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2.3 Segurança e comportamento dinâmico de barragens

2.3.4 Incidentes e acidentes em barragens Causas e consequências

No âmbito do controlo de segurança de barragens, as principais preocupações com a segurança destas para evitar acidentes e incidentes (além das preocupações com a adequada manutenção e deterioração destas obras) referem-se ao comportamento das barragens durante a ocorrência de eventos excecionais, nomeadamente: i) cheias, que podem dar origem a galgamentos e provocar danos materiais, humanos e ambientais elevadíssimos; ii) sismos de média e elevada intensidade, com efeitos especialmente danosos para obras antigas (em virtude da utilização dos critérios de segurança e dimensionamento sísmico desatualizados) e até mesmo obras novas (no caso de não serem considerados adequadamente todos os fatores e critérios de comportamento e segurança estrutural).

Nesse sentido, é imperativo procurar o desenvolvimento e a implementação de mais e melhores sistemas de observação e recolha de informação experimental bem como de modelos de previsão mais fiáveis, por forma a garantir uma melhor caracterização e simulação do comportamento e resposta estrutural das obras, bem como das ações dinâmicas a analisar, nomeadamente ações sísmicas.

2.3.4.1 Incidentes e acidentes em barragens

Existem referências a incidentes/acidentes em barragens que envolvem deslocamentos elevados, o aparecimento de fissuras e outros problemas associados à fundação, como a percolação de água devido a rotura das cortinas de impermeabilização e escorregamento de blocos do maciço rochoso a partir das descontinuidades deste. Este tipo de incidentes e as respetivas anomalias e patologias detetadas, permitiram identificar a admissão de hipóteses erradas ou desadequadas ao nível de projeto e da construção daquelas obras (Chen & Scawthorn, 2002), em grande parte por falta de informação adequada.

De seguida apresentam-se algumas causas que provocaram acidentes em barragens, acompanhadas dos respetivos exemplos (Silvestre, 2012; Wikipédia, 2015):

 Falhas na escolha dos materiais utilizados e nas técnicas de construção

Como exemplo refere-se a barragem de Gleno (Itália) em 1923. Esta era uma barragem de abóbadas múltiplas em betão, tendo sido inicialmente projetada como barragem gravidade com curvatura, para garantir maior economia ao cliente em termos de construção e materiais, com erros ao nível da ligação da barragem e da fundação. O colapso deveu-se à incapacidade de suportar

 Errado dimensionamento/falha dos órgãos de descarga

O colapso da barragem de South Fork nos Estados Unidos que ruiu em 1889, devido à remoção dos órgãos de descarga; e o quase colapso da barragem de Glen Canyon (Figura 2.16b) em 1983 devido a grandes cheias (tendo ocorrido fenómenos de cavitação nos órgãos de descarga que afetaram o seu funcionamento).

 Instabilidade geológica causada pela variação do nível da água na albufeira ou falta de prospeção adequada

Acidente da barragem de Vajont (Itália) em 1963, tendo ocorrido o desmoronamento e deslizamento de rocha a montante da barragem e que provocaram uma onda na albufeira que galgou a barragem em 1963; colapso da barragem de Malpasset (França) em 1959 devido à fraca qualidade e impermeabilidade do terreno de fundação (tendo sido descoberta mais tarde uma falha tectónica), tendo ocorrido roturas na barragem (Figura 2.16c); a barragem em arco-gravidade de betão de Saint Francis nos EUA em 1928.

 Falta de manutenção

Como exemplos existem a barragem de terra de Lawn Lake que colapsou em 1982, a barragem em arco-gravidade de betão de Saint Francis nos EUA em 1928 (Figura 2.16d) e a barragem de aterro de Val di Stava que colapsou em 1985, situada em Itália.

 Grande enchente na albufeira após chuva intensa

A barragem de Shakidor no Paquistão que colapsou em 2005; a barragem de terra de Banqiao (Figura 2.16e). e 62 outras no rio Zhumadian que colapsaram em 1975 devido a chuvas intensas, provocando um dos maiores desastres de sempre relacionados com barragens; a barragem de terra e enrocamento de Machchhu-2 na Índia, que colapsou em 1979.

 Erosão Interna

Como exemplo, a barragem de terra de Teton nos E.U.A., que colapsou em 1976 (Figura 2.16e). Nesta barragem deu-se a infiltração da água no corpo da obra, devido à permeabilidade, o que levou à ocorrência de fenómenos de erosão interna e consequentemente ao colapso da barragem.

a) b)

c) d)

e) f)

Figura 2.16 – Incidentes/acidentes em barragens: a) Colapso da barragem de Gleno; b) Barragem de Glen Canyon;

c) Colapso da Barragem de Malpasset; d) Colapso da Barragem de St. Francis; e) Colapso da Barragem de Baqiao; f) Colapso da Barragem de Teton.

2.3.4.2 Incidentes devido a eventos sísmicos

As grandes barragens de betão pertencem ao grupo de estruturas que começaram a ser estudadas e projetadas para suportar ações sísmicas, em virtude da sua enorme importância social, económica e ambiental, e também do risco potencial elevado associado a este tipo de obras. De maneira geral, as barragens de betão apresentam uma adequada resistência estrutural a eventos sísmicos, nomeadamente por serem projetadas para a ação de forças horizontais elevadas devido à pressão hidrostática e à sistematização dos processos de projeto relativamente a ações sísmicas (Westergaard, 1933; Wieland, 2008; Wieland, 2010). No entanto, para sismos que provoquem valores de aceleração elevados ao nível da fundação, podem ocorrer danos relevantes que afetem a condições de funcionalidade e segurança das obras.

Por outro lado, atualmente a segurança sísmica das barragens tem vindo a ser revista, tendo em conta que na maior parte das barragens que se encontram em serviço aos dias de hoje, foram utilizados critérios e métodos de análise do comportamento dinâmico em fase de projeto que hoje estão claramente desajustados (Wieland & Brenner, 2010). Desta forma, recorrendo às normas e requisitos destas em vigor (Eurocódigo 8, RSB e requesitos regulamentares da ICOLD), os projetos de novas barragens bem como as barragens existentes têm de cumprir estes requisitos definidos no que respeita a ações sísmicas, voltando a dar-se enfâse à importância de desenvolver e utilizar tecnologias cada vez mais eficientes ao nível dos sistemas de observação e dos modelos, para obter as adequadas condições de segurança e fiabilidade em todas as fases de vida da obra. Apresentam-se seguidamente alguns exemplos de incidentes devido a eventos sísmicos de média/elevada intensidade em barragens (Mendes, 2010; Silvestre, 2012; Wikipédia, 2015): i) A barragem de Koyna na Índia (barragem de gravidade em betão), foi abalada em 1967 por

um sismo de magnitude 6,5 (acelerações de pico de 0,63 g na direção transversal ao rio, 0,49 g na direção montante jusante e 0,34 g na direção vertical) que provocaram fissuras horizontais nos paramentos, fissuras na galeria a meia altura da barragem e na galeria de fundação, movimentos relativos entre os blocos monolíticos durante o sismo e infiltrações nas zonas fissurada (Figura 2.17a).

ii) Na barragem de Pacoima (abóbada com 113 metros de altura) situada nos E.U.A. (Figura 2.17b). e que foi abalada pelo sismo de São Fernando em 1971 (magnitude de 6,5) e o sismo de Northridge em 1994 (magnitude de 6,7). O primeiro (aceleração de pico horizontal de 1,25 g e 0,7 g na vertical) provocou o movimento da secção superior do encontro esquerdo e do maciço rochoso a jusante do encontro, além da abertura da junta de contração e ainda a ocorrência de fissuras no encontro; relativamente ao segundo, a maioria dos acelerómetros saturaram, tendo-se registado acelerações de pico elevadas (que variaram

entre 0,5 g na base da barragem e 2,0 g ao longo dos encontros próximo do coroamento. Foram também registados valores de aceleração de pico a jusante do local da barragem e na zona do encontro esquerdo, com 0,4 g e 1,6 g, respetivamente) que provocaram o deslizamento do maciço a jusante da margem esquerda e ainda na fundação desse lado (que apenas não deslizou severamente devido aos cabos de pré-esforço colocados depois do sismo de San Fernando). Por outro lado registaram-se fissuras em blocos próximos do encontro da margem esquerda, movimentos de abertura e fecho das juntas verticais, fissuração no betão e movimentos horizontais entre as juntas dos blocos.

iii) A barragem de Sefid Rud no Irão (Figura 2.17c), é uma barragem de gravidade em betão com contrafortes, e foi solicitada por um sismo de magnitude 7,6 (aceleração de pico no maciço rochoso de 0,72g). Esta barragem sofreu fissuração horizontal significativa na zona superior dos contrafortes e a formação de uma cunha com deslocamentos tangenciais para jusante.

iv) Já na barragem de Shih-Kang no Taiwan (Figura 2.17d), em 1999 foi sujeita a um sismo de magnitude 7,6 que provocou acelerações de pico de 0,5g na direção horizontal e vertical, provocando a rotura de três descarregadores junto ao encontro direito, a separação de blocos entre a barragem e a fundação e a rotura das vigas que suportavam o pavimento sobre a barragem devido a deslocamentos elevados.

a) b)

c) d)