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Por meio do relatos de viajantes como os de Adelle Toussaint, ou de pinturas como as de Debret, percebemos também a preocupação do Império de se mostrar ao resto do mundo. Não eram apenas nos grandes salões que os anfitriões e seus convivas desejavam ser notados, um país inteiro queria sair bem nas fotografias ou nas pinturas.

O imperador e seu império tiveram seus retratos desenhados ou fotografados pelas mãos de honrados pintores e pelos viajantes que por aqui transitaram. Independente da forma com que foram registradas, essas imagens foram construídas por estrangeiros que nos enquadravam ao mesmo tempo em que disciplinavam nosso olhar, “para que nós mesmos pudéssemos nos mirar nos espelhos da cultura importada de seus paises de origem”.70

A escolha da cidade do Rio de Janeiro era unânime para representar o império. Viajantes que por ali passaram ficavam deslumbrados com as belezas naturais e com a forma com que a cidade assumiu as belezas parisienses e suas formas de interação.

Para o viajante, a impressão causada pelo olhar era o que interessava de fato para garantir as suas narrativas um teor incontestável de verossimilhança, uma vez que até 1839 o daguerreótipo ainda não tinha sido apresentado. O que os olhos fotografavam eram o que iriam passar adiante em seus diários de bordo, em seus relatos de viagens. Os olhares estavam sempre atentos a cada movimento das donzelas e escravos, a cada baile e jantares, enfim, observavam e retratavam com clareza quase classificatório tipos, costumes e normas de comportamento.

Porém, a “problemática” da subjetividade causada pelo olhar pode proporcionar ao daguerreótipo o sucesso que ele teve.

A fotografia chegou ao Brasil por volta de 1840, sendo recebida com entusiasmo pelo jornal mais popular da época, o Jornal do Commercio, em 17 de Janeiro do mesmo ano.71 O daguerreótipo, como era então conhecido – imagem positiva direta em chapa de cobre, coberta por uma fina camada de prata, cuidadosamente polida e sensibilizada com vapores de

70 ALENCASTRO, Luiz Felipe (org). História da vida privada no Brasil. São Paulo: Ed. Companhia das

Letras, 1997.P. 184.

iodo – foi assim chamado para homenagear Louis Jacques Mandé Daguerre, que o apresentou na Academia de Ciências da França em 1839.

A experiência do daguerreótipo possibilitou imagens mais minuciosas e realistas, socializando retratos feitos a mão que até então se restringiam as grandes elites. O retrato fotográfico pode, no entanto, democratizar a imagem.

Por proporcionar uma representação precisa da realidade , o daguerreótipo forneceu à imagem um estatuto de técnico que lhe proporcionava objetividade e precisão, fácil manuseio, com procedimentos simples, seu uso ficou cada vez mais comum no século XIX. Sua chegada pelo Brasil foi registrada pelos jornais da época:

Finalmente chegou o daguerreótipo para cá os mares e a fotografia, que ate agora so era conhecida no Rio de Janeiro por teoria [...] Hoje de manha teve lugar na hospedaria Pharoux um ensaio fotográfico tanto mais interessante, quanto é a primeira vez que a nova maravilha se apresenta aos olhos dos brasileiros. Foi o abade Compte que fez a experiência: é um dos viajantes que se acha a bordo da corveta francesa L’Orientale, o qual trouxe condigo o engenhoso instrumento de Daguerre, por causa da facilidade com que por meio dele se obtém a representação dos objetos de que se deseja conservar a imagem [...] É preciso ver a cousa com seus próprios olhos para se fazer idéia da rapidez e do resultado da operação. Em menos de nove minutos o chafariz do Largo do paço, a praça do Peixe, o mosteiro de São Bento, e todos os outros objetos circunstantes se acharam reproduzidos com tal fidelidade, precisão e minuciosidade, que bem se via que a cousa tinha sido feita pela própria mão da natureza, e quase sem intervenção do artista.72

Nesta sociedade em que a maioria de seus habitantes era analfabeta, a necessidade da experiência visual possibilitava um novo tipo de conhecimento, mais imediato, mais generalizado, ao mesmo tempo em que era acessível e podia representar diferentes grupos sociais e não mais apenas às elites que tinham renda para financiar as pinturas de seus retratos.

A chegada do daguerreótipo pode oferecer ainda ao país mais uma maneira de se mostrar, de se representar ao resto do mundo e principalmente de mostrar que apesar de todas as mazelas, a tecnologia, o progresso material e a civilização estavam de fato ajudando a construir o ideal de um mundo novo.

Por meio de olhares, diários de bordo, pinturas e fotografias, se torna pujante o significado que a imagem possui na construção de um ideal de civilização. Como um país

pode se mostrar e ao mesmo tempo camuflar o indesejado. As imagens se tornam, portanto, narrativas que permitem transmitir o imaginário, as memórias de uma época.

As imagens do Rio de Janeiro abriam uma janela para o cotidiano oitocentista, permitindo avaliar os significados atribuídos às noções de conforto e de bem viver. Percebemos, portanto, como as imagens representadas em tal período foram relevantes para a criação e divulgação de um país que se decalca na figuração do império.

O papel da imagem era o de exaltar as belezas do Império e de seus habitantes, não visava fornecer uma cópia reconhecível dos traços da monarquia ou uma descrição sóbria de suas ações. Ao contrário, a finalidade era celebrar o império, glorificá-lo, em outras palavras, persuadir espectadores, ouvintes e leitores de sua grandeza.

Como nos lembra Solange Ferraz de Lima, a fotografia abstrai o tempo e reordena elementos do real na síntese da imagem. No caso do Rio de Janeiro imperial, as imagens eliminavam as relações sociais, justapondo-se numa colagem do real em que o progresso se equivale pelo que aparente e não por sua realidade.

Capítulo 3

Neste capitulo falaremos sobre a vida de Machado de Assis, como o nosso autor via e transcrevia a vida na corte fluminense. Como seus personagens nos fazem enxergar personagens que realmente existiram nas redondezas do Rio de Janeiro. Como os contos machadianos são capazes de extrapolar os limites de seus periódicos e livros e nos transmitem imagens de uma época e de uma sociedade que se pretendia civilizada.

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