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1 INTRODUÇÃO

2.2.2 Improvisação como processo criativo

Para uma compreensão mais aprofundada da improvisação como processo criativo, para esta fundamentação teórica, recorreu-se a alguns autores da área da psicologia, em especial àqueles que discutem a criatividade com ênfase nas diferenças individuais de personalidade e habilidades cognitivas. Apesar de não haver consenso entre os autores da área da psicologia sobre o que significa ser criativo, há uma certa semelhança nas definições de criatividade compreendendo-a como um processo que envolve a emergência de um produto novo, que pode ser uma ideia ou invenção original (ALENCAR; FLEITH, 2003).

Apesar das diferenças individuais, Heerwagen (2002) considera a criatividade como algo que o cérebro faz naturalmente. Isto é, a criatividade é uma característica adaptativa do funcionamento cognitivo normal, que evoluiu para ajudar a solucionar problemas nas condições de incerteza (HEERWAGEN, 2002).

A criatividade na resolução de problemas envolve dois processos de pensamento diferentes. Um deles é o pensamento convergente ou analítico e o outro, o pensamento lateral ou associativo. Enquanto o pensamento convergente é o processo de criticar e transformar as

ideias em produtos úteis, o lateral é a fonte de ideias e insights. Ambos os processos são essenciais para promoção de trabalho criativo (STERNBERG, 2006).

Contudo, Csikszentmihalyi (1996) ressalta que, independentemente de saber se a criatividade é considerada um processo ou um resultado, ela está relacionada a processos e contextos sociais e, em última instância, pode ser considerada a partir de uma perspectiva sistêmica. Nesse sentido, o autor a considera resultado da interação de um sistema constituído por três elementos: uma cultura que contém regras simbólicas, uma pessoa, que traz uma novidade para um domínio simbólico, e um campo de especialistas que reconhecem e validam a inovação. Em suma, criatividade pode ser compreendida como um o processo pelo qual um domínio simbólico, em uma determinada cultura, é modificado. O autor considera ainda que o nível de criatividade não depende apenas do quanto uma pessoa é criativa individualmente, mas também de quão adaptados os respectivos domínios e campos estão para o reconhecimento e difusão de novas ideias (CSIKSZENTMIHALYI, 1996).

Para Csikszentmihalyi (1996), o processo criativo consiste em cinco etapas: a primeira é um período de preparação, conscientemente ou não, de um conjunto de questões problemáticas que são interessantes e despertam curiosidade. A segunda fase é um período de incubação, que acontece no limiar da consciência e, por vezes, conexões incomuns tendem a ser feitas nessa fase. O terceiro componente do processo criativo é o insight, quando são realizados raciocínios inconscientes que veem à consciência como uma espécie de intuição. O quarto componente é a avaliação, ou seja, decidir se a ideia é valiosa e se vale a pena prosseguir. Por fim, o quinto e último componente do processo é a validação, pois uma vez que uma boa ideia acontece, ela precisa ser validada ou suprimida, dependendo do contexto sociocultural, das diferenças de personalidade e das experiências pessoais específicas.

Com base nas considerações acima, cabe notar a importância dos processos sociais na criatividade, porém voltada para a geração de ideias e debates, e não para a tomada de sentido e interpretação de interações. Nesse sentido, Burnard (2006) afirma que processos criativos ocorrem:

[...] dentro de várias unidades sociais e culturais, bem como da influência de pais e cuidadores no núcleo familiar, ou na interface dos contextos sociais com amigos e colegas dentro e fora das comunidades escolares e como membros de múltiplas culturas [...]. (BURNARD, 2006, p. 354).

Todavia, Sternberg (2006) sugere que a criatividade não está somente relacionada ao contexto sociocultural, mas também a uma sólida base de conhecimentos. Essa base de

conhecimentos é essencial para distinguir atos deliberados de criação daqueles de criatividade acidental. Este elemento não só alicerça a geração de ideias auxiliares, como também apoia o componente de avaliação da criatividade, colocando a ideia em um determinado contexto e sugerindo o quanto ela é ou não importante. No entanto, Sternberg (2006) observa que, por um lado, é preciso saber o suficiente sobre um campo para movê-lo para a frente. Por outro, o conhecimento sobre um campo pode resultar em uma perspectiva hermética, que pode comprometer a criatividade.

Outro componente cognitivo relevante para a criatividade é a capacidade de usar diferentes modelos mentais. Modelos mentais podem ser compreendidos como uma representação interna de realidades externas. Segundo Sternberg (2006), utilizar modelos mentais significa agrupar informações para mudar a compreensão de um conceito. Para o autor, metáforas auxiliam na utilização de modelos mentais e na mudança de perspectiva, sendo úteis por chamarem a atenção para duas ações aparentemente não relacionadas (STERNBERG, 2006).

Sternberg (2006) aponta ainda quatro atributos que apoiam o funcionamento do processo criativo: atributos de personalidade, a motivação, a influência do ambiente e a confluência. Os atributos de personalidade incluem a vontade de superar os obstáculos, de assumir riscos razoáveis, a disposição para tolerar a ambiguidade e a crença de autoeficácia. Sobre a motivação, o autor considera não se tratar de algo inerente a uma pessoa; raramente um trabalho verdadeiramente criativo é desenvolvido em uma determinada área, a menos que as pessoas envolvidas realmente gostem do que estão fazendo. O autor ressalta que, além da motivação e dos atributos de personalidade, é necessário um ambiente que apoie incentive ideias criativas. Em relação à confluência, Sternberg (2006) considera a hipótese de envolver mais do que uma mera soma entre cada componente, podendo assim aumentar os potenciais criativos de um indivíduo. Tais interações podem ocorrer entre os atributos já citados, por exemplo, inteligência e motivação.

Por fim, com base nas considerações acima, é possível entender que a criatividade depende de como as pessoas pensam e, obviamente, isso depende de muitos outros fatores, como o ambiente, a cultura, as capacidades individuais e a motivação. No entanto, processos mentais como analogias, metáforas e autorreflexão podem funcionar como um impulsor do processo criativo. Quando alguns membros de uma determinada cultura dialogam entre si para desenvolver novas ideias, sob certas circunstâncias, essas podem ser amplificadas e aplicadas de forma a se tornarem predominantes.