• Nenhum resultado encontrado

Capítulo II – Transformação e crise na “década perdida”

1. Indivíduos, instituição e contexto: diferentes crises, diferentes efeitos (1980-1985)

1.1. INPES e o fortalecimento da assessoria ao governo

Quando Delfim Netto assume a secretaria de planejamento, em 1979, o mundo sentia os efeitos do segundo choque do petróleo. A alta dos preços dos barris levou os Estados Unidos ao aumento de sua taxa de juros, causando, em consequência, escassez de recursos financeiros no cenário internacional e o aumento do valor das dívidas dos países que haviam contraído empréstimos nos anos anteriores, entre eles, o Brasil. Some-se a isso, a aceleração da inflação. Em relação ao IPEA, o ministro nomeou os superintendentes do INPES e do IPLAN63. Embora seja corrente que, por serem cargos de confiança, alteravam-se superintendentes e presidente do IPEA quando das mudanças de ministros, nesse caso, as nomeações por Delfim são narradas como se carregassem algo atípico. Essa quase reserva em relação aos novos superintendentes ou seus subordinados apresenta nuances entre aqueles que criticam as indicações, entre os que relativizam a crítica com o reconhecimento da qualidade das pessoas contratadas e os que, envolvidos de alguma maneira com projetos desenvolvidos a partir do trabalho dessas pessoas, enfatizam os frutos que eles geraram.

Entre os primeiros, estão mais frequentemente pesquisadores de Brasília. Entre os segundo e terceiro grupos estão pesquisadores do Rio de Janeiro. As críticas de pesquisadores de Brasília, mais especificamente do CNRH, diz respeito à avaliação de que as indicações e postura do ministro Delfim enfraqueciam ainda mais a posição já fragilizada do IPEA. Para os pesquisadores do Rio, o problema é mais frequentemente colocado com relação à já

63

Para o INPES foi indicado Luiz Paulo Rosenberg (1979-82), que foi substituído por Michal Gartenkraut (1982-85). Para o IPLAN foi indicado José Augusto Arantes Savasini (1979-83). Existe um relato segundo o qual Savasini era amigo de Delfim, mas não Rosenberg. Este teria sido indicado por Savasini.

100

mencionada64 demissão de seis pesquisadores do INPES. Os técnicos contratados para substituí-los entraram na instituição para formar um grupo de estudos encomendado pelo ministro Delfim: o pedido era de elaboração de uma nova estratégia de mobilização energética para o país. É possível - pela forma como personalidades e relações com elas acomodam tensões ou eventuais conflitos, exposta há pouco - que essa via de entrada tenha criado as condições para que o grupo de novos pesquisadores se estabelecesse na casa, antes que se criassem as percepções a respeito de suas competências.

“Delfim detestava o IPEA, exatamente por isso, que o IPEA era muito crítico. Ele dizia: ‘pô, seu eu quiser crítica eu vou ler jornal, não preciso do IPEA’. E ele avacalhou com o IPEA. Olha que eu gosto muito do Delfim, das coisas que ele escreve. Acho um cara brilhante, inteligente. Mas ele avacalhou com o IPEA. Tirou a seriedade, colocava coordenadores que não tinham nada a ver com a gente, não dava responsabilidades maiores pro IPEA, foi podando mesmo.” (Entrevista

com Claudio Salm em 02.11.2011)

Quando vinha uma diretriz como essa, de que precisava mudar as coisas na área de energia - e no caso isso representava virada estratégica enorme - o IPEA tornou-se o articulador dos programas que existiam na Eletrobras, na Petrobras, no BNDES, no Ministério de Minas e Energia. Havia problemas setoriais e passou a ser política macro a partir da entrada em cena do IPEA. Então por que fomos parar lá? Precisava de gente com conhecimento ‘engenheiral’ da coisa. Não era só economia, precisava entender como é isso de consumo de energia, precisava modelar isso e desenvolver nova política. Eu já encontrei esse grupo lá. Eu indiquei essas pessoas porque tinham sido meus alunos. Eu indiquei pro Luiz Paulo e ele também conhecia esse pessoal, ele tinha dado aula no ITA. (...) Quando fui, estava começando a se montar. (Michal

Gartenkraut, entrevista realizada em 20.08.2010)

Este grupo era formado por engenheiros com interesse em assuntos econômicos e muitos de seus pesquisadores continuaram trabalhando na instituição, embora em outras áreas. Na mesma época e com a mesma base de pesquisadores, montou-se o grupo para estudar o problema de balanço de pagamentos. Dele participavam também economistas com muitos anos de casa e muito reconhecidos, mas diferentemente dos pesquisadores que então ingressaram, eram “meio soft, mais na conversa, gráficos” (idem, Gartenkraut). Finalmente, montou-se também um grupo para estudo da previdência social, com outros pesquisadores, mas com o mesmo perfil de forte competência na área de métodos quantitativos. Outra

64 Ver nota 61.

101

iniciativa desse período foi o estabelecimento do Grupo de Acompanhamento Conjuntural65. Embora não necessariamente em termos de maior importância que os demais grupos formados, ele evidencia a proximidade crescente que o INPES adquiria com o ministério do Planejamento. Iniciativa nesse sentido já havia sido tomada com a criação das reuniões de conjuntura – cujos participantes eram denominados como formando o Grupo de Conjuntura –, em 1979, ainda durante a gestão de Mario Henrique Simonsen (Francisco Lopes como superintendente do INPES). Segundo relato de seu primeiro coordenador, José Claudio Ferreira da Silva (D’ARAÚJO, FARIAS e HIPÓLITO, 2004: 283), o novo superintendente manifestou interesse em ampliar o Grupo, o que foi feito. Em reuniões mensais66, os participantes discutiam assuntos e questões de interesse do ministério do Planejamento, com base em estudos realizados pelos técnicos cariocas. Faziam parte dos encontros, exclusivamente, assessores e representantes dos ministérios, além de acadêmicos e empresários convidados.

65

O Grupo foi interrompido, no ano de 2007, por decisão do então presidente do Instituto, Marcio Pochmann. A medida foi acompanhada pelo desligamento do coordenador do grupo, Fábio Giambiagi (funcionário do BNDES cedido ao IPEA, na época) e de mais três pesquisadores. Os pesquisadores aposentados Regis Bonelli e Gervasio Rezende e o também funcionário do BNDES Otávio Tourinho. A decisão foi duramente criticada (em jornais, revistas e internet) e classificada como perseguição a pesquisadores críticos ao governo e consequente aparelhamento do IPEA pelo novo presidente. Pochmann, por usa vez, justificou as medidas com base em argumentos de gestão: o convênio que mantinha os dois funcionários dos BNDES na casa já estava em fase final e os dois outros pesquisadores estavam em situação irregular, sem contrato formal. Ainda segundo Pochmann, a análise de conjuntura também era feita por outros órgãos estatais e deveria ser substituída por discussões de longo e médio prazo. Além disso, o Boletim de Conjuntura (ver nota seguinte), publicado trimestralmente, foi suspenso e seria substituído, também, segundo o presidente Pochmann, por outras publicações mais alinhadas à nova perspectiva adotada pelo IPEA. Para algumas dessas manifestações, ver: FSP- Mercado, 17.11.2007; FSP- Mercado, 02.12.2007; FSP- Mercado, 27.06.2008; FSP- Brasil, 29.06.2008.

66 A menção à periodicidade com que esse grupo se reunia varia conforme a fonte, possivelmente refletindo

variações ocorridas, de fato, ao longo do tempo. Relatório de atividades de 1997 da Diretoria de Pesquisa (forma como o INPES, unidade do Rio de Janeiro, era chamado nessa época) dá periodicidade “geral” de três vezes por ano. A última reunião registrada no relatório daquele ano foi a de número 73. Vale mencionar a distinção feita por esse documento entre Grupo de Conjuntura (criado em 1979, segundo o relato mencionado) e Grupo de Acompanhamento Conjuntural, criado em 1987, “responsável pelas atividades permanentes de conjuntura, que

consistem na atualização da base de dados, na melhoria da qualidade destes e na difusão das análises e informações (...) elaboração de notas quinzenais de acompanhamento conjuntural e informes eventuais da área econômica do governo, como pela preparação e edição de dois dos periódicos publicados pelo IPEA: Boletim Conjuntural e Carta de Conjuntura. É responsável ainda pelas notas GAC de informações e opiniões sobre temas do momento da economia brasileira e pelos Indicadores IPEA, volume contendo estatísticas econômicas, distribuído às autoridades do Governo” (Relat 1997:5). Embora os nomes sejam usados, por vezes,

indistintamente, deve ser suficiente compreender que havia um grupo com caráter mais assessor, herdado de fins de 1970, e outro de análises mais cotidianas, surgido no fim da década seguinte.

102

Pode-se afirmar consensual a percepção de que esses grupos tenham feito parte de uma orientação do ministro Delfim de tornar o INPES um órgão mais fortemente voltado para as questões do governo. As avaliações a respeito disso, mais uma vez, vão desde as ressalvas até a adesão à proposta e engajamento nas tarefas em que ela implicava. Coerentemente com a tradição do INPES de cultivo de seu status quase-acadêmico, tal direcionamento era visto com dúvidas entre os mais antigos. Os mais diretamente envolvidos na condução dos trabalhos, diferentemente, resgatam a experiência e as contribuições para os problemas que originaram os grupos, na linha de excelência com que se costuma caracterizar o IPEA de maneira geral. Ou, dito de outra forma, a contribuição do INPES naquele período não representa, para esses então novos pesquisadores, nenhuma mudança em relação à forma como ele trabalhava ou se relacionava com os centros decisórios do governo federal. Ao contrário, encaixava-se perfeitamente na tradição do instituto.

Vale explicitar, ainda, o fato de que não havia, nesse momento, nenhum tratamento excepcional às questões sociais, exceção feita ao estudo sobre os problemas da previdência. Mas mesmo nesse caso, as referências a esse grupo são infinitamente menos frequentes na descrição dos trabalhos realizados pelo INPES na primeira metade da década de 1980. Com o passar do tempo, o esquema de elaboração e assessoria intensivos foi se suavizando, na medida em que se fortalecia, no governo, a sensação de que o pior das crises já havia passado. No caso do Grupo de Conjuntura, ele mantém-se primordialmente voltado para aquele grupo fechado até fins dos anos 1980, quando se começa a publicar o Boletim de Conjuntura (editado pela primeira vez em 198767), com síntese das discussões, para circulação mais ampla.

Não sendo interesse deste trabalho avaliar o que foi ou não sugerido pelo IPEA entre as medidas adotadas em cada uma das áreas, para a questão aqui colocada, três pontos são relevantes. Dois deles já foram expostos: o primeiro, o ingresso, na instituição, de profissionais com um perfil diferente daquele que predominava no INPES e, muito provavelmente, no IPEA como um todo, até aquele momento. Os mais antigos, “bons, mas soft”. Os novos, fortemente munidos de instrumental quantitativo. O segundo ponto refere-se à força com que esse novo perfil chegou à instituição e o prestígio que ele conquistou a partir dos trabalhos realizados. O fato de que se detiveram a algumas poucas áreas específicas não

67 Ver nota 66.

103

deve ser entendido como de menor importância. Ao contrário, esses pesquisadores recém chegados foram alocados em áreas priorizadas pelo governo em função das crises e problemas enfrentados. O terceiro ponto que interessa a esta discussão refere-se não aos resultados, como foi dito, das proposições daqueles grupos para as políticas de fato implementadas, mas à maneira como esses resultados são contextualizados por seus narradores. Nesse sentido, a noção de antecipação de problemas pelo IPEA é central.

Para muitos de seus pesquisadores, a antecipação de problemas, a detecção de algo que não vai bem e cujos efeitos negativos devem ser prevenidos é uma das formas da assessoria que o IPEA, por definição, presta a ministérios, secretarias e outros órgãos do governo. Mas se para quem está na gestão, essa antecipação é descrita como produto da obviedade e da objetividade dos fatos, pensar no que consiste essa objetividade abre caminho alternativo para a compreensão da produção de conhecimento especializado para a condução de assuntos de interesse público. O tratamento do problema da dívida é um bom exemplo. Conta o então superintendente do INPES que, desde o início de 1982, um grupo coordenado pelo pesquisador Pedro Malan estudava a questão da dívida externa em sigilo. Se a informação de que estavam trabalhando na direção de viabilizar um empréstimo ao FMI chegasse à imprensa, o ministro seria obrigado a demitir todos os envolvidos, pois o governo negava qualquer movimentação nesse sentido (idem, Gartenkraut). Quando o México declarou moratória em agosto daquele ano e o governo brasileiro se viu na eminência de agravamento de sua crise, o INPES já possuía uma série de estudos reunidos sobre como proceder em caso de pedido de empréstimo ao Fundo: regras, negociações, experiência de outros países. Em novembro, depois das eleições para governador, senador, prefeito e deputados federal e estadual, o governo anuncia a ida ao FMI (SALLUM, 1996: 78).

“Tínhamos um estoque de estudos bem-feitos para serem entregues aos executores da política, com sugestões de como negociar com o fundo e os credores. Enfim, problemas nos quais nunca ninguém tinha pensado, porque eram impensáveis”. (Michal Gartenkraut em: D’ARAÚJO,

FARIAS e HIPÓLITO, 2004: 242).

Quando se pensa em problemas impensáveis está-se, ao mesmo tempo, configurando tais problemas, dando-lhes existência por meio de explicações para suas causas e variações, identificando seus mecanismos de funcionamento e, assim, criando as condições para

104

determinados “remédios”68

. Não se trata de negar a existência do problema. Mas é interessante admitir que o sentido da antecipação possui, também, um viés que explicita a vantagem que determinada proposição de encaminhamento adquire sobre outras possíveis proposições, num contexto de posição e disposição privilegiadas para sua enunciação69. É essa margem de possibilidades que o argumento da objetividade não comporta e que torna o IPEA uma instituição tão fundamental, por ser ele o produtor dessa objetividade. No caso da resolução do problema da dívida, a ida ao FMI foi a proposição privilegiada70. É possível, ainda, supor que os próprios artífices da antecipação concordassem com essa interpretação, na medida em que fazem raciocínio semelhante quando se referem a interlocutores, identificando neles as bases sobre as quais assumem determinados posicionamentos.

“O jogo de interesses é tão grande que é difícil: [contar com ou obter

uma opinião] isenta e competente. Isenta e incompetente tem um monte,

mas não adianta. Você ter certeza [como gestor] de que não tem nada por trás. Uma penada dessas e você pode beneficiar ou prejudicar um monte de gente. Se o ministro compra uma opinião dessa, ele dá dinheiro prá um projeto e não prá outro, fecha o projeto. Não tem a ver com alocação de recursos, é um problema político com P maiúsculo. (...) No IPEA é muito fácil. O difícil é você separar o que é competente do que é incompetente. E ter certeza de que você tem um a pessoa ali que não se vende. Não se vende entre aspas, porque às vezes a pessoa se apaixona por uma ideia. Não é que ele tá ganhando dinheiro, não é corrupto. Ele simplesmente tá comprado por uma ideia que é furada”. (Michal

Gartenkraut, entrevista realizada em 20.08.2010)

68 Ainda que para um debate mais específico – uma “proposta de antropologia do dinheiro através da história

cultural da inflação”-, Neiburg elabora questão semelhante ao sugerir que, ao criarem mecanismos e regras para

o manejo cotidiano de problemas econômicos, os profissionais atuantes nesse campo contribuem para a existência do problema (NEIBURG, 2007: 138).

69 Centeno (1993) acredita que um dos principais problemas com a bibliografia sobre governos tecnocráticos é o

fato de serem análises estáticas, de um ponto específico no tempo. Tentando, então, tratar de fatores que contribuem para a apreensão da emergência desse tipo de governo, cita o exemplo do México no momento da crise de 1982. O surgimento de uma elite tecnocrática não é, segundo seu argumento, apenas a resposta a uma demanda resultante de maior complexidade dos problemas ou mesmo da sociedade. O caso mexicano mostra que esse processo também envolve forças institucionais e do meio. Nesse caso, a crise econômica e a atuação das instituições internacionais credoras. Embora não trabalhemos com a noção de tecnocracia, a aproximação com o caso brasileiro é pertinente, na medida em que o episódio da negociação da dívida externa tem desdobramentos nesse cenário, que se assemelham àqueles observados no México, pelo autor. Com ênfase maior do que a que atribuímos para o caso brasileiro, esses desdobramentos são o desenvolvimento de novas formas de decisão, o fortalecimento de uma elite tecnocrática, o avanço dessa elite sobre outras instituições com base em certos critérios de performance (CENTENO, 1993: 317).

70 O coordenador do estudo, Pedro Malan, iniciou sua carreira internacional no ano seguinte, 1983, e foi o

105

No raciocínio muito coerente do pesquisador, a base do posicionamento do pesquisador imaginário que ele censura é o apego a uma ideia que o faz defender determinada medida política. O problema estaria em que, nessa situação hipotética, trata-se da defesa de uma ideia que não se sustenta sobre evidências racionais, objetivas, demonstráveis. Na defesa de seu argumento, o entrevistado afirma seu lugar de técnico em oposição a potenciais pesquisadores apaixonados por uma “ideia furada”.

O lançamento da dúvida sobre eventuais interlocutores é um artifício retórico que resulta na afirmação, por antecipação, de seu autor. Recorrentemente encontrado nas entrevistas, não se trata de privilégio da instituição, sendo comum também, por exemplo, no mundo acadêmico. O fato é o de que a afirmação da correção de certos posicionamentos não depende exclusivamente de estarem baseadas em evidências científicas, mas, fundamentalmente, que disponha de formas eficientes de demonstrar que o estão. Tais evidências, por fim, sempre estarão imbricadas aos círculos de relações, interlocuções e interesses que circundam sua produção. Assim como a ressalva para o “vendido”, não se trata de afirmar que seja uma postura desonesta, mas de admitir que há condicionantes sociais e políticos, inclusive para a busca de soluções, que escapam ao controle técnico.

Nesse caso particular da decisão em torno da resolução do problema da dívida, vê-se a interlocução específica desses técnicos com grupos de grande poder político e econômico. Na medida em que a formulação de problemas e soluções seja, também, influenciada pelo meio que a circunda, considerar que o uso da boa técnica se faça dentro de um leque reduzido de possibilidades parece até mesmo banal. Mais uma vez, não se afirma, com isso, nenhuma novidade. Versados na vida da gestão e da política, vários dos entrevistados mencionam a importância de “bancar”, para usar um termo deles próprios, determinadas decisões. O interessante, por outro lado, é como essa obviedade desaparece ou é recusada quando se trata de defender cientificamente determinada decisão política, esse o ponto que de fato nos ocupa aqui. O argumento científico substitui com muita facilidade o argumento político e isso não apenas porque o argumento científico é poderoso em si – ele é e com isso também não queremos dizer que ele não seja importante –, mas também por circunstâncias que envolvem sua enunciação e uso e porque, questão explicitada mais adiante, o argumento político perdeu força.

106

No que se refere ao âmbito mais geral da instituição no período inicial dos anos de 1980, os relatórios de atividades do INPES reforçam a caracterização de concentração do instituto em algumas áreas específicas71. Considerando um item específico desses documentos, para fins comparativos, o de áreas de concentração dos projetos de pesquisa, vê- se a manutenção das áreas de energia, agricultura, setor externo e setor público. As áreas mencionadas no relatório de 1980 – pré-crise, portanto – compreende estudos de macroeconomia e economia urbana e regional, sendo um dos projetos, inclusive, voltado para a definição do “perfil de pobreza nas áreas metropolitanas” (Relat1980)72

. De maneira semelhante, o relatório de 1984 também menciona outras áreas: indústria, emprego e salários, previdência social, além do acompanhamento de conjuntura. O de 1985, finalmente, reduz mais uma vez o número de áreas mencionadas àquelas dos anos de crise, mas substituindo a área de setor externo pela de indústria. Na comparação com a produção social do IPLAN, é possível perceber que cada uma das instituições começou a “década perdida” de maneiras distintas.