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Inovação, Conhecimento, Aprendizado e Assimetrias: Uma

1 - Introdução

Este capítulo apresenta as bases conceituais que servirão para apoiar o objetivo

central deste trabalho. Será introduzida a abordagem neo-schumpeteriana, especificamente

a sua corrente analítica sobre sistemas de inovação e os seus processos de aprendizado e

difusão do conhecimento; esta abordagem será combinada com uma releitura do

pensamento latino-americano clássico sobre desenvolvimento e inserção internacional das

economias periféricas, principalmente as contribuições de Raul Prebish. Estas duas

correntes apresentam diversos pontos de convergência e podem ser consideradas

complementares, na medida que é possível associar as condições estruturais dos países

periféricos à análise dos processos de aprendizado e capacitação produtiva e inovativa. As

principais convergências serão apontadas e analisadas no item 2.

Diversos autores brasileiros e latino-americanos contemporâneos

1

vêm utilizando

conceitos e abordagens estruturalistas, cepalinas, desenvolvimentistas em suas análises

sobre os impactos e desafios do novo paradigma técnico econômico – representado pela

revolução das TICs – e da globalização em nossas economias. Destacam-se os trabalhos da

Redesist

2

, que buscam adaptar o referencial teórico neo-schumpeteriano sobre sistemas da

inovação, conhecimento e aprendizagem à nossa realidade, principalmente para analisar

sistemas inovativos e arranjos produtivos locais em diversas regiões do Brasil. Os aspectos

conceituais relevantes deste enfoque serão abordadas no item 3 deste capítulo.

2 Convergências e Complementariedades

O marco inicial relativo aos pontos de convergência entre a corrente

neo-schumpeteriana e o pensamento latino-americano clássico sobre desenvolvimento e

1 Cassiolato, Lastres, Perez, Katz, Arocena, Sutz, Vargas, Campos, Maldonado, Scatolin, Lemos, Szapiro, Melo, Vilaschi, entre outros.

2 REDESIST – Rede de Pesquisa em Sistemas Produtivos e Inovativos Locais. A Redesist é uma rede de pesquisa interdisciplinar sediada no Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e que conta com a participação de várias universidades e institutos de pesquisa no Brasil, além de manter parcerias com outras organizações internacionais.

inserção internacional das economias periféricas pode ser sintetizada na seguinte

observação: para ambas as correntes os processos de desenvolvimento econômico são

caracterizados por profundas mudanças estruturais na economia. Ou seja, o

desenvolvimento econômico ocorre a partir de descontinuidades (geralmente de caráter

tecnológico e/ou produtivo) que afetam, e também são afetados, pela estrutura produtiva,

social, política e institucional de cada nação. Portanto, o desenvolvimento econômico não é

um processo linear e sequencial. Neste sentido, seria incorreto considerar os países menos

desenvolvidos como “atrasados” ou entender o desenvolvimento como sendo passível de

um “catch-up”. O desenvolvimento de cada nação é um processo único e depende de

aspectos que envolvem suas especificidades políticas, econômicas, históricas e culturais,

ocorrendo a partir de mudanças estruturais de longo prazo que geram rupturas com os

padrões historicamente estabelecidos. Estes processos criam uma série de novas

oportunidades, porém, ao mesmo tempo, impõe um conjunto de novos e profundos

desafios, já que não são processos harmônicos, caracterizando-se por incertezas, conflitos e

assimetrias.

A partir desta relação entre mudança estrutural e desenvolvimento econômico

constróem-se as convergências e complementariedades entre a corrente neo-schumpeteriana

e a visão estruturalista clássica. Esta dissertação propõe a existência de cinco pontos de

convergência, que serão analisados nas seções seguintes deste capítulo: (i) a negação do

equilíbrio clássico; (ii) a importância da inovação para o desenvolvimento das nações; (iii)

as assimetrias de desenvolvimento tecnológico e econômico; (iv) a divisão internacional do

trabalho e (v) o enfoque de orientação política de ambas as teorias. Estes três últimos

surgem como corolário natural das duas primeiras.

2.1 Negação do Equilíbrio Clássico

A Teoria Neoclássica tem como um dos seus pilares a hipótese do equilíbrio entre

mercados e a existência de processos de convergência a este equilíbrio. As correntes

neo-schumpeteriana e estruturalista, inversamente à teoria neoclássica, têm como marco

analítico fundamental o estudo de processos assimétricos e de desequilíbrio.

A concorrência neo-schumpeteriana é um processo ativo de criação de espaços e

oportunidades econômicas, e não apenas um processo passivo de ajustamento em direção a

um suposto equilíbrio. Nessa concepção, concorrência implica o surgimento permanente e

endógeno de diversidade no sistema econômico capitalista. O processo de crescimento

interage como processo de mudança, alternando-se ao longo do tempo, produzindo a

própria dinâmica de acumulação capitalista, que se move por inovações, descontinuidades e

incertezas [Schumpeter (1911)]. Dosi propõe, de maneira simples e direta, que a aceitação

da capacidade das firmas influenciarem o ambiente econômico, por exemplo, fixando

preços ou introduzindo inovações é condição suficiente para a eliminação da possibilidade

de existência da concorrência pura neoclássica. [apud. Kupfer (1996, p.5)]

A corrente estruturalista também torna clara a negação de qualquer hipótese de

equilíbrio, já que toda teoria é baseada em processos de hierarquização e geração de

assimetrias. Como por exemplo: as assimetrias tecnológicas entre centro e periferia, a

deterioração dos termos de troca internacionais, as debilidades estruturais e o modelo de

dois hiatos, todos incompatíveis com modelos com tendência a algum ponto de equilíbrio.

2.2 A importância do Progresso Técnico e da Inovação

As formulações centrais de Prebisch e dos neo-schumpeterianos incluem o

progresso técnico (ou inovação) como um dos principais determinantes para o

desenvolvimento econômico das nações.

Prebish negou-se a tratar o “subdesenvolvimento” como uma anomalia ou um

simples estado de atraso. Para o autor, o “subdesenvolvimento” pode ser identificado como

um padrão de funcionamento e de evolução específica de certas economias. O processo de

desenvolvimento nas condições periféricas seria um processo diferenciado, cujos

desdobramentos históricos seriam singulares à especificidade de suas experiências.

Portanto, a estrutura socioeconômica periférica determina um modo próprio de

industrializar, introduzir progresso técnico e crescer, cabendo esperar-se sequências e

resultados distintos aos que ocorrem no desenvolvimento cêntrico [ver, por exemplo,

Furtado (1961), Bielschowsky (2000), Rodriguez (2001)].

O progresso técnico seria a chave para os diferentes níveis de desenvolvimento das

nações. A distribuição desigual dos benefícios do aumento da produtividade e eficiência

(frutos do progresso técnico) gera as acentuadíssimas diferenças nos padrões de vida entre

centro e periferia, assim como, as notórias discrepâncias entre as suas respectivas forças de

capitalização [ver Prebisch, (1949.a)]. Neste sentido, conforme explicitado por Fiori (2001

a, p.46): “as colocações de Prebisch e dos demais estruturalistas possuem conotações

fortemente schumpeterianas, na medida que a inovação e a difusão tecnológica ocupam o

lugar central na periodização da história capitalista e na determinação, em última

instância, do processo histórico de hierarquização ou dualização do sistema capitalista”.

Na visão de Prebisch a revolução industrial (e as suas profundas inovações

tecnológicas e produtivas) colocou a Europa – principalmente a Inglaterra – no final do

século XIX e os Estados Unidos, durante o século XX, no epicentro da economia capitalista

mundial. Estes centros cíclicos impunham os padrões tecnológicos, comerciais e de

desenvolvimento desiguais e hierarquizados que deram origem à periferia do sistema [ver

Fiori (2001)]. Nesse processo “a iniciativa esteve com as economias que se

industrializaram e geraram o progresso técnico; a acumulação rápida que nelas tinha

lugar constituía o motor das transformações capitalistas. Portanto, existe uma íntima

interdependência entre a evolução da tecnologia nos países industrializados e as condições

históricas do seu desenvolvimento econômico” [Celso Furtado (1961) apud. Bielschowsky

(2000, p.251)].

Como se sabe, a obra de Joseph Schumpeter

3

representou um importante marco

evolutivo na teoria econômica no século XX. Talvez a sua principal contribuição,

convergente com as formulações de Prebisch, foi a teorização sobre a relação existente

entre inovação tecnológica e o desenvolvimento econômico. Segundo o autor os ciclos de

desenvolvimento econômico de longo prazo são gerados por ondas de revoluções

tecnológicas. O empresário ao introduzir as inovações desafia as empresas existentes, o

sucesso dos empresários inovadores é imitado pelos demais, gerando uma onda de

investimentos que estimula toda a economia. Neste sentido, o crescimento da economia é

3 O essencial da teoria de Schumpeter encontra-se em três trabalhos – Teoria do Desenvolvimento Econômico (1912), Business Cycle (1939) e Capitalismo, Socialismo e Democracia (1942) em sua obra The Theory of Economy Development

um processo dinâmico que depende tanto da geração e uso das inovações, quanto dos

processos de difusão destas inovações

4

[Schumpeter (1911), ver ainda Cassiolato e Schmitz

(1992), Tigre (1997) ePossas (2002)]

As contribuições originais de Schumpeter têm sido aprimoradas e melhor

qualificadas nos últimos 30 anos por uma série de autores que pretendem explicar a

dinâmica capitalista atual através da endogeinização do progresso técnico em suas análises.

De fato a abordagem neo-schumpeteriana aponta uma estreita relação entre o os ciclos de

crescimento econômico e as mudanças que ocorrem com a introdução e difusão de

inovações. Nesta visão os avanços (produtivos, tecnológicos, organizacionais,

institucionais, etc.) resultantes de processos inovativos são fator básico na formação dos

padrões de transformação da economia, bem como do seu desenvolvimento de longo prazo.

Partindo das limitações dos conceitos originais de invenção, inovação e suas formas

de difusão, propostos por Schumpeter, os autores neo-schumpeterianos têm realizado

importantes adaptações e desenvolvimentos. Estas modificações possibilitam uma melhor

caracterização sobre os processos inovativos e os seus efeitos sobre a dinâmica econômica

[ver Freeman (1994)].

Uma importante limitação na herança schumpeteriana foi a ênfase dada às chamadas

inovações radicais

5

que estão associadas a grandes descontinuidades no processo

econômico. Schumpeter subestimou os esforços necessários para realização de inovações

incrementais, que se referem à introdução de qualquer tipo de melhoria em um produto,

processo ou organização da produção, sem alteração substancial na estrutura industrial [ver

Freeman (1988)]. As inovações incrementais, ao contrário das inovações radicais, ocorrem

com maior frequência e provocam modificações marginais na estrutura produtiva e

econômica. Muitas destas mudanças são imperceptíveis, mas nem por isso menos

importantes

6

, podendo gerar: crescimento da eficiência técnica, aumento da produtividade,

4 Inovações em sentido amplo referem-se a quaisquer mudanças no “espaço econômico” no qual operam as empresas, sejam elas mudanças nos produtos, nos processos produtivos, nas fontes de matérias-primas, nas formas de organização produtiva, ou nos próprios mercados. [Possas (2002,p.418)]

5 Inovação radical refere-se ao desenvolvimento de um novo produto, processo ou forma de organização da produção inteiramente novas (Redesist, 2004, p.15). Segundo Freeman estas inovações, em Schumpeter, estão associadas à emergência de novos ciclos longos (ex: máquina a vapor, ferrovias, motor à combustão, eletricidade).

6 Estas inovações são particularmente importantes para a análise dos processos de inovação em países periféricos, onde diversos estudos empíricos comprovam a predominância deste tipo de inovação.

redução dos custos, aumento de qualidade e ampliação das aplicações de um produto ou

processo. [ver Lemos (1999), Redesist (2004)].

Freeman e Perez [1988] sugerem ainda a existência, além das inovações radicais e

incrementais, de dois outros processos de mudança tecnológica: novos sistemas

tecnológicos e mudanças no paradigma técnico-econômico.

Os novos sistemas tecnológicos consistem em combinações de inovações que

possuem grandes ramificações e impactos sobre diversos setores produtivos e que,

geralmente, geram o surgimento de novos setores na economia. Como exemplo, temos a

internet, a telefonia móvel e a indústria de software pacote.

As mudanças no paradigma técnico-econômico ocorrem com o desenvolvimento e

difusão de novas tecnologias e/ou novos sistemas tecnológicos que possuem um grande e

genérico conjunto de aplicações que impactam diretamente sobre as condições estruturais

de produção em praticamente todos os setores da economia. Como exemplo, pode-se citar o

motor a vapor e a eletricidade. Com relação direta com os objetivos deste trabalho, pode-se

citar o amadurecimento do mais recente paradigma técnico-econômico, caracterizado pela

revolução das tecnologias da informação e comunicação – TICs.

As mudanças nos paradigmas técnico-econômicos são essenciais para explicar os

períodos de crescimento e de crise econômica. Os novos paradigmas alteram as fronteiras

tecnológicas e criam novos conjuntos de padrões, práticas e processo produtivos,

geralmente a mudança tecnológica é rápida e acompanhada por um grande nível de inércia

nas instituições e organizações públicas e privadas existentes. Desta forma os períodos de

crise são vistos a partir do conflito entre a emergência do novo paradigma e a estrutura

institucional anterior, da mesma forma os booms econômicos estariam relacionados aos

períodos em que ocorre a adaptação das instituições e da estrutura econômica e a sua

interação com o novo paradigma tecno-econômico.

Talvez o ponto mais importante na visão neo-schumpeteriana é que a inovação, ao

invés de ser entendida como um ato isolado do empresário, passa a ser compreendida como

um processo complexo, interativo, de múltiplas fonte e, portanto, não linear. Neste enfoque,

a inovação consiste em um fenômeno sistêmico

7

gerado e sustentado por relações

inter-firmas e por uma complexa rede de relações inter-institucionais, sendo considerada como o

resultado de trajetórias que são cumulativas e construídas historicamente, de acordo com as

especificidades institucionais e padrões de especialização econômica inerentes a um

determinado país, região ou setor. [Cassiolato (1992)].

Assim, tanto o entendimento da inovação como sendo um processo sistêmico como

a qualificação das diferentes formas pelas quais ocorrem a mudança tecnológica e os seus

efeitos sobre a estrutura econômica, propostas pela visão neo-schumpeteriana, se mostram

convergentes à visão estruturalista cepalina proposta inicialmente por Prebisch, no sentido

em que a mudança tecnológica é o fenômeno diretamente relacionado ao processo de

mudança estrutural e desenvolvimento econômico sendo, portanto, o motor da dinâmica

capitalista.

2.3 Assimetrias Internacionais de Desenvolvimento Econômico e Tecnológico.

No item anterior ficou clara a correlação entre inovação e desenvolvimento

econômico. Portanto, à primeira vista, temos como um corolário direto que o caminho do

desenvolvimento de um país pode ser trilhado com a promoção do seu desenvolvimento

científico e tecnológico. Porém o processo de introdução, uso, difusão e geração de

inovações em uma determinada economia, dado que ele é específico e historicamente

determinado, não é independente das relações que esta economia terá com as demais.

Portanto, as possibilidades de desenvolvimento tecnológico e econômico que o país possui

são influenciadas tanto pela sua estrutura interna (econômica, social e institucional) quanto

pela sua forma de inserção econômica e geopolítica internacional.

Historicamente as nações que se colocaram à frente do processo inovativo tenderam

a ser mais dinâmicas e competitivas obtendo melhor desempenho econômico e poder

geopolítico. Desta forma estabeleceram-se linhas divisórias entre os que estão capacitados a

promover ou participar ativamente da dinâmica atual de inovação e aprendizado, e aqueles

que foram, ou tendem a ser deslocados e marginalizados. A origem desta dualização está no

7 Como um fenômeno sistêmico inclui o conjunto de fatores econômicos, institucionais sociais, políticos e organizacionais que influenciam o desenvolvimento, difusão e uso das inovações.

processo de difusão das inovações, que pode originar concentrações dos benefícios

competitivos e econômicos do progresso tecnológico em empresas, regiões e países. Este

fato já tinha sido identificado por Prebisch no final dos anos 40:

A propagação do progresso técnico, a partir dos países de

origem para o resto do mundo, tem sido lenta e irregular

8

, as novas

formas de produção beneficiaram apenas uma proporção reduzida da

população mundial. Assim foram se formando os grandes centros

industriais do mundo, em torno dos quais a periferia do novo sistema

se forma” [Prebisch, 1949.b].

Em consonância e complementarmente à afirmação de Prebisch, Freeman (1988)

afirma que o hiato temporal entre inovadores e imitadores está positivamente relacionado à

sustentação do fluxo de inovações pelos inovadores e à fragilidade das condições

necessárias para inovar nos países imitadores. Estas “assimetrias tecnológicas” agem, ao

mesmo tempo, como uma barreira dinâmica ao acesso às novas tecnologias e como um

novo incentivo à inovação para aqueles que estão liderando o processo tecnológico. Desta

forma, as assimetrias internacionais e históricas entre centro e periferia podem perdurar e se

intensificar.

Este processo de dualização não seria alimentado somente pelo hiato temporal, mas

principalmente, pela dificuldade de acesso à informação e ao conhecimento e pela

ampliação constante dos limites da fronteira tecnológica. Neste sentido, quanto mais

distantes da fronteira tecnológica estiverem os países periféricos maiores serão as barreiras

para uma atuação inovativa em um novo padrão tecnológico.

Ainda mais grave do que as assimetrias tecnológicas são as assimetrias de

aprendizagem que implicam na impossibilidade de acessar, compreender, absorver,

dominar, usar e difundir conhecimentos. Desta forma, mesmo quando o acesso às novas

tecnologias torna-se possível, muitas vezes, não dispomos de conhecimentos suficientes

para fazer uso das mesmas. Isso ocorre porque o processo de aprendizado depende da

existência (e operação) de capacidades produtivas e inovativas, as quais, nem sempre estão

disponíveis ou suficientemente desenvolvidas. Arocena e Sutz (2004, p.8) argumentam que,

neste aspecto, há uma clara separação entre Norte e Sul, as divisórias del aprendizaje são

na opinião dos autores o aspecto maior da problemática atual do subdesenvolvimento. Estas

condições ampliam o fenômeno do development divide representado pelas condições

assimétricas de desenvolvimento econômico e social existentes entre países do centro e

periferia. Neste sentido, o aprofundamento do gap econômico e social é determinado pelo

gap na aquisição e uso de conhecimentos o qual delimita fronteiras cada vez mais rígidas

entre economias avançadas e periféricas. [ver ainda Cassiolato (1999) Lastres e Albagli

(1999), Maldonado (1999), Lastres (2004); Lastres, Cassiolato e Arroio (2005)].

Uma releitura da obra de Prebisch permite extrair as mesmas conclusões obtidas

pelos autores neo-schumpeterianos. Segundo Prebisch as assimetrias do progresso técnico

são o fator responsável pela diferenciação econômica e social entre países periféricos e

centrais, fator determinante o conceito centro-periferia. Os imensos benefícios do

desenvolvimento, frutos do progresso técnico não chegaram à periferia numa medida

comparável àquela que logrou desfrutar a população dos grandes países. Daí as

acentuadíssimas diferenças nos padrões de vida, assim como as notórias discrepâncias entre

as suas respectivas forças de capitalização e desenvolvimento [Prebisch, 1949.a].

2.4 A Nova Divisão Internacional do Trabalho

Neste sentido, tanto Prebisch quanto os autores neo-schumpeterianos negam a

hipótese dos benefícios da divisão internacional do trabalho baseada no princípio

neoclássico das vantagens comparativas. Ao contrário, ambas as correntes indicam que a

divisão do trabalho entre centro e periferia é caracterizada pela existência e ampliação dos

hiatos tecnológicos e de conhecimento entre as nações. Estes hiatos seriam responsáveis

pela exportação de produtos e serviços pelos países líderes, com características de preço e

desempenho superiores, enquanto os países menos desenvolvidos ficam restritos a um

padrão de produção e exportação crescentemente obsoleto e não competitivo.

A inserção da América Latina, na divisão internacional do trabalho no início do

século XX, era caracterizada como exportadora de commodities primárias e importadora de

produtos industrializados. Esta etapa de “crescimiento hacia afuera” da América Latina

marcou um tipo de inserção periférica na economia mundial tal que o avanço tecnológico

provinha, sobre tudo, do exterior ou das filiais das empresas estrangeiras instaladas na

região [ver Arocena e Sutz (2004), Fiori (1999)]. Prebisch considerava que esta forma de

inserção provocava uma série de desequilíbrios internos (déficits na balança comercial,

baixa acumulação de capital, processos inflacionários e desemprego estrutural) e

apresentava a tendência de agravamento do conflito (assimetrias) centro x periferia.

O autor explicava a ampliação destes desequilíbrios com a sua tese de Tendência à

Deterioração dos Termos de Troca: este tese defendia que a maior lentidão no progresso

técnico dos produtos primários em relação aos industriais não estava motivando o

encarecimento dos primeiros em relação aos últimos. Desta forma os centros desenvolvidos

preservavam integralmente o fruto do seu progresso técnico, enquanto os países periféricos

transferiam para eles uma parte do fruto do seu pequeno progresso técnico

9

.

A inserção internacional recente da América Latina, caracterizada pelas políticas

liberalizantes implementadas nos anos 80 e 90, gerou na maioria dos países da região, um

processo de desnacionalização e destruição da capacidade produtiva e inovativa endógena,

aumentando a gravitação e a importância de interesses do capital estrangeiro. A perda de

graus de liberdade na condução de política - com o aumento da subordinação política e

econômica aos interesses do capital financeiro internacional e dos grandes conglomerados

multinacionais - criaram uma série de constrangimentos externos à implementação de

políticas que visem ampliar as exportações, desenvolver a produção nacional e a

capacidade endógena de gerar conhecimento e inovação. Desta forma, o hiato-tecnológico

secular entre centro e periferia se mantém, podendo inclusive se ampliar, caso a destruição

ocorrida nas capacidades produtivas e inovativas não se reverta. [ver, por exemplo,

Chesnais e Sauviat (2003), Katz e Cimoli (2003), Arocena e Sutz (2004)].

Pode-se dizer que o processo de inserção internacional da América Latina no início

o século XXI é o mesmo do início do século XX. A participação de nossas economias na

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