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A importância da força extra-econônica do Estado capitalista no processo de circulação das

Os possuidores das mercadorias não têm escolha entre aliená-las ou não no mercado, pois, para eles as suas mercadorias não têm qualquer valor de uso direto. Elas têm valor de uso somente para outros. Elas são para seu possuidor um não-valor de uso e, ao mesmo tempo, ao serem vendidas, se tornam valor de uso para aquele que as comprou. Para seus possuidores, as mercadorias possuem valor de uso somente porque elas são portadoras de valor de troca. Portanto, eles são obrigados a leva-las ao mercado para serem trocadas por uma determinada quantia de dinheiro como pagamento pelo valor de uso imanente a elas.

Nesse momento, no mercado, as mercadorias realizam o sonho de seus guardiões. Mas o processo de intercâmbio ainda não acabou. O antigo possuidor da mercadoria agora é possuidor de uma mercadoria monetária, o dinheiro, e procurará trocá-lo por outros bens que para ele possuem valor de uso. O processo de intercâmbio de mercadorias se amplia em infinitas e sucessivas séries de trocas. As mercadorias passam então por infinitas transformações, trocando constantemente de corpo para realizar os anseios dos seus donos. Marx comenta:

O processo de intercâmbio da mercadoria opera-se, portanto, por meio de duas metamorfoses opostas e reciprocamente complementares - transformação da mercadoria em dinheiro e sua retransformação de dinheiro em mercadoria. Os momentos da metamorfose da mercadoria são, ao mesmo tempo, transações do possuidor de mercadoria - venda, intercâmbio da mercadoria por dinheiro; compra, intercâmbio do dinheiro por mercadoria e

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unidade de ambos os atos: vender, para comprar. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 92.)

O processo de intercâmbio da mercadoria se completa da seguinte forma: Mercadora - Dinheiro - Mercadoria

M - D - M

No primeiro estágio da transformação, M - D, a mercadoria precisa realizar o que Marx chama de salto mortal. A mercadoria precisa realizar seu valor no corpo da outra mercadoria, o ouro. Marx observa:

Caso ele [o salto] falhe, não é a mercadoria que é depenada, mas sim o possuidor dela. A divisão social do trabalho torna tão unilateral seu trabalho quanto multilaterais suas necessidades. Por isso mesmo seu produto serve-lhe apenas como valor de troca. Mas ele somente obtém a forma equivalente geral, socialmente válida, como dinheiro e o dinheiro encontra-se em bolso alheio. Para tirá-lo de lá, a mercadoria tem de ser, sobretudo, valor de uso para o possuidor do dinheiro, que o trabalho despendido nela, portanto, tenha sido despendido em forma socialmente útil ou que se confirme como ela da divisão social do trabalho. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 95.)

A divisão social do trabalho é um processo histórico que se desenvolve organicamente com o desenvolvimento da mercadoria. Na divisão social do trabalho os “fios se teceram e continuam a tecer-se às costas dos produtores de mercadorias” (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 95.). Isso significa que as tentativas de coibir ou regular o consumo de certas mercadorias ou ainda as tentativas de promover o consumo de outras, através de leis, incentivos fiscais ou formas de propaganda realizadas pelo Estado são paliativos momentâneos, meras reformas, e representam uma partilha dos recursos públicos entre determinados setores privados. As leis naturais da mercadoria são as que impõem suas necessidades, para se transformarem a qualquer custo em dinheiro. Conforme Marx:

O produto satisfaz hoje a uma necessidade social. Amanhã será, talvez deslocado parcial ou totalmente, de seu lutar, por uma espécie semelhante de produto. Mesmo que o trabalho, como o de nosso tecelão de linho, seja um elo patenteado da divisão social de trabalho, não está com isso garantido, de modo algum o valor de uso precisamente de suas 20 varas de linho. Se a necessidade social de linho, e ela tem sua medida como tudo mais, estiver saturada por tecelões rivais, o produto de nosso amigo torna-se excedente, supérfluo e com isso inútil. A cavalo dado não se olha o dente, mas ele não vai ao mercado para distribuir presentes. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 95.).

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As forças do mercado é que impõem, de forma autônoma, as necessidades do consumo social. Todo o processo de intercâmbio se concretiza por causa da lei do valor ou como diz Marx, há muito tempo já foram dadas às costas de todos:

Nossos possuidores de mercadorias descobrem por isso que a mesma divisão de trabalho, que os torna produtores privados independentes, torna independentes deles mesmos o processo social de produção e suas relações dentro desse processo, e que a independência recíproca das pessoas se complementa num sistema de dependência reificada universal [...] A divisão do trabalho transforma o produto do trabalho em mercadoria, tornando, com isso, necessária sua transformação em dinheiro. Ao mesmo tempo, ela torna aleatório o sucesso dessa transubstanciação. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 96.).

Seguindo sua exposição Marx propõe que se analise o processo de intercâmbio supondo que não haja nenhum erro de cálculo subjetivo do possuidor de mercadorias ou que os eventuais erros sejam logo corrigidos objetivamente pelas leis do valor no mercado. Supõe também que cada possuidor de mercadorias tenha despendido em seu produto apenas a média socialmente necessária de tempo de trabalho social objetivado nela. E por último supõe que o decurso da mercadoria até transformar em dinheiro será normal, não havendo prejuízos com excessos de produção ou com mercadorias não vendidas. Depois de todos esses pressupostos, tem-se que o valor é igual ao seu preço, o preço é igual ao quantum de trabalho humano objetivamente dado na divisão social do trabalho. As condições objetivas da complexa divisão social do trabalho foram dadas.

Em seguida, Marx toma para ser analisado o fenômeno em sua pureza. Temos então, na esfera da circulação a relação M - D, onde M é a mercadoria que muda de mãos, ela é trocada por sua própria figura geral de valor. E onde D é o ouro, que é a figura universal geral de valor alienável. O valor de uso da mercadoria atrai o ouro, que em seu preço era apenas imaginário. Há dois polos simultâneos e inversos, de um lado o possuidor de mercadorias, de outro o possuidor do ouro em sua forma dinheiro: eles se apropriam do produto do trabalho alheio, alienando o próprio.

A mercadoria somente entra na relação de valor porque é na sua origem mercadoria capitalista. Segundo Marx:

Um possuidor de mercadoria apenas pode defrontar-se com o outro, como possuidor de dinheiro porque seu produto possui, por natureza, a forma monetária, portanto é monetário, ouro etc., ou porque a sua própria mercadoria já mudou de pele e desfez-se de sua forma de uso original. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.).

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Marx escreve ainda que “não conhecemos, até agora, nenhuma outra relação econômica dos homens, além da de possuidores de mercadorias” (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.). Sendo a mercadoria uma forma de mercadoria capitalista, segue-se a isso que para ela realizar seu processo de circulação simples é necessário que ela mova-se no âmbito da circulação simples. Eis então que os primeiros pressupostos, dados no início da exposição de Marx na obra O Capital, enfim são postos: o motor imanente que impulsiona o processo de intercâmbio entre as mercadorias é o motor das leis do valor, determinadas na esfera da produção das mercadorias, ou seja, o motor impulsionador é a luta de classes, interiorizada pela contradição entre valor de uso e valor. Todas as categorias lógicas da sociedade capitalista estão submetidas ao impulso desse motor, pois, toda a história da sociedade capitalista está oculta por detrás dos segredos de cada mercadoria. O Estado capitalista, portanto, está presente interiormente em cada mercadoria.

No ambiente da circulação, ao realizar a venda de sua mercadoria, seu o antigo possuidor agora tem em suas mãos o ouro. “O ouro é na mão de cada possuidor de mercadorias a figura alienada de sua mercadoria alienada, produto da venda ou da primeira metamorfose da mercadoria, M – D.” (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.). Em posse de certa quantidade ouro, agora ele tem o poder de atrair todas as outras medidas de valor das mercadorias. Com o ouro em mãos, todo o restante dos trabalhos úteis particulares é reduzido à figura de valor do ouro. “O ouro se tornou dinheiro ideal ou medida de valor porque todas as mercadorias, pela sua alienação universal, fazem dele sua figura de uso natural e do trabalho útil particular ao qual deve sua origem”. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.). Diante disso, temos que todas as diferentes formas de valor de uso são reduzidas a algo indistinto. E ainda, todos os trabalhos distintos utilizados na produção das mercadorias perdem sua origem, para universalizar-se num trabalho humano indistinto. “Em sua forma monetária, uma parece exatamente igual à outra” (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.).

Todas as relações sociais são encobertas pela forma dinheiro, tornando-se reificadas, ou seja, a mercadoria na sua forma particular, natural com sua própria e distinta grandeza de valor e, portanto, enquanto forma historicamente determinada de riqueza transformou-se na forma universal, indeterminada e ilusória de riqueza, ou seja, em uma forma superior de mercadoria, o dinheiro.

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Agora, na esfera da circulação, o dinheiro tomou o lugar da mercadoria. A mercadoria é banida completamente para a esfera do consumo. Marx afirma:

Como a mercadoria desaparece ao converter-se em dinheiro, não se reconhece no dinheiro, como chegou às mãos de seu possuidor ou o que transformou-se nele. Non olet [não fede – disse o imperador romano Vespasiano, sobre o dinheiro quando seu filho o repreendeu por lançar impostos sobre as retretas públicas] qualquer que seja sua origem. Se por um lado representa mercadoria vendida, por outro representa mercadorias compráveis (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.)

O dinheiro é a forma de mercadoria superior porque é altamente alienável. Com ela é possível comprar tudo. Com a forma dinheiro o processo de circulação pode fluir conforme o ritmo da torrente da lógica do valor. Ao completar-se a venda, M - D, começa-se a segunda parte do circuito: a compra, D - M. Vender para então comprar; dois atos necessários e indissociáveis para a continuidade do processo da circulação.

A venda da mercadoria é simultaneamente compra. Na primeira parte do circuito, o possuidor da mercadoria produzida conforme a divisão social do mercado vende-a em grandes quantidades. Na segunda parte, o vendedor é possuidor de múltiplas necessidades de uso e, de posse do dinheiro que recebe da primeira venda, fragmenta-o em várias compras para satisfazer aquelas necessidades de uso. “A metamorfose final de uma mercadoria constitui, assim, uma soma de primeiras metamorfoses de outras mercadorias” (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.)

Dessa forma, todos os personagens do mercado, vendedores e compradores não possuem papéis fixados, mas suas existências enquanto personagens dessa trama são condicionadas pela lógica da metamorfose da mercadoria. “Assim, o vendedor do primeiro ato torna-se comprador, no segundo, onde com ele se defronta um terceiro possuidor de mercadorias, como vendedor” (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 97.). Marx comenta:

[...] desenvolve-se todo um círculo de vínculos naturais de caráter social, incontroláveis pelas pessoas atuantes. O tecelão somente pode vender linho porque o camponês já vendeu trigo, o cabeça quente apenas pode vender a Bíblia porque o tecelão já vendeu linho, o destilador só pode vender aguardente porque o outro já vendeu a água da vida eterna etc. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 99).

Nesse processo de circulação de mercadorias o Estado não tem a função de garantir os direitos do homem ou do cidadão, mas sim de garantir os direitos da circulação da mercadoria.

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Na esfera da circulação simples de mercadorias o vendedor ao conduzir sua mercadoria ao mercado, o faz com a esperança de encontrar imediatamente um comprador. No entanto, “ninguém pode vender, sem que o outro compre e ninguém precisa comprar imediatamente apenas por ter vendido” (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 100). Segundo Marx:

Que os processos, que se confrontam autonomamente, formem uma unidade interna, significa por outro lado que a sua unidade interna se move em antíteses externas. Se a autonomização externa dos internamente não autônomos por serem mutuamente complementares se prolonga até certo ponto, a unidade se faz valer de forma violenta, por meio de uma crise. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 1, p. 100).

Imanente à crise da mercadoria, na esfera da circulação, acontece a crise do Estado capitalista. Quando uma mercadoria fica sem seu comprador, a crise se espalha por toda a rede de relações sociais. A crise da mercadoria faz com que o sistema todo entre em crise. Isso significa que as políticas de intervenção do Estado nas crises capitalistas, podem, no máximo servir como um paliativo momentâneo, garantindo que os elos do processo de circulação permaneçam por mais algum tempo no tempo e no espaço do mercado. No entanto, o Estado não tem o poder de solucionar a crise interna da mercadoria, que se exterioriza em forma de crises comerciais. Não é possível superar a lógica da contradição entre valor de uso e valor, interna à forma mercadoria, apenas com medidas de regulação das causas exteriorizadas das crises. Não é possível superar a crise interna da mercadoria sem superar o modo de produção de mercadorias, onde sua lógica contraditória é historicamente determinada.

Durante a crise, milhares de valores de uso são deixados sem utilidade nas prateleiras, sem poder realizar-se. O aumento da intervenção do Estado em políticas de emprego e ajustes de demanda somente faz ampliar a ilusão da mercadoria. Podemos aqui observar que, assim como o valor de uso da mercadoria precisa encontrar um valor de uso ilusório na mercadoria dinheiro, o Estado corresponde à forma ilusória do valor mercadoria, pois, sua função é salvar da crise os possuidores das mercadorias que não conseguem encontrar compradores para elas.

Nos momentos de crise, o Estado compra o excesso dos valores de uso abandonados nas prateleiras e estoques sem compradores. O Estado também abre seus cofres e doa dinheiro para seus os guardiões das mercadorias, em forma de crédito. Ou ainda, age com violenta repressão contra aqueles que reivindicam a manutenção de seu emprego, salário e condições de vida. Toda a liberdade ilusória existente e proclamada pelo Estado capitalista, com seu direito burguês é

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negada abertamente nas ocasiões das crises do mercado. A verdadeira e natural função repressora do Estado e a crise capitalista são dois processos indissociáveis e se desenvolvem antiteticamente.

A crise é uma contradição imanente ao próprio modo de produção capitalista e ela é indispensável para a retomada do processo de acumulação do capital. Geralmente, esses momentos críticos são politicamente turbulentos, pois, ocorrem levantes daqueles que reivindicam manutenção de suas condições de vida. Por isso são necessários os aparelhos de repressão física, controlados e monopolizados pelo Estado capitalista. Nesse sentido, a função do Estado é indispensável para a reprodução social do sistema.

Diante disso, podemos compreender que até aqui, no processo de circulação simples de mercadorias, Marx excluiu de sua análise toda a ação direta do Estado. Isso se justifica pela sua opção por um método de exposição que lhe permitisse atingir a pureza do fenômeno. No entanto, o conceito de Estado ainda está presente, como pressuposto imanente no interior de cada mercadoria. Portanto, não existe até este momento um parágrafo ou trecho onde Marx descreva, no sentido positivista, uma teoria explícita e acabada sobre o Estado. O Estado é um organismo superestrutural, um personagem de uma das classes e, por isso, sobredeterminado, não merecendo um tratamento específico, como tentou dar-lhe Althusser. Esse organismo, da forma como é tratado por Marx, é desvelado na medida em que o conceito de capital é desenvolvido dialeticamente ao longo da exposição de O Capital.

Marx segue sua análise até o final da seção I do livro I de O Capital e daí para adiante. Nós, no entanto, por questões dos limites que envolvem nossa pesquisa, faremos um salto até o capítulo XXIV do Livro Primeiro, com o objetivo de tentar buscar alguns pressupostos para responder a uma das questões principais de nossa pesquisa, a saber, sobre as especificidades da função do Estado na reprodução das condições de produção capitalista.

3. 6. O Estado capitalista e sua relação com o processo de acumulação originária

No final do livro I de O Capital, no capítulo XXIV, intitulado A assim chamada acumulação primitiva de capital, as categorias de capital e Estado são expostas sem suas

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máscaras, em suas atuações mais explícitas e violentas sobre a sociedade que agora aparece fundamentada em uma luta de classes.

O modo de produção capitalista tem como base material a luta de classes. A acumulação de capital, por sua vez, tem origem em uma acumulação originária que a precede como seu ponto de partida. Como afirma Marx:

A acumulação do capital, porém, pressupõe a mais-valia, a mais-valia a produção capitalista, e esta, por sua vez, a existência de massas relativamente grandes de capital e de força de trabalho nas mãos de produtores de mercadorias. Todo esse movimento parece, portanto, girar num círculo vicioso, do qual só podemos sair supondo uma acumulação primitiva, precedente à acumulação capitalista, uma acumulação que não é resultado do modo de produção capitalista, mas sim seu ponto de partida. (MARX, 1983, p. 261). Desse modo, a acumulação originária é o fundamento do modo de produção capitalista.11 Essa acumulação originária é explicada pela economia política burguesa através de uma anedota ocorrida no passado. Marx comenta essa anedota dizendo que “havia, por um lado, uma elite laboriosa, inteligente e, sobretudo parcimoniosa, e, por outro, vagabundos dissipando tudo o que tinham e mais ainda (...) assim se explica que os primeiros acumularam riquezas e os últimos, finalmente, nada tinham para vender senão sua própria pele”. (MARX, 1983 vol. 1, tomo 1, p. 161). Essa anedota da economia política burguesa encobre a realidade de um processo histórico de luta de classes onde uma classe domina a outra por meios violentos, lançando os dominados na pobreza, em tal situação que precisam vender sua pele para sobreviver.

É no capítulo XXIV do livro Primeiro de O Capital, que Marx analisa essa acumulação originária e seus segredos, desvelando nela o processo histórico que separou o trabalhador direto de seus meios de produção (instrumentos de trabalho, objetos de trabalho e força de trabalho) necessários asua sobrevivência.

Ainda antes, nas Formações Econômicas Pré-capitalistas, um capítulo dos Grundrisse, Marx escreve:

O que exige explicação não é a unidade de seres humanos vivos e ativos com as condições naturais e inorgânicas de seu metabolismo com a natureza e, portanto sua apropriação da natureza; nem isto é o resultado de um processo histórico. O que tem de ser explicado é a separação entre essas condições inorgânicas da existência humana e a existência ativa, uma separação somente completada, plenamente, na relação entre o trabalho assalariado e o capital. (MARX, 1981, p. 82)

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Para Marx, não há leis naturais, mas sim esse processo objetivo de separação violenta que faz com que a maior parte da humanidade precise ir até o mercado vender sua força de trabalho para sobreviver. A economia política burguesa não foi além da análise superficial do modo de produção capitalista, uma ciência positiva que ao longo da história mascarou o violento processo de luta de classes que separou o homem de seus meios de produção, dando ao capitalismo uma aparente ordem natural, como se existisse sozinho e não dependesse do trabalho do trabalhador. Para Marx, o modo de produção capitalista não é uma ordem natural, mas ao contrário, foi produzido a partir de um processo histórico objetivo de expropriação, dominação e exploração da vida de uma classe social por outra.

A acumulação originária do capital é, portanto, o processo de separação dos trabalhadores diretos das suas condições de subsistência. Como escreve Marx no capítulo XXIV de O Capital: “Assim, o povo do campo, tendo sua base fundiária expropriada à força e dela sendo expulso e transformado em vagabundos, foi enquadrado por leis grotescas e terroristas numa disciplina necessária ao sistema de trabalho assalariado, por meio do açoite, do ferro em brasa e da tortura”. (MARX, 1983, vol. 1, tomo 2, p. 277).

Marx escreve ainda, nas Formações Econômicas Pré-capitalistas:

Grande massa de força de trabalho viva duplamente livre foi lançada no mercado de trabalho: livre das velhas relações de dependência, servidão ou prestação de serviço e livre, também, de todos os bens e propriedades pessoais, de toda forma real e objetiva de existência, livre de toda propriedade. Uma tal massa ficou reduzida ou a vender sua força de trabalho ou a mendigar, a