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INEFICÁCIA DA DOGMÁTICA CONSTITUCIONAL PENAL GUINEENSE

2. O HABEAS CORPUS COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO DO DIREITO

3.4. INEFICÁCIA DA DOGMÁTICA CONSTITUCIONAL PENAL GUINEENSE

GUINEENSE NA PROTEÇÃO DO DIREITO DE IR E VIR.

O Estado Democrático de Direito é um Estado de teleologia antropológica, na medida em que tem como função principal, proteger os direitos fundamentais, através das garantias constitucionais previstas na Constituição191, que são nada mais, nada menos, os remédios preventivos e corretivos contra ações ofensivas a esses direitos, tendo como finalidade última, proteger a dignidade da pessoa humana.

190

Este artigo fala da competência dos tribunais de círculo e em nenhuma alínea se refere o assunto de habeas

corpus. Não se transcreveu o dispositivo porque é longo, por conter várias alíneas.

191 O Título II, da Constituição da República da Guiné-Bissau assegura os direitos, liberdades garantias

fundamentais aos cidadãos, isto é, quando estes direitos são ameaçados, o cidadão tem uma justa causa de acionar autoridade competente para livrar-se desse constrangimento.

Como já foi menciona alhures, a fundamentação ou a constitucionalização dos direitos, não é o grande problema a ser enfrentado, apesar de ser também um ato importante, mas o ponto crucial nesta questão reside na efetivação desses direitos, ou seja, usando a classificação de constituições do Loewenstein, é transportá-los de Constituição Nominal para Constituição Normativa, isto é, dar efetiva proteção aos direitos fundamentais.

A Constituição da República (1984) consagra como garantia fundamental, a liberdade de ir, vir e ficar dos indivíduos em seu artigo 39, nº. 3, 4 e 5, com a autorização do manejo de habeas corpus nos casos da ilegalidade da prisão ou detenção decorrente de abuso de autoridade, ao Supremo Tribunal de Justiça – STJ, que é única instância no país competente para conhecer e dar providência sobre o habeas corpus, embora o requerimento possa ser feito no tribunal regional mais próximo192. A mesma dogmática constitucional foi reproduzida no Código do Processo Penal – CPP guineense, nos seus artigos 171, nº 1 e 2; 190, nº 1 e 2193.

Analisando os dispositivos supracitados, do ponto de visto garantista, observa-se que, não oferecem uma proteção efetiva ao direito de ir, vir e ficar dos cidadãos, por uma dificuldade criada pela própria dogmática constitucional, que sedimentou de forma centrada ou concentrada, ao eleger um único órgão competente para deliberar sobre a providência do remédio heroico – o habeas corpus. No próximo capítulo, será abordado de forma mais detida esta questão de desconcentração da competência do Supremo Tribunal de Justiça, no que tange à matéria de habeas corpus. Esta breve referência, aqui aludida, é somente para demonstrar como o dogma constitucional dificulta a celeridade do instrumento heroico na tutela da liberdade de locomoção.

Norberto Bobbio elaborou três critérios de valoração da norma jurídica que são: justiça, validade e eficácia. Segundo ele, a justiça é a “correspondência ou não da norma aos valores últimos ou finais que inspiram um determinado ordenamento jurídico”; a validade é a

192 Este requerimento, é para que o referido tribunal encaminhe a ação para o Supremo para que este aprecie e

decida sobre a concessão ou não de mandado de habeas corpus.

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Art. 171, nº. 1. “Qualquer pessoa ilegalmente presa pode requerer a STJ193, por si ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos que lhe seja concedida a providência de Habeas Corpus. nº 2. A legalidade de prisão deve fundar-se no facto de: a) Ter sido efectuado ou ordenado por entidade incompetente; b)Ser motivada por facto pelo qual a lei não permite a sua aplicação; c) Mostrarem-se ultrapassados os prazos máximos de duração”. Art.190, nº. 1. “Qualquer detido pode requerer o juiz de círculo judicial da área em que se encontrar que ordene a sua imediata apresentação judicial se: a) Estiver excedido nos artigos 55; 183; 184 ou qualquer outro prazo para entrega ao poder judicial; b) Mantiver a detenção fora dos locais e das condições legalmente previstas; c) Detenção tiver sido ordenada ou efectuada por entidade incompetente; d) A detenção não for admitida com os fundamentos invocados”.

2. O requerimento pode ser subscrito pelo detido ou qualquer outra pessoa no gozo dos seus direitos que o apresentará à entidade que o detenha, a qual o remete imediatamente ao juiz com as informações que entenda necessárias.

simples existência da norma como a regra jurídica e a eficácia está atrelada a questão de saber se esta norma está sendo seguida pelas pessoas a quem se destina194.

O que se quer sacar desta tese valorativa da norma do Bobbio são os critérios da justiça e da eficácia, uma vez que, a validade das normas parece dispensar muitos comentários, por ser aferida, simplesmente, pela sua existência no ordenamento jurídico.

O dogma constitucional ora referido, observada sob critério da justiça do Bobbio, ou seja, a realização dos valores superiores que inspiraram o constituinte é dissonante, em certa medida, com a intenção de proteger o direito fundamental (direito de ir e vir), plasmado no título II, da Constituição da República (1984).

A garantia de um direito é a vida para o próprio direito garantido. Um direito sem garantia é um direito morto, uma vez que, o direito vivo é aquele em que os seus destinatários podem gozar dele. No que diz respeito ao destinatário da norma constitucional fundamental, proclama Van Der Broocke, que o seu destinatário195 é o Estado, a quem se incumbe a responsabilidade de prover meios necessários para garantir eficácia aos direitos fundamentais, cujo titular é o individuo196.

Neste ponto, entra-se na questão da eficácia, isto é, a produção dos efeitos jurídicos, que se esperam de uma norma – no caso em tela, a proteção efetiva do direito fundamental de ir e vir. Assim, pode-se concluir que, a garantia assegurada pela dogmática constitucional e penal, ou seja, a proteção da liberdade de locomoção é insuficiente, violando o principio da proibição de proteção deficiente.