições passa a ser condição prévia para que a igualdade de oportunidades seja melhor alcançada. Com condições de vida mais aproximadas, a hierarquia das oportunidades ganha mais legitimidade (DUBET, 2012).

As políticas de redistribuição são o meio mais seguro de tornar as desigualdades moderadas e aceitáveis; minimizar a diferença de rendimentos se torna uma tarefa essencial no modelo das posições. Políticas de renda, de proteção e transferências sociais devem ser colocadas em prática, levando sempre em consideração o contrato de solidariedade ampliada onde todos devem a todos, recordando que o sucesso de uns não precisa advir do fracasso de outros. Dentro desta lógica, o modelo de igualdade se mostra como um projeto mais sólido e generoso quando comparado ao modelo de igualdade de oportunidades (DUBET, 2012).

Dubet (2012) ilustra a diferença entre a igualdade de oportunidades e a igualdade de posições, através de um exemplo que permite compreender de forma clara os princípios aos quais se baseiam ambas as concepções de justiça. De acordo com o autor, a igualdade de oportunidades estabelece que os filhos dos operários tenham os mesmos direitos que os filhos dos executivos de se tornarem executivos, sem colocar em questão, entretanto, as diferenças e lacunas que existem entre as posições dessas classes. A igualdade de posições, por sua vez, ao invés de prometer aos filhos dos operários as mesmas oportunidades que os filhos dos executivos possuem para se tornarem também executivos, está mais preocupada em aproximar as condições de vida desses dois grupos (DUBET, 2012, p. 12). O destino que conduz um indivíduo ser um trabalhador não é tão penoso, se o estatuto dos operários e executivos e suas condições de vida não são demasiadamente distintos. A igualdade de

posições promove mais igualdade que muitas políticas calcadas no modelo das oportunidades, pois uma sociedade menos desigual dá mais autonomia aos indivíduos - inclusive para que estes usufruam das oportunidades, “competindo” com os demais em condições e posições mais próximas (“de igual para igual”) -, do que uma sociedade na qual a igualdade de oportunidades evidencia e aumenta as distâncias (DUBET, 2012).

Não se trata de escolher, unicamente, entre um ou outro modelo de justiça, já que ambos possuem limitações e/ou contradições. O ideal é a mescla de ambos, com predominância do modelo de posições. Este atua como pré-requisito para que a igualdade de oportunidades ocorra de forma justa. Assim, para que se garanta o princípio da equitativa igualdade de oportunidades a todos, deve-se, primeiramente, minimizar as desigualdades sociais e econômicas a fim de alcançar uma vida social justa; e a igualdade de posições é a que se compromete em fazê-la (DUBET, 2012).

Sabe-se que o sistema escolar se encontra completamente inserido dentro da lógica da igualdade de oportunidades. Como já foi demonstrado, a elite escolar é composta massivamente pela elite social. Assim, pode-se afirmar que as oportunidades voltam-se aos grupos mais favorecidos; a igualdade de oferta escolar tem se mostrado cega em relação às desigualdades sociais. A próxima seção dedica-se a aprofundar este assunto, através da compreensão da democratização do ensino a partir de quatro perspectivas nas quais se fazem presentes as diversas desigualdades escolares: democratização do acesso; democratização interna; democratização das utilidades dos diplomas e democratização e equidade.