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Desde o início desta tese que temos partido do pré conceito de que vivemos numa civilização que se funda essencialmente na imagem; ora quanto mais me debruço sobre o conceito de imagem, e mais me apercebo das inovações/aperfeiçoamentos técnicos que auxiliam à sua construção, mais relevância atribuo à contribuição das definições quer de Heraclito1 quer de Platão, em que as imagens são sombras, e por sombra se tem a figuração do duplo, do outro através do mesmo. Platão, acrescenta ainda (à noção de imagem como sombra) os reflexos, “Chamo imagens, em primeiro lugar, às sombras; seguidamente, aos reflexos nas águas, e àqueles que se formam em todos os corpos compactos, lisos e brilhantes, e a tudo o mais que for do mesmo género, (...)”2. Aqui, o termo imagem deixa de evocar apenas uma representação visual para se apoiar numa semelhança, tornando a imagem, num objecto, seguindo um outro que ela representa de acordo com algumas leis particulares.

O conceito de semelhança/analogia não mais é do que um lugar sem sentido neste universo em que, quanto mais vemos, mais e melhor somos seduzidos assim como induzidos – ainda que não sejam muito banalizados os mecanismos que nos permitam vivenciar essa realidade (realidade virtual, holografia, imagens de síntese, simuladores, etc.).

A realidade apresentada no livro A Invenção de Morel, de Adolfo Bioy Casares (1987), pela antecipação, tem referências irrepreensíveis a este respeito3. Estas vivências de realidades, não seguramente verdadeiras

1 As suas reflexões desenvolveram-se em torno do “Logos” (razão). Apesar da sua preocupação se centrar

em explicações acerca do mundo que nos rodeia, Heraclito não desprezava a necessidade/importância da harmonia social para a vida. Apontava como uma falha humana a dificuldade em compreender o “Logos” – princípio universal através do qual todas as coisas estão interrelacionadas – que se manifesta e fundamen- ta pela ligação dos opostos, partindo da constatação de que «nada pode ser pensado sem o seu contrário» e que na natureza nada há de permanente senão o conflito e a mudança – aquele advir que deixa antever a célebre máxima «não nos podemos banhar duas vezes no mesmo rio». Heraclito foi também um dos primei- ros a afirmar a falácia do conhecimento que deriva dos sentidos – incapazes de nos fazer ultrapassar o nível superficial das aparências – consistindo a verdadeira sabedoria em compreender o “Logos”.

2 Platão, A República, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian (8ª edição), 1996, p.313.

3 Em A Invenção de Morel, que é um romance fantástico e um romance de aventuras, mas também uma

reflexão em torno das fronteiras da realidade, em torno do amor e da imortalidade, Adolfo Bioy Casares (publicado pela primeira vez em 1940), conta a história do perfeito multimédia, na era em que a televisão era um meio futurista. Um homem descobre que a ilha deserta onde foi parar não está completamente deserta, aparecem pessoas e paisagens, espaços, e acções, e ele observa. Tudo o que viu é uma espécie de

165. O Jardim das

Delicias (painel central do tríptico) (1500)

Hieronymus Bosch (1450-1516), óleo sobre madeira (220 x 195 cm).

(apesar de muito verosímeis) ressaltam a noção de que o receio de falsidade das imagens sempre se fez presente.

Desde os tempos de Platão que a expectativa de verdade foi assumida; quando ele questiona a imagem pintada considerando-a imitação inútil que nos afasta da verdade4. Somente a imagem reflexo, sombra (visível – eikon5) ou a matemática, são caminhos para a verdade. Aristóteles

acrescenta, na Poética, que a pintura nos leva por um caminho de verdade metafísica e transcendente, relacionando o visual (a imagem pintada) com o conhecimento, a educação e a verdade.

Na sequência da história da representação visual ocidental seguem- se afirmações como “a pintura é a verdade”de Filóstrato (1996)6 e ainda hoje a preocupação com a veracidade da imagem se coloca, principalmente pela facilidade de manipulação dos sentidos (ilusão ao nível cerebral) que as tecnologias contemporâneas permitem (como os simuladores ou as imagens virtuais). A respeito da natureza da veracidade da imagem, Pascal Engel (1989), triplica as possibilidades apresentando-as segundo: verdade como ela própria (duplo) ligada ao seu aspecto de vestígio; verdade como correspondência ligada ao seu aspecto de testemunho; verdade como coerência ligada ao seu aspecto de género.

No nosso quotidiano estamos sempre a construir imagens; ao utiliza- las estamos a interpreta-las e ao procurar percebe-las construímos significados. Por vezes os dispositivos aparentemente mais simples (cinema, publicidade, televisão, fotografia, pintura) põe à prova a nossa capacidade de interpretação, fazendo-nos crer ingénuos e incapazes de penetrar no implícito hermetismo que a “figura” mais simples encerra. O estado de conotação parece imediato.

Pretendemos expor algumas fases/estádios de comunicação, avançadas por alguns estudiosos da área da comunicação que se debruçaram sobre este assunto, na tentativa de clarificar algumas zonas e conceitos menos definidos. Assim sendo, delimitamos o conceito de imagem àquilo que se encontra visualmente traduzido sobre um suporte. Baseando-nos em diversas definições possíveis, uma vez que o termo é utilizado com tantas

cassete, uma espécie de gravação de aparelhos escondidos no sótão – apresenta-se como uma projecção tridimensional contendo todas as modalidades sensoriais, que é no fundo a invenção de Morel. A construção de uma “realidade”, que na verdade é só uma imagem dela, um signo; só denunciado na constante repetição das réplicas. Casares, Adolfo Bioy, A Invenção de Morel, Lisboa: Antígona, 1987.

4 A verdade da qual somos afastados não resulta do mundo visível mas do inteligível, respeitando a divisão

que Platão faz do mundo.

5 Eikon, significa o conceito Grego de imagem (que tem o seu correspondente no Latim – imago), que evolui

do conceito de substituição para representação.

6 Filostrato, Heroico; Gimnástico; Descripciones de Cuadros, col. Biblioteca Clásica, nº.217, Madrid: Gredos,

1996. A descrição de quadros, foi objecto, durante o Renascimento e o Barroco, de tentativas para recriar historicamente as representações das pinturas que supostamente descrevia, como no caso da gravura sobre a criança de Aquiles, com o título, Os cupidos, que foi incluída em diversas edições do séc. XVII da tradução francesa Les Images ou Tableaux de Platte Peinture des deux Philostrates, et des Statues de Callistrate, feita em 1578 por Blaise de Vigenère [veja-se uma tradução espanhola do texto “Crianza de Aquiles”, em http://www.saltana.com.ar/1/docar/0525.htm (acedido a 15 de Junho de 2004).

166. Tulip (1988), Robert Mapplethorpe, dye transfer (60 x 50 cm).

significações distintas que se torna tarefa ingrata ter de o fazer caber dentro de uma só definição.

O que é que aproxima um filme, uma foto, um cartaz, uma canção, uma imagem de marca ou uma imagem mental? Todas estas situações indicam proximidade ao visual, que depende de um sujeito para a sua produção e/ ou reconhecimento, mas nem todas estão sujeitas a um suporte.

As imagens, aparentemente, podem ser naturais ou culturais, visíveis ou imateriais, virtuais ou reais, fixas ou em movimento, sagradas ou profanas, passadas ou futuras, analógicas ou digitais..., mas o Homem parece não se importar demasiado com esta multiplicidade, o que comprova efectivamente, que existe um ponto de transferência nessas significações aparentemente tão díspares, que de certo modo as destrinça; no entanto só uma reflexão e análise poderão auxiliar na procura de um ponto de união.

A teoria semiótica, por ser globalizante, permite-nos ultrapassar as categorias funcionais da imagem. A abordagem proposta é a do ponto da vista da significação (da produção de sentido), em detrimento do emotivo ou estético, que atribui ao signo uma relação de activação da necessidade de interpretação por parte do sujeito que se apercebe do mundo que o rodeia.

A semiótica consiste em categorizar os diferentes signos e perceber as suas especificidades, organização interna e peculiaridades processuais de significação, deixando definido o campo para as imagens como o da semiologia, “L’Association internationale de sémiotique (PAIS, fondée en 1967 par A. J. Greimas) a donné très tôt la préférence au terme de «sémiotique». �ais il nous�ais il nous faut bien cependant, et en l’occurrence, appliquer un des principes de la linguistique en distinguant la règle de l’usage. Les deux termes continuent d’être employés : «sémiotique » étant plutôt compris comme une extension générale de la linguistique, comme une philosophie du langage, et «sémiologie» comme l’étude des langages particuliers (image, cinéma, peinture, littérature, etc.)”7.

A semiologia foi enunciada em 1907 pelo, linguista Suíço, Ferdinand de Saussure (1857-1913)8. Esse projecto semiológico foi actualizado quando outras disciplinas próximas se desenvolveram consideravelmente; colocando em primeiro plano a preocupação de uma disciplina semiológica que estudaria como damos sentido às coisas. Afinal como é que os homens interpretam as coisas que não são ouvidas? Essa exploração tem acontecido com alguma

7 Joly, Martine, L’image et Les Signes: Approche Sémiologique de L’image Fixe, col. Nathan Cinéma, Image,

Paris: Nathan, 2002, p.17. Esta classificação difere da atribuída por Umberto Eco que se sustentava na classificação de Charles Morris, no entanto segundo Eco, ao utilizarmos a estrutura que dividia em três aspectos a semiologia: semiótica geral; semiótica especifica; e semiótica aplicada, verificamos que seria a semiótica específica a que daria conta dos sinais particulares tal e qual os da imagem ou do cinema – cfr., Eco, Umberto, Sémiotique et Philosophie du Langage, Paris: PUF, 1988.

8 Saussure leccionou, entre outros locais, na Universidade de Genebra onde iniciou, em 1907, as lições que

deram origem ao conceito de semiologia, explanada na conhecida obra Cours de Linguistique Générale (Curso

cautela, pois tudo o que no mundo significa está sempre demasiado próximo da linguagem. Será difícil encontrar sistemas significantes de objectos no estado puro; a linguagem intervém constantemente, como substituição, mesmo nos sistemas de imagens, como títulos, legendas ou artigos. Por esses motivos, quando se afirma que estamos numa civilização da imagem, talvez se deva precisar, acrescentando, predominantemente da imagem, no sentido mais lato da mesma.

Saussure (1974), partiu do princípio que para além da língua outros sistemas de signos servem a comunicação, donde provém a “ciência geral dos signos”9 incluindo a linguística (estudo sistemático da língua) como primeiro campo de estudos.

Muitos anos se passaram até que os pesquisadores pudessem se autonomizar em relação à “supremacia do modelo linguístico” proposto por Sausurre, que ainda apresenta alguma utilidade para a compreensão de alguns tipos de mensagem. Assim sendo, no intuito de rever algumas informações históricas como tentativa de enquadrar a ideia de imagem e do que ela apresenta/representa, prossigo com algumas conclusões de Charles Sanders Peirce (1839-1914) . O facto de Peirce ter pensado numa teoria geral dos signos desde o início, incluindo a língua na tipologia geral, mas numa perspectiva ampla, permitiu-nos acercar um pouco mais da definição de imagem.

Para Peirce (1978), o signo implica uma ausência e uma presença, “A sign (...) is something which stands to somebody for something in some respect or capacity. It addresses somebody, that is, creates in the mind of that person an equivalent sign, or perhaps a more developed sign. That sign which it creates I call the interpretant of the first sign. The sign stands for something, its object. It stands for that object, not in all respects, but in reference to a sort of idea, which I have sometimes called the ground. (...)(...)”10.

O signo apresenta-se sempre como que a significar uma outra coisa implicada pela primeira, envolvendo também um lado fenomenológico com essa presença que se pode ver, ouvir, sentir, tocar (cores, gestos, linguagem verbal, música, etc), “(...)um signo mantém uma relação solidária entre pelo menos três pólos (e não apenas dois como em Saussure): a face perceptível do signo, “representamen”, ou significante; o que ele representa, “objeto” ou referente; e o que significa, “interpretante” ou significado.”11.

A semiótica actual parametriza, com alguma acuidade, o funcionamento da comunicação e da significação, desenvolvendo a apropriação das relações entre código e mensagem, signo e discurso. Embora os signos sejam o ponto de partida, eles são inseridos nas relações com códigos

9 Saussure, Ferdinand, Cours de Lnguistique Générale, Paris: Payot, 1974.

10 Peirce, C.S. The Collected Papers of Charles Sanders Peirce, ed. Charles Hartshorne and Paul Weiss,

Cambridge: Harvard Univ. Press, 1931, vol. II, p.135. - Collected Papers of Charles Sanders Peirce, Volumes I and II, Principles of Philosophy and Elements of Logic.

e enquadrados em projectos mais abrangentes (figura retórica, função narrativa, definições), como se pode verificar em Umberto Eco (1985),12o signo é usado para transmitir uma informação, para indicar a alguém alguma coisa que um outro conhece e quer que outros também conheçam. Ele insere-se, pois, num processo de comunicação deste tipo: fonte-emissor-canal-mensagem-receptor”13. Neste caso, a mensagem assume-se como a estruturação de vários signos, pois a triangulação: Significado (Interpretante); Objecto (Referente); Representamen (Significante) representa a forma dinâmica do signo enquanto processo semiótico, pois a significação depende do contexto, de

seu surgimento e da expectativa do seu receptor14.

12 “Definições do SIGNO (do lat. signum, marca, entalhe): 1. Sintomas, indício, sinal manifesto a partir dos

quais se podem tirar deduções e similares a respeito de qualquer coisa latente. Elemento característico de uma doença referido por um doente; 2. Imperfeições físicas, pequenas marcas, alguns peque-nos defeitos, cicatrizes, etc., pelos quais seja mais fácil o reconhecimento de uma pessoa e que venham citados nos documentos de identidade; 3. Qualquer marca e sinal visível deixado por um corpo numa superfície; 4. Gesto, acto ou qualquer coisa do género que manifeste um certo modo de ser ou de fazer e similar, como por exemplo dar sinais de alegria, etc. B. 5. Gesto com o qual se quer comunicar ou exprimir alguma coisa, como uma ordem, um desejo ou outra coisa do género; 6. Sinal, elemento distintivo impresso em alguém ou em alguma coisa para o poder reconhecer. Marca; 7. Linha, figura ou coisa do género, que se traça para marcar o ponto a que se chegou (donde a expressão figurada estás perto deste sinal! e a acepção de S. como «ponto» ou «grau»); ou então um ponto de referência (donde a acepção de S. como Alvo); ou a direcção e a posição querida (donde ainda Alvo). Todos os signos dessa categoria podem ser indicados com um aparente sinónimo de S., que é «Sinal»; 8. Qualquer expressão gráfica, ponto, linha, recta, curva, etc. convenientemente assumida como representando um objecto abstracto. Qualquer entidade gráfica igualmente destinada a representar um objecto abstracto, tais como números, fórmulas químicas, expressões algébricas, operações lógicas, etc. Em certos contextos chama-se também Símbolo, mas não se deve confundir com o homónimo da acepção n.° 12 ou n.° 13; 9. Qualquer processo visual que reproduza objectos concretos, como o desenho de um animal para comunicar o objecto ou o conceito correspondentes; 10. (em linguística) Processo pelo qual um conceito (ou um objecto) é representado por uma imagem acústica (como as «palavras», etc.). Às vezes, qualquer componente menor do processo precedente; 11. Cada uma das partes de um processo visual que remete para uma emissão fónica, um conceito, um objecto, uma palavra: tais como as letras do alfabeto (ou grafemas), os símbolos gráficos subsidiários (signos diacríticos), os signos da notação musical, do alfabeto Morse, Braille, etc.; 12. Símbolo, entidade figurativa ou objectual que representa por convenção ou por causa das suas características formais um valor, um acontecimento, uma meta etc., como a Cruz, a Foice e o Martelo, a Caveira (muitas vezes usada como sinónimo de Emblema, ou símbolo heráldico); 13. Símbolo, entidade figurativa ou objectual que remete para um valor, um acontecimento, uma meta não exactamente definidos, de um modo obscuro e alusivo (às vezes usado no sentido de «palavra poética»); 14. (raro elit.) Insígnia, bandeira; 15. (obsoleto) Imagem esculpida ou pintada, estátua, efígie; 16. (obsoleto) Estrela; 17. Configuração astronómica, S. do zodíaco;18. (obsoleto) Amostra de urina para analisar; 19. Em per filo e per segno: minuciosamente e com ordem; 20. Qualquer acontecimento natural assumido como manifestação de uma vontade oculta, intenção divina, fado, potências mágicas.”Eco, Umberto, O signo, Lisboa: Editorial Presença, 1985, p.13-15.

13 Eco, op. cit., p.21.

14 “(...) o cheiro de pão fresco, de uma padaria próxima; a cor cinza das nuvens é sinal de chuva; assim

como um certo gesto com a mão, uma carta ou um telefonema podem ser sinais de amizade; também posso acreditar que ver um gato preto é sinal de azar; o farol vermelho em um cruzamento é sinal de proibição de atravessar com o carro, e assim por diante. Vê-se, portanto, que tudo pode ser signo, a partir do momento em que dele deduzo uma significação que depende de minha cultura, assim como do contexto de surgimento

Os processos sígnicos, só deveriam, segundo Piaget (1896-1980), ser assim apelidados quando são reversíveis, como os processos intelectuais, quando a volta de referente ao signo seja possível15. Esta defesa de Piaget (1970), vem no sentido de completar a ideia de que os estímulos não funcionam como signos (nem devem ser tomados por eles), pois implicam reacções (coisas) de imediato, em vez de enunciar algo substituindo-o. Logo, o resultado deste processo de comunicação é reduzido, pois salta o lugar de código, não se podendo afirmar que existe significação, “o signo não é apenas um elemento que entra num processo de comunicação (posso também transmitir e comunicar uma série de sons privados de significado) mas é uma entidade que entra num processo de significação.”16.

Segundo Eco (1985), para os Estóicos o processo de significação devia permitir a distinção entre: o signo (no autêntico sentido da palavra), ou

semainon, tido como entidade física; o que é referido pelo signo ou o semainomenon, não interpretado como entidade física; e o objecto a que

o signo se refere, ou seja o pragma, que pode ser uma entidade física, uma acção ou um evento. Os signos, dispõem de uma estrutura comum que implica essa triangulação a unificá-los, apesar da sua variedade e multiplicidade.

O signo é composto por um significante e um significado, Barthes (1964), que são as duas faces da mesma moeda, sendo que o significante é um elemento perceptível e o significado a representação mental da coisa a que o signo se refere. Obviamente que uma imagem e uma palavra apresentam diferenças, mas um gesto, uma palavra, um som, uma postura corporal, podem significar, mais do que eles próprios, uma outra coisa e/ou todos a mesma coisa, tornando-se signos, “Um signo tem uma materialidade que percebemos com um ou vários de nossos sentidos. É possível vê-lo (um objecto, uma cor, um gesto), ouvi-lo (linguagem articulada, grito, música, ruído), senti-lo (vários odores: perfume, fumaça), tocá-lo ou ainda saboreá-lo.”17.

Na tentativa de clarificar algumas especificidades dos signos e da relação existente entre o referente (objecto) e significante (representamen), Peirce propôs-nos uma tipologia (colected papers, 1931-1935), onde estabelece a existência de três tipos de signos: os indícios, os ícones e os símbolos. (1) Indícios (ou índices): caracterizam-se por uma relação de continuidade

do signo. O signo pode constituir um ato de comunicação quando me é destinado intencionalmente (uma saudação, uma carta) ou me fornecer informações, simplesmente porque aprendi a decifrá-lo (uma postura, um tipo de roupa, um céu cinza), in Joly, op. cit., 1996.

15 A função semiótica, para Piaget (1970), é uma capacidade adquirida pelas crianças até aos dois anos,

que lhes permite imitar a algo ou alguém sem a presença directa do modelo (memória, imagens mentais, desenhos, descrições orais, etc.), tendo como denominador comum a estas possibilidades a capacidade de representar a realidade por um significante distinto do significado. Piaget distingue a manifestação da função semiótica de outras formas de relacionar significados. Enquanto o significante do índice é descrito como um aspecto objectivo do significado (diz-nos que no signo e no símbolo), a expressão e o conteúdo distinguem-se do ponto de vista do sujeito. Um caçador identifica os animais pelas marcas (rastos) e conclui a direcção que tomou pelas mesmas, com o objectivo de o caçar, não confundindo nunca o índice com o animal em si.

16 Eco, op. cit., 1985, p.22.

psíquica com o que representam, em que reenviam ao objecto que denotam, porque são realmente afectados por esse objecto – relação do fumo e do fogo ou da temperatura corporal elevada que pode ser sintoma de febre e de doença; (2) ícones: de carácter analógico, em que o significante mantém uma relação de similitude com aquilo que representa (referente) – tipo: imagem pintada da Virgem, dos santos e anjos ou de cenas bíblicas, usada principalmente nas igrejas orientais católicas ou nas igrejas ortodoxas; (3)

símbolos: mantém uma relação arbitrária, culturalmente instituída, com

aquilo que representam, – pomba da paz, a representação convencional da