• Nenhum resultado encontrado

1. O SURGIMENTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL

1.2 As origens da Economia Solidária no Brasil

1.2.3 Incubadoras universitárias

A participação das universidades na emergência da Economia Solidária está estreitamente vinculada ao processo de incubação de iniciativas, feita principalmente pela Rede Unitrabalho e pelas ITCPs.

A Rede Unitrabalho foi criada em 1996. Constitui-se numa rede de 92 instituições de ensino superior que busca “contribuir para o resgate da dívida social que têm com os trabalhadores”. A Unitrabalho atua através de projetos de estudos, pesquisas, extensão universitária e capacitação ligados ao mundo do trabalho, inclusive a Economia Solidária. Sobre esse tema, partiu da Unitrabalho o primeiro esforço de pesquisa nacional qualitativa sobre o campo que se tem notícia, que resultou no livro “Sentidos e experiências da Economia Solidária no Brasil”, publicado em 2004 com organização de Luiz Inácio Gaiger (Rede Unitrabalho, 2009).

Como visto antes, o surgimento da primeira ITCP vincula-se ao desejo de replicação dos resultados considerados bem-sucedidos da Cooperativa de Manguinhos. Sua constituição foi apoiada pelas organizações vinculadas à “Ação”: Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Fundação Banco do Brasil (FBB) e o Comitê de Entidades no Combate à Fome e pela Vida (COEP).

A idéia inicial era a construção de um centro de tecnologia, no qual a universidade pública tornaria disponíveis seu Know-how e seus recursos acumulados de modo a promover a (re) inserção de populações historicamente excluídas, tanto do ponto de vista econômico quanto no que diz respeito aos direitos elementares de cidadania. A opção pelo cooperativismo, como alternativa viável para atingir tais objetivos, se deu pelas suas próprias características: organização social e empreendimento econômico, ou seja, a cooperativa ao mesmo tempo é uma empresa e uma associação de trabalhadores, podendo, deste modo, contribuir nos aspectos econômicos do empreendimento, porém

42

privilegiando as oportunidades da inserção cidadã, contrariando a lógica histórica da competitividade do capitalismo.

Além da colocação no mercado, o que a ITCP se propunha era promover a organização popular, criando uma rede solidária que representasse uma resposta ao modelo excludente de economia e que gerasse alternativas de trabalho, renda e cidadania (Portal do Cooperativismo Popular, 2009).

Ainda durante o período de estruturação da ITCP COOPE/UFRJ, universidades e governos buscaram-na para montarem projetos similares. Daí foram fundadas ITCPs na Universidade Federal do Ceará (UFCE), em 1997 e na Universidade Federal do Paraná (UFPR), em 1998. Nesse mesmo ano, foi criado o Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas Populares (PRONINC), possibilitando o surgimento de outras quatro ITCPs nas seguintes universidades: Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Em 1999, essas incubadoras criaram a Rede Universitária de ITCPs.

Apesar das universidades julgarem seus resultados como positivos, uma nova chamada do PRONINC só foi realizada em 2003, quando passou a ser coordenado pela SENAES. Pelo seu impulso recente dele, hoje 44 instituições de ensino superior de todo o país formam a Rede de ITCPs. A cessão de recursos, diga-se, também contemplou os núcleos da Unitrabalho (Guimarães, 2000; Singer, 2000; Projeto de Acompanhamento do Proninc, 2009).

Quanto aos impactos dos processos de incubação, as incubadoras vinculadas ao PRONINC os identificam em dois níveis:

Impactos em relação aos indivíduos, envolvendo: elevação da a auto-estima; aumento da escolaridade e da consciência político-social; incremento da renda(ainda que muitas vezes em escala reduzida) e maior acesso a serviços e políticas públicas(em áreas como documentação, saúde, educação, habitação etc.).

Impactos em relação aos grupos, incluindo, entre outros itens: agregação de novas tecnologias ao processo produtivo; elevação da capacidade gerencial e qualificação profissional; aumento das iniciativas para captação de apoios e recursos; e maior vinculação com as comunidades e movimentos sociais (Acompanhamento e avaliação do Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas Populares, 2007, p. 76, grifos do original).

43

Ademais, apontam que seu surgimento permitiu revitalizar e consolidar a extensão universitária em diversas universidades do país; elevar o número de trabalhos científicos sobre as atividades econômicas e formas organizativas da Economia Solidária; e formar profissionais orientados para a incubação e/ou assessoria e para as políticas públicas (ibidem). A presença de outros elementos no funcionamento dessas experiências, no entanto, sugere que elas estão sujeitas a uma forte instabilidade institucional.

A maioria das incubadoras e núcleos não dispõe de rubrica própria nos orçamentos das universidades. Disso deriva que seus custos de manutenção dependem de recursos externos. Esses são principalmente obtidos através do PRONINC e de parcerias com instituições públicas e/ou agências de cooperação, quase sempre após a passagem por processos seletivos em que concorrem com um sem número de iniciativas com propósitos semelhantes. O próprio PRONINC, aliás, só se tornou um programa permanente do Governo Federal em fins de 2010.

Esta situação gera um quadro de permanente instabilidade financeira e operacional, acarretando, entre outras conseqüências negativas, as dificuldades de execução de um planejamento de médio e longo e longo prazo, a alocação de uma parcela considerável do tempo de trabalho das equipes técnicas em ações de captação de recursos e a conseqüente redução do tempo disponível para as atividades-fim das incubadoras. E, ainda, o risco de descontinuidade ou suspensão temporária de ações de pesquisa e intervenção junto à população atendida, a alta rotatividade da equipe e a correspondente perda de investimentos em capacitação. E por último, a incapacidade de fazer face às demandas do público-alvo dada a limitação dos recursos financeiros e materiais (ibidem, p. 85).

Enfim, o que se vê é que, a despeito da avaliação positiva dos resultados, o apoio da universidade às iniciativas solidárias tem tido uma boa dose de precariedade. Ainda que a estabilidade financeira e organizativa das suas incubadoras possa se estabelecer num futuro próximo, uma questão permanece. As incubadoras orientam-se para potencializar o desempenho mercantil de unidades de baixa densidade tecnológica, quase sempre descritos como frágeis do ponto de vista econômico e organizativo. A não ser que conectados a cadeias de produção e consumo bem consolidadas, ou a garantias de compras pelo Estado, que possibilidade tem as iniciativas apoiadas pelas incubadoras de não serem tragadas pela concorrência?

44