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3. TRAJETÓRIAS DE IMPLEMENTAÇÃO DOS PROJETOS ESTUDADOS:

3.3. O P ROGRAMA D E B RAÇOS A BERTOS

3.3.3. Implementação e Arranjo intersetorial

A parte mais fácil da construção de um trabalho intersetorial é falar dele; eu vou falar, você vai escrever, vai ficar lindo! Contudo, na prática, qualquer construção coletiva tem sua complexidade (DBA_ME_SMS 1).

Apesar de ter sido lançado em janeiro, o decreto de institucionalização do DBA foi publicado em abril de 2014 (Decreto nº 55.067). Uma das definições do decreto foi a criação do Comitê Gestor, do qual deveriam participar diretamente os secretários e seus adjuntos77. A escolha de envolver o alto escalão foi justamente porque já estavam acompanhando o desenvolvimento do programa, reforçando a centralidade do programa na agenda municipal. Segundo entrevistados, no início esse comitê chegou a se reunir toda semana, depois quinzenalmente. Conforme o programa foi sendo consolidado e as decisões se tornaram menos estruturantes, o intervalo entre reuniões chegou a ser de dois meses.

Apenas em novembro de 2015 instituiu-se uma coordenação para o programa (portaria 1752/2015 de SGM), a qual definiu que o DBA teria um coordenador e representantes indicados pelas secretarias, o que oficializou os pontos focais já mencionados78. Sendo assim, a relação

entre esses atores antecedeu a formalização dessa instância. A coordenação era uma demanda de atores envolvidos: “Pedimos [a coordenação] para o prefeito porque a gente se esbarrava. Se estou no mesmo patamar da colega da saúde, quem vai mandar em quem? ” (DBA_ME_SMADS1). Inicialmente, a coordenação não ficou vinculada a nenhuma pasta específica.

Dali em diante, essa coordenação executiva79 passou a se reunir semanalmente para articular e discutir questões. Apesar de englobar o médio escalão, essa foi considerada a instância mais importante do programa, porque tratava das questões políticas, de gestão, e filtrava o que deveria ser tratado no comitê gestor. Em geral, as decisões que precisavam ser levadas ao alto escalão eram as que envolviam custos adicionais ao programa.

Essa coordenação possuía um local no território, conhecido como casa da coordenação80, criado justamente para ser um espaço intersecretarial próximo ao cotidiano do programa. Nesse local, o fluxo de pessoas variava bastante, porque em geral os burocratas de

77Das seguintes secretarias: Secretaria do Governo Municipal; Secretaria Municipal da Saúde; Secretaria

Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social; Secretaria Municipal de Segurança Urbana; Secretaria Municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Empreendedorismo; Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania; Secretaria Municipal de Habitação.

78 Cada representante de médio escalão ficou conhecido como coordenador do DBA de sua respectiva secretaria.

Sendo assim, o DBA tem os coordenadores dos setores e um coordenador geral.

79 Os indicados de cada secretaria, do médio escalão, são conhecidos como coordenadores de ponta. 80 Al. Dino Bueno, 454.

nível de rua e médio escalão circulavam entre as sedes de suas respectivas secretarias, a tenda do DBA, os equipamentos públicos e a própria rua.

Além dessas duas instâncias, eram realizadas as reuniões dos trios (burocracia de nível de rua do programa que acompanhava diariamente os beneficiários) também semanalmente. Essa reunião foi instituída com o objetivo de alinhar e fazer a coordenação desses atores. Em um primeiro momento serviu para discussão de casos e dificuldades pontuais da atuação desses burocratas, contudo, a gestão consolidou esse espaço como um momento de formação dos agentes implementadores. A Figura 2 apresenta as características das três instâncias intersetoriais do DBA:

Figura 2 - Instâncias Intersetoriais do DBA

Fonte: Elaboração própria a partir de normativos e entrevistas.

Ao longo da implementação do programa, a figura da coordenação mudou algumas vezes, e, como supracitado, foi oficializada apenas ao fim de 2015. Entretanto, o DBA teve dois coordenadores informais anteriores ligados ao gabinete do prefeito. No início de 2014 foi realizada a transição da coordenação da SMS, que estava à frente do GEM, para um coordenador da Secretaria do Governo Municipal (SGM), devido à percepção de que as secretarias setoriais não deveriam coordenar o programa. No entanto, a pessoa indicada, a qual tinha recém-saído do gabinete da Subprefeitura da Sé, não possuía muita afinidade com o programa nem com o fato de ser coordenador do mesmo.

Após esse período, assumiu o Capitão Renato, da PM, que ficou ligado ao gabinete do prefeito, e coordenou o programa entre outubro de 2014 até início de 2015. Por ser Capitão, a

esse coordenador foi atribuído um papel específico de negociar o desmonte de novas barracas montadas na região. Entretanto, no dia do desmonte, após mais de 80 pessoas serem cadastradas para se tornarem beneficiárias do DBA, ocorreu um confronto com a PM e duas pessoas foram feridas81. No dia seguinte, o Capitão Renato deixou a coordenação, que ficou vaga entre abril e

julho.

O Capitão Renato veio com essa função de desmontar essas barracas, sem violência. Aí ele veio conhecer, ver onde estava pisando, só que ele gostou muito e teve um papel fundamental na articulação. [...], mas foi muito difícil também, porque quando ele termina o desmonte das barracas, teve no último minuto – faltava uma barraca, uma carroça – um confronto com a PM. Ele ficou bem cansado, e entendeu que já tinha feito seu papel e pede para sair. Ele ficava aqui o dia inteiro, como ele era Capitão, ele entendia coisas que às vezes a gente não entende, ou nem quer entender (DBA_ME_SMADS1).

Após esse período, foi nomeado como coordenador Benedito Mariano82, o qual ficou até o final de 2016. Nesse tempo, a coordenação foi formalizada e Mariano foi convidado para assumir como secretário municipal de segurança urbana, acumulando assim as duas funções. Entrevistados ressaltam que Mariano empenhou grande esforço para aprimorar a sistematização, organização e restruturação de algumas ações do DBA. Foi nesse período que se efetivou o cadastro dos beneficiários, as instâncias de coordenação, a atuação dos trios, e a expansão e a gestão 24 horas dos hotéis. Entretanto, entrevistas apontam como um pouco problemático o acúmulo dos cargos de coordenador e secretário, tanto pela quantidade de atribuições, quanto pela vinculação da coordenação à pasta de segurança urbana.

Todas as secretarias entrevistadas reforçam a importância da coordenação e da centralização de decisões e fluxos na figura de um coordenador. O principal papel destacado para a coordenação do DBA é estabelecer a ponte para dentro e fora do governo, fazendo a relação com todos os escalões, no cotidiano do programa e nas instâncias intersetoriais. Ademais, a coordenação centraliza demandas de imprensa e representação institucional, o que antes era uma questão, pois os pedidos chegavam pelas diversas secretarias e muitas vezes as respostas eram de acordo com a perspectiva de cada uma.

81Folha de São Paulo. ‘Prefeitura de São Paulo faz ofensiva contra 'favelinha' da cracolândia’.

http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/04/1622597-prefeitura-de-sao-paulo-faz-ofensiva-contra- usuarios-na-cracolandia.shtml.

Prefeitura Municipal de São Paulo. ‘Prefeitura pactua retirada de “favelinha” na Luz e reabre a praça Júlio Prestes’. http://www.capital.sp.gov.br/portal/noticia/5588#ad-image-0

82Benedito Mariano, sociólogo, foi secretário de Segurança Urbana de São Paulo, Osasco e de São Bernardo do