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Inserção e interação da pesquisadora no campo de estudos e coleta de dados

2.2 AS SINGULARIDADES E A OPERACIONALIZAÇÃO DA PESQUISA

2.2.2 Inserção e interação da pesquisadora no campo de estudos e coleta de dados

Para a aplicação dos instrumentos coleta de dados, os primeiros contatos foram realizados por e-mail enviado aos gestores de saúde, no segundo semestre de 2010. Neles se expunha o tema e os objetivos da pesquisa. Não se obteve sucesso. Apenas dois gestores responderam aos e-mails e manifestaram concordância e apoio à realização da pesquisa. Decidiu-se, então, realizar contatos telefônicos com os gestores, igualmente expondo a proposta da pesquisa e, novamente, não se obteve sucesso. As ligações passavam de ramais a ramais, raras vezes chegavam até os gestores e muitas vezes as ligações ―caiam‖. Houve muitas resistências e pouca receptividade.

Frente a essas dificuldades apontadas, optou-se em realizar a abordagem diretamente no campo, através de visitas aos municípios e aos gestores. A primeira entrevista foi realizada no dia 14.01.2011, via telefone, com gestor de uma das cidades-gêmeas, uma vez que este estaria em férias, e teve a duração, aproximada, de 30 min. A inserção no campo propriamente dita ocorreu entre 18 a 25 de janeiro de 2011. No dia 18.01.2011 em São Borja; 19.01.2011 Itaquí; 20 e 21.01.2011 Uruguaiana; 21.01.2011 Barra do Quaraí e; 24.01.2011 nos municípios de Quaraí e Santana do Livramento.

Do ―outro lado‖ da fronteira, ultrapassando os limites geográficos, realizaram-se

visitas de campo em quatro cidades - Paso de Los Libres, Bella Unión, Artigas e Rivera, objetivando conhecer o contexto local da política de saúde e identificar possíveis estratégias de integração e regionalização, respectivamente na Argentina, nos dias 20 e 21.01.2011em

Paso de Los Libres e no Uruguai nos dias 22.01.2011 em Bella Unión, 24.01.2011 em Artigas

e 25.01.2011 em Rivera.

Os contatos realizados foram:

a) Departamento de Saúde e Assistente Social do Hospital em Paso de Los Libres, Argentina;

b) Médico, Diretor do Hospital em Bella Unión; Enfermeira, Diretora Departamental de Saúde, Artigas; Médica, Rivera, Uruguai respectivamente.

Para essa etapa, dois instrumentos foram utilizados: entrevista e observação assistemática. Na coleta de informações para compor o banco de dados utilizou-se a entrevista semi-estruturada, orientada por um roteiro (Anexo E), contendo perguntas sobre os dois eixos da pesquisa: SIS Fronteiras e Pacto pela Saúde sendo que todas foram gravadas e posteriormente transcritas por outra pesquisadora. As entrevistas tiveram, em média, duração de 50min.

Além da entrevista, foi desenvolvida observação assistemática, relacionada ao objeto de estudo, sintetizada e registrada em diário de campo. Esta teve como foco os seguintes pontos: agendamentos e contatos com os gestores, técnicos e profissionais que trabalham no sistema de saúde, a receptividade dos entrevistados, o grau de disponibilidade para a entrevista, as resistências, o local onde se realizou a entrevista e a interação da equipe. Essas informações forneceram elementos valiosos e significativos para a leitura e interpretação posterior, bem como para a compreensão do campo investigado. Registraram-se também, no diário de campo, apontamentos relativos à inserção no campo, e que foram incorporadas a este estudo. Cabe lembrar que a pesquisa não se esgotou nessa atividade. Ela consistiu em apenas uma das etapas desse processo.

Os arquivos das transcrições foram entregues pela coordenadora da pesquisa a mim, conforme os Termos de Doação e de Termo de Compromisso para Utilização de Dados (Anexo D e Apêndice A).

Os sujeitos entrevistados - gestores, Secretários Municipais de Saúde, profissionais e diretores e/ou coordenadores responsáveis por setor, área e/ou programa específico, foram devidamente esclarecidos e convidados a participarem da coleta de dados.

A dinâmica das entrevistas consistiu em:

a) apresentação das pesquisadoras, dos propósitos da pesquisa e da documentação: Após serem informados sobre o que consiste a pesquisa decidiram, em pleno conhecimento, pela participação da pesquisa. Além da Carta de Apresentação das pesquisadoras (Anexo B) foi disponibilizado a cada entrevistado um resumo do Projeto de Pesquisa (Anexo C), onde constam os objetivos e procedimentos a serem realizados nesta, obedecendo às normatizações de pesquisa em saúde do CNS 196/1996. Utilizou-se também o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo A);

b) metodologia da entrevista: as questões feitas seguiram o roteiro estabelecido e de acordo com as informações disponibilizadas e quando necessário buscava-se aprofundar a temática relatada.

É oportuno destacar que, nesse processo, foram identificadas várias resistências13 por parte de alguns gestores, profissionais e técnicos materializadas na dificuldade e morosidade no agendamento da entrevista e principalmente por ser um período de férias. Em decorrência

13 Acredita-se que as resistências estão relacionadas ao exercício da gestão e da apreensão por sentirem-se avaliados.

desses fatos, foram entrevistados vinte e dois sujeitos, sendo onze do sexo masculino e onze do sexo feminino, dezenove com formação superior, a maioria (dez) na área da saúde:

a) Gestores, Secretários Municipais de Saúde (compreendendo seis gestores, dois adjunto-substitutos, assim denominados G1, G2, G3, G4, G5, G6);

b) Profissionais (compreendendo quatro da área da Enfermagem, um da Farmácia, dois da Psicologia, um da Medicina, um da Medicina Veterinária, um técnico em enfermagem, denominados respectivamente P1, P2, P3, P4, P5, P6, P7, P8, P9, P10);

c) Diretor e/ou Coordenador responsáveis por setor, área e/ou programa específico (um da área da Administração, cinco com funções de Assessoria e Secretaria Executiva denominados C1, C2, C3, C4, C5, C6).

No quadro 1, a seguir, seguem informações complementares a cerca do campo da pesquisa – as cidades-gêmeas, o número de habitantes, o número de entrevistas realizadas por município, a formação profissional, cargos ocupados dos entrevistados e adesão ao Pacto com a respectiva portaria ministerial.

Cidades-Gêmeas/ População Nº de entrevistas realizadas Gestor Sujeitos Adesão ao Pacto/ Portaria MS- GM/Data São Borja/61.671 03 Superior incompleto Enfermagem; Biologia – Diretor de Planejamento, Orçamento e Projetos 0003/ 04/01/10 Itaqui/38.159 05 Adjunto – substituto Enfermagem Administração; Enfermagem (2); Psicologia – Presidente do CMS 581 / 28/03/11 Uruguaiana/125.435 Paso de Los Libres/51.000 05 02 Administração Enfermagem Farmácia; Psicologia; Ciência Contábil – Diretor;

Professora – Diretora Assistente Social --- Barra do Quaraí/ 4.012 Bella Unión/15.300 03 02 Adjunto – substituto Vice- prefeita / Auxiliar de enfermagem Medicina Professor – Secretário; Enfermagem; --- 581 / 28/03/11 Quaraí/23.021 Artigas/78.019 02 01 Direito Enfermagem Medicina Veterinária --- 581 / 28/03/11 Santana do Livramento/82.464 Rivera/104.921 05 01 Economia Medicina Medicina; Técnica em Enfermagem; Assessor --- 581 / 28/03/11

Quadro 1 - Informações sobre a área de pesquisa de campo, sujeitos entrevistados e situação do município em relação à adesão ao pacto

Foi frequente a indicação, dos próprios entrevistados, para realização de entrevistas coletivas, objetivando a interação e complementação das informações. Cabe salientar que alguns documentos foram disponibilizados pelos entrevistados, no momento das entrevistas.

Em todos os municípios visitados questionou-se sobre a inserção do Assistente Social no quadro de funcionários. Com exceção de Quarai e Barra do Quarai, que não contam com esse profissional na Secretaria de Saúde, nos demais municípios o Assistente Social não participou do processo de pactuação e assim não operacionalizou a normativa.

As falas dos entrevistados foram analisadas e interpretadas a partir da análise de conteúdo temática. Esta técnica possibilita encontrar núcleos de sentido que compõem uma comunicação cuja presença ou freqüência (de palavras, frases, conceitos e representações) são significativas para o alcance dos objetivos traçados nesta pesquisa. A análise temática ligada à noção de tema pesquisado permitiu identificar a compreensão de gestores, profissionais e técnicos entrevistados acerca do processo de pactuação, os significados manifestos e latentes nessas falas.

Segundo Bardin (1994) a técnica consiste em três etapas:

a) Pré-análise

Na exploração do material e tratamento dos resultados obtidos ou interpretação. É o trato inicial das entrevistas, e pode ser decomposta nas seguintes tarefas:

a) leitura flutuante: leitura do material, de maneira exaustiva, deixando-se impregnar pelo seu conteúdo;

b) constituição do corpus: organização do material, contemplando todos os aspectos levantados no roteiro;

c) formulação de hipóteses em relação ao material a ser analisado.

Nessa fase, definiu-se a unidade de registro (palavra-chave ou frase), a unidade de contexto (delimitação do contexto de compreensão da unidade de registro), os recortes, a forma de categorização, a modalidade de codificação e os conceitos teóricos mais gerais que nortearam a análise. As categorias de análise do estudo são: Pacto pela Saúde, processo de pactuação, gestão do SUS, regionalização.

Consistiu na operação de decodificação, transformando os dados brutos e objetivando alcançar o núcleo de compreensão do texto, permitindo assim uma maior aproximação e aprofundamento ao conteúdo das entrevistas.

c) Tratamento dos resultados obtidos e interpretação

Nesta etapa, realizaram-se inferências e interpretações de acordo com o quadro teórico da tese – compreendendo as categorias escolhidas:

a) Pacto pela Saúde/processo de pactuação;

b) Gestão do SUS/regionalização, mas sem deixar de considerar outras que emergiram a partir da leitura do material.

Da análise temática, do conteúdo das falas, extraíram-se as categorias:

―regionalização‖, ―autonomia municipal‖ e ―descentralização‖. Estas categorias são

abordadas no decorrer desta tese.

É importante ressaltar, ainda, algumas das limitações deste estudo. A primeira limitação, e mais significativa, relaciona-se a disponibilidade de tempo, parcial, desta pesquisadora para realização do doutoramento, da pesquisa e construção da tese. Além do tempo, a distância foi outra limitação: a pesquisadora reside a aproximadamente 500 km da capital do estado onde se localiza a instituição na qual realizou o doutoramento. Também em virtude da distância, não foi possível a coleta de dados em todas as cidades-gêmeas do RS.

Algumas limitações do estudo podem ser indicadas, sendo tanto de ordem pessoal como decorrente do próprio objeto de estudo. No primeiro caso, embora soubesse de antemão das dificuldades relativas à disponibilidade de tempo e da distância da instituição onde se realizou o doutoramento, não há dúvida que interferiram na qualidade da tese. As limitações derivadas do objeto de estudo ocorrem em função da dificuldade que se tem, no Brasil, de realizar quaisquer pesquisas avaliativas. Aliada à esse persistente receio outro aspecto diz respeito à posição reticente dos gestores, que se sentem ameaçados e entendem as questões como pessoais e não como próprias de um gestor público.

O contexto mundial atual caracteriza-se por uma série de profundas mudanças, nos campos científicos e tecnológico, entre eles destacam-se a integração em rede. Os resultados destas mudanças influenciam as áreas produtivas, econômicas, sociais e políticas. No que tange à saúde estas mudanças, sob influência das organizações produtivas como, por exemplo, o taylorismo e fordismo, introduzem inovações nos modos de organização dos processos de trabalho, de produzir saúde e de gestar os serviços.

Considerando o objeto desse estudo, O Pacto pela Saúde – Gestão do SUS, na intenção de avaliar o processo de implementação deste dispositivo governamental incidente sobre a proteção sanitária em regiões fronteiriça, no caso as cidades-gêmeas da fronteira Arco Sul, Brasil – Rio Grande do Sul, Argentina e Uruguai, o tema gestão14 ocupa lugar privilegiado nesta discussão, tornando-se, assim, imprescindível uma aproximação ao seu referencial teórico, que se deu a partir de leituras de obras oriundas da área da administração.

Nessa incursão, num primeiro plano, resgata-se, de maneira sucinta, o histórico acerca dos fundamentos de gestão abordando os paradigmas tradicionais e contemporâneos dessa. Num segundo plano, a partir dessa contextualização, busca-se definir as categorias teóricas gestão e gestão em saúde. Para tanto, tem-se, também, o entendimento que,

Daí não segue que definir é coisa irrelevante. Muito ao contrário. Segue que precisamos definir com tanto maior cuidado, buscando termo médio entre definições que apenas simplificam, e outras que apenas complicam. Eis o desafio árduo: simplificar, de um lado, para ver melhor, complicar de outro, para ser justo com a riqueza do fenômeno (DEMO, 2008, p. 14).

Há que se deixar claro que o objetivo central do capítulo não é aprofundar o debate e tampouco realizar uma análise crítica acerca das teorias administrativas. Trata-se de uma incursão ao seu referencial, de modo a sustentar a discussão e análise aqui realizada e, da tentativa de identificar quais os paradigmas que têm sido adotados, implícita e explicitamente, no campo da gestão em saúde. Acredita-se que os paradigmas adotados, retratam o contexto

14 Não há uma distinção significativa entre gestão e administração. Observa-se que esta distinção relaciona-se à divisão do trabalho nas organizações, responsável por criar as categorias, em virtude da complexidade e características de cada função: gerente, diretor, chefe, etc. (NOGUEIRA, A. M., 2007; OLIVEIRA; SILVA, 2006).

das organizações, nos sistemas de saúde e o modo como são incorporados e reproduzidos no discurso dos entrevistados.