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3.4 INSTINTOS, HÁBITOS E INSTITUIÇÕES O AGENTE VEBLENIANO

3.4.1 Instintos

A raça humana age a partir das propensões instintivas que evoluíram através do processo de seleção natural darwiniano. Estes são os “prime movers” da conduta humana e determinam além da sobrevivência da espécie, outros aspectos da vida como: a eficiência, o prazer, a dor e o propósito da ação humana. Assim, os instintos funcionam teleologicamente e podem ser compreendidos através de uma abordagem que os classifique como os motivadores últimos de qualquer tomada de decisão.

Seres humanos possuem vários instintos e estes se diferenciam quanto ao objetivo a que estão voltados, assim como quanto ao tempo com o qual a resposta ao estímulo aparece. Neste último aspecto, variam de meros reflexos36 (cuja reação é imediata) a reações que envolvem forte grau de consciência deliberativa. Porém, Veblen alerta para a diferenciação entre os instintos humanos e os tropismos presentes em qualquer espécie animal. Humanos possuem consciência de seus instintos e buscam adaptá-los para melhor realização de seu fim, enquanto os tropismos são apenas reações fisiológicas automáticas (VEBLEN, 1918).

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Segundo Waller (2014), o conceito de instintos em Veblen apresenta uma série de inconsistências. Fato que desmotivou gerações de economistas na compreensão deste conceito. Neste trabalho considera-se que os instintos são transmitidos geneticamente, apesar das diferentes interpretações possíveis.

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Denominadas de quasi-tropismatic devido sua proximidade com os tropismos. O conceito de tropismo será discutido a seguir.

61 O autor delimita o termo instinto, amplamente utilizado nas ciências biológicas e na psicologia, como as propensões inatas voltas a uma busca consciente a determinado objetivo, relegando às demais reações automáticas aos tropismos37. A diferença entre o homem e os animais está no fato de que apesar de ambos serem governados por propensões instintivas, nos primeiros há um forte componente deliberativo entre a propensão inata e a realização da ação determinada por esta propensão. Todavia, a presença deste componente deliberativo não afasta a onipotente e absoluta sujeição humana a seus instintos, haja vista serem estes os responsáveis por direcionar esta capacidade deliberativa ao método de realizar suas ações. Nas palavras do autor: “Men take thought, but the human spirit, that is to say the racial

endowment of instinctive proclivities, decides what they shall take thought of, and how and to what effect” (VEBLEN, 1918, p.6).

Os agentes estão sobre influência de diversas propensões que se relacionam entre si e determinam quais os objetivos a serem seguidos pelos agentes. Em última instância a determinação de sobre qual instinto determinada ação foi tomada no ambiente econômico é dificultada pela grande variedade de instintos complexos que agem sobre a capacidade deliberativa deste. Não obstante, uma análise pormenorizada de quais são estes instintos e suas ramificações é importante à formulação de uma teoria da tomada de decisão vebleniana.

Uma observação adicional ainda sobre a complexidade de instintos torna-se importante. Segundo Veblen, é impossível analisar a ação individual destes uma vez que, muitas vezes o agente toma a decisão sobre a influência de dois ou mais instintos que se contrapõem. “[…] it

is perhaps even more to the purpose to take note of how and with what effect the several instinctive proclivities cross, blend, overlap, neutralize or reinforce one another” (VEBLEN,

1918, p.8). Há ainda uma diferenciação quanto à interelação instintiva visto que os instintos mais simples, específicos e diretos (mais próximos das reações tropismáticas) não se relacionam em rede. Contudo, instintos mais gerais, como o Parental Bent ou o Instinct of

Workmanship38 (analisados a seguir), compõem uma rede tão intrincada que torna difícil sua

delimitação. O autor afirma que essa “complicação e contágio infinitos”, em que cada instinto afeta os demais, assim como os efeitos cumulativos dos hábitos que objetivam a realização das propensões instintivas, são o foco de sua análise do processo de decisão.

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Na concepção vebleniana, tropismo são a capacidade de reação a estímulos externos que não levam em conta qualquer componente social, ou seja, não são mediados pelos hábitos ou instituições (ALMEIDA, 2014).

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62 Figura 2 – Tipos de Instintos Quanto à Complexidade

Todos os instintos, inclusive os que se localizam no extremo esquerdo da figura acima, utilizam a capacidade de raciocínio do agente, e são teleológicos no sentido em que determinam um objetivo último para o agente. Mesmo os instintos quasi-tropismatic, que aparentam estar próximos dos tropismos automáticos, necessitam que o agente utilize sua inteligência em menor grau a fim de alcançar o objetivo por ele traçado. Assim, Veblen afirma que: “[…] all instinctive action is intelligent in some degree. This is what marks it off

from the tropisms and takes it out of the category of automatism” (VEBLEN, 1918, p.31).

Na abordagem psicológica na qual Veblen baseia sua teoria do processo de decisão, instintos são substratos das características fisiológicas das espécies, que são transmitidas geneticamente e por isso comandam seu comportamento. Essa relação indica que há um relação hierárquica forte entre as características físicas e os instintos que estas desenvolvem. Ainda que tais características físicas determinem indiretamente o comportamento social que a espécie virá a desenvolver. Na citação a seguir, o autor ilustra essa relação hierárquica e aponta como esta gera a possibilidade de uma grande variabilidade nos objetivos instintivos e seus consequentes métodos habituais:

This vague and shifty character of the instincts, or perhaps rather of the habitual response to their incitement, is to be taken in connection with the breadth and variability of their physiological ground as spoken of above. For the long−term success of the race it is manifestly of the highest value, since it leaves a wide and facile margin of experimentation, habituation, invention and

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accommodation open to the sense of workmanship. At the same time and by the same circumstance the scope and range of conventionalization and sophistication are similarly flexible, wide and consequential. No doubt the several racial stocks differ very appreciably in this respect (VEBLEN, 1918, p.13).39

Segundo o autor, os instintos são herdados geneticamente entre gerações (conjuntamente com as características físicas) e possuem uma forte estabilidade mutagênica. Os instintos humanos são os mesmos desde sua origem genética, porém, o ambiente físico e institucional sobre os quais os agentes estão cercados estão em constante (e rápida) mudança.40 Contudo, a estabilidade genética dos instintos não representa uma total imutabilidade destes e sua exclusão do ponto de vista evolucionista de maneira que os instintos e as características físicas estão também em constante mudança porém sob um ritmo muito mais lento que o de mudança habitual e institucional.