• Nenhum resultado encontrado

A IMPLANTAÇÃO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA

Embora a implantação da Justiça Restaurativa enquanto política pública nos tribunais brasileiros tenha ocorrido em 2016, os projetos de Justiça Restaurativa encontravam-se por quase todos os estados brasileiros há mais tempo. Em pesquisa à produção de artigos científicos para a elaboração deste estudo, observou-se que a adoção de meios alternativos de resolução de conflito no acesso à justiça em Santa Catarina remonta o ano de 2003, na comarca de Joinville, na modalidade de projeto piloto. Denominado “Projeto Mediação”, esse foi criado por meio da Portaria nº 05/2003, na Vara da Infância e Juventude, voltado para os adolescentes autores de ato infracional, sob a responsabilidade do Juiz, Dr. Alexandre Morais da Rosa. O objetivo era atuar nas questões que envolvessem adolescentes autores de atos infracional, seus responsáveis, vítimas e comunidade. O trabalho era subsidiado com técnica de mediação, e orientado conforme os art.150 e art. 151 Estatuto da Criança e do Adolescente. Originalmente o projeto começou com a atuação dos profissionais de serviço social, direito, psicologia, orientadora educacional, comissário da infância e demais atuantes das unidades, indicados pelo juiz.

Esse projeto ficou mais tarde denominado Justiça Restaurativa. Seguindo esta linha, no ano de 2011 por iniciativa da Coordenadoria Estadual da Infância e da Juventude (CEIJ) do Tribunal de Justiça de Santa Catarina foi criado na Vara da Infância e da Juventude da Capital, um projeto piloto de Justiça Restaurativa como objetivo ao atendimento dos adolescentes em conflito com a lei, de cunho pedagógico, baseados nos pressupostos da Justiça Restaurativa. O piloto começou com a parceria do Ministério Público, a Secretaria da Segurança Pública e os cursos de graduação em Psicologia e em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul). O projeto teve como proposta de ação, segundo sua constituição as seguintes diretrizes:

a) o atendimento aos adolescentes em conflito com a lei por meio de práticas restaurativas, como preconizam o artigo 35, incisos II e III, da recente lei do Sistema Nacional Socioeducativo – Lei n.12.594, e as diversas normativas internacionais, com a Resolução n. 2002/12 do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, que trata sobre os “Princípios básicos para utilização de programas de justiça restaurativa em matéria criminal”;

b) a reinserção social e familiar do adolescente autor de ato infracional;

c) o encaminhamento desses adolescentes a programas de aprendizagem profissional ou de inserção profissional (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, s.d.).

A partir de 2015 o Tribunal de Justiça desenvolveu importantes ações relacionadas à construção do Projeto de Justiça Restaurativa, com vistas a disseminação da cultura reparadora e ao estímulo de novas adesões por parte de magistrados, servidores e comunidade e instituições parceiras, ora fomentada.

Constatou-se que poucos dias depois da publicação da Resolução nº 225/2016, que trata sobre a Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário Nacional, a Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude (CEIJ), enquanto setor técnico responsável pela implantação da Justiça Restaurativa em âmbito institucional, promoveu reunião técnica para debater o teor da referida norma, denotando a acolhida institucional do Poder Judiciário no sentido adotar a Justiça Restaurativa enquanto Política Pública para o atendimento dos jurisdicionados.

Assim, em prosseguimento a construção do projeto de Justiça Restaurativa, a citada Coordenadoria participou do Curso de Formação para Ingresso na Carreira da Magistratura, na Academia Judicial, quando apresentou aos novos juízes integrantes do Poder Judiciário experiências restaurativas e da área da infância e juventude, sentido de demonstrar a importância da Justiça Restaurativa no uso de solução dos conflitos dos jurisdicionados que chegarão para suas decisões, no futuro breve.

Em busca de informações disponíveis no site do Poder Judiciário, examinou-se que dentre as principais ações em direção à concretização da política pública, foram realizados seminários e capacitações específicas, em que importantes convidados, como a norte- americana Janet Murdock, especialista com passagem pela United Nations Development Programme (UNDP), órgão sediado em Nova Iorque e ligado à ONU, foi chamada a trazer seus ensinamentos.

Em 2017, a Academia Judicial ofereceu Curso de capacitação em Justiça Restaurativa para formação facilitadores em Círculos de Construção de Paz, com a presença dos professores canadenses Aaron Lyons, integrante da Community Justice Initiatives Association, e Dorothy Vaandering, da Memorial University of Newfoundland, bem como nomes nacionais conhecidos, como a psicóloga Mônica Mumme compuseram uma plêiade de especialistas referências no assunto. Desta formação surgiram os Grupos Gestores dos respectivos núcleos, e consolidou-se o Núcleo de Justiça Restaurativa na capital, e a implantação do projeto na comarca de Lages.

Mais tarde, em 2018, o professor Theofilos Rifiotis, do Departamento de Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com escopo de firmar parceria no que diz respeito à Justiça Restaurativa e gênero, mais especificamente

relacionado a Lei Maria da Penha palestrou para servidores e interessados com finalidade debater os preceitos e as práticas restaurativa, e interface com questão de gênero. Extrai-se da página da instituição que: “A ideia do projeto apresentado pelo professor é estudar as práticas restaurativas no âmbito da Lei Maria Penha e traçar um diagnóstico das possibilidades e limites de atuação do próprio Judiciário” (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, 2018, on-line).

O juiz Alexandre Karazawa Takaschima, titular da 2ª Vara Criminal de Lages e coordenador da Justiça Restaurativa naquela comarca, reuniu-se nesta tarde (16/2) com diversos agentes atuantes na área e com o professor Theofilos Rifiotis, do Departamento de Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), para formalizar parceria que resultará em troca de experiências relacionadas à violência de gênero. A ideia do projeto apresentado pelo professor é estudar as práticas de justiça no âmbito da Lei Maria Penha e traçar um diagnóstico das possibilidades e limites de atuação do próprio Judiciário [...] (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, 2018, on-line).

Um notável impulso deu-se quando em 9 de outubro de 2019 foi assinado o Acordo de Cooperação n. 165/2019, conduzido pelo Tribunal de Justiça com a participação do Poder Executivo, Ministério Público Estadual, Defensoria Pública Estadual, Ordem dos

Advogados do Brasil (OAB), Federação Catarinense de Municípios

(FECAM), Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL). O acordo firmado em prevê a cooperação entre os envolvidos com a finalidade, dentre outras, estabelecer um protocolo de implantação e expansão da Justiça Restaurativa, enquanto política pública, e criar um Grupo Gestor de Justiça Restaurativa no Estado de Santa Catarina (GGJR-SC) e o Plano de Trabalho Estadual da matéria. Concernente a execução do Acordo de Cooperação, nele estabelece-se que:

Cláusula segunda. Para a execução do objeto acordado, fica criado, por meio deste acordo de cooperação, o Grupo Gestor de Justiça Restaurativa no Estado de Santa Catarina (GGJR-SC), composto por representantes dos signatários, com o intuito de criar, implantar, implementar e avaliar Plano de Trabalho Estadual (PTE), cronograma e mapa de irradiação, e demais instrumentos necessários para sua efetiva ação. § 1º As reuniões ordinárias do GGJR-SC ocorrerão a cada 2 (dois) meses, podendo, a qualquer tempo, ser designada reunião extraordinária. § 2º O Plano de Trabalho Estadual (PTE), e anexos, será construído em até 6 (seis) meses, e integrará o presente acordo. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, 2019a).

Quanto ao recurso financeiro para a execução do plano consta que:

Cláusula sétima. As despesas decorrentes do objeto deste acordo de cooperação correrão à conta de dotações próprias dos cooperantes, de acordo com as responsabilidades assumidas, sendo que não haverá a transferência de recursos

financeiros. Parágrafo único. Os serviços decorrentes do presente acordo de cooperação serão prestados em regime de cooperação mútua, não cabendo aos partícipes quaisquer remunerações pelos mesmos (TRIBUNAL DE JUSTIÇA SANTA CATARINA, 2019a).

Concernente ao prazo da cooperação, o tempo estipulado designa que “O prazo de vigência deste acordo de cooperação é de 60 (sessenta) meses, contados da data da assinatura, podendo ser prorrogado, a critério dos cooperantes, mediante assinatura de aditivo” (TRIBUNAL DE JUSTIÇA SANTA CATARINA, 2019a).

Cabe ressaltar que o principal passo dado pela justiça catarinense, aconteceu em 6 de novembro de 2019 com a disposição da Resolução TJ nº 19, e o exposto no Processo Administrativo nº 12051/2016, que por deliberação do Órgão Especial, instituiu a Justiça Restaurativa no Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina, conforme consta no Art 1º da referida resolução: “Fica instituída a Política de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina”, a qual tem “o objetivo de alinhar diretrizes de incentivo e expansão das práticas restaurativas nos termos da Resolução 225, de 31 de maio de 2016, do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre a Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário” (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, 2019b).

Art. 2º São diretrizes da Política de Justiça Restaurativa no Estado de Santa Catarina:

I - a disseminação da cultura das práticas restaurativas na sociedade;

II - a articulação interinstitucional para estabelecer parcerias para difundir a justiça restaurativa;

III - a formação de gestores, facilitadores e multiplicadores na área da justiça restaurativa; e

IV - a implantação e a expansão da justiça restaurativa no Poder Judiciário do Estado (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, 2019b).

Pode-se deduzir que as diretrizes gerais da política restaurativa recentemente criada no Poder Judiciário guarda aproximação com as atribuições determinadas na resolução maior, que criou a Justiça Restaurativa como política pública judiciária.

Documentos relacionados