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Em 1982, o Conselho Federal de Educação criou o Programa de Avaliação da Reforma Universitária (PARU), que seria responsável por desenvolver uma metodologia de avaliação que pudesse ser aplicada a todo o sistema, público e privado, e que combinasse elementos externos –aspirações da sociedade – com elementos internos – objetivos propostos pela própria IES (INEP, 2003b). Porém, faltou força política para dar continuidade ao processo, apesar de o programa ter conquistado a participação de uma amostra de 33 IES e ter desenvolvido uma metodologia viável de avaliação.

O esforço seguinte data de 1985, com a criação da Comissão Nacional de Reformulação do Ensino Superior, cujo objetivo era o de “oferecer subsídios à formulação de uma nova política para a educação superior. Uma política que atenda ás exigências do desenvolvimento do País e aos anseios democráticos de seu povo”. (MEC, 1985). O fato de ter sido composta, em sua maior parte, por professores universitários, não impediu que as propostas realizadas pela comissão fossem alvo de sérias críticas e questionamentos por parte da comunidade acadêmica, o que acabou por inviabilizar a sua implementação.

Desde o início, o relatório deixa claro que as IES precisam das provas de bom desempenho à sociedade, como contrapartida pela tão sonhada autonomia universitária. No entender da comissão:

A autonomia não pode ser entendida, naturalmente, como um cheque em branco que a sociedade passa a seu sistema universitário e a seus diversos segmentos; ao contrário, ela supõe uma contrapartida bem definida em termos de desempenho. Não pode haver autonomia sem essa contrapartida de responsabilidade. (MEC, 1985).

Mas que tipo de avaliação a comissão recomendava? O item 6 das recomendações do relatório é dedicado totalmente a detalhar o projeto de avaliação proposto, que deveria solucionar um dos principais problemas do ensino superior no Brasil, na visão do grupo: a falta de parâmetros.

Para solucionar esse problema, a comissão propôs um processo avaliativo que combinasse avaliação externa e interna e cobriria seis áreas básicas:

1) cursos; 2) alunos; 3) professores;

4) aspectos didático-pedagógicos do ensino; 5) funcionários administrativos;

6) carreiras. Dentro da avaliação dos alunos, três subitens eram propostos: a) demanda pelo curso;

b) avaliação comparativa dos formandos;

c) avaliação das oportunidades de trabalho. Sobre a avaliação comparativa dos formandos, a comissão dizia que:

Por este procedimento, todos os alunos formados em determinada área de conhecimento (ou uma amostra deles) são submetidos a testes padronizados, que permitem aferir o quanto sabem. Este é, possivelmente, o melhor

indicador de desempenho dos cursos. Sua dificuldade principal consiste

em institucionalizar a aplicação dos testes, que em alguns países assume a forma de "exames de Estado" ou de exames realizados por conselhos e outros tipos de associação profissional. (MEC, 1985, grifo nosso).

Em outras palavras, eles já imaginavam algo similar ao que seria o Provão. Portanto, embora naquele momento as propostas não tenham sido implementadas, o trabalho da comissão ofereceu sementes que foram aproveitadas posteriormente.

Entre 1986 e 1990, foram feitas novas tentativas de se discutir a questão da avaliação do ensino superior no Brasil. Em 1986, foi criado um grupo de trabalho para discussão da questão da avaliação no Brasil, o Grupo Executivo da Reforma da Educação Superior (GERES), que está em funcionamento até hoje. As propostas feitas pelo grupo

foram questionadas pela comunidade acadêmica pois se julgou que estavam por demais associadas “aos interesses do mercado”. (INEP, 2004c, p. 7).

Depois de tantas tentativas, começou a ficar claro para os envolvidos que as propostas eram bombardeadas muito mais por interesses políticos do que por problemas de ordem técnica. Dessa forma, a próxima iniciativa foi bastante cautelosa: em 1987, a Secretaria de Educação Superior (SESu) deu início a um amplo ciclo de debates, cujo objetivo era difundir a questão da avaliação e sensibilizar a comunidade acadêmica da necessidade de um programa formal de avaliação do ensino superior. Como realmente se tratava de um ciclo de debates, esse esforço “foi pouco eficaz na proposição de políticas e diretrizes que resultassem na consolidação de processos de avaliação consistentes, seja em nível do Ministério, seja em nível das IES”. (INEP, 2004c, p. 8).

Finalmente, em 1990, um grupo de trabalho organizado pela Secretaria Nacional de Ensino Superior (SENESu), conquistou suporte político suficiente para propor aquela que continua a ser reconhecida, pela comunidade acadêmica, como a mais bem sucedida proposta de avaliação institucional para o ensino superior brasileiro, o Programa de Avaliação Institucional da Universidade Brasileira (PAIUB). As conclusões do grupo de trabalho estão consolidadas no Documento Básico de Avaliação das Universidades Brasileiras, datado de 26 de novembro de 1993. O grupo parte do pressuposto de que a avaliação institucional é uma exigência legítima da sociedade contemporânea, inclusive reforçando o já mencionado aspecto de prestação de contas que o sistema de avaliação poderia assumir.

Em relação à proposta anterior, apresentada pela Comissão Nacional de Reformulação do Ensino Superior, algumas diferenças merecem destaque:

1) ao contrário da proposta anterior, o PAIUB não vincula desempenho na avaliação com liberação de verbas orçamentárias, ao passo que o relatório da comissão vinculava verbas adicionais ao recebido normalmente pela IES ao bom desempenho na avaliação externa. Outra importante diferença é que o PAIUB não previa um teste comparativo de desempenho dos alunos, como a proposta anterior. Em outras palavras, o PAIUB de fato não considerava importante um instrumento como o Provão. Finalmente, a adesão ao processo previsto pelo PAIUB seria voluntária. Em 1997, quase cinco anos após a criação do PAIUB, 138 IES, entre particulares e privadas, haviam aderido ao programa (MEC, 2005). Dessa forma, cinco anos após a criação, o PAIUB atingia somente cerca de 15% das 900 IES existentes no país.

Portanto, muito embora tenha havido ampla discussão sobre avaliação do ensino superior no Brasil a partir de 1980, os resultados desse processo foram tímidos. Havia a necessidade de um programa de avaliação realmente nacional, que englobasse a totalidade do sistema de ensino superior brasileiro e fosse de fácil compreensão pela sociedade.

3.3 Criação do Exame Nacional de Cursos – Provão

O Exame Nacional de Cursos foi criado através da lei nº 9.131 de 24 de novembro de 1995. Nos artigos 3º e 4º, posteriormente revogados pela lei 10.861 de 2004, ficava estabelecido que o MEC faria avaliações periódicas das IES e de cursos superiores, através de exames nacionais que cobririam conteúdos mínimos determinados para cada curso por grupos de especialistas em cada área. A mesma lei determinava que o MEC utilizaria os resultados dos exames nacionais para “estimular e fomentar iniciativas voltadas para a melhoria da qualidade do ensino, principalmente as que visem a elevação da qualificação dos docentes” (BRASIL, 1995).

Para Jocimar Archangelo, um dos principais idealizadores do ENC, a situação, no início do governo Cardoso era de desconhecimento total do sistema de ensino superior e da qualidade das IES brasileiras e algo precisava ser feito para abrir a “caixa-preta” (ARCHANGELO, 2003, p. 11).

Segundo ele, o Provão era um bom lugar para começar por, pelo menos, dois importantes motivos:

1) avaliar diretamente a aprendizagem;

2) utilizar um formato de exame que segue a cultura escolar brasileira. Nas palavras de Archangelo:

O Provão dá conta do cotidiano da sala de aula. Ele verifica o desempenho do aluno, a aprendizagem média de um grupo de alunos. Esse era o primeiro passo: verificar a aprendizagem do aluno. Outra coisa importantíssima, o Provão seguiu a cultura escolar do país. A avaliação de todos nós, como alunos e professores, sempre foi com provas. Embora teoricamente se fale em avaliações processuais, etc., nossa cultura está associada a provas, como o vestibular, que tem grande credibilidade nacional. Não há objeções ao vestibular. Era começar por aí, por um instrumento que fosse absorvido pela sociedade porque tem credibilidade. (p. 11)

Além dos motivos citados acima, é interessante relembrar que, de acordo com o programa de reforma de Estado do Presidente Cardoso, o governo deveria definir indicadores e acompanhar o desempenho dos gestores nos indicadores definidos e o Provão está totalmente de acordo com essa diretriz gerencial. Além disso, para o ex-Ministro Paulo Renato Souza, a utilização do desempenho no Provão como indicador de qualidade do curso permitiria ao governo atingir uma espécie de Meca educacional: a ampliação do sistema com garantia de qualidade no ensino (O Ensino Superior Tem Mais Qualidade, 1999b).

Portanto, não só a expansão do sistema era necessária, ela era também desejada. Segundo o ex-Ministro, essa expansão resultaria em melhoria de qualidade, pois “inequivocamente, expandir a oferta e avaliá-la ajuda a melhorar a qualidade do ensino. Outra razão significativa que justifica a expansão da oferta” (Avaliação e Expansão do Ensino Superior, 1999a). Por todos esses motivos, o Provão era um ponto de partida adequado para a construção de um programa de avaliação de ensino superior no Brasil.

3.3.1 Principais características do Provão

Mello (2004) define o Provão como “um exame escrito aplicado anualmente a alunos em fase de conclusão ou recém concluintes de cursos de graduação” (p. 113). Esse exame era universal, ou seja, cobria todo o universo dos formandos dos cursos avaliados. Pode-se classificar o Provão, portanto, como um exame em larga escala (INEP, 2003b).

O processo de elaboração das provas foi estabelecido de forma a envolver o máximo possível as comunidades acadêmico-científicas e profissionais de cada área (Esquema 3).

Projetos pedagógicos dos

cursos da área

MEC

Nomeia Comissões das áreas

Nomeia Comissões das áreas Definem Diretrizes de Avaliação (1) Definem Diretrizes de Avaliação (1) Comissões A A A

A Realiza licitação para elaboração dos exames Realiza licitação para elaboração dos exames

MEC

Elabora o exame de acordo com as Diretrizes

Elabora o exame de acordo com as Diretrizes

Consórcio vencedor (2) Discussões com

comunidades acadêmica e profissional da área

Esquema 3 - Processo de elaboração das provas do ENC