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Alguns impactos positivos de programas de microfinanças são de difícil mensuração em razão da existência de múltiplos outros fatores que também podem influenciar as mudanças analisadas. Como exemplo, pode parecer precipitado associar a elevação dos níveis de educação e nutrição dos filhos de famílias que participam de programas de microfinanças unicamente ao ‘empowerment’91 das mulheres (mães) tomadoras de financiamentos. Todavia, é possível correlacionar esses fatos, como se mostra a seguir:

5.1 - “Empowerment” das Mulheres

HASHEMI et al (1996) estudaram o impacto das microfinanças sob o ponto de vista do empowerment das mulheres com base em oito indicadores, a saber: mobilidade, segurança econômica, habilidade de realizar pequenas compras, habilidade de realizar compras maiores, envolvimento na tomada de decisão sobre temas mais relevantes do lar, liberdade da dominação, consciência política e jurídica, e envolvimento em campanhas políticas e protestos. Segundo o critério aplicado pelos autores, uma mulher seria considerada “empowered” se cumprisse ao menos cinco dos oito indicadores.

Entre 1.225 mulheres pesquisadas em 1992, os autores concluíram que as participantes dos programas do Grameen Bank têm chances 7,5 maiores de serem “empowered”, se comparadas ao grupo de controle. No que diz respeito aos programas do BRAC, essa chance seria 4,5 vezes maior.

MKNELLY e DUNFORD (1999) mostraram que, na Bolívia, mulheres envolvidas em programas de microfinanças tinham maior participação em grupos ou associações comunitárias e maior participação em ações de aconselhamento sobre saúde, nutrição e negócios.

STEELE, AMIN e NAVED (1998), em estudo acerca dos impactos em

empowerment e fertilidade sobre as mulheres, indicaram, em Bangladesh, uma maior

utilização de contraceptivos dentre as envolvidas em programas de microfinanças do que nos demais grupos de analisados. No entanto, a análise das estatísticas sobre número de

91 Utiliza-se nesse texto o termo original do ‘inglês’ por tratar-se de um conceito mais amplo que o simples fortalecimento, uma

tradução literal. O termo empowerment designa mais do que o simples fortalecimento, pois inclui uma ampliação da capacidade de influência de um segmento, o aumento da importância de sua autoridade, indica que um determinado grupo adquiriu mais poder, mais autoridade, e até mesmo legitimidade, perante a sociedade.

nascimentos não revelou uma relação entre adesão aos programas e os índices de natalidade, no que os autores concluíram que há uma diferença entre o uso de contraceptivos e o desejo de concepção de fato. A primeira etapa desse estudo foi realizada em 1993, com 6 mil mulheres entrevistadas, e depois refeito em 1995, com 4 mil mulheres,

Com relação ao uso de contraceptivos, as participantes mais antigas do programa BRAC (mais de quatro anos), apresentavam índices mais altos de uso de métodos contraceptivos (HUSSAIN, 1998). Os créditos fornecidos aos homens, por meio do Grameen Bank, indicaram também o aumento do uso de métodos contraceptivos. Todavia, GOLDBERG (2005) sugere cautela no uso desses dados, por necessidade de atualização e ampliação desses estudos.

Com o empowerment das participantes de programas de microfinanças, a mulher passa a ter um novo papel em casa, seus filhos e marido passam a lhe dar maior autonomia e, segundo PITT et al (2001), as condições de vida da família melhoraram quando as mulheres participantes de programas como BRAC e RD-12 passaram a controlar as finanças do lar.

No que diz respeito aos aspectos nutricionais, PITT et al (2001) detectou, em Bangladesh, um significativo impacto positivo sobre o nível de nutrição das crianças, em casos de tomada de empréstimos por mulheres. O caso torna-se relevante porque, analisados os empréstimos tomados por homens, não se encontrou impacto positivo estatisticamente relevante.

Ainda segundo PITT et al (2001), o estudo não só mostra o impacto na renda disponível dos tomadores de crédito, mas também a relevância em se analisar o empowerment da mulher na gestão desses recursos. Constata-se que as crianças, em um lar onde a mãe passa a tomar crédito, passam a se sentir melhor, muito em razão da priorização em dispêndios com escola e saúde para os filhos.

“Outros trabalhos já vêm demonstrando que o efeito de programas de crédito focados em mulheres abrange, educação das crianças, gastos, controle de fertilidade e gestão do patrimônio”. (PITT et. al, 2001).

5.2 - Microfinanças e as Metas do Milênio

Publicações e pesquisas mais recentes reconhecem nos programas de microfinanças um dos principais caminhos para o cumprimento das Metas de

Desenvolvimento do Milênio (Millennium Development Goals92), lançadas pela Organização das Nações Unidas.

Segundo LITTLEFIELD et al, diversos estudos, de natureza quantitativa e qualitativa, podem ser citados para demonstrar que as Metas do Milênio podem ser atingidas, em parte, pela promoção de programas de microfinanças, em particular no que tange a erradicação da pobreza, educação infantil, melhoria da saúde das mulheres e das crianças, e o fortalecimento das mulheres.

Entre os impactos positivos de programas de microfinanças citados no estudo de LITTLEFIELD et al, merecem destaque aqueles relativos à erradicação da pobreza, tais como:

• Programa CRECER, da Bolívia: renda de dois terços dos mutuários cresceu depois que passaram a integrar o programa;

• Programa Freedom from Hunger, de Gana: pessoas que participaram do programa apresentaram crescimento de renda duas vezes maior que as demais; • Estudo do Banco Rakyat, na Indonésia, demonstrou que clientes de microfinanças aumentaram sua renda em 112%, e que 90% dos lares reportaram ter saído da pobreza.

• Estudo sobre o programa SHARE, da Índia: três quartos dos clientes que participaram do programa experimentaram mudanças significativas em seu bem-estar econômico.

• Relato sobre o Zambuko Trust, no Zimbábue: clientes extremamente pobres que participaram do programa tiveram incremento do consumo de alimentos com alto teor protéico.

• Estudo detalhado sobre o programa BRAC, em Bangladesh: clientes que permaneceram no programa por período superior a quatro anos aumentaram as despesas de seus lares em 28% e seus ativos em 112%.

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São oito as Metas do Milênio: (1) erradicação da pobreza e fome extremas; (2) alcançar educação primária universal; (3) promoção da equidade de gênero e o fortalecimento do papel das mulheres; (4) redução da mortalidade infantil; (5) melhoria da qualidade de saúde das mães; (6) combate ao HIV/Aids, malária e outras doenças; (7) garantir a sustentabilidade ambiental; e (8) construir uma parceria global pelo desenvolvimento.

PARTE C

Esta parte do trabalho descreve e analisa os dados coletados na pesquisa de campo em três unidades do São Paulo Confia. Primeiramente, apresento arcabouço teórico sobre avaliação de impactos em programas de microcrédito e a metodologia utilizada nesta pesquisa. Na seqüência, apresento o Programa São Paulo Confia, objeto deste estudo, descrevo o processo de coleta de dados, bem como as variáveis utilizadas na pesquisa. Por fim, faço análise financeira e estatística do banco de dados coletado.

1 – ARCABOUÇO TEÓRICO DE AVALIAÇÃO DE IMPACTOS EM PROGRAMAS DE