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Projeto 1 – O PAPEL DO FARMACÊUTICO COMUNITÁRIO NO CONTEXTO DA COVID-19

2. Introdução teórica

2.2 Infeção pelo novo coronavírus de 2019

Inicialmente, identificou-se uma transmissão animal-humano, com a maioria dos casos iniciais a reportar uma associação direta ao mercado em Wuhan46. Contudo, rapidamente se detetou a transmissão pessoa-a-pessoa em alguns desses casos iniciais46, 47, sendo que atualmente esta é considerada a principal via de transmissão da COVID-19.

Atualmente, pensa-se que a principal forma de transmissão da COVID-19 seja através de gotículas respiratórias, com mais de 5 – 10 µm de diâmetro 48. Isto implica a sua transmissão quando uma pessoa (especificamente as suas mucosas e conjuntivas) está em contacto próximo (de menos de um metro) de alguém que apresente sintomas de infeção respiratória, ou através de contacto indireto com superfícies ou objetos que tenham estado em contacto direto com as secreções respiratatórias de uma pessoa infetada 48. A transmissão por pacientes assintomáticos da doença foi também reportada 49, o que desde uma fase muito inicial se afigurou como sendo um grande desafio para a contenção do surto e um dado importante para definir estratégias para o controlar.

O período de incubação (tempo entre a exposição do organismo ao vírus e o desenvolvimento de sintomas) atualmente estimado para a COVID-19 é de 1 a 14 dias 50. Um dos estudos que foi feito mais cedo reportou um período de incubação médio de 6,4 dias 51, com estudos posteriores a corroborar estes achados. Estes dados justificam os tempos de quarentena e de monitorização ativa a serem aplicados por muitas autoridades de saúde, mundialmente.

2.2.2 Características clínicas

A apresentação clínica desta doença varia com o nível de severidade da mesma, embora a maioria das infeções não seja severa. A manifestação clínica severa mais frequente é pneumonia, caracterizada por febre, tosse, dispneia e infiltrado bilateral em imagens do tórax 44. Alguns fatores de risco para o desenvolvimento de doença severa incluem idade avançada, doença cardiovascular, diabetes mellitus e doença pulmonar e/ou renal crónica 44.

A taxa de letalidade da COVID-19 é difícil de estimar com precisão devido à dificuldade de determinar todos os casos confirmados de doença (o que contribui para as diferentes taxas verificadas em diferentes países, por exemplo). No entanto, parece ser maior do que as taxas verificadas para a infeção pelo vírus da gripe (questão frequentemente levantada pelos utentes), mas menor que a infeção

22 por SARS e, em março, esta taxa encontrava-se nos 3,4%, a nível global 52. Em Portugal, em meados de abril, a taxa de letalidade situava-se num valor próximo desse (nos 3,2%), com a maioria dos casos a ocorrer numa população mais idosa, o que se encontra conforme o verificado em alguns estudos, destacando-se um onde se obteve uma taxa de letalidade de 2,3% que era bastante maior (14,8%) naqueles com mais de 80 anos e com outras comorbilidades 53.

Atualmente, não existe nenhum tratamento específico contra o SARS-CoV-2, sendo que a estratégia atualmente usada é o tratamento sintomático dos casos ligeiros a severos e outras medidas como oxigénio- e fluidoterapia e ventilação mecânica para casos muito severos 54. Existem algumas vacinas em desenvolvimento (cerca de 115 candidatas, no início de abril 55) e alguns fármacos usados para outras patologias a serem estudados como potenciais candidatos terapêuticos contra esta infeção – particularmente o remdesivir, a cloroquina e hidroxicloroquina e a associação de lopinavir com ritonavir, por exemplo 56. É de extrema importância que o farmacêutico comunitário se mantenha atualizado relativamente a estas potenciais hipóteses de tratamento, já que as mesmas iam sendo frequentemente comunicadas pelos mídia, o que levou a uma maior procura destes medicamentos por parte de alguns utentes – sem qualquer tipo de prescrição. Por outro lado, foram surgindo outras questões relevantes, como por exemplo, a associação entre o uso de anti-inflamatórios não esteroides (em particular o ibuprofeno) e a agravação da COVID-19, e uma hipótese que relaciona um aumento da gravidade da doença em pacientes tratados com inibidores da enzima de conversão de angiotensina ou antagonistas dos recetores de angiotensina. Estas informações foram ambas desmentidas, à data 57, 58, mas a veiculação deste tipo de informações pela comunicação social pode criar confusão nos utentes e, na pior das hipóteses, levar à suspensão voluntária desta terapia por parte de alguns deles, motivada pelo medo.

2.2.3 Atuação do farmacêutico comunitário

As farmácias comunitárias, pelo facto de muito frequentemente serem o primeiro ponto de contacto do utente com o sistema de saúde, têm um papel fulcral e são parte integrante ativa na resposta a uma emergência de saúde pública de natureza infeciosa, como é o caso da COVID-19. O farmacêutico tem como responsabilidade não só garantir o adequado acesso dos utentes à sua medicação, mas também o de promover a prevenção da doença e o controlo da infeção, nomeadamente através da referenciação de casos suspeitos e da informação e aconselhamento ao público 59. É de particular interesse que o farmacêutico se mantenha informado e com capacidade de responder às perguntas mais frequentemente colocadas pelo público, relacionadas essencialmente com algumas características clínicas da doença, forma prevenção, definição de caso suspeito e o que fazer em caso de suspeita de infeção.

Na Fase de Preparação (em que não existia epidemia ou epidemia concentrada fora de Portugal) e na Fase de Contenção (definida pela existência de um “epicentro identificado fora da Portugal, com transmissão internacional e casos importados na Europa”) 60, as medidas de prevenção preconizadas pela Direção-Geral da Saúde (DGS) eram as seguintes: a adoção de uma correta “etiqueta respiratória” (ou seja, tapar adequadamente a boca e nariz ao tossir ou espirrar, ou com um lenço, ou com o interior do cotovelo e lavar ou desinfetar as mãos depois disso), a higiene frequente e adequada das mãos (usando sabão e água, ou uma solução desinfetante de base alcoólica), evitar tocar na cara com as

23 mãos e evitar contacto próximo com pessoas que apresentassem sintomas de doença respiratória. O uso de máscara por pessoas que não apresentassem sintomas de doença respiratória era desaconselhado, dada a preocupação das autoridades de saúde com o potencial uso incorreto, possível sensação de falsa segurança e esgotamento dos stocks comprometendo o acesso das máscaras a quem mais precisa delas.

As condições para se ser considerado um caso suspeito, na altura, eram a presença de sintomas indicativos de doença respiratória (nomeadamente febre, tosse e dificuldades respiratórias) e viagem ou residência para/em locais que tivessem, na altura, transmissão comunitária ativa (nos 14 dias anteriores ao início dos sintomas) ou contacto com um caso confirmado de COVID-19. As recomendações para alguém que apresentasse sintomas eram de contactar a linha SNS 24 antes de se deslocarem para qualquer estabelecimento de saúde 61, 62.

Em fevereiro, quando ainda não existiam orientações específicas das autoridades de saúde sobre as responsabilidades da farmácia comunitária na luta contra a COVID-19, a Associação Nacional das Farmácias (ANF) disponibilizou um fluxograma de intervenção farmacêutica elaborado pelo Centro de Informação do Medicamento (CEDIME), que foi, entretanto, incorporado nas guidelines da Federação Farmacêutica Internacional 59 e que permitia fazer uma rápida triagem dos utentes que deviam ser referenciados para a linha SNS 24, segundo as condições descritas acima.

3. Intervenção

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