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Destaca-se claramente que, para a maioria dos estudantes, a importância da educação infantil para a formação da criança está relacionada à perspectiva da escola como a instituição de formação curricular (60%). Em muito menor número, encontram-se os entrevistados que valorizavam a escola da educação infantil como
meio de formação social (30%). E proporcionalmente apenas um em dez
estudantes ressaltaram a importância da escola como lugar de formação da
personalidade (10%). Embora a ideia de formação integral, que compõe as
dimensões do cognitivo, do social e do pessoal, seja bastante difundida no pensamento educacional que fundamenta a formação dos estudantes de pedagogia, o que se sobressai é a imposição da cultura do currículo escolar na perspectiva dos adultos, definido especialmente pela abordagem pedagógica e pela organização didática tradicionais.
Aparentemente, entre os estudantes entrevistados há uma contradição de noções, com o nítido domínio da visão da formação curricular como o mais importante da Educação Infantil para a formação da criança, com os números bem menores para a concepção/visão educativa de criança e de infância. E isso, mesmo após o ingresso no curso de pedagogia.
Todavia, esse paradoxo pode ser entendido como a expressão do indiscutível papel social e até da exaltação da importância do espaço escolar coletivo para a formação da criança como objeto de ensino e sujeito de aprendizagem. Ao mesmo tempo se admite os limites da visão educativa como imposição escolar na perspectiva do adulto, justamente na Educação Infantil, assimilando-se, em contrapartida, um maior reconhecimento da visão individualizante de criança como indivíduo e ser social específico, isto é, a participação da criança na própria educação.
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3.3. SOCIALIZAÇÃO DE CRIANÇAS, PAPEL DA PROFESSORA E AÇÃO DA ESCOLA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Agora, apresento e analiso as questões focalizadoras, ou seja, perguntas claramente voltadas para o foco da formação acadêmica e profissional direcionado aos conhecimentos e às competências esperadas de uma professora da educação infantil, tal como prevê a habilitação do curso de pedagogia para esse campo de trabalho. A partir de questões fundamentais, no sentido teórico e prático, como socialização de crianças, papel da professora e ação da escola na educação infantil, pretendo tratar de concepções e entendimentos que consideraríamos como categorias de entendimento, orientadas especialmente por fundamentos sociológicos e psicológicos, mais consequentes com a condição de estudantes avançados, ou veteranos, no curso de pedagogia.
Supõe-se que com a bagagem de conhecimentos adquiridos no decorrer do curso, como uma espécie de capital cultural acadêmico específico, além da experiência vivida no estágio, os estudantes entrevistados pudessem focalizar melhor conteúdos relacionados à Educação Infantil, assim como relatar fenômenos de tipo sociológico na prática de educadores de crianças. Assim, com a suposição de que muitos pressupostos curriculares da pedagogia já estivessem, em diferentes estágios, assimilados, acredito que as respostas tenham refletido o pensamento corrente entre os estudantes entrevistados, que considerei pertinentes e em conformidade à média dos estudantes de pedagogia. De fato, espera-se dos estudantes veteranos no curso de pedagogia que já tenham incorporado aspectos como socialização, papel do professor, gestão escolar, especialmente didática e atividades próprias da Educação Infantil e da interação com crianças em sala de aula.
Como questão inicial inescapável, o reconhecimento social que possa informar um diagnóstico pedagógico do grupo da sala de aula, colocou-se para os entrevistados a pergunta: “Como você percebe a socialização das crianças na Educação Infantil?” Após a leitura das respostas, foi possível identificar trechos ou fragmentos significativos que me pareceram revelar os indícios das categorias de percepção do processo de socialização que estavam presentes nos estudantes. Assim, a partir de trechos e fragmentos das falas, proponho as seguintes categorias:
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Visão coletivista: relaciona a socialização das crianças com aspectos sociais coletivos da interação entre os pares e das relações do grupo com os professores;
Visão subjetivista: associa a socialização com aspectos subjetivos das crianças, como sujeitos particulares identificados com seu desenvolvido psicológico individual;
Visão interacionista: vê a socialização das crianças como o resultado de uma interação entre a experiência social coletiva e o comportamento psicológico particular.
Quadro 7
Como você percebe a socialização das crianças na Educação Infantil?
Trechos ou fragmentos significativos por categorias
VC - VISÃO COLETIVISTA (8)
As crianças estão o tempo todo interagindo, trocando experiências e aprendizados.
Através das brincadeiras, das leituras as crianças têm a oportunidade de fazerem muitas trocas.
A partir do momento que ela começa a conversar com as outras crianças, a brincar, fazer amizade, a gostar umas das outras, aí acredito que tem a ver com a socialização.
Mesmo com brigas é o momento das crianças se relacionarem. Aprendizado de comportamento.
As crianças desse grupo ainda batem umas nas outras.
As crianças são mais participativas entre elas e com os professores. Elas brincam, interagem e correspondem a expectativas da professora. VS - VISÃO SUBJETIVISTA (7)
Essa socialização não é uma coisa pensada, uma coisa ali que surge na vida dela.
A socialização das crianças é bem distinta.
Tem a questão do egocentrismo na disputa do que ela quer. Você tá falando em relação à forma delas falar...
Crianças egocêntricas que na maioria das vezes brincam sozinhas e querem tudo só para ela.
Na minha experiência no berçário não vi processo de socialização. Nesse período, passam pela fase do egocentrismo.
VI - VISÃO INTERACIONISTA (4)
É exatamente esse aprendizado... de comportamentos, de estímulos, porque se eu bato palma, ou então uma criança bate palma, outro já acompanha. A maioria delas, são abertas ao novo, a descoberta.
Acho que socialização é aquilo que traz o comportamento, as características das crianças na educação infantil.
Fundamental, pois desde pequena a criança deve ser adaptada a viver em sociedade.
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Como se pode ver no Quadro 7, no conjunto das expressões captadas dos entrevistados (19), viu-se um número maior de trechos/fragmentos identificados com uma visão coletivista (8), mas muito próximo daqueles com uma visão subjetivista (7), enquanto a visão interacionista obteve um número bem menor (4).
No Gráfico 3, a seguir, se destacam os pesos relativos próximos da Visão Coletivista (42%) e da Visão Subjetivista (37%), diante de uma percepção menor da Visão Interacionista (21%). É como se houvesse uma alternância ou uma divisão de percepção entre o social e o individual, entre o coletivo e subjetivo, talvez como instâncias separadas, no tempo e no espaço da sala de aula, na experiência de socialização das crianças na educação infantil.
Gráfico 3
n=19
Entretanto, parece ocorrer uma sensibilidade menor à percepção integradora entre essas instâncias, que seria a perspectiva interacionista na dialética entre o coletivo e o subjetivo. Embora muitos dos educadores clássicos (Piaget, Vygotsky, Dewey, Freire) abordados no curso de pedagogia proponham justamente uma visão interacionista como forma de superar a fragmentação entre o social e o psicológico, os estudantes em formação ainda mostram uma clara dicotomia na percepção da socialização infantil.
Visão Coletivista Visão Subjetivista Visão Interacionista 42%
37%
21%